quarta-feira, 14 de maio de 2014

Entrevista Jorge Preto - Oposição Metalúrgica de São Paulo

Elaboração, coleta e transcrição da entrevista: Alessandro de Moura.
[Falta revisão]

Realizada no Jardim Alzira, Santo Amaro - 18/3/2014

Nasceu na Bahia, na cidade de Santo Estavão/BA, 1955. Migrou para São Paulo em 1973. Chegou em São Paulo com 14 anos. Seu primeiro emprego na indústria foi na metalúrgica Sandewic, na Nações Unidas/SP. Trabalhou em 16 fábrica em São Paulo, em mais uma em Barueri e outra no ABC. Foi militante ativo em Santo Amaro organizando operários na fábrica Villares-Santo Amaro, que na época contava com cerca de 5.800 operários. Em 1979 atuou na organização dos Piquetões. Como militante da Oposição Metalúrgica, integrou chapa para disputa da direção do sindicato metalúrgico de São Paulo em 1981.
Seu primeiro emprego foi aqui em São Paulo?
É, registrado sim. Mas trabalhar eu trabalho desde quando eu aprendi a andar, né, lá no Nordeste. Então, a gente, desde que aprende a andar, a partir dos 5 anos que aprende andar e falar e fazer movimento já trabalhava. Pelo que eu me conheço por gente, eu trabalho desde que comecei a falar e andar, agora, emprego com registro em carteira foi a partir dos 15 anos , ai já foi aqui [em São Paulo]. O primeiro emprego eu não tinha registro porque tinha 14 anos, era sem registro, porque eu trabalhei em uma imobiliária de office-boy, ai, depois que eu fui para área metalúrgica...
Qual foi a primeira metalúrgica?
A primeira metalúrgica foi a Sandewich do Brasil.
Isso com 15 anos?
Sim.
E o sr ficou quanto tempo nela?
Eu trabalhei pouco tempo, trabalhei só 6 meses na Sandewich. Em seguida eu fiz inscrição para o SENAE pela indústria Villares. Porque ai eu fui fazer o curso do Senai para aprendiz Senai pela indústria Villares. Fui para a Villares e para o Senai pela própria empresa.
A Villares tinha quantos trabalhadores?
5.800 trabalhadores.
Foi lá onde trabalhou o Lula?
O Lula trabalhou na Villares de São Bernardo do Campo, na divisão motores, na divisão... Porque a Villares tinha várias unidades: Tinha a unidade Santo Amaro, que era motores e elevadores, tinha a divisão São Bernardo que fazia peças para navios, tinha São Caetano do Sul que era laminação. O grupo todo tinha 15.000 trabalhadores. O grupo Villares na época tinha 15.000 trabalhadores.
O sr trabalhou lá até que ano?
Eu trabalhei até 1979. De 1974, do final de 1974 até 1979. No começo de 1979.
E o sr começou a militar quando?
Em 1978. Na própria Villares nos anos de 1978, ai, eu comecei ter contato... porque assim que eu sai do... Na Villares eu fiquei 2 anos como aprendiz, eu ia para o Senai e voltava para a empresa. Depois é que eu fui trabalhar direto na empresa, ai que a gente começou um contato real com a vida operária em si, né. Ai, como a Villares era uma empresa que sempre tinha militantes, tinha até dirigente sindical dentro da empresa, o Antônio Lauro de Campana, era mais conhecido como Toninho Cabeleira. Ele era diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, e ele trabalhava na Villares la...
Ele era da mesma turma do Joaquinzão?
Era da turma do Joaquinzão. Então, assim, os primeiros contatos que a gente teve assim, mais com a direção porque dentro da fábrica tinha um diretor sindical e a gente começou a ter contato no comportamento dele, justamente quando tinha algum problema referente à própria empresa, o comportamento dele era completamente o contrário do normal...
Mas tendia para a patronal?
Sempre era mais para a patronal. Então, assim... ai... E começou o contato assim a partir de 1978, que teve assim o contato mais com a chapa de oposição, que onde o encabeçador da chapa era o Anísio Batista e o vice-presidente era o Santo Dias da Silva, porque ele trabalhava aqui na região. Ai eu vim a conhecer o Santo nessa época de 1978. E ai comecei a conhecer gente dentro da empresa, também, a gente já começou participar de pequenos movimentos dentro da empresa, quer dizer, movimento reivindicatório sempre, como melhoria do refeitório, limpeza, banheiro, essas coisas, assim bem simplório, aparentemente não tem nada haver com nada, coisa assim.
Então a partir daí que a gente começou a ter contato com a vida real operária na fábrica, com a vida metalúrgica. Foi dentro da Villares que eu comecei a dar os primeiros passos rumo a uma consciência operária. Então a partir daí veio tudo, as eleições [sindicais] de 1978 onde eu participei ativamente na campanha, como a Villares é uma das fábricas que tinha maior número de sindicalizados, ai eu participei bastante dentro da fábrica, mesmo sendo ilegal. Porque tudo, qualquer coisa que fizesse dentro da empresa era ilegal. Então, até material para a gente entrar, para fazer propaganda, era tudo clandestino, não tinha... Nos banheiros...
