Elaboração, coleta e transcrição da entrevista: Alessandro de Moura.
[Falta revisão]
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Realizada no Jardim Alzira, Santo Amaro -
18/3/2014
Nasceu na Bahia, na cidade de Santo Estavão/BA, 1955. Migrou
para São Paulo em 1973. Chegou em São Paulo com 14 anos. Seu primeiro emprego
na indústria foi na metalúrgica Sandewic, na Nações Unidas/SP. Trabalhou em 16
fábrica em São Paulo, em mais uma em Barueri e outra no ABC. Foi militante
ativo em Santo Amaro organizando operários na fábrica Villares-Santo Amaro, que
na época contava com cerca de 5.800 operários. Em 1979 atuou na organização dos
Piquetões. Como militante da Oposição Metalúrgica, integrou chapa para disputa
da direção do sindicato metalúrgico de São Paulo em 1981.
Seu primeiro emprego
foi aqui em São Paulo?
É, registrado sim. Mas trabalhar eu trabalho desde quando eu
aprendi a andar, né, lá no Nordeste. Então, a gente, desde que aprende a andar,
a partir dos 5 anos que aprende andar e falar e fazer movimento já trabalhava.
Pelo que eu me conheço por gente, eu trabalho desde que comecei a falar e
andar, agora, emprego com registro em carteira foi a partir dos 15 anos , ai já
foi aqui [em São Paulo]. O primeiro emprego eu não tinha registro porque tinha
14 anos, era sem registro, porque eu trabalhei em uma imobiliária de
office-boy, ai, depois que eu fui para área metalúrgica...
Qual foi a primeira
metalúrgica?
A primeira metalúrgica foi a Sandewich do Brasil.
Isso com 15 anos?
Sim.
E o sr ficou quanto
tempo nela?
Eu trabalhei pouco tempo, trabalhei só 6 meses na Sandewich.
Em seguida eu fiz inscrição para o SENAE pela indústria Villares. Porque ai eu
fui fazer o curso do Senai para aprendiz Senai pela indústria Villares. Fui
para a Villares e para o Senai pela própria empresa.
A Villares tinha
quantos trabalhadores?
5.800 trabalhadores.
Foi lá onde trabalhou
o Lula?
O Lula trabalhou na Villares de São Bernardo do Campo, na
divisão motores, na divisão... Porque a Villares tinha várias unidades: Tinha a
unidade Santo Amaro, que era motores e elevadores, tinha a divisão São Bernardo
que fazia peças para navios, tinha São Caetano do Sul que era laminação. O
grupo todo tinha 15.000 trabalhadores. O grupo Villares na época tinha 15.000
trabalhadores.
O sr trabalhou lá até
que ano?
Eu trabalhei até 1979. De 1974, do final de 1974 até 1979.
No começo de 1979.
E o sr começou a
militar quando?
Em 1978. Na própria Villares nos anos de 1978, ai, eu
comecei ter contato... porque assim que eu sai do... Na Villares eu fiquei 2
anos como aprendiz, eu ia para o Senai e voltava para a empresa. Depois é que
eu fui trabalhar direto na empresa, ai que a gente começou um contato real com
a vida operária em si, né. Ai, como a Villares era uma empresa que sempre tinha
militantes, tinha até dirigente sindical dentro da empresa, o Antônio Lauro de
Campana, era mais conhecido como Toninho Cabeleira. Ele era diretor do
Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, e ele trabalhava na Villares la...
Ele era da mesma
turma do Joaquinzão?
Era da turma do Joaquinzão. Então, assim, os primeiros
contatos que a gente teve assim, mais com a direção porque dentro da fábrica tinha
um diretor sindical e a gente começou a ter contato no comportamento dele,
justamente quando tinha algum problema referente à própria empresa, o
comportamento dele era completamente o contrário do normal...
Mas tendia para a
patronal?
Sempre era mais para a patronal. Então, assim... ai... E
começou o contato assim a partir de 1978, que teve assim o contato mais com a
chapa de oposição, que onde o encabeçador da chapa era o Anísio Batista e o
vice-presidente era o Santo Dias da Silva, porque ele trabalhava aqui na
região. Ai eu vim a conhecer o Santo nessa época de 1978. E ai comecei a
conhecer gente dentro da empresa, também, a gente já começou participar de
pequenos movimentos dentro da empresa, quer dizer, movimento reivindicatório
sempre, como melhoria do refeitório, limpeza, banheiro, essas coisas, assim bem
simplório, aparentemente não tem nada haver com nada, coisa assim.
Então a partir daí que a gente começou a ter contato com a
vida real operária na fábrica, com a vida metalúrgica. Foi dentro da Villares
que eu comecei a dar os primeiros passos rumo a uma consciência operária. Então
a partir daí veio tudo, as eleições [sindicais] de 1978 onde eu participei
ativamente na campanha, como a Villares é uma das fábricas que tinha maior
número de sindicalizados, ai eu participei bastante dentro da fábrica, mesmo
sendo ilegal. Porque tudo, qualquer coisa que fizesse dentro da empresa era
ilegal. Então, até material para a gente entrar, para fazer propaganda, era
tudo clandestino, não tinha... Nos banheiros...
Isso mesmo em 1978?
1978. Principalmente. Naquela época, que foi na época do...
acho que era o Geisel, porque ai depois
veio o Figueiredo, que foi em oitenta... Figueiredo já foi em 1984, já foi no
final do... Mai ai, assim, nos anos 1970, mesmo eu começando cedo em 1973, por
ai... todo esse tempo, eu só vim a ter contato real assim com o que é
sindicato, essas coisas, em 1978. Porque não existia também movimento nos anos
1970... Depois de 1968, os anos 1970 houve uma paralisia geral. Ai só começou a
ter os primeiros movimentos, assim, operário, a partir de 1978. Que, começou
com o trabalho do pessoal com o trabalho das Comunidades Eclesiais de Base e as
mães do Clube de Mães com o movimento chamado Movimento do Custo de Vida, que
foi criado nos bairros né. E, assim, o movimento operário mesmo, ele começou a
ganhar corpo, assim, nos anos de 1978, que, com a participação da Oposição
Metalúrgica, principalmente na categoria dos metalúrgicos de São Paulo né...
O sr já concorreu em
eleições do sindicato?
Já, já. Eu saí na chapa com o Waldemar Rossi em 1981. Na
prática ganhamos. Todas eleições que a Oposição participou, ganhou. Mas, até,
nas ultimas... eu estava pesquisando alguns documentos, assim, o Regime
Militar, ele, acontecia o que acontecia, mas o Sindicato dos Metalúrgicos de
São Paulo não era prática vir com uma posição mais de esquerda. Então, todas as
eleições a Oposição ganhava mais não levava. Sempre os caras davam um jeito de
burlar alguma coisa para que a oposição não levasse o Sindicato dos Metalúrgicos
de São Paulo.
O Sindicato do Metalúrgicos na época tinha, a categoria aqui
em São Paulo era 450 mil, hoje deve ter cento e poucos mil, mas na época era
450 mil trabalhadores em São Paulo, mas assim, pulverizados em grande e
pequenas indústrias. Como a indústria de São Paulo era um indústria de
transformação, muito assim, a pesar de não ser grandes industriais como as
montadoras do ABC, que tinha uma concentração de operários em grandes
industrias, havia concentração, grandes havia poucas, a maior mesmo era a
Villares e a Metal-leve, a Prada, a Vaps [Santo Amaro], aqui na região, a
Monarq, a Cibié, eram as maiores indústria que tinha... a que tinha maior
número de operário era a Villares que tinha 5.800, depois vinha a Monarq com 4
000, a Prada com 2.800, a Vaps, que era do grupo Bosch, com 2.000. Então era
assim, o resto era pequenas, grandes, médias indústrias, tinham muitas.
Nesse setor de transformação, aqui em São Paulo fazia tudo.
Produzia desde peças para avião até armas, que era produzido aqui em São Paulo.
Então era, do ponto de vista estratégico,
para a manutenção de um sistema, era fundamental. Se o sistema perde o
Sindicato de São Paulo,que era apoiador do Regime Militar, era muito difícil o
controle do movimento operário. Então, por isso que eles jogavam forte assim. O
sistema e mesmo a patronal, jogavam forte que era para que o Sindicato do
Metalúrgicos continuasse como estava. Então, pelas entrevista que você fez você
já ouviu vários exemplos, filmes, tudo, que mostra isso ai, né. Então, é nesse
período de 1978 que eu comecei a dar os primeiros passos via Oposição
metalúrgica como a consciência operária de fato.
O sr começou a
militar antes ou depois das greves do ABC em 1978?
Antes. Bem antes. Antes das greves do ABC... O começo foi em
São Paulo. Porque aqui em São Paulo foram feitas greves por fábrica. Eram
greves individuais por fábricas. E muitas fábricas, principalmente, acho que
umas 5 empresas nós conseguimos criar as comissões de fábricas, algumas criar
comissões de fábrica. Assim, foi destroçadas depois, porque assim... o pessoal
começou a atuar então automaticamente... porque não tinha estabilidade, não
tinha nada. O movimento estava começando, era inexperiente, ai formava uma
comissão e ai o que acontecia? O pessoal ia lá, pegava o todo mundo da comissão
e mandava embora. Então, os primeiros passos das comissões de fábrica foram
dados aqui em São Paulo, aqui em Santo Amaro, o nome da empresa que teve a
primeira comissão nos anos de 1978 foi a metalúrgica Raistein, na Nações Unidas...
Ainda existe, eles fabrica empilhadeiras, essa empresa ainda está nas Nações
Unidas ainda, eu acho que é uma das únicas que sobrou, hoje eles já estão com a...
junto com a Comat, com outras empresas grandes né. Mas foi os primeiros...
Antes de 1978 o sr
não tinha ouvido falar das comissões?
Não. Porque as primeiras comissões foram todas espontâneas.
Não havia nada assim, organizado. Previamente preparado. O que é que existia? A
própria repressão, assim, o que ela reprime, ela cria seu próprios adversários.
O que que acontecia,assim, acontecia algum movimento dentro de uma empresa,
automaticamente os patrões mandavam aquele pessoal embora. Eles já iam para
outra empresa com experiências, com experiência de lutas. Então, ao invés de
ficar assim... Tinha um movimento na Villares, um exemplo, então, nós fizemos
vários movimentos, daqueles movimentos, normalmente é demitido umas 100
pessoas. Essas 100 pessoas, ele passou a ter uma experiência pelo
enfrentamento. Quando ele ia para outra empresa, ele já tinha essa consciência,
ele não era mais aquele peão xucro, que, como nós chamamos, 'o burro
obediente', né, faz o que manda. Ele já tinha, além de ele ser operário, ele já
tinha lampejo de consciência, de pelo menos os primeiros enfrentamentos. E o
Regime Militar, pela a dureza, a perseguição, ele também criava essas
situações, porque cada um de nós que saiu e ia para outra empresa, ai só aqui
na região... em São Paulo eu trabalhei em 16 empresas, trabalhei em mais uma no
ABC, trabalhei em mais uma em Barueri, foi um total de 18 empresas. Trabalhei
quando não tinha mais espaço em São Paulo. E, em todas empresas que eu
trabalhei em São Paulo, era de média para grande. As maiores empresas, eu
trabalhei em todas elas.
Então isso, os frutos, que eu falo que são os algozes do
capital, é assim o próprio capital, assim, a repressão, que ela mesmo prepara.