Isso mesmo em 1978?
1978. Principalmente. Naquela época, que foi na época do... acho que era o Geisel,  porque ai depois veio o Figueiredo, que foi em oitenta... Figueiredo já foi em 1984, já foi no final do... Mai ai, assim, nos anos 1970, mesmo eu começando cedo em 1973, por ai... todo esse tempo, eu só vim a ter contato real assim com o que é sindicato, essas coisas, em 1978. Porque não existia também movimento nos anos 1970... Depois de 1968, os anos 1970 houve uma paralisia geral. Ai só começou a ter os primeiros movimentos, assim, operário, a partir de 1978. Que, começou com o trabalho do pessoal com o trabalho das Comunidades Eclesiais de Base e as mães do Clube de Mães com o movimento chamado Movimento do Custo de Vida, que foi criado nos bairros né. E, assim, o movimento operário mesmo, ele começou a ganhar corpo, assim, nos anos de 1978, que, com a participação da Oposição Metalúrgica, principalmente na categoria dos metalúrgicos de São Paulo né...
O sr já concorreu em eleições do sindicato?
Já, já. Eu saí na chapa com o Waldemar Rossi em 1981. Na prática ganhamos. Todas eleições que a Oposição participou, ganhou. Mas, até, nas ultimas... eu estava pesquisando alguns documentos, assim, o Regime Militar, ele, acontecia o que acontecia, mas o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo não era prática vir com uma posição mais de esquerda. Então, todas as eleições a Oposição ganhava mais não levava. Sempre os caras davam um jeito de burlar alguma coisa para que a oposição não levasse o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo.
O Sindicato do Metalúrgicos na época tinha, a categoria aqui em São Paulo era 450 mil, hoje deve ter cento e poucos mil, mas na época era 450 mil trabalhadores em São Paulo, mas assim, pulverizados em grande e pequenas indústrias. Como a indústria de São Paulo era um indústria de transformação, muito assim, a pesar de não ser grandes industriais como as montadoras do ABC, que tinha uma concentração de operários em grandes industrias, havia concentração, grandes havia poucas, a maior mesmo era a Villares e a Metal-leve, a Prada, a Vaps [Santo Amaro], aqui na região, a Monarq, a Cibié, eram as maiores indústria que tinha... a que tinha maior número de operário era a Villares que tinha 5.800, depois vinha a Monarq com 4 000, a Prada com 2.800, a Vaps, que era do grupo Bosch, com 2.000. Então era assim, o resto era pequenas, grandes, médias indústrias, tinham muitas.
Nesse setor de transformação, aqui em São Paulo fazia tudo. Produzia desde peças para avião até armas, que era produzido aqui em São Paulo. Então era, do ponto de vista estratégico,  para a manutenção de um sistema, era fundamental. Se o sistema perde o Sindicato de São Paulo,que era apoiador do Regime Militar, era muito difícil o controle do movimento operário. Então, por isso que eles jogavam forte assim. O sistema e mesmo a patronal, jogavam forte que era para que o Sindicato do Metalúrgicos continuasse como estava. Então, pelas entrevista que você fez você já ouviu vários exemplos, filmes, tudo, que mostra isso ai, né. Então, é nesse período de 1978 que eu comecei a dar os primeiros passos via Oposição metalúrgica como a consciência operária de fato.
O sr começou a militar antes ou depois das greves do ABC em 1978?
Antes. Bem antes. Antes das greves do ABC... O começo foi em São Paulo. Porque aqui em São Paulo foram feitas greves por fábrica. Eram greves individuais por fábricas. E muitas fábricas, principalmente, acho que umas 5 empresas nós conseguimos criar as comissões de fábricas, algumas criar comissões de fábrica. Assim, foi destroçadas depois, porque assim... o pessoal começou a atuar então automaticamente... porque não tinha estabilidade, não tinha nada. O movimento estava começando, era inexperiente, ai formava uma comissão e ai o que acontecia? O pessoal ia lá, pegava o todo mundo da comissão e mandava embora. Então, os primeiros passos das comissões de fábrica foram dados aqui em São Paulo, aqui em Santo Amaro, o nome da empresa que teve a primeira comissão nos anos de 1978 foi a metalúrgica Raistein, na Nações Unidas... Ainda existe, eles fabrica empilhadeiras, essa empresa ainda está nas Nações Unidas ainda, eu acho que é uma das únicas que sobrou, hoje eles já estão com a... junto com a Comat, com outras empresas grandes né.  Mas foi os primeiros...
Antes de 1978 o sr não tinha ouvido falar das comissões?