Porque, uma vez que teve um enfrentamento, a pessoa nunca esquece. Ele vai para
outro lugar, quando surge qualquer oportunidade, esse pessoal que já fez o
enfrentamento, são os primeiros a estar na frente. Então, em 1978 foi um ano
muito rico em movimentos localizados. Como o sindicato não jogava...
A primeira foi a
Raistein? E depois, quais foram as outras?
Da comissão de fábrica, teve a Toshiba onde o Anísio trabalhava,
Anísio Batista, ele trabalho na Toshiba, então lá também houve uma greve por
fábrica. então o que acontecia? Fazia greves localizadas, até reivindicações
bem básicas, refeição, aumento salarial e nisso ai, como não tinha sindicato, o
sindicato não dava a menor importância e jogava contra o movimento, o que que o
pessoal fazia? Não chamava o sindicato. Fazia greve, não chamava o sindicato.
'E ai, vai negociar com quem?'. Ai a própria patronal falou: 'Então forma a
comissão e vamos conversar'. Ai o pessoal formava a comissão e ia lá
conversava, decidia até encerrar o movimento, terminava e ai depois disso
mandava todo mundo embora né, porque já estava todo mundo identificado.
Então, começou nessa questão, as comissões de fábricas muito
assim... E, a partir daí, com a continuidade do movimento, aconteceu greves
localizadas em várias fábricas, chegou o mês de novembro, porque era outubro
que era o mês de campanha salarial, como já tinha essa força acumulada por
fábrica, a Oposição já tinha militantes em toda São Paulo e já teve a
experiência da chapa, tinha tido a eleição em maio, de 1978, no meio do ano e
teve todo aquele... a Oposição ganhou a eleição, foi constatado várias fraudes,
foi anulada, depois o Ministro do Trabalho Arnaldo Preto, foi ele pessoalmente
no sindicato e empossou a diretoria, ai já tinha essa experiência acumulada de
fardo do trabalho de Oposição e na campanha salarial nós mobilizamos os que nó
podíamos para ir para o sindicato. Porque assim, mesmo contra nós, o sindicato
tinha a premissa da categoria, eu o que que nos fizemos: 'Vamos mobilizar a
categoria e vamos forçar o sindicato a decretar greve na categoria'. Então essa
foi uma decisão em reuniões paralelas que a gente fazia nos bairros,
principalmente nas Igrejas, né... Tinha as Igrejas ai, o setor progressista da
Igreja, eles davam muito espaço para a gente, se reunia, a gente ia para dentro
do sindicato com essa posição.
E que impacto tiveram
as greves do ABC...
Não. O impacto foi ao contrário. Assim, porque então nós
mobilizamos assim, aquelas fábricas quando tinha trabalhos organizados, levamos
todo esse pessoal para as assembléias do sindicato, para construir a greve por
categoria, porque a gente só fazia greve por fábrica. A gente queria uma greve
por categoria em 1978. Ai, nós mobilizamos em todas as regiões, assim, nós
tomamos literalmente a direção do sindicato antes da greve. Tomamos,
totalmente. Só que... os cara tem a máquina. [risos]. Ai então, como o
sindicato não tinha espaço, nós tivemos assembléia na rua, não tinha sistema de
comunicação, sistema de comunicação é aquele de um fala e faz o eco, vai
repetindo, repetindo, repetindo, não é. Ai um fala e os outros vão repetindo
até chegar no ultimo.
Ai nós, teve um companheiro nosso, que a gente chamava de
Chico-viola, que era da Exprettchu, ele trabalhava na Exprettchu ele também
foi.. ele estava na chapa de 1978, ele era da Oposição, nós dominamos toda a
assembléia, tomamos conta literalmente de todo o sistema de som do sindicato,
ai passamos a direção para o Chico-viola, ai o que que ele fez, ele entregou o
microfone para o Joaquinzão, para o Joaquinzão decretar a greve. [risos]. Ai ,
ele já assim impressionado pela...
Porque naquele tempo era uma coisa inédita na época, na assembléia o
máximo que acontecia nessas assembléias era 200 pessoas, a gente estava com
10.000 pessoas lá, assim na Rua do Carmo, em outubro de 1978. Aquela famosa
foto lá, se você olhar, tem uma faixa da Villares lá no meio, na época eu
trabalhava na Villares e eu estava com 3.000 pessoas da Villares lá. Então
assim, nós levamos assim, intimamos o pessoal.
E como o sr fez esse
chamado dentro da fábrica?
Era no boca-boca. Como eu trabalhava na manutenção, eu tinha
muita circulação dentro da empresa, o pessoal me conhecia bem. Ai, a gente
passava: 'Passa para o fulano, vai lá passa para as pessoas'. Ai a greve, foi
decretada greve geral. Ai o que que nós fizemos? Voltamos para a fábrica,
'vamos preparar as greves'. Ai, porque não era assim greve de rua, era greve
localizada dentro da fábrica, parando empresa, essa empresa que eu estava
parou, várias outras. Ai, nesse espaço que a gente estava em greve dentro da
fábrica, o Joaquinzão já estava negociando o acordo com a FIESP. [risos] para
acabar com a greve no dia seguinte. Então a greve durou muito pouco, mais teve
um impacto muito grande a nível de categoria porque atingiu assim, as pequenas
e... as grandes e médias empresas pararam todas. Ai quando a gente chegou lá o
acordo já estava pronto, negociado. Durou 2 dias a greve. Então o ano de 1978
foi isso. E ai o que que aconteceu, nesse ano mesmo de 1978 teve assim, ai já
surgiu as primeiras greves por fábrica no ABC, que foi na Scania.
Mas à essa greve
geral, de 1978, o ABC não aderiu?
Não. Porque na época não existia inter-categoria, não
existia inter-fábricas, não existia assim, interligação, não existia nada
disso. É cada qual fazia sua partezinha no seu local de trabalho e tocava a
vida para frente. Porque ai, com essa greve de 1978, que foi no final do ano,
que é em outubro, que é o nosso acordo coletivo é 1º de novembro. Mas o pessoal
do ABC acompanhou, tinha muita gente aqui, na região, que era do ABC como o
Betão, o Bagaço, o Rômeu, porque eles trabalhavam na... O Betão trabalhava na
Ford, o Rômeu na Volks, o Bagaço acho que era na Mercedez. Os três eram do ABC
e que acompanhavam a gente aqui. O Rômeu era mais conhecido como Ganso. Ninguém
conhecia por Rômeu, é Ganso. E pior, porque dentro da fábrica, a primeira coisa
que você ganha é um apelido, raramente você pega um pessoal que não tem um
apelido dentro da fábrica.
E isso ai deu luz, mais, para o pessoal começar a fazer o
trabalho de fábrica no ABC. O ABC não começou por uma greve geral, começou por
uma fábrica. Ai, depois estendeu para uma greve geral. Mas, assim, a primeira greve geral foi em 1978,
em outubro de 1978 aqui em São Paulo.
O que teve de mais
organizado em São Paulo, no movimento operário foi essa greve geral? Porque no
ABC só teve greve por fábricas...
Exatamente. Foi a greve geral de 1978, que foi organizada
assim... basicamente, o que que contribuiu? [...]. Não aparece, como não foi
uma coisa oficial, ai o que que... Porque o movimento, nessa parte assim, as
vezes encobre muito da história e só aparece, assim, aquilo que... a greve de
São Paulo, quem publicou? Acho que foi o Estadão e a Folha de São Paulo. Na
época, vc... Aquela foto [da rua do Carmo] acho que é até da Folha ou do
Estadão, não lembro... Então a greve, assim, o movimento organizado de 1958
contribuiu bastante com esse trabalho de fábrica, a gente fez... principalmente
as fábricas que tinham comissão né, e o trabalhozinho miúdo de fábrica. A gente
mobilizou tudo e fomos tudo para dentro do sindicato.
Na Villares chegou a
ter uma comissão?
A Villares é uma das fábricas que nunca teve uma comissão.
Não... Era uma fábrica onde tinha um trabalho...
Em nenhuma delas?
Não. Em nenhuma das unidades da Villares. Era... onde tinha
o movimento mais assim, organizado, onde tinha mais militantes, mas, só que
assim, nós nunca conseguimos uma comissão dentro da Villares. Em situação nenhuma,
em nenhuma das unidades, nós nunca conseguimos uma comissão dentro da Villares.
Mas isso porque não
tinha como institucionalizar uma?
Não, a direção não aceitava mesmo...
Qual direção?
A direção da empresa...
Mas vocês tinham um
grupo que se reunia?
Sim. A gente sempre tinha grupo. Então, o que que a gente
fez na Villares, assim... como a gente não conseguia um trabalho organizado via
comissões, então a gente começou a atuar pelas CIPAS. Ai, na prática a gente
fazia comissão via CIPA. Mas sempre tinha grupo organizado, pessoas
organizadas, se reuniam fora... a gente atuava, assim, era uma das fábricas
mais oposicionistas à diretoria do sindicato, era a Villares,não é?! Por causa,
assim, dessa efervescência e militância. Mesmo, se saia [da fábrica], os caras
mandavam [embora], mas sempre ficava gente e continuava o trabalho. Sempre,
assim, quando eu sai, ficou um grupo grande organizado dentro da Villares.
Um grupo de quantos,
mais ou menos?
Assim, que a gente se reunia periodicamente fora, era 30 pessoas
direto, que se reunia fora. E o interessante é que essas pessoas eram de cada
setor, não era só de um setor, como a empresa é grande, a empresa é organizada
por setores. Então, o que que a gente fazia, pegava setor de fermentaria,
usinagem, manutenção, almoxarifado, produção, montagem, teste, então, a gente
sempre procurava, assim, formar e puxar militância em todos esses setores.
Quando acontecia alguma coisa, assim, a gente só chamava os militantes de cada
setor [...], como a comunicação, tudo era proibido, então a gente só fazia um
mosquitinho [panfleto minúsculo] e passava: 'passa para tal setor, passa para o
homem de tal setor'. Era só um... ai, a gente falava: 'Meu, passa lá pra ele',
ai o cara lia: 'passa para outro', e ia... ai em pouco tempo a gente já tinha
comunicação em toda a empresa. Então, essa era a forma que a gente usava
para... As vezes até escrito à mão, pegava um papel de pão lá, o papel de
produção lá, o que eles escreviam e passava. Então essa era uma forma de
mobilização interna.
E
no meio dessas pessoas, tinha gente de partido também? Quem que atuava na Villares, de corrente?
Sim, Tinha. Tinha, assim, depois... com a continuação do...
como começou a surgir esses focos de movimento mais organizado, ai a esquerda,
os partidos de esquerda, começou a chamar a atenção. Eles começaram a preparar
militantes, o pessoal que saia da... militantes deles de faculdade, estudantes,
para se tornar operários, para ir para as fábricas, o pessoal ia trabalhar na
área de controle, trabalhar no escritório. Ai, depois, ai sim, começou a surgir
militantes do PC do B, começou a surgir militantes da Convergência, militantes
d´O trabalho... E o pessoal, com a incisão das próprias correntes de esquerda,
para jogar o pessoal para a produção. Tanto que eu tive contato com partidos,
pessoal de esquerda dentro da Villares. Eu tive contato com militantes da
Villares, do PC do B, dentro da Villares que eu não sabia. Na verdade não fui
eu que descobri o pessoal, o pessoal é que me descobria [risos]. A pessoa via aquele
neguinho rebelde: 'aquele lá serve'. Então, não era só visado pela repressão
era visado também pelos partidos de esquerda.