Não. Porque as primeiras comissões foram todas espontâneas. Não havia nada assim, organizado. Previamente preparado. O que é que existia? A própria repressão, assim, o que ela reprime, ela cria seu próprios adversários. O que que acontecia,assim, acontecia algum movimento dentro de uma empresa, automaticamente os patrões mandavam aquele pessoal embora. Eles já iam para outra empresa com experiências, com experiência de lutas. Então, ao invés de ficar assim... Tinha um movimento na Villares, um exemplo, então, nós fizemos vários movimentos, daqueles movimentos, normalmente é demitido umas 100 pessoas. Essas 100 pessoas, ele passou a ter uma experiência pelo enfrentamento. Quando ele ia para outra empresa, ele já tinha essa consciência, ele não era mais aquele peão xucro, que, como nós chamamos, 'o burro obediente', né, faz o que manda. Ele já tinha, além de ele ser operário, ele já tinha lampejo de consciência, de pelo menos os primeiros enfrentamentos. E o Regime Militar, pela a dureza, a perseguição, ele também criava essas situações, porque cada um de nós que saiu e ia para outra empresa, ai só aqui na região... em São Paulo eu trabalhei em 16 empresas, trabalhei em mais uma no ABC, trabalhei em mais uma em Barueri, foi um total de 18 empresas. Trabalhei quando não tinha mais espaço em São Paulo. E, em todas empresas que eu trabalhei em São Paulo, era de média para grande. As maiores empresas, eu trabalhei em todas elas.
Então isso, os frutos, que eu falo que são os algozes do capital, é assim o próprio capital, assim, a repressão, que ela mesmo prepara. Porque, uma vez que teve um enfrentamento, a pessoa nunca esquece. Ele vai para outro lugar, quando surge qualquer oportunidade, esse pessoal que já fez o enfrentamento, são os primeiros a estar na frente. Então, em 1978 foi um ano muito rico em movimentos localizados. Como o sindicato não jogava...
A primeira foi a Raistein? E depois, quais foram as outras?
Da comissão de fábrica, teve a Toshiba onde o Anísio trabalhava, Anísio Batista, ele trabalho na Toshiba, então lá também houve uma greve por fábrica. então o que acontecia? Fazia greves localizadas, até reivindicações bem básicas, refeição, aumento salarial e nisso ai, como não tinha sindicato, o sindicato não dava a menor importância e jogava contra o movimento, o que que o pessoal fazia? Não chamava o sindicato. Fazia greve, não chamava o sindicato. 'E ai, vai negociar com quem?'. Ai a própria patronal falou: 'Então forma a comissão e vamos conversar'. Ai o pessoal formava a comissão e ia lá conversava, decidia até encerrar o movimento, terminava e ai depois disso mandava todo mundo embora né, porque já estava todo mundo identificado.
Então, começou nessa questão, as comissões de fábricas muito assim... E, a partir daí, com a continuidade do movimento, aconteceu greves localizadas em várias fábricas, chegou o mês de novembro, porque era outubro que era o mês de campanha salarial, como já tinha essa força acumulada por fábrica, a Oposição já tinha militantes em toda São Paulo e já teve a experiência da chapa, tinha tido a eleição em maio, de 1978, no meio do ano e teve todo aquele... a Oposição ganhou a eleição, foi constatado várias fraudes, foi anulada, depois o Ministro do Trabalho Arnaldo Preto, foi ele pessoalmente no sindicato e empossou a diretoria, ai já tinha essa experiência acumulada de fardo do trabalho de Oposição e na campanha salarial nós mobilizamos os que nó podíamos para ir para o sindicato. Porque assim, mesmo contra nós, o sindicato tinha a premissa da categoria, eu o que que nos fizemos: 'Vamos mobilizar a categoria e vamos forçar o sindicato a decretar greve na categoria'. Então essa foi uma decisão em reuniões paralelas que a gente fazia nos bairros, principalmente nas Igrejas, né... Tinha as Igrejas ai, o setor progressista da Igreja, eles davam muito espaço para a gente, se reunia, a gente ia para dentro do sindicato com essa posição.
E que impacto tiveram as greves do ABC...
Não. O impacto foi ao contrário. Assim, porque então nós mobilizamos assim, aquelas fábricas quando tinha trabalhos organizados, levamos todo esse pessoal para as assembléias do sindicato, para construir a greve por categoria, porque a gente só fazia greve por fábrica. A gente queria uma greve por categoria em 1978. Ai, nós mobilizamos em todas as regiões, assim, nós tomamos literalmente a direção do sindicato antes da greve. Tomamos, totalmente. Só que... os cara tem a máquina. [risos]. Ai então, como o sindicato não tinha espaço, nós tivemos assembléia na rua, não tinha sistema de comunicação, sistema de comunicação é aquele de um fala e faz o eco, vai repetindo, repetindo, repetindo, não é. Ai um fala e os outros vão repetindo até chegar no ultimo.
Ai nós, teve um companheiro nosso, que a gente chamava de Chico-viola, que era da Exprettchu, ele trabalhava na Exprettchu ele também foi.. ele estava na chapa de 1978, ele era da Oposição, nós dominamos toda a assembléia, tomamos conta literalmente de todo o sistema de som do sindicato, ai passamos a direção para o Chico-viola, ai o que que ele fez, ele entregou o microfone para o Joaquinzão, para o Joaquinzão decretar a greve. [risos]. Ai , ele já assim impressionado pela...  Porque naquele tempo era uma coisa inédita na época, na assembléia o máximo que acontecia nessas assembléias era 200 pessoas, a gente estava com 10.000 pessoas lá, assim na Rua do Carmo, em outubro de 1978. Aquela famosa foto lá, se você olhar, tem uma faixa da Villares lá no meio, na época eu trabalhava na Villares e eu estava com 3.000 pessoas da Villares lá. Então assim, nós levamos assim, intimamos o pessoal.