Então foi isso que eu comecei ter mais contato com a
política via militantes de partidos de esquerda. A gente começou, uma coisa que
na época chamou muito a atenção, foi aquele, um jornal que era... que era o
jornal O movimento, que era
encabeçado por Raimundo Pereira, Fernando Henrique Cardoso, Teotônio Vilela, o
outro escabroso, que era da Cobertores Paraíba... o... até que foi super homenageado ai... isso ai
é... faz parte da história né... Esse jornal O movimento, assim, ele contribuiu bastante para elevação da
mili... para elevar o nível da militância. Porque na época, assim, porque
quando a Folha, a Folha apoiava o Regime, depois que a Folha deixou de
apoiar... Então assim, quando alguém lia a Folha, o pessoal já ficava de olho,
porque na época era um jornal avançado, que era Folha de São Paulo... Então, se
um peão de fábrica entrasse com uma Folha debaixo do braço, ai os cara já
ficavam de olho: 'porque que ele tá lendo a Folha?' Não é um pessoa... Já está
um pouco além do... da expectativa, já está acima da média. Então os olheiros observavam muito o que a gente
lia né... Ai, eu comecei a ter contato com a esquerda via o jornal O movimento, porque tinha um militante
lá do PC do B, era um engenheiro, assim, um dia eu vi ele lendo um jornal ai eu
perguntei o que que era né, ai ele passou um jornal pra mim...
Isso em 1978?
Em 1978. Foi via jornal O
movimento que eu conheci um dirigente do PC do B dentro da empresa, lá...
E como o senhor
descreveria o ano de 1978?
O ano de 1978, assim, acho que foi o despertar do movimento
operário. Que foi um ano, onde vinha... porque depois da repressão de 1968,
aquele movimento estudantil de 1968, a morte de Vladmir Herzog, que foi muito
pouco divulgado né, assim, a gente via só fotografias, jornais, a gente não
tinha... o movimento operário, ele não tinha conhecimento de nada, tudo o que
acontecia estava tudo dentro... era o milagre econômico, não é... Então, assim,
a classe operária era muito jovem ainda, estava vindo do campo para a fábrica,
ainda havia uma migração de pessoas do interior para trabalhar na indústria,
pessoas que vinham do campo para trabalhar na indústria, né. E assim, tinha
além da efervescência da construção civil, mas a indústria metalúrgica que é um
setor especializado, então os melhores trabalhadores, assim, que eram
recrutados, iam para o setor na área de metalurgia, depois ia para a química,
ia para os setores mais especializados da indústria e eles pegavam, justamente,
mandavam fazer cursos no Senai, porque a indústria estava precisando de mão de
obra especializada. E, na nossa época, a gente que tinha uma certa especiali...
que era especializado, tinha um tramite
maior dentro da empresa, por isso que a gente tinha mais liberdade para andar
né, para se locomover de local para outro...
Então, esse ano de 1978 foi o ano, assim, do... aonde o
despertar da consciência de classe, principalmente da classe operária que é a
classe que produz, começou a despertar e ai que começou a abrir fissuras no
Regime Militar, porque até a época, assim, o forte era o movimento estudantil.
Que ai, ia lá, brigava, fazia uma manifestação, mas, assim, não arranhava o
sistema. O que é... o que começou a arranhar o sistema, começou a quebrar a
muralha do sistema, praticamente, é a produção, parou a produção, ai se
questiona o sistema. Porque, o que que acontece, no despertar da consciência de
classe? Como eu falei para voc~e, a gente começa com coisas pequenas, você vai
reivindicar assim: 'a comida está ruim, então vamos fazer um movimentozinho
para melhorar a porra dessa comida que está uma merda, esse banheiro está sujo
pra caralho'. Ai, para o operário aquilo é normal, quando ele vê essas pequenas
reivindicações, o que que aparece, qual é a primeira coisa que aparece? O que
aparece é que, além do... você acha que vai negociar com o patrão, mas, quando
você vè, você não está mais negociando com o patrão, você está conversando com
o Estado.
Porque, a primeira coisa, o que que o estado fazia? Era um
movimento, por menor que seja, ai eles já mobilizavam a polícia e já montava
uma barreira na porta da fábrica para proteger a empresa. Ai, o que que o
operário pensava? 'Pô, mas eu não estou fazendo nada demais, eu estou
trabalhando, estou querendo só que melhore um pouquinho o local de trabalho, eu
quero no mínimo um comida que eu possa comer. Porque que a polícia está aqui?'
Ai já abria assim: 'está aqui para proteger o patrão'. ai, quando você já ia indo, assim, no processo
de negociação, não era mais o patrão, já era o sindicato, depois já não era o
sindicato, era o Ministério do Trabalho e já era o Estado. Ai é o despertar da
consciência de classe. Ai você fala: 'oh, eu não estou lutando só contra o, na
época do... contra o Luiz Villares, eu estou lutando contra o Luiz Villares,
contra a direção do sindicato dos metalúrgicos, contra o governo do Estado e ai
tem o Ministério do Trabalho que é o Governo Federal.
Sai até da esfera do
estado de São Paulo...
Sim! Aparece primeiro para nós a fábrica, só que, quando
assim, no enfrentamento você vê que é muito além da fábrica. O enfrentamento,
assim, ai o despertar da consciência de classe vem por ai... É nos primeiros
enfrentamentos. Então, assim, não há consciência sem enfrentamento. Porque se
não há enfrentamento, assim, o pessoal vai e se limita ao fazer no dia-a-dia...
Tá tuim mas tá bom... Ai um dia fala assim, 'um dia vai melhorar', ai vem todas
as crendices e tudo mais. Mas, assim, a partir do enfrentamento, o operário,
ele só se conscientiza de fato, no enfrentamento de fato, que ai ele vai ver
toda a máquina que ele está enfrentando. Ele não está enfrentando o chefinho
dele que fica lá enchendo o saco dele lá, o encarregadozinho ou o diretor da
empresa, ele vê que a coisa é bem maior, por isso que 1978 foi um ano assim,
que marcou na história do movimento operário a consciência de classe. E isso,
assim, se espalhou, se espalhou assim, para todas as regiões fabris de São
Paulo e para várias regiões do Brasil. É tanto que, muitos militantes nossos,
a... e eu faço um parênteses nesse patamar de espalhar o movimento, os setores
progressistas, principalmente da pastoral operária, da JOC, da Igreja Católica,
ajudou bastante.
O senhor era desse
setor?
Não. Eu nunca fui militante católico. O Waldemar era
militante católico, o Waldemar, o Anísio, o Santo, Santo Dias... Então, eles
eram militantes católicos, ne... Mas eu nunca fui militante católico não. E,
mas, a Igreja contribuiu muito para a divulgação das lutas, principalmente na
questão das comissões de fábrica... As primeiras comissões que foram criadas,
que a gente percebeu que ela era muito frágil, era voluntária, era muito
frágil, então o que que nós começamos, falamos assim: 1Vamos criar assim,
primeiro aquela comissão que vai em frente e a paralela. A que aparece e a que
não aparece. Porque a que dirigia mesmo era a que não aparecia. ai, a gente
pegava os melhores militantes, ficavam na retaguarda. E aqueles, os mais ou
menos, iam assim, iam para transmitir o que pensava a maioria dos
trabalhadores, para preservar a militância. A gente começou a aprender também
na luta. E ai começou a surgir comissões de fábrica de fato mesmo, reconhecida
pela empresa, assim, eu participei... ai já fugindo um pouco de 1978, ai já vem
para o ano de 1979, quando 1978 foi o despertar né e 1979 foi um ano assim,
onde já vinha muita força acumulada assim, das greves de 1978. Ai também
veio... os metalúrgicos do ABC o dissídio, terminou 1978 o dissídio dos
metalúrgicos do ABC é em maio, maio assim, é em abril né... Ai já veio a greve
dos metalúrgicos de 1979.
Tinha
acabado de acontecer a greve geral em São Paulo, ai já veio outra em maio...
Então, a gente já tinha uma puta experiência de greve aqui
de São Paulo, por fábrica e a gente já tinha contato com o pessoal do ABC,
então, a gente procurou assim, o pessoal captou a idéia de criar núcleos por
fábricas. criar comissões, grupos organizados. Ai então, não simplesmente...
E
vocês, aqui de São Paulo, vocês não iam ao ABC panfletar, fazer trabalho de
base lá?
Não, não. A gente tinha contato assim, com o pessoal da
militância, o s dirigentes, o pessoal lá já era eficiente para fazer isso. O
ABC, eles tinham muitos militantes. Como era um sindicato que jogava a favor
dos trabalhadores, é, eles tinham muita militância, o sindicato tinha muita
militância. Então, no ABC, eles não tinham o problema da gente aqui em São
Paulo, porque eles tinham o sindicato e aqui em São Paulo o sindicato jogava
contra nós. E lá o sindicato jogava para a categoria. então, a gente tinha
contato com os dirigentes sindical, com o Gilson Menezes, com o Devanir, com o
Expedito, é, todos os dirigentes, os velhos dirigentes sindical de São
Bernardo, tudo tinha muito contato com a gente.
Ai, o ano de 1979 foi um ano assim, de acumulação, tinha
muita força, a classe já tinha experiência, veio todo aquele movimento, ai depois
veio a eclosão das greves do ABC, com a intervenção nos sindicatos, com a
prisão dos dirigentes sindicais. E ai, com essa experiência em 1979 também nós
fomos para a greve geral em São Paulo.
Em outubro de novo?
Em outubro de novo. Só que, é, o que que ocorria, o
sindicato assumia a greve, pressionado também... Nós usamos a mesma tática:
'Vamos pressionar a categoria, procurar espaço maior para reunir todo mundo.
Então, as assembléias, ao invés de ser no auditório dos metalúrgicos de São
Paulo, que não dava, foi no Cine-Rox, lá no Brás, que era um espaço bem amplo.
Ai nós mobilizamos... a assembléia era feita nos domingos, ai a gente
mobilizava o pessoal de todas as regiões e vamos para o Cine-Rox.
Domingo é bom que
ninguém trabalha?
Mas para a mobilização é ruim. É péssimo, mas mesmo assim a
gente ainda levava muita gente. E a gente mantinha assim... era pressão assim,
ferrenha na diretoria do sindicato. Praticamente, assim, os militantes da
Oposição é que dirigiam a assembléia, só não tinha a máquina. Mas dirigia. Os
cara colocavam a tropa de choque lá, a gente passava por cima [risos]. A gente
organizava assim, é... o pessoal da linha de frente com bumbo. começou a fazer
enfrentamento, era enfrentamento direto mesmo, assim, com o pessoal de fábrica.
Faziam piquetes?
Quando era necessário, sim.
Em 1978 teve os
piquetões?
Os piquetões depois eu vou te passar, como começou os
piquetões. Então teve os primeiro enfrentamentos das assembléias [...] que era
para decretar greve geral. Ai os caras saíam postergando. Ai... foi decretada a
greve geral e o que que a gente exigia, assim, ó: 'Vamos alugar espaço na
região, em todas as regiões, que é para reunir o pessoal nas regiões. Então,
assim, essa foi uma das... uma cagada histórica que nos fizemos...
Porque, deu errado?
Não, não é que deu errado, ai o sindicato fez, alugou sede
em todas as regiões, só que essas sedes eram armadilhas.
Como assim?