E como o sr fez esse chamado dentro da fábrica?
Era no boca-boca. Como eu trabalhava na manutenção, eu tinha muita circulação dentro da empresa, o pessoal me conhecia bem. Ai, a gente passava: 'Passa para o fulano, vai lá passa para as pessoas'. Ai a greve, foi decretada greve geral. Ai o que que nós fizemos? Voltamos para a fábrica, 'vamos preparar as greves'. Ai, porque não era assim greve de rua, era greve localizada dentro da fábrica, parando empresa, essa empresa que eu estava parou, várias outras. Ai, nesse espaço que a gente estava em greve dentro da fábrica, o Joaquinzão já estava negociando o acordo com a FIESP. [risos] para acabar com a greve no dia seguinte. Então a greve durou muito pouco, mais teve um impacto muito grande a nível de categoria porque atingiu assim, as pequenas e... as grandes e médias empresas pararam todas. Ai quando a gente chegou lá o acordo já estava pronto, negociado. Durou 2 dias a greve. Então o ano de 1978 foi isso. E ai o que que aconteceu, nesse ano mesmo de 1978 teve assim, ai já surgiu as primeiras greves por fábrica no ABC, que foi na Scania.
Mas à essa greve geral, de 1978, o ABC não aderiu?
Não. Porque na época não existia inter-categoria, não existia inter-fábricas, não existia assim, interligação, não existia nada disso. É cada qual fazia sua partezinha no seu local de trabalho e tocava a vida para frente. Porque ai, com essa greve de 1978, que foi no final do ano, que é em outubro, que é o nosso acordo coletivo é 1º de novembro. Mas o pessoal do ABC acompanhou, tinha muita gente aqui, na região, que era do ABC como o Betão, o Bagaço, o Rômeu, porque eles trabalhavam na... O Betão trabalhava na Ford, o Rômeu na Volks, o Bagaço acho que era na Mercedez. Os três eram do ABC e que acompanhavam a gente aqui. O Rômeu era mais conhecido como Ganso. Ninguém conhecia por Rômeu, é Ganso. E pior, porque dentro da fábrica, a primeira coisa que você ganha é um apelido, raramente você pega um pessoal que não tem um apelido dentro da fábrica.
E isso ai deu luz, mais, para o pessoal começar a fazer o trabalho de fábrica no ABC. O ABC não começou por uma greve geral, começou por uma fábrica. Ai, depois estendeu para uma greve geral.  Mas, assim, a primeira greve geral foi em 1978, em outubro de 1978 aqui em São Paulo.
O que teve de mais organizado em São Paulo, no movimento operário foi essa greve geral? Porque no ABC só teve greve por fábricas...
Exatamente. Foi a greve geral de 1978, que foi organizada assim... basicamente, o que que contribuiu? [...]. Não aparece, como não foi uma coisa oficial, ai o que que... Porque o movimento, nessa parte assim, as vezes encobre muito da história e só aparece, assim, aquilo que... a greve de São Paulo, quem publicou? Acho que foi o Estadão e a Folha de São Paulo. Na época, vc... Aquela foto [da rua do Carmo] acho que é até da Folha ou do Estadão, não lembro... Então a greve, assim, o movimento organizado de 1958 contribuiu bastante com esse trabalho de fábrica, a gente fez... principalmente as fábricas que tinham comissão né, e o trabalhozinho miúdo de fábrica. A gente mobilizou tudo e fomos tudo para dentro do sindicato.
Na Villares chegou a ter uma comissão?
A Villares é uma das fábricas que nunca teve uma comissão. Não... Era uma fábrica onde tinha um trabalho...
Em nenhuma delas?
Não. Em nenhuma das unidades da Villares. Era... onde tinha o movimento mais assim, organizado, onde tinha mais militantes, mas, só que assim, nós nunca conseguimos uma comissão dentro da Villares. Em situação nenhuma, em nenhuma das unidades, nós nunca conseguimos uma comissão dentro da Villares.
Mas isso porque não tinha como institucionalizar uma?
Não, a direção não aceitava mesmo...
Qual direção?
A direção da empresa...
Mas vocês tinham um grupo que se reunia?
Sim. A gente sempre tinha grupo. Então, o que que a gente fez na Villares, assim... como a gente não conseguia um trabalho organizado via comissões, então a gente começou a atuar pelas CIPAS. Ai, na prática a gente fazia comissão via CIPA. Mas sempre tinha grupo organizado, pessoas organizadas, se reuniam fora... a gente atuava, assim, era uma das fábricas mais oposicionistas à diretoria do sindicato, era a Villares,não é?! Por causa, assim, dessa efervescência e militância. Mesmo, se saia [da fábrica], os caras mandavam [embora], mas sempre ficava gente e continuava o trabalho. Sempre, assim, quando eu sai, ficou um grupo grande organizado dentro da Villares.
Um grupo de quantos, mais ou menos?