Quando a gente estava preparando a greve, assim, a
meia-noite, para começar a greve, assim, o que é que nós fizemos, a maioria dos
militantes, nós reuníamos nesses locais. Ai, antes de a gente sair para a greve
ai chegou a polícia e prendeu todo mundo. Ai, simplesmente, quando nós fomos
observar o local, parede que foi previamente preparado, não tinha saída! Só
tinha entrada! Então nós caímos numa
armadilha geral. E assim, e foi preparada pela diretoria...
O sr foi preso?
Em 1979, né. Então, no dia que ia começar a greve, na noite,
a maioria dos dirigentes assim, das regiões foram presos, assim, os principais
dirigentes foram presos, foram para o DOPS. Mesmo assim, a gente estava tão
organizado que a greve aconteceu. A greve aconteceu, assim, e começou a ganhar
corpo. E nesse espaço também, depois, nós ficamos 2 dias lá no DOPS ai foi
liberado todo mundo...
Foram torturado? Teve
tortura?
Não. Não porque era muita gente né...
Quantos foram presos?
Tem uma idéia?
Só aqui na Região foi 380, assim, de uma leva. Foi 380 pessoas.
Só aqui da Região Sul, né... Mas, em todas as regiões, eles fecharam, levaram
toda a militância de linha de frente, todo mundo. Mesmo assim, os que ficaram
fora deram continuidade...
Todo mundo era mais
de 500?
Não, acho que na época foi mais... Tem a lista hoje lá no
IIEP, tem a lista de todas as prisões, dá mais de 1000 pessoas presas em uma
noite. Mesmo assim, com toda essa militância presa a greve aconteceu e ganhou
corpo. Ai o pessoal estava se organizando assim... e é tanto que aconteceu a
morte do Santo, porque eles foram fazer uma paralisação em uma empresa aqui em
Santo Amaro, na Silvânia onde o Santo foi assassinado, né... E ai onde surgiu a
idéia dos piquetões.
Então é a partir de
1979 os piquetões?
É, foi em 1979.
Antes disso não tem
piquetão?
Não. Não existia. Então o que eu fiz, reunia os pequenos
grupos, os caras vinham lá e descia-lhe a porrada, a polícia vinha e
dispersava. Como eu ainda trabalhava na Villares, porque eu fui mandado embora
depois da greve, depois de outubro [de 1979], eu fui na Villares, assim, nós
reunimos 800 pessoas, ai eu peguei o pessoal mais...
800 é muito!
Não, a fábrica que tinha 5000 mil pessoas, é nada. Ai,
cheguei lá o pessoal estava todo mundo lá,meio na porta da empresa, falo assim:
'Agora, nós vamos...' Na Nações Unidas tinham várias empresas de porte, tinha
a... ai começava pela Raister, depois vinha a MWM, a Cartepillar, FAG, é
Bras-inter, Instron, hoje não existe mais nenhuma dessas, a AMORTEX, então, eu
falei para o pessoal: 'Nós vamos começar, vamos todo mundo aqui, nós vamos
fazer uma marcha aqui, vamos parar todas as empresas da Nações Unidas'. Ai nós
começamos, saiu 800 homens e mulheres também... Ai nos começamos pela Raister,
depois veio a MWM, depois, subindo os corredores ali, as pequenas empresa, a
gente começou a fechar corredores, ao a gente começou a marchar nas Nações
Unidas, assim, quando nós chegamos na Amortex, a gente já estava com mais de 10.000
mil pessoas na Nações Unidas, ai era imbatível, que ai foi a idéia dos
piquetões. Então o que a gente fez, quando tinha muita gente, a gente começou a
deslocar gente para todos os lados, ai pegava as ruas, os corredores fabris,
Capela do Socorro, Metal-leve... ai começou a deslocar gente para todos os
lados.
Então surgiu daqui da
região?
Surgiu de santo Amaro. Surgiu da Villares o piquetão. Por
isso que a Villares aparece muito, porque tinha um maluco igual a mim. Ai que
eu falei: 'Só vai dar certo... não podemos ficar em pouca gente, porque
assim... o enfrentamento. Os caras estavam em muitos, a gente em poucos,
então... Então, a partir do momento que começou a ter muita gente, o que que
aconteceu? A polícia recuou. Porque tinha muita gente... assim... não sei... ai
eles recuaram. No que eles recuaram, abriu o flanco e nós tomamos, assim,
literalmente, as empresas.
Mas vocês não iam
armados com pau, etc?
Não. Só caminhando, assim, e palavras de ordem. Então, não
tinha... O enfrentamento era assim, bem... era corporal o negócio, enfrentar
com palavra de ordem e crescendo, cada vez mais ia crescendo. Cada empresa que
a gente ia lá, o pessoal estava parado dentro da empresa, então o que que a
gente fez, assim: 'Não, ninguém vai assim, se continuar dentro da empresa nós
vamos ficar invisíveis. Nós temos que jogar essa gente para rua'. Então a gente
ia assim, e chegava, parava na frente da empresa, fazia uma assembléia na
empresa, fazia todo mundo sair, que não queria sair, a gente fazia sair, a
mesma coisa, 'vai ter que sair'. [risos].
Entrava uma comissão
para tirar?
Não entrava assim, chegava na porta e falava: 'Ou sai ou a
gente entra'. [risos]. Ai os patrões babavam né, então os cara falavam assim:
'manda esse pessoal ir embora!' Ai, o que que a gente falava, chegava os
seguranças todos armados, porque seguranças eram todos armados, a segurança de
empresa era tudo assim, tudo armado e era assim, a repressão... Ai falava assim
ó: 'Vocês escolhem, ou vocês mandam todo mundo sair, ou nós vamos entrar e
tirar!'. Dai, daqui um pouco, você via todo mundo saindo. [risos]. Ai, a gente
parava o pessoal, fazia assembléia e falava: 'Oh, que quer acompanhar a gente
seja bem-vindo, quem não quer vai pra casa, vai fazer qualquer coisa, vai pro
boteco, mas não fica na rua, então quem quer acompanhar, vamos!'. Ai foi
engrossando, engrossando, engrossando. E ai, chegou uma hora que a gente estava
assim, tinha piquetões em todos os cantos da cidade. Então a idéia do piquetão
nasceu. Nasceu na porta da Villares. Porque eu vim lá do centro, depois que eu
fui... que eu saí lá do DOPS, daí eu vim e chamei o pessoal assim: 'Vamos mudar
o cardápio dessa coisa aqui!'. E ai, a idéia do piquetão começou ai...
E
depois, em 1979 vocês retomaram os piquetões?
Não, ai foi uma outra, foram outras situações depois de
1979. Então, foi várias assim... que
houve, depois 1979, depois ABC, houve também... houve muita articulação, porque
ai a gente já começava a pensar em... pensar mais geral, não só na questão do
sindicato, mas já começava pensar na questão de uma central sindical, que ai já
começou a ter a idéia da CUT.
Isso
em 1979 ainda?
Em 1979. Assim, a Oposição, e já tem documentos da Oposição
que a gente já colocava assim, acho que em um congresso da Oposição em 1979. E
já nasce ali a idéia da Central Geral dos Trabalhadores, que a gente já começou
a ver mais longe, não só assim... A gente já via o embate aqui em São Paulo: a
gente ganhava e não levava, ganhava e não levava. Mas, mesmo assim a gente... A
história é engraçada, nós somos os únicos dirigentes que não ganhamos
sindicato, e até hoje... Não, até hoje nós temos um conhecimento assim, dentro,
como os dirigentes sindicais, os mais antigos assim, temos um respeito assim,
muito grande pelas direções sindicais, porque muitos militantes nossos foram
para outros Estado, começou a ganhar sindicato, criar oposições e tudo assim,
de um trabalho que a gente começou por aqui né.
Porque os piquetões, eles nasceram e morreram em 1979, que
ai já vem várias outras situações, ai já veio o outro estado de greve, o ABC já estava muito, já estava bem no ar. Assim,
ele já estava ofuscando São Paulo, São Paulo já não aparecia, porque São Paulo
não tinha sindicato só tinha Oposição. Então aparecia bem mais os metalúrgicos
do ABC, greve nas montadoras, ai já vinha toda questão das reivindicações
gerais, eleições assim, ai já veio o pessoal do ABC, que já... já estava com a
idéia de criação de partido, criação do PT. Ai já entra para os anos 1980.
Porque ai ja vem, assim, vem a preparação, tudo para as eleições em 1981.
E onde surge as
interfábricas nisso?
As interfábricas surgiram a partir de 1979. Porque ai, o que
que acontece, nos anos 1980 a gente percebe assim, que nenhuma fábrica
sobrevive sozinha. E ai já começa o inter-categoria, inter-fábrica... A gente
pegava assim... começamos a fazer em São Paulo, pegava pessoal em fábrica da
Região Sul para trocar experiência com a Região Leste, com a Região Norte, com
a Moca, com a Região Oeste...
E essas reuniões
serão onde? No sindicato?
Não. Sempre em salões, ou salões de Igreja, ou outros
locais.
Ai entra a
importância das pastorais...
Ai onde entra a importância da Pastoral Operária, o pessoal
sempre aqui na logística, no espaço, sempre contribuiu para isso. Vários salões
da Igreja em vários locais... Só era em sindicato quando foi assim... a gente
começou a ter interação com o pessoal do ABC, ai era mais o Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC. Ai usava o espaço do sindicato dos metalúrgicos. Mas o
Sindicato do Metalúrgicos de São Paulo, nunca foi feita para fazer
inter-fábricas, primeiro porque eles eram contra, eles não permitiam, a gente
fazia isso tudo via pastoral operária. Porque ai vinha... ai no ano de 1979 já
veio a preparação, veio os anos 1980 e a preparação para as eleições de 1981.
Nos anos 1980 a gente já veio a preparação para 1981... Em
todo esse movimento de 1979, o que que surgiu na região? Nós conseguimos assim,
eleger dois deputados na Região, foi o Aurélio Peres e a Irma Passoni. Isso
veio do movimento de bairro, do movimento custo de vida e do movimento operário
na região. Nós conseguimos eleger o Aurélio e a Irma, ai com o passar dos anos 1980
veio a... preparação para as eleições de 1981, o pessoal do PC do B junto com o
Aurélio, ai eles exigiam a cabeça de chapa, porque o Aurélio tinha que ser o
cabeça de chapa. E pelo nosso trabalho assim, pela nossa concepção...
O Aurélio era da
Oposição também?
Era da Oposição, era do mesmo grupo. Então, ai foi uma
decisão política do PC do B... Na época eu era muito próximo do PC do B, tinha
muita interação com o pessoal do PC do B, até que todo mundo achava que eu era
militante do PC do B, eu era área de influência. Ai, a decisão que eles tiraram
era que só aceitava com o Aurélio na cabeça de chapa, não aceitava o Waldemar
Rossi, não aceitava o Fernando Ó, assim, começou a vetar pessoas, porque eles
achavam que eles eram os... Ai, um dia, a gente com a nossa política de
trabalho de base, que a gente... 'Tudo bem, aceito, mas, só que tem que ir para
uma convenção, ganhou na convenção leva'. Só que eles: 'Não queremos convenção,
queremos a cabeça da chapa. Então não adianta ir para convenção porque chegar
na convenção vocês ganham'. E logicamente a gente ia ganhar porque a gente
tinha muito trabalho de fábrica. E eles: 'Não, a convenção é só para
legalizar'. Ai, ai limou, ai...
Mas ná época o sr.
apoio a posição do PC do B?
Não. Eu fui assim, o
que mais bateu de frente com a posição do PC do B, eu era área de influência,
porque eu tinha ainda pouca experiência na militância política. Ai eu fui em
uma reunião com o Waldemar Rossi...