Assim, que a gente se reunia periodicamente fora, era 30 pessoas direto, que se reunia fora. E o interessante é que essas pessoas eram de cada setor, não era só de um setor, como a empresa é grande, a empresa é organizada por setores. Então, o que que a gente fazia, pegava setor de fermentaria, usinagem, manutenção, almoxarifado, produção, montagem, teste, então, a gente sempre procurava, assim, formar e puxar militância em todos esses setores. Quando acontecia alguma coisa, assim, a gente só chamava os militantes de cada setor [...], como a comunicação, tudo era proibido, então a gente só fazia um mosquitinho [panfleto minúsculo] e passava: 'passa para tal setor, passa para o homem de tal setor'. Era só um... ai, a gente falava: 'Meu, passa lá pra ele', ai o cara lia: 'passa para outro', e ia... ai em pouco tempo a gente já tinha comunicação em toda a empresa. Então, essa era a forma que a gente usava para... As vezes até escrito à mão, pegava um papel de pão lá, o papel de produção lá, o que eles escreviam e passava. Então essa era uma forma de mobilização interna.
E no meio dessas pessoas, tinha gente de partido também? Quem que atuava  na Villares, de corrente?
Sim, Tinha. Tinha, assim, depois... com a continuação do... como começou a surgir esses focos de movimento mais organizado, ai a esquerda, os partidos de esquerda, começou a chamar a atenção. Eles começaram a preparar militantes, o pessoal que saia da... militantes deles de faculdade, estudantes, para se tornar operários, para ir para as fábricas, o pessoal ia trabalhar na área de controle, trabalhar no escritório. Ai, depois, ai sim, começou a surgir militantes do PC do B, começou a surgir militantes da Convergência, militantes d´O trabalho... E o pessoal, com a incisão das próprias correntes de esquerda, para jogar o pessoal para a produção. Tanto que eu tive contato com partidos, pessoal de esquerda dentro da Villares. Eu tive contato com militantes da Villares, do PC do B, dentro da Villares que eu não sabia. Na verdade não fui eu que descobri o pessoal, o pessoal é que me descobria [risos]. A pessoa via aquele neguinho rebelde: 'aquele lá serve'. Então, não era só visado pela repressão era visado também pelos partidos de esquerda.
Então foi isso que eu comecei ter mais contato com a política via militantes de partidos de esquerda. A gente começou, uma coisa que na época chamou muito a atenção, foi aquele, um jornal que era... que era o jornal O movimento, que era encabeçado por Raimundo Pereira, Fernando Henrique Cardoso, Teotônio Vilela, o outro escabroso, que era da Cobertores Paraíba... o...  até que foi super homenageado ai... isso ai é... faz parte da história né... Esse jornal O movimento, assim, ele contribuiu bastante para elevação da mili... para elevar o nível da militância. Porque na época, assim, porque quando a Folha, a Folha apoiava o Regime, depois que a Folha deixou de apoiar... Então assim, quando alguém lia a Folha, o pessoal já ficava de olho, porque na época era um jornal avançado, que era Folha de São Paulo... Então, se um peão de fábrica entrasse com uma Folha debaixo do braço, ai os cara já ficavam de olho: 'porque que ele tá lendo a Folha?' Não é um pessoa... Já está um pouco além do... da expectativa, já está acima da média. Então os olheiros observavam muito o que a gente lia né... Ai, eu comecei a ter contato com a esquerda via o jornal O movimento, porque tinha um militante lá do PC do B, era um engenheiro, assim, um dia eu vi ele lendo um jornal ai eu perguntei o que que era né, ai ele passou um jornal pra mim...
Isso em 1978?
Em 1978. Foi via jornal O movimento que eu conheci um dirigente do PC do B dentro da empresa, lá...
E como o senhor descreveria o ano de 1978?
O ano de 1978, assim, acho que foi o despertar do movimento operário. Que foi um ano, onde vinha... porque depois da repressão de 1968, aquele movimento estudantil de 1968, a morte de Vladmir Herzog, que foi muito pouco divulgado né, assim, a gente via só fotografias, jornais, a gente não tinha... o movimento operário, ele não tinha conhecimento de nada, tudo o que acontecia estava tudo dentro... era o milagre econômico, não é... Então, assim, a classe operária era muito jovem ainda, estava vindo do campo para a fábrica, ainda havia uma migração de pessoas do interior para trabalhar na indústria, pessoas que vinham do campo para trabalhar na indústria, né. E assim, tinha além da efervescência da construção civil, mas a indústria metalúrgica que é um setor especializado, então os melhores trabalhadores, assim, que eram recrutados, iam para o setor na área de metalurgia, depois ia para a química, ia para os setores mais especializados da indústria e eles pegavam, justamente, mandavam fazer cursos no Senai, porque a indústria estava precisando de mão de obra especializada. E, na nossa época, a gente que tinha uma certa especiali...  que era especializado, tinha um tramite maior dentro da empresa, por isso que a gente tinha mais liberdade para andar né, para se locomover de local para outro...
Então, esse ano de 1978 foi o ano, assim, do... aonde o despertar da consciência de classe, principalmente da classe operária que é a classe que produz, começou a despertar e ai que começou a abrir fissuras no Regime Militar, porque até a época, assim, o forte era o movimento estudantil. Que ai, ia lá, brigava, fazia uma manifestação, mas, assim, não arranhava o sistema. O que é... o que começou a arranhar o sistema, começou a quebrar a muralha do sistema, praticamente, é a produção, parou a produção, ai se questiona o sistema. Porque, o que que acontece, no despertar da consciência de classe? Como eu falei para voc~e, a gente começa com coisas pequenas, você vai reivindicar assim: 'a comida está ruim, então vamos fazer um movimentozinho para melhorar a porra dessa comida que está uma merda, esse banheiro está sujo pra caralho'. Ai, para o operário aquilo é normal, quando ele vê essas pequenas reivindicações, o que que aparece, qual é a primeira coisa que aparece? O que aparece é que, além do... você acha que vai negociar com o patrão, mas, quando você vè, você não está mais negociando com o patrão, você está conversando com o Estado.
Porque, a primeira coisa, o que que o estado fazia? Era um movimento, por menor que seja, ai eles já mobilizavam a polícia e já montava uma barreira na porta da fábrica para proteger a empresa. Ai, o que que o operário pensava? 'Pô, mas eu não estou fazendo nada demais, eu estou trabalhando, estou querendo só que melhore um pouquinho o local de trabalho, eu quero no mínimo um comida que eu possa comer. Porque que a polícia está aqui?' Ai já abria assim: 'está aqui para proteger o patrão'.  ai, quando você já ia indo, assim, no processo de negociação, não era mais o patrão, já era o sindicato, depois já não era o sindicato, era o Ministério do Trabalho e já era o Estado. Ai é o despertar da consciência de classe. Ai você fala: 'oh, eu não estou lutando só contra o, na época do... contra o Luiz Villares, eu estou lutando contra o Luiz Villares, contra a direção do sindicato dos metalúrgicos, contra o governo do Estado e ai tem o Ministério do Trabalho que é o Governo Federal.
Sai até da esfera do estado de São Paulo...
Sim! Aparece primeiro para nós a fábrica, só que, quando assim, no enfrentamento você vê que é muito além da fábrica. O enfrentamento, assim, ai o despertar da consciência de classe vem por ai... É nos primeiros enfrentamentos. Então, assim, não há consciência sem enfrentamento. Porque se não há enfrentamento, assim, o pessoal vai e se limita ao fazer no dia-a-dia... Tá tuim mas tá bom... Ai um dia fala assim, 'um dia vai melhorar', ai vem todas as crendices e tudo mais. Mas, assim, a partir do enfrentamento, o operário, ele só se conscientiza de fato, no enfrentamento de fato, que ai ele vai ver toda a máquina que ele está enfrentando. Ele não está enfrentando o chefinho dele que fica lá enchendo o saco dele lá, o encarregadozinho ou o diretor da empresa, ele vê que a coisa é bem maior, por isso que 1978 foi um ano assim, que marcou na história do movimento operário a consciência de classe. E isso, assim, se espalhou, se espalhou assim, para todas as regiões fabris de São Paulo e para várias regiões do Brasil. É tanto que, muitos militantes nossos, a... e eu faço um parênteses nesse patamar de espalhar o movimento, os setores progressistas, principalmente da pastoral operária, da JOC, da Igreja Católica, ajudou bastante.
O senhor era desse setor?
Não. Eu nunca fui militante católico. O Waldemar era militante católico, o Waldemar, o Anísio, o Santo, Santo Dias... Então, eles eram militantes católicos, ne... Mas eu nunca fui militante católico não. E, mas, a Igreja contribuiu muito para a divulgação das lutas, principalmente na questão das comissões de fábrica... As primeiras comissões que foram criadas, que a gente percebeu que ela era muito frágil, era voluntária, era muito frágil, então o que que nós começamos, falamos assim: 1Vamos criar assim, primeiro aquela comissão que vai em frente e a paralela. A que aparece e a que não aparece. Porque a que dirigia mesmo era a que não aparecia. ai, a gente pegava os melhores militantes, ficavam na retaguarda. E aqueles, os mais ou menos, iam assim, iam para transmitir o que pensava a maioria dos trabalhadores, para preservar a militância. A gente começou a aprender também na luta. E ai começou a surgir comissões de fábrica de fato mesmo, reconhecida pela empresa, assim, eu participei... ai já fugindo um pouco de 1978, ai já vem para o ano de 1979, quando 1978 foi o despertar né e 1979 foi um ano assim, onde já vinha muita força acumulada assim, das greves de 1978. Ai também veio... os metalúrgicos do ABC o dissídio, terminou 1978 o dissídio dos metalúrgicos do ABC é em maio, maio assim, é em abril né... Ai já veio a greve dos metalúrgicos de 1979.
Tinha acabado de acontecer a greve geral em São Paulo, ai já veio outra em maio...
Então, a gente já tinha uma puta experiência de greve aqui de São Paulo, por fábrica e a gente já tinha contato com o pessoal do ABC, então, a gente procurou assim, o pessoal captou a idéia de criar núcleos por fábricas. criar comissões, grupos organizados. Ai então, não simplesmente...