O Aurélio Peres tinha sido eleito para o que?Vereador?
Não, deputado federal.
[...] Foi no finalzinho de 1979. Ele e a Irma, foram eleitos por nós
aqui, assim, principalmente a Região Sul.
O Aurélio Peres era
do PC do B?
Não, não existia naquela época, na época era o MDB. Só tinha
a Arena e o MDB né. Foi um fato histórico na época... Qual foi o tema de
campanha que nós demos? Tinha: 'O tostão contra o milhão', 'Não vote no patrão
vote no peão', esse era o nosso slogan. [risos]. E nós elegemos o filho da****
do Aurélio Peres. Só que em 1980, em 1981, para a eleição de 1981 assim, ai
casualmente eu fui participar de uma reunião lá no comitê do Darci Passos lá,
ai eu assisti a cena, assim, o pessoal exigindo... Porque eu bati de frente com
o pessoal do PC do B, com o Aurélio, com todo mundo. Ai, até numa época eu
falei para o Aurélio, era a ultima eleição que ele ia se eleger, porque se
dependesse dos votos da Região Sul ele estava... Tanto que na próxima eleição a
votação dele caiu. [risos]. Ele ficou muito puto comigo... Eu bati de frente
mesmo porque eu achei aquilo uma sacanagem, assim, que vem contra todos os
princípios, ai aeu falei: 'Vocês não querem negociar, vocês querem impor a
política de vocês'. Se a partir de um momento senta à mesa para se negociar, os
dois lados tem que ceder e o lado de cá já cedeu, o lado de cá está muito
claro, é o pessoal assim, que está aqui com o Wademar Rossi, tudo bem, vai para
a cabeça quem a convenção decidir, então assim, se vocês, que se dizem os donos
da democracia operária, precursor da luta do... Que porra que é essa, que luta
de classe, que democracia operária que vocês estão defendendo? É a democracia
de vocês ou é a democracia da classe? Porque ai vocês estão privilegiando a
democracia da porra do partido de vocês. Então o que que prevalece? Ai foi
paulera véi...
E ai naquele dia rachou. A oposição rachou, o pessoal do PC
do B foi e montou a chapa deles em 1981 e nós montamos a nossa. Ai nós montamos
a chapa com o Waldemar Rossi na cabeça, fomos para... Fizemos a convenção
normalmente como estava programado. Ainda abrimos espaço para assim, se eles quisessem participar da
Convenção o espaço estava aberto. E nós fomos para a convenção, tiramos a
chapa, a chapa foi muito bem votada nas empresas, sei que foi lavada. Ai não
deu quórum no primeiro turno, que ai veio o segundo turno das eleições...
Não deu quórum?
A chapa vencedora
tinha que ter 50% mais 1%.
E nenhuma das três
chapas tinham, né?
Nenhuma das três né. A nossa, apesar de ter sido muito bem
votada, não aconteceu o quórum porque que é... A chapa do Aurálio Peres tinha
poucos votos, mas, junto dom as nossas dava... Então, ai veio o segundo turno,
ai o pessoal teoricamente apoiou a posição, mas... é, perdemos no segundo
turno.
A
chapa Aurélio Peres estava com o pessoal do ABC, que foi apoiada pelo Lula?
Não. O Lula nunca apoio, o Lula sempre apoiou a chapa da
oposição em São Paulo. Sempre apoiou a nossa chapa. Então, mesmo com diferença,
mesmo com críticas, o Lula sempre apoiou a chapa da Oposição em São Paulo. O PC
do B, isso foi na eleição depois que houve a cassação dos metalúrgicos do ABC,
o PC do B lançou uma chapa no ABC contra o Lula, que foi encabeçada pelo alemão
e o pessoal lá. Mas em São Paulo, assim, e no ano seguinte, ai o PC do B já
estava junto com o Joaquim.
Isso em 1982?
Depois de 1981 foi 1984 porque era de 3 em 3 anos, que foi a
chapa encabeçada pelo Hélio Bombardi né. Ai o PC do B já estava junto com o
Joaquim contra nós. A história, ele vai num processo bem dinâmico.
O
Stanislaw falou na entrevista que tinha um certo atrito com o pessoal do ABC
por causa das comissões de fábrica...
O problema, sempre teve um mal entendido [...]. Alguns
dirigentes sindicais do ABC falava que a gente praticava o sindicalismo
paralelo, que a gente não atuava dentro do sindicato...
Tem entrevista do
Lula falando isso...
Tem, tem. Então, eles falavam assim, que a grande falha
nossa era que a gente não atuava dentro do sindicato, e assim, o que que a
gente fazia? A gente atuava dentro e fora. Porque os primeiros, assim, os
dirigentes, os militantes nosso que ia para dentro do sindicato, a própria
direção do sindicato dava um jeito de cassar a gente dentro da fábrica. Então,
a gente só, assim, usava... Nunca usava a estrutura do sindicato para mobilizar
os nossos militantes. Sabia que era colocar o pescoço na forca.
E eles não permitiam
usar o sindicato...
Até permitia, mas assim, só que identificava toda nossa
militância. E como o pessoal jogava no time do Regime, identificava nossa
militância, pegava lá, pegava o nosso pessoal e jogava na boca do leão, velho.
Por isso assim, que o pessoal do ABc nunca entendeu isso porque lá eles tinham
o sindicato e aqui o sindicato jogava contra a classe. Então, assim, até o Lula
uma vez falou isso... Ele já conversou várias vezes com a gente aqui, nessa
questão de atuar dentro do sindicato, porque ele falava que não entendia porque
a gente não atuava lá dentro: 'Mas a gente atua, só que...' 'ganhamos várias
vezes...
Mas sempre assim, mesmo com diferença ou com divergência, o
pessoal do ABC, principalmente o Lula, eles sempre nos apoiaram. Eles nunca
apoiaram outra corrente aqui em São Paulo, então isso é fato, né. E no... nessa
questão do movimento operário, assim, ele começou, basicamente começou em 1978
foi em 1979 ai veio os anos 1980...
E a derrota da greve
do ABC de 1980, teve impacto aqui?
Na verdade assim, não foi uma derrota, a greve dos anos 1980
do ABC, que foi 40 e... foi assim... O que que foi organizado naquele ano? Foi
organizado comitês de greve, foi usados grupos de apoio, foi feito assim, um
dos maiores fundos de greve que não existia no Brasil para sustentar a greve e
foi um impacto, assim, não só no ABC, foi assim, a nível de Brasil. então, isso
ai... assim... como o pessoal considera derrota, eu acho que foi um dos maiores
avanços e vitória do movimento operário, porque até aquele momento, ninguém
sabia que existia metalúrgico, ninguém sabia que existia ABC, ninguém sabia que
existia montadora, ninguém sabia o que era operário, ninguém sabia o que era
metalúrgico. Então, a partir do momento que eles cassaram a direção do
sindicato, que depois o pessoal retomou e voltou a dirigir, a tomar a direção
de fato, ai que os metalúrgicos a nível de Brasil começou a ter visibilidade,
ai que você vê que a partir dos anos 1979 e dos anos 1980 se eclodiu movimentos
em todos os cantos do Brasil, desde pequena cidade onde existiam fábricas, não
só metalúrgicos, como todas as categorias. Ai, como a gente já tinha nos anos
1980, com toda experiência acumulada, a gente já tinha idéia do trabalho geral,
não só das inter-fábricas, mas da inter-categorias, não só de metalúrgicos, nós
temos plástico, nós temos químicos, nós temos peças, nós temos coureiros, tem
vidraceiros, nós temos sapateiro, nós temos frios, nos temos tecelões, então, tem uma cadeia
produtiva.
Porque assim, como assim... na linguagem do cara, do Marx, o
capital não tem pátria? Por que que o movimento operário vai ter só... ficar só
restrito numa categoria? Então isso tem que se expandir por outras categorias.
Ai nós começamos, assim, com a idéia da criação da CUT, a CUT foi criada na
prática, não foi criada assim no... hoje existe com decreto...
Como na prática?
Não. Foi criada na prática assim, na ilegalidade, não
existia, era contra, era ilegal, não podia criar central sindical e nós
criamos, junto com vários sindicatos, criamos a central única dos
trabalhadores. E não só se limitamos a criar assim, de nome, começou a existir
na prática, nas inter-categoria, um dos grandes que a CUT fez, que ainda era
clandestina, foi em 198... no final de 1984, aonde nós organizamos assim, aqui
em São Paulo, a campanha salarial unificada. então, o que que nós fizemos?
Todos os sindicatos que tinham campanha salarial em novembro, em todas as
categorias, reunimos todos e conseguimos fazer, assim, três dias de greve em
São Paulo em todas as categorias, em 1984, comandado pela Central Única dos
Trabalhadores que não existia legalmente, mas na prática existia. É tanto que
foi fato noticiado em todos os jornais de todo o Brasil, assim, a campanha
salarial unificada das categorias de São Paulo.
O Sindicato do Metalúrgicos participou. Porque ele já estava
assim, ele já estava... o... Luis Antônio Medeiros, o pessoal do PC do B, o
pessoal do PC já estava tudo dentro do sindicato já. O Joaquim ainda estava na
diretoria, mas assim, o sindicato, praticamente, estava sendo comandado pelo
pessoal do PC do B, do PCB e do MR8, e eles participaram da campanha unificada,
o sindicato dos metalúrgicos participou junto conosco, com os químicos, com os
plásticos, com os coureiros e com os vidreiros. Ai então, a partir da... a CUT
ganhou visibilidade a partir daí...
Então
a Oposição tem uma grande influencia nesse processo de formação da CUT?
A articulação foi toda feita pela Oposição. Foi toda feita
pela Oposição. Como a gente tinha muita influencia no sindicato dos químicos,
dos plásticos, dos coureiros, foram diretorias criadas por nós dentro das
categorias para ganhar esse sindicato, foram todos militantes metalúrgicos que
foram para outras categorias... Ai, a gente pegou todo esse pessoal,
pressionando as outras categorias que estava com os metalúrgicos, para entrar
na greve geral unificada e teve um bom resultado naquela época...
Foi a primeira greve
geral unificada?
Foi a primeira greve geral unificada. Que ai, depois veio a
greve geral, depois veio vários movimentos, mas assim, a primeira experiência
de unificação de categorias foi no final de 1984... no começo... bem no
finalzinho do ano... novembro de 1984,
foi aquela campanha salarial unificada, ai que o pessoal começou... as outras
categorias a partir daí todo mundo começou a descobrir que podia juntar outras
categorias além de metalúrgicos, só se falava em greve de metalúrgicos, greve
de metalúrgicos, metalúrgicos estão em greve, e a parti daí que a gente
começou... Começou a dar visibilidade a outras categoria a partir daí...
E a Oposição tinha
uma posição fechada para as diretas?
Não era assim uma posição fechada da Oposição Metalúrgica...
Não saiu nada?
Assim, pela questão institucional a Oposição pecou muito,
porque a gente foi muito sindical e menos assim... tivemos pouca influência na
criação de partido, na criação do Partido do Trabalhadores a atuação foi
individual, não foi uma atuação coletiva, não houve uma discussão coletiva.
Assim, a maioria dos militantes nossos foi, se filiou ao partido, atuou, mas
tudo em posição individual...
Então nessa área dava
para ter tido uma política mais organizada?
A gente, assim, se a gente tivesse uma política organizada
hoje o quadro poderia ser outro. Porque, como a gente não tinha posição
fechada, então cada qual dispersou nessa, assim em nível de eleição cada qual
fez o que quis. Não tinha uma posição fechada a respeito de partido, a respeito
assim da Constituinte, a respeito de eleição para o Parlamento. Então, não
havia uma posição a esse respeito, sabe? Havia, assim, posições em relação a
questão sindical, a gente se voltou muito para o sindical e esqueceu a política
institucional, a política partidária. Então, é uma das coisa que...
Acabou deixando o
espaço para o pessoal do ABC?
É. Exatamente. Que capitalizou... Uma das coisas que a gente
nunca discutiu entre nós, até para fazer uma crítica ou autocrítica, foi uma
falha histórica. Nós tivemos muitos acertos, mas também tivemos muitos
erros. Esse da questão
político-partidária foi um. Nós voltamos muito para o sindical, para central única
do sindicato, para central única dos trabalhadores, para central geral, só que
nós esquecemos um detalhe muito importante: sindicato, central não muda. Não
muda o Estado, não muda o Regime. Elas influenciam, mas que tem projeto
político de mudança, são os partidos. E nós, a nível de Oposição, não
discutimos isso e nem interferimos. E o
pessoal, nessa ai, o pessoal do ABC capitalizou assim... geral, a questão do
partido e a gente correu por fora. Se filiamos, ou filiamos vários dirigentes,
mas assim individual, não foi um coletivo. Então foi isso que deu. Ai a
situação mudou, a democracia mudou, mudou... ai... E nos anos 1990 a Oposição
acabou dispersando e foi o ultimo suspiro...
É, nós estamos atuando hoje em várias frentes, hoje a gente
atua com o projeto memória, na reconstituição...
Que é o IEEP...
O IEEP é o arquivo, assim, mas a gente reuniu assim, a
maioria dos dirigentes para escrever, contar a história, que é o Projeto
Memória, que nós já temos escrito já para lançar tem o livro, um DVD, já com
uma documentação muito grande onde a gente conta... Vai ser lançado agora no
final do ano, onde a gente define,
assim, depois de todos esses anos que acabou a Oposição, de atuar enquanto
bloco na categoria, enquanto grupo, assim... Mas até a Oposição acabar, assim,
teve uma história. e o que que nós estamos reunindo... nós reunimos dirigentes
e militantes em todos os bairros, assim, pros militantes contar a história,
para buscar documento, todos os documentos que o pessoal tinha em casa... o
pessoal... É tanto que surgiu tanto documento, assim, nunca vi uma... tanto
documento aparecer.... Nessa ai também, o que que nós causamos? Quando a gente
reuniu para contar história, criar a história da Oposição Metalúrgica, vários
sindicatos também começou a fazer isso, vários, vários outros chamou a gente
para mostrar a experiência como é que nós... è tanto que hoje, na Comissão da
Verdade, o documento base da Comissão Nacional da Verdade, é o nosso documento.
Aquele documento de contar a história e pesquisar, é o documento do projeto
memória, o nosso documento que hoje foi encabeçado pela Comissão da Verdade.
Tanto que o [Sebastião] Neto está ajudando bastante o pessoal da Comissão da
Verdade, o Nacional. e foi baseado no nosso documento. Assim, a maioria dos documentos
que a gente começou a pesquisar no DOPS, começou a pesquisar no SNI, começou a
descobrir documen... O que que a gente queria provar?
É o Sebastião Neto?
É. O Neto é um dos nosso principais dirigentes.
O que que, assim, nesse processo todo da... o que que a
gente queria mostrar para a sociedade? O golpe militar não foi só militar!
Assim, a ditadura militar, assim, para ter um regime Militar tinha que ter uma
base civil de sustentação. E qual base civil de sustentação é... de qualquer
sistema? Quem tem o capital! Então, assim, principalmente assim, ele é duas
somas: Intelectual e financeiro. Então a sustentação do Regime, além da
sustentação intelectual por vários setores da elite, ele tem que ter uma
sustentação financeira, quem fez a sustentação financeira? O empresariado! E
nunca apareceu isso em nada! E nós conseguimos provar com documentos, assim,
tudo cadastrado, que o empresariado participou ativamente, contribuiu e
sustentou o Regime Militar por vários anos, e foi muito beneficiado por isso. E
no nosso livro e no nosso DVD e na nossa documentação, que deu base para a
Comissão da Verdade, tem tudo isso. Então, mais uma vez... tem 5 anos que nós
começamos a desenvolver isso ai, esse trabalho. e hoje já estamos finalizando,
mas tem 5 anos que a gente está fazendo isso. Juntou novamente esses velhos,
agente fala assim: 'esses velhos dinossauros' e... para a gente colocar a nossa
história para todos, e assim, a gente não pensava, jamais imaginava que ia...
ter uma dimensão da forma que está tendo, né. Porque a gente queria uma coisa
pequenininha assim, só os operários contando a sua história, mas assim, o troço
cresceu tanto que hoje, assim, é base da Comissão da Verdade.
Vocês estão fazendo à
parte, não é pelo sindicato?
Não, não, estamos fazendo... estamos sediados no IEEP e nós
estamos fazendo.
O sindicato não está
participando?
Não, eles estão contribuindo com documentos, essas coisas.
Nós estamos buscando. Nós estamos buscando todo mundo. Não estamos excluindo
ninguém. Assim, porque, assim, uma coisa é a divergência política que nós
tínhamos, outra coisa é contar a história. Quando você conta a história, você
não conta um lado... e o nosso objetivo não é mostrar um lado, assim, a nossa
política, da Opo..., assim, a base é o trabalho da Oposição, nós mostramos,
assim, tudo o que aconteceu na época. Então, assim, nós buscamos via Oboré, que é o pessoal que tem a
documentação do Sindicato, assim, o pessoal cedeu muitos documentos, muitas
fotos, assim, todo o pessoal, mesmo o pessoal que foi contra nós.
Assim, é tanto... aconteceu uma... e vai acontecer outra
agora em São José dos Campos, está acontecendo em vários, assim, é... onde nós
conseguimos articular as 10 centrais sindicais para fazer um ato, foi feito em
São Bernardo, em São Paulo, vai ser feito em São José, e foi tudo articulado,
baseado nesse trabalho nosso, da Oposição. E o nosso pessoa que está puxando,
via Neto, Djalma Bom, o Marinho lá de São Bernardo... Então, o pessoal do
Conlutas, lá do PSTU, o pessoal da Força Sindical, o pessoal da CUT... Todo
esse pessoal começou a...
Então, o que que a... assim, qual é o objetivo, assim, todo
o pessoal que foi militante perseguido pelo Regime Militar, não importa em que
posição está hoje, vai ser... vai sair...
É um livro grande?
É que tem limitações, nós vamos fazer um que vai ficar para
a memória e outro, outra documentação que nós vamos criar um portal para deixar
tudo... que já está sendo feito pelo pessoal ai da... da faculdade... lá da
USP. O pessoal está dando... no.... abrindo espaço que é para a gente... ajudar
a criar esse portal para deixar toda essa documentação num grande portal
digitalizado, para ficar ai... E a gente... vai ser lançado agora no final do
ano... Mas é muito trabalho e quando a gente começa a pesquisar, a gente pensa
que está no começo, que está no fim, ai você descobre que... você volta para o
começo... e falta, assim... que o nosso trabalho é [...], assim, não tem os
recursos para fazer. Sempre, assim, a maioria do pessoal que trabalho conosco é
trabalho voluntário, é um pesquisador, é o Murillo, é um escritor, o pessoal
que se propõe a escrever: 'Não, eu ajudo vocês, vamos escrever!', porque nos
conhece, vai lá e nos ajuda, tudo trabalho assim, voluntário.
O senhor chegou a
militar no PT?
Sim. Eu sou filiado.
Até hoje o senhor é
filiado?
Sou filiado ao PT.
E como o senhor vê o
processo da fundação do PT
O processo, a fundação do PT foi um processo, assim, um
processo muito bom, assim, a gente participou, onde as correntes... onde houve
muito debate, muito de muito debate, muita divergência, até institucional,
assim, hoje, assim, eu participo institucionalizado, mas, assim, o que foi... o
objetivo era criado como um negócio de classe. Mas infelizmente, assim, muita
militância deixou de participar e tal... hoje a gente participa meia-boca, a
participação é muito pouca, então...
O senhor fazia parte
de qual tendência dentro do PT?
É que a gente, assim, dentro da CUT... Só para você entender
o processo... Quando a gente criou a Central Única dos Trabalhadores, nós
criamos dentro da própria Central, assim, uma posição muito forte que a gente
chamava CUT pela base, que era uma
posição muito forte dentro da CUT, não era maioria, mas era o pessoal que fazia
barulho, era o pessoal que...
Influenciava nos
rumos?
Influenciava em todas as decisões. Então essa tendência,
também era a mesma tendência dentro do PT.... Que ai entrava... O que é que
tinha dentro dessa tendência... assim quais os partidos de esquerda: tinha o
pessoal do Em Tempo, tinha o pessoal
do... que foi o pessoal do PLC, o
pessoal do... a ala, assim, da Convergência,
d'O Trabalho...
A DS [Democracia
Socialista]?
A DS também tinha uma influência grande... E tinha toda...
Juntava todo esse pessoal, assim, e tinha... todo pessoal e também estava...
esse enfrentamento existia dentro do PT... que ai criou, assim, o pessoal da Articulação e o resto... [Risos]. Eu
era do... participava do resto, nunca participei da Articulação... [Risos]. A
gente participava da ala mais à esquerda, né, tinha todo esse pessoal ai, de
esquerda...
E o senhor acha que
eram quantos por cento? Quantos por cento somava essa ala esquerda?
Olha, a gente chegava assim, a 45% nas convenções. Porque estatutariamente o partido, assim, é
proporcional, a direção é colegiada. Então, se você... toda tendência que participava,
tinha mais de... acima de 5% da votação, já tinha direito a participar da
direção. Então, hoje, isso existe até hoje nos estatutos do partido, e isso foi
uma posição nossa criada dentro do PT, a questão da proporcionalidade. Nós
brigamos muito por isso e existe hoje... E dentro da CUT também existia a
proporcionalidade. então todas as tendências que participava da CUT, nos
Congressos, na direção, entra na proporcionalidade, não importa quanto...
passou de 5% você tem direito. Então era contemplado todas as posições de
esquerda na direção da Central Única dos Trabalhadores, era contemplado. No PT
também foi assim muito tempo.
Até quando existiu
isso na CUT?
Até no... até 2005 ainda foi... recentemente... Hoje não sei
como está porque não participo mais dos congressos... Ai... mas, até 2005 ainda
tinha a questão da proporcionalidade, né... Porque no PT também tinha, não sei
como está hoje também. Hoje é partido de gabinete. Não existe... na prática a
participação de base não existe.
E quando o senhor
acha que foi mudando a participação da base no PT?
Eu acho muito difícil mudar isso...
Mas na década de 1980
a base tinha um controle maior sobre o partido...
Muito maior. A base assim... tanto...
Quando o senhor acha
que começou a mudar isso?
Começou a mudar em 1995/1996... depois do... a ultima
eleição antes de 2000, do Lula ser presidente... O Dirceu era dirigente... era
o Dirigente Nacional do PT... O que é que ele fez, assim, acabou com todos os
núcleos de base.
Isso depois das
eleições de 1994?