E vocês, aqui de São Paulo, vocês não iam ao ABC panfletar, fazer trabalho de base lá?
Não, não. A gente tinha contato assim, com o pessoal da militância, o s dirigentes, o pessoal lá já era eficiente para fazer isso. O ABC, eles tinham muitos militantes. Como era um sindicato que jogava a favor dos trabalhadores, é, eles tinham muita militância, o sindicato tinha muita militância. Então, no ABC, eles não tinham o problema da gente aqui em São Paulo, porque eles tinham o sindicato e aqui em São Paulo o sindicato jogava contra nós. E lá o sindicato jogava para a categoria. então, a gente tinha contato com os dirigentes sindical, com o Gilson Menezes, com o Devanir, com o Expedito, é, todos os dirigentes, os velhos dirigentes sindical de São Bernardo, tudo tinha muito contato com a gente.
Ai, o ano de 1979 foi um ano assim, de acumulação, tinha muita força, a classe já tinha experiência, veio todo aquele movimento, ai depois veio a eclosão das greves do ABC, com a intervenção nos sindicatos, com a prisão dos dirigentes sindicais. E ai, com essa experiência em 1979 também nós fomos para a greve geral em São Paulo.
Em outubro de novo?
Em outubro de novo. Só que, é, o que que ocorria, o sindicato assumia a greve, pressionado também... Nós usamos a mesma tática: 'Vamos pressionar a categoria, procurar espaço maior para reunir todo mundo. Então, as assembléias, ao invés de ser no auditório dos metalúrgicos de São Paulo, que não dava, foi no Cine-Rox, lá no Brás, que era um espaço bem amplo. Ai nós mobilizamos... a assembléia era feita nos domingos, ai a gente mobilizava o pessoal de todas as regiões e vamos para o Cine-Rox.
Domingo é bom que ninguém trabalha?
Mas para a mobilização é ruim. É péssimo, mas mesmo assim a gente ainda levava muita gente. E a gente mantinha assim... era pressão assim, ferrenha na diretoria do sindicato. Praticamente, assim, os militantes da Oposição é que dirigiam a assembléia, só não tinha a máquina. Mas dirigia. Os cara colocavam a tropa de choque lá, a gente passava por cima [risos]. A gente organizava assim, é... o pessoal da linha de frente com bumbo. começou a fazer enfrentamento, era enfrentamento direto mesmo, assim, com o pessoal de fábrica.
Faziam piquetes?
Quando era necessário, sim.
Em 1978 teve os piquetões?
Os piquetões depois eu vou te passar, como começou os piquetões. Então teve os primeiro enfrentamentos das assembléias [...] que era para decretar greve geral. Ai os caras saíam postergando. Ai... foi decretada a greve geral e o que que a gente exigia, assim, ó: 'Vamos alugar espaço na região, em todas as regiões, que é para reunir o pessoal nas regiões. Então, assim, essa foi uma das... uma cagada histórica que nos fizemos...
Porque, deu errado?
Não, não é que deu errado, ai o sindicato fez, alugou sede em todas as regiões, só que essas sedes eram armadilhas.
Como assim?
Quando a gente estava preparando a greve, assim, a meia-noite, para começar a greve, assim, o que é que nós fizemos, a maioria dos militantes, nós reuníamos nesses locais. Ai, antes de a gente sair para a greve ai chegou a polícia e prendeu todo mundo. Ai, simplesmente, quando nós fomos observar o local, parede que foi previamente preparado, não tinha saída! Só tinha entrada! Então nós caímos numa armadilha geral. E assim, e foi preparada pela diretoria...
O sr foi preso?
Em 1979, né. Então, no dia que ia começar a greve, na noite, a maioria dos dirigentes assim, das regiões foram presos, assim, os principais dirigentes foram presos, foram para o DOPS. Mesmo assim, a gente estava tão organizado que a greve aconteceu. A greve aconteceu, assim, e começou a ganhar corpo. E nesse espaço também, depois, nós ficamos 2 dias lá no DOPS ai foi liberado todo mundo...
Foram torturado? Teve tortura?
Não. Não porque era muita gente né... 
Quantos foram presos? Tem uma idéia?
Só aqui na Região foi 380, assim, de uma leva. Foi 380 pessoas. Só aqui da Região Sul, né... Mas, em todas as regiões, eles fecharam, levaram toda a militância de linha de frente, todo mundo. Mesmo assim, os que ficaram fora deram continuidade...
Todo mundo era mais de 500?
Não, acho que na época foi mais... Tem a lista hoje lá no IIEP, tem a lista de todas as prisões, dá mais de 1000 pessoas presas em uma noite. Mesmo assim, com toda essa militância presa a greve aconteceu e ganhou corpo. Ai o pessoal estava se organizando assim... e é tanto que aconteceu a morte do Santo, porque eles foram fazer uma paralisação em uma empresa aqui em Santo Amaro, na Silvânia onde o Santo foi assassinado, né... E ai onde surgiu a idéia dos piquetões.
Então é a partir de 1979 os piquetões?
É, foi em 1979.
Antes disso não tem piquetão?