Sim... Ai a base deixou de ter influência no partido porque
o José Dirceu acabou com todos os núcleos. Ai, assim, começou as decisões serem
tomadas pela cúpula e não mais pela base, a base deixou de ter influência
literalmente no partido. Só ficou os diretórios, aquelas coisinhas bem
chechelentas, diretórios controlados pelos candidatos de mandatos, quem tinha
mandato controlava cada diretório e hoje ainda continua assim. E, assim, se a
gente tem ilusão de mudar... Logicamente não tem. Porque a partir de agora, as
decisões vão ser sempre feitas pela cúpula, então... mas ainda é uma coisa
necessária, ainda acho que não esgotou o ciclo. Mas não temos nenhuma ilusão
que o PT vai voltar a ser um partido dirigido pelas bases, porque não vai.
[risos].
A a CUT?
A CUT hoje, as centrais sindicais, elas se igualaram pela
super-estrutura, elas, assim, elas não são igualadas pela política, são
igualadas, todas que estão montadas numa super-estrutura, todas sem base
nenhuma...
Inclusive a CUT?
Inclusive a CUT, a CUT, principalmente a CUT...
Então não tem mais
nada a ver com a CUT dos anos 1980?
Não tem nada mais... não tem mais nada a ver... Então, é uma
grande central sindical que tem uma puta estrutura, mas base, de categoria, tem
muito pouco, todas elas, né... a CUT também... Estão todas no mesmo vale
comum... E tem essa micro ai, essas pequenininhas que também tá tudo no mesmo
patamar, cada qual segura na sua estruturinha ali do seu sindicato e fica
segurando ai, mas ... Hoje o movimento sindical, as centrais sindicais, elas
estão muito institucionalizadas. Hoje elas só operam pelo institucional. Então
opera assim... se mantém com o imposto sindical...
Quer dizer que ela
não tem preocupação com a base, de ganhar gente, formar militantes, formar
quadros?
Não. Eu não vejo isso.
Essa era um
preocupação que se tinha na década de 1980...
Sim. Até o PT criou um centro de formação política em
Cajamar, que é assim, uma coisa gigantesca, só que hoje é um elefante branco,
não serve para nada, que era um centro para formar militância. E tá lá, uma
estrutura enorme jogada para as traças, porque o pessoal está operando tudo no
institucional, hoje passa tudo pelos gabinetes, nada passa por decisões de
base. As centrais sindicais também estão no mesmo patamar, passa tudo pela
direção. Então quando chega na base é só para levantar a mão. E assim, se a
gente falar que está errado... até está, mas nós temos culpa disso, porque nós
nos omitimos, nós nos afastamos de momentos importantes de mudança da
sociedade, de mudanças, assim, na vida política institucional... Então...
assim...
Em quais principais?
Principalmente aquele fato que eu te coloquei... na
participação... A partir da constituinte, não só na constituinte... mas, assim,
na questão institucional, é... assim... Nós demos pouca importância para eleger
militantes operários para o parlamento. É tanto que hoje você não vê militantes
operários, só tem pouquíssimos. Se você pega aqui (Santo amaro), vereador, só
tem o Alfredinho que é um b... Mesmo no ABC, os dirigentes operários do ABC estão...
cada vez mais diminuindo... Hoje nós temos, assim, tem o Vicentinho... E nas
decisões política, assim, à nível institucional, a nível de parlamento, nós não definimos assim: 'olha, nós vamos
criar, preparar núcleos de operário que vão ser eleitos e atuar dentro do
parlamento, nós vamos atuar nas direções do partido, nós vamos, assim, assumir
e disputar direção política dentro do partido político', ou... dentro das...
principalmente nos partidos, na Central [Única dos Trabalhadores] nos
disputamos, tinha muitos dirigentes nossos que era dirigente da Central, na
criação da Central eu fui eleito secretário geral da Central, onde os
trabalhadores da grande São Paulo... Eu fui um dos dirigentes, fui secretário
geral da Central Única dos Trabalhadores da CUT grande São Paulo. Na Central
nacional, nós tínhamos vários dirigentes nossos, da Oposição, dentro da Central
Sindical, como direção mesmo. E dentro do PT nós não fizemos isso. Nós tínhamos
muitos militantes ai, que poderia ser
colocado, assim, o Anísio Batista foi Deputado, mas assim, nós demos muito
pouca importância...
Foi um projeto
individual do Anísio Batista?
Foi projeto individual. E vários, assim, outros militantes
nossos que saiu ai, foi eleito prefeito, vereadores em várias Cidades, como a
gente não tinha uma discussão ou um plano, um projeto para isso, então ficou
tudo como projeto individual. Nós temos militantes hoje nossos até no Ceará,
que foi militante da Oposição, que é o Eudes Deputado Federal pelo Ceará, foi
militante nosso. E a gente não teve um projeto organizado para dar vazão ou,
assim, dar organicidade a isso ai e criar dirigentes operários mesmo já que a
gente defende uma política de classe. Não basta só defender, você tem que as
condições reais para que isso aconteça. Nós não fizemos isso. Conseqüência
disso, que, hoje nós temos um partido dirigido, na maioria, por burocratas. Se
a gente acha ruim ou bom, nós vamos ter que aceitar, na maioria das vezes vamos
ter que apoiar as decisões, porque nós nos omitimos delas... Entanto, assim, a
situação se perdurar, hoje assim... a divisão de classes ela é real, mesmo
assim com essa questão do PT sendo um partido institucional as suas direções,
assim, tem vários desvios, mas a divisão de classe existe. Assim, a classe
dominante, assim, eles não aceita ser dirigido por pessoas, assim, que veio de
setores mais humildes da sociedade. Então, assim, eles podem até elogiar o Lula,
mas você acha que os caras aceitam o Lula ser o presidente do Brasil? Não
aceita velho! Por mais concessões que ele fez para todos os setores da
sociedade, mesmo assim, o pessoal não aceita ser dirigido por um operário .
Como é que o senhor
avaliou o governo de Lula, nos doi mandatos?
Teve vários avanços, assim, que necessário né, avanços
sociais, assim, mesmo porque a proposta que o Lula foi eleito... assim, acho
que ele cumpriu o papel da eleição dele... foi cumprido... Porque ele prometeu,
assim, mudanças, assim, sociais básicas. Assim, o Lula não prometeu assim uma
mudança revolucionária, e se alguém estava pensando que ia acontecer... Não
prometeu isso. Então, assim, o que o Lula prometeu assim claramente foi: 'eu
vou lutar para que todo trabalhador, todo brasileiro, todo cidadão brasileiro
tenha direito a café, almoço e janta'. Essa foi a proposta do Lula e foi feito.
Ele não falou assim: 'Nós vamos mudar radicalmente a sociedade, nós vamos fazer
uma revolução social, nós vamos mudar o judiciário, nós vamos fazer uma nova
constituinte para mudar a relação'... Não foi prometido nada disso. Foi
prometido, assim, mudanças sociais que houve,as quais foram muito importantes,
o nosso povo evoluiu. Insuficiente? É! Mas necessário e ocorreram. A coisa mais
importante na eleição do Lula, não só o fato de ser o Lula, foi mostrar para o
trabalhador que ele é capaz. Porque até então o trabalhador achava, assim, que
ele tinha que ser dirigido por alguém, tinha que ter alguém com nível social e
intelectual muito grande que era para poder dirigir. E o que é que mostrou com
a eleição do Lula e de vários outros operários? Que o trabalhador além de
produzir ele também sabe se auto-dirigir, se auto-administrar, ele consegue
administrar bem aquilo que os próprios capitalistas não conseguem administrar.
Então para o senhor
não foi uma decepção?
Não. Não foi uma decepção, muito pelo contrário.
Mas você acha que tem
relação com o projeto dos anos 1980?
Muita coisa é do projeto que nós trabalhamos, muitas coisas
que houve ai, que ocorreram, assim... social, nós batalhamos por isso...
Como quais?
Como a questão do trabalho/emprego, hoje, apesar da
economia, assim, nós vivemos em pleno emprego. Era uma reivindicação, assim,
desde os anos... desde 1978. Hoje nós estamos em pleno emprego. A questão da
independência do... A independência financeira do capital internacional, do
FMI, é uma reivindicação nossa. Então isso aconteceu. A questão... a questão
social ai... vários projetos sociais, era reivindicação nossa. Agora coisa que
não acorreu, assim, redução da jornada de trabalho não ocorreu. Melhorou as
condições de trabalho? Melhorou. Mas não ocorreu a redução da jornada de
trabalho. A questão da aposentadoria, que é o...
O INSS?
Isso não melhorou em nada. Então ainda o trabalhador tem que
trabalhar muito e aposenta com pouco, perde muito. Tem a questão do fator
previdenciário, então isso não ocorreu... São conquistas que ainda está no ar,
mas isso não era o governo Lula ou outro governo que tenha um projeto de... O
projeto da reforma agrária não ocorreu como a gente lutava, mas ocorreu, ou a
fixação do homem no campo, assim, é um fato. Então, assim, não coloco que tudo
foi em vão... ocorreu muita coisa boa, acorreu assim, houve desvios? Houve. Mas
nós também temos culpa nisso.
Como o senhor recebeu
o impacto da crise do mensalão em 2005?
Olha, uma coisa mostra pra gente, aquilo provou para nós,
assim, o nosso pessoal, não é que é, nosso pessoal não é inocente, nosso
pessoal não são bandidos, não são ladrões, eles cometeram erros... como a gente
recebeu... principalmente dirigentes conhecidíssimos nosso, de caráter ilibado
como o José Genuíno, o próprio José Dirceu como grande militante, o próprio
Delubio e outros dirigentes do PT... esses dirigentes, eles cometeram erros, o
que que... assim, onde a classe trabalhadora não se equipara as classes
dominantes? Na questão da violência e da corrupção, porque eles têm anos e anos
de experiência nisso, na questão de trapaça, na truculência e na corrupção.
Os nossos dirigentes cometeram uma falha, de querer entrar
nessa área da arrecadação de capital via outros meios, cometeram falhas. Isso
para nós foi chocante. Porque, assim, nós sempre defendemos a ética, a
moralidade e o combate à corrupção, e, os nossos dirigentes pecaram, e o que é
que as classes dominantes aproveitou: 'já que eles cometeram uma falha que a
gente comete direto aqui e ninguém fala nada'... porque a elite, eles fazem
isso, para eles isso é normal, assim: o desvio de verba, a captação de verba em
todos os setores, então para eles isso é normal, e os nossos dirigentes
cometeram um erro, aonde, deixar um dos nossos fazer essa captação. E o mais grave,
o fato mais grave, eles deviam assumi publicamente que cometeram uma falha,
para não ser linchado como estão sendo.
Deveria vir a público falar assim: 'Nós erramos.' Ai, o que
é que eles permitiram assim, ao não fazer isso publicamente permitiram que a
elite fizesse esse linchamento da forma mais escrota possível, onde coloca,
assim, dirigentes que lutaram a vida toda, onde... doaram sua vida pelo bem
comum e hoje são colocados como bandidos em uma prisão. Assim, a ponto de
pegar... pega os tribunais: controlados pelas elites, controlado pelo capital,
controlado pela mídia e foi feito linchamento público de dirigentes que se
doaram a vida inteira pela causa pública... e houve assim... De outro lado
também, o que que... assim, além, porque todo erro sempre sobra saldos... A
contribuição que isso também propõem para a própria sociedade dentro da
democracia dominante, eles foram espelho, pagaram caro, mas assim, agora também
tem moral para ser aplicado para todos...
Então assim, a falha que o pessoal cometeu foi essa, foi de
não vir à público assumir que cometeu uma falha, falado: 'Não, realmente nós
fizemos caixa 2, isso é crime, isso é errado, nós cometemos essa falha', e dar
a cara, ser julgado por aqueles que eles defenderam e não por aqueles que sempre
nos condenaram. Infelizmente, assim, por não ser feito isso eles permitiram que
a elite, a classe dominante e a mídia, principalmente a mídia, fizesse um
linchamento público. Assim, onde trata vários fatos, coloca dirigentes como
criminosos, e eles não são criminosos, foram dirigentes que cometeram erros e
todo ser humano pode cometer erros. Então, isso foi a falha que chocou, assim,
parte da militância. Agora, outro fato real, alguns... outro fato real assim,
nessa, na última condenação, quando os nossos dirigentes foram presos, que
muitos deles não tinha nem condições de pagar a fiança que foi cobrada, o que
que a militância fez? Foi lá e contribuiu, mostrando, assim, para essa... para
a imprensa e para a classe dominante, que nós julgamos, nós, assim, condenamos
os nossos, mas nós sabemos ser solidários quando somos chamados à participar,
para defender os nossos, e a prova, assim, que em poucos dias todos os nossos
dirigentes, a militância foi lá e contribuiu para pagar a fiança, e isso mostra
que nós, a classe trabalhadora, ela é solidária com os seus, ela jamais
abandona os seus, mesmo cometendo erros. Ela é capaz de re-erguer, como foi
provado nessa questão da contribuição para que pagasse, para que pudesse pagar
a fiança. Então esse é o saldo que ficou. E hoje, apesar de tudo, assim, nós
também temos moral para cobrar de todo mundo, assim também a questão ética, é
para todos, fomos linchados, tudo bem, mas, assim, temos a moral para cobrar de
todos também, exatamente igual para todos, mesmo sabendo que a lei nem sempre é
igual. Então, isso é fato.
[...]
Foi em aqui, em Santo
Amaro, que surgiram os comandantes de fábrica?
Ah, sim. Comandantes para nós... Isso ai, o que é que a
gente fazia, porque a nossa segurança, sempre era feita por nós. Hoje, quando eu
vejo, assim, as manifestações, o pessoal deixar se infiltrar por vândalos,
mesmo militantes descontrolados que acaba... Então, a nossa, a nossa
militância, quando a gente fazia um ato, qualquer coisa... assim, nós
cuidávamos da nossa própria segurança, então em cada setor, em cada situação, a
gente tinha um comandante nosso, que aquele ia ser a nossa voz para garantir a
nossa segurança, então a gente identificava o pessoal, cada um tinha uma
identificação, que eram os comandantes. Quando a gente fazia um ato na Praça da
Sé, então... porque a gente sabia que tinha os Skin-Head, tinha os
integralistas, tinha o.... o pessoal que a gente chamava... que era os Galinha
Verde, os integralistas, tinha os Skin-head e tinha outro grupo, que era
menos.... os Punk... E tinha também os, qu a gente não considera inimigos de
classe, mas assim... que eram os anarquistas, que hoje eles colocam como
Black-blocs.
Primeiro a gente tinha que controlar o pessoal, porque eles,
os integralistas, os Skin-head, eles vinham para quebrar tudo, quebrar a gente,
inclusive quebrar a gente, eles vinham para o enfrentamento pessoal. Então a
gente já preparava pessoas para evitar um enfrentamento e afastar, se bem que
se precisasse enfrentar, também, a gente estava preparado para o enfrentamento,
já tinha uma comissão de frente para o enfrentamento. Não era enfrentamento com
a polícia, porque a policia a gente conhecia e a gente já sabia que o
enfrentamento com a polícia é inútil, porque primeiro assim, eles estão muito
bem armados. O enfrentamento maior que a gente tinha era com esses grupos, eram
os grupos para-militares que se infiltravam dentro das manifestações para jogar
contra o movimento, para colocar todo mundo como baderneiros. E a gente, os
comandantes nossos eram preparados para isso, para evitar essa situação. Se
houvesse um militante nosso mais exaltado, assim, os nossos militantes iam lá e
controlava o nosso próprio pessoal, sem precisar da interferência Força
Militar... Agora, o fato é que a gente jogava sempre jogava na força coletiva,
assim, na criação individual para transformar isso em força coletiva. Então na
adianta, assim, o Jorge [Preto], ou Waldemar [Rossi], ou o Neto, serem
dirigentes se não tem uma força coletiva , se não tem um coletivo para absorver
e levar essas idéias para frente, por isso que a gente sempre joga, assim, o
esforço individual a gente sempre procurou e procura canalizar para o esforço
coletivo. Nós acreditamos nessa idéia, é uma idéia que não está morta, que é a
idéia da libertação de classe. Ela pode estar um pouco adormecida, meio
desacordada, meia sonolenta, ma, assim, a classe operária ela é imortal. Ela
pode ficar um pouquinho quieta, um pouquinho parada, mas a própria situação de
classe obriga o ressurgimento. E essas, esses militantes abnegados que passam
anos e anos trabalhando pela luta de
classes, esse fruto fica. Podemos até não ver, mas talvez os nossos filhos, os
nossos netos verão. E isso é o esforço que nós sempre joga, sempre a gente
procura jogar o esforço individual para o esforço coletivo. A gente nunca,
assim, esse, o adjetivo 'eu', a gente procura sempre estar no nós. se você ver
a nossa documentação, um pouco da nossa história, a maior parte dos dirigentes,
raramente ele fala eu. Ele sempre fala nós, ele sempre é um entre o todo, ele
não procura ser sempre o eu e o todo, ele procura sempre estar entre o todo.
Porque o grande dirigente, ele é aquele que está... é aquele que consegue
transmitir idéias, ele não forma, ele consegue transmitir as idéias. essa é a
essência do nosso trabalho e vamos continuar assim, espero que por muito tempo.
Por aas coisas... se agora não está bom... mas a gente vai trabalhar e vai
lutar para melhorar. Enquanto nós estivermos respirando e capacidade de pensar,
nós vamos continuar. Essa é a essência da luta de classe.
O
senhor ficou animado com os movimentos de Julho do ano passado [2013]?
Não, eu não fiquei animado. Assim, não me causou estranheza
porque, assim, não é uma coisa nova.
Mas fazia tempo que
não acontecia...
Fazia tempo, mas não é coisa nova. Assim, esses movimentos,
eles são cíclicos, assim, o ultimo movimento desse que ocorreu, assim... foi
nos anos...
No fora Collor?
Não, antes do Fora Collor, Fora Collor foi nos anos 1990.
Foi em 1992
Em 1992, nos anos noventa porque foi a partir de 1990, né.
Mas nos anos 1980 houve uma situação igualzinha a que ocorreu agora em Julho, a
explosão social. E assim, onde há um acontecimento, e ai repercutindo, vai em
cadeia. Começou com um quebra-quebra em Santo Amaro, onde houve um saque de um
mercado...
Que ano foi isso?
Foi em 1982, que surgiu, depois surgiu o movimento dos
desempregados... existia muito desemprego, surgiu uma situação de saque.
Naquela época a luta era por emprego. Essa ai [de 2013] é o pessoal por passe
livre né...
E começou esses
saques aqui em Santo Amaro?
Ai começou, houve uma eclosão, assim, foi para toda a
cidade, não tinha controle, ninguém conseguia controlar nada... Fazia assim,
explodia, depois explodia em um lugar, explodia em outros e em cada canto e
ai... todos os dirigentes, dirigentes de partido, todo mundo ficou maluco sem
saber o que era aquilo, como controlar isso, para onde vai? Para onde foi?
Então terminou como acabou... E assim, quando eu vi esse movimento de julho,
praticamente foi um... eu vi o retrato daquilo que aconteceu a vários anos
atrás, onde era uma coisa sem controle, onde o pessoal não aceitava direção,
não sabia o que queria, só queria... era uma explosão... assim, onde tem mil
pessoa e cada cabeça é uma sentença... Entendeu? [risos]. Cada qual, assim, tem
a sua reivindicaçãozinha, cada qual quer fazer a sua revolução...
Mas foi a primeira
experiência de massa para essa juventude...
Para a juventude foi a primeira experiência de massa. Foi
importante? Foi. Foi muito importante. Agora, assim, a nível de saldo político,
muito pouco, igual em 1982... Então, a única coisa que sobrou de 1982 foi um
grupo que formou um acampamento do movimento dos desempregados e acampou no
Palácio dos Bandeirantes, depois acamparam á no Ibirapuera. A única coisa que
sobrou foi isso, dessa explosão de 1982... e de julho foi a mesma coisa, porque
o... a classe, como um todo, ela é muito influenciável, ela eclode e é
passional. Nesses movimentos sem controle chega qualquer um maluco , fala assim
oh: 'pega aquele lá e mata!' O pessoal vai lá e mata. Não quer saber se você é
culpado ou inocente, não quer saber que você é. Porque alguém falou assim:
'Olha, pega lá!' Ai oh... e todo movimento sem controle, ele é um perigo para a
sociedade. Assim, é bonito... assim, mas é um perigo para a sociedade, é um
perigo, porque assim, pode ir para qualquer lado, ou pode não dar em nada, ele
pode ir para a direita, para a esquerda, para o centro ou para lugar nenhum,
porque não tem controle. E, a prática mostrou, não só o nosso movimento, mas
como em todo o mundo, Primavera Árabe, no Oriente Médio, o que é que deu
aqueles movimentos? Mudou para pior! O que mudou? Mudou para pior!
Mas o que se discute
é que é um momento do mundo, assim, do Ocidente pelo menos que está acontecendo
esse monte de movimentos, mas que na próxima safra de movimentos que
surgirem... trabalha-se com a hipótese de que vão surgir outros e qu as
direções vão ter que ir se consolidando dentro disso ai...
Isso é ótimo. E isso vai acontecer. O que ocorre, assim,
muitas dessas direções que participaram disso ai, nos próximos o pessoal já
está, já tem... já amadureceu para poder saber o que fazer... Se bem que pode
demorar um pouco...
Mas assim, eu fiquei a principio, restou um pouco de
preocupação por isso... porque tudo aquilo que nasce sem controle, ele pode
morrer sem controle e acontecer qualquer coisa séria e por pouco não acontecia
tragédias sérias nessas manifestações. E o que é que restou? Restou grupos
localizados, porque assim, que pelas suas ações acabam jogando toda sociedade contra...
Mas
o senhor não vê nada hoje que pode ser elemento de um germe de alguma coisa, de
esquerda?
Não, o positivo, assim, a ebulição da juventude. Certo ou
errado, eu concordando ou não, assim, essa coisa está em ebulição. E assim,
independente da minha vontade ou de qualquer outra pessoa da minha época,
assim, é uma juventude em ebulição. Esse é o fato positivo, assim, aquela
vontade de mudar não morreu, ela está em curso de diversas formas, agora, lá na
frente qual forma que vai ter, não sabemos, mas está em estado de evolução, e
isso é esperança. Então eu concordando ou não, mas há um processo em curso.
então cabe a gente, que as vezes costuma pensar, ajudar também, assim, a muitos
dessa garotada, a pensar. Não precisa fazer mais nada, assim, ensinar
filosofia... Não precisa nada disso, é só ajudar o pessoal a parar e pensar,
que a partir daí, quando se começa a pensar você começa a transformar... Então
não precisa, assim, colocar filosofia marxista ou maoísta ou seja lá o que for,
não! Ensina o pessoal a para e pensar, que o próprio pessoal vai criar e
descobrir o seu caminho. É isso meu caro.