Não. Não existia. Então o que eu fiz, reunia os pequenos grupos, os caras vinham lá e descia-lhe a porrada, a polícia vinha e dispersava. Como eu ainda trabalhava na Villares, porque eu fui mandado embora depois da greve, depois de outubro [de 1979], eu fui na Villares, assim, nós reunimos 800 pessoas, ai eu peguei o pessoal mais...
800 é muito!
Não, a fábrica que tinha 5000 mil pessoas, é nada. Ai, cheguei lá o pessoal estava todo mundo lá,meio na porta da empresa, falo assim: 'Agora, nós vamos...' Na Nações Unidas tinham várias empresas de porte, tinha a... ai começava pela Raister, depois vinha a MWM, a Cartepillar, FAG, é Bras-inter, Instron, hoje não existe mais nenhuma dessas, a AMORTEX, então, eu falei para o pessoal: 'Nós vamos começar, vamos todo mundo aqui, nós vamos fazer uma marcha aqui, vamos parar todas as empresas da Nações Unidas'. Ai nós começamos, saiu 800 homens e mulheres também... Ai nos começamos pela Raister, depois veio a MWM, depois, subindo os corredores ali, as pequenas empresa, a gente começou a fechar corredores, ao a gente começou a marchar nas Nações Unidas, assim, quando nós chegamos na Amortex, a gente já estava com mais de 10.000 mil pessoas na Nações Unidas, ai era imbatível, que ai foi a idéia dos piquetões. Então o que a gente fez, quando tinha muita gente, a gente começou a deslocar gente para todos os lados, ai pegava as ruas, os corredores fabris, Capela do Socorro, Metal-leve... ai começou a deslocar gente para todos os lados.
Então surgiu daqui da região?
Surgiu de santo Amaro. Surgiu da Villares o piquetão. Por isso que a Villares aparece muito, porque tinha um maluco igual a mim. Ai que eu falei: 'Só vai dar certo... não podemos ficar em pouca gente, porque assim... o enfrentamento. Os caras estavam em muitos, a gente em poucos, então... Então, a partir do momento que começou a ter muita gente, o que que aconteceu? A polícia recuou. Porque tinha muita gente... assim... não sei... ai eles recuaram. No que eles recuaram, abriu o flanco e nós tomamos, assim, literalmente, as empresas.
Mas vocês não iam armados com pau, etc?
Não. Só caminhando, assim, e palavras de ordem. Então, não tinha... O enfrentamento era assim, bem... era corporal o negócio, enfrentar com palavra de ordem e crescendo, cada vez mais ia crescendo. Cada empresa que a gente ia lá, o pessoal estava parado dentro da empresa, então o que que a gente fez, assim: 'Não, ninguém vai assim, se continuar dentro da empresa nós vamos ficar invisíveis. Nós temos que jogar essa gente para rua'. Então a gente ia assim, e chegava, parava na frente da empresa, fazia uma assembléia na empresa, fazia todo mundo sair, que não queria sair, a gente fazia sair, a mesma coisa, 'vai ter que sair'. [risos].
Entrava uma comissão para tirar?
Não entrava assim, chegava na porta e falava: 'Ou sai ou a gente entra'. [risos]. Ai os patrões babavam né, então os cara falavam assim: 'manda esse pessoal ir embora!' Ai, o que que a gente falava, chegava os seguranças todos armados, porque seguranças eram todos armados, a segurança de empresa era tudo assim, tudo armado e era assim, a repressão... Ai falava assim ó: 'Vocês escolhem, ou vocês mandam todo mundo sair, ou nós vamos entrar e tirar!'. Dai, daqui um pouco, você via todo mundo saindo. [risos]. Ai, a gente parava o pessoal, fazia assembléia e falava: 'Oh, que quer acompanhar a gente seja bem-vindo, quem não quer vai pra casa, vai fazer qualquer coisa, vai pro boteco, mas não fica na rua, então quem quer acompanhar, vamos!'. Ai foi engrossando, engrossando, engrossando. E ai, chegou uma hora que a gente estava assim, tinha piquetões em todos os cantos da cidade. Então a idéia do piquetão nasceu. Nasceu na porta da Villares. Porque eu vim lá do centro, depois que eu fui... que eu saí lá do DOPS, daí eu vim e chamei o pessoal assim: 'Vamos mudar o cardápio dessa coisa aqui!'. E ai, a idéia do piquetão começou ai...
E depois, em 1979 vocês retomaram os piquetões?
Não, ai foi uma outra, foram outras situações depois de 1979. Então, foi várias assim...  que houve, depois 1979, depois ABC, houve também... houve muita articulação, porque ai a gente já começava a pensar em... pensar mais geral, não só na questão do sindicato, mas já começava pensar na questão de uma central sindical, que ai já começou a ter a idéia da CUT.
Isso em 1979 ainda?
Em 1979. Assim, a Oposição, e já tem documentos da Oposição que a gente já colocava assim, acho que em um congresso da Oposição em 1979. E já nasce ali a idéia da Central Geral dos Trabalhadores, que a gente já começou a ver mais longe, não só assim... A gente já via o embate aqui em São Paulo: a gente ganhava e não levava, ganhava e não levava. Mas, mesmo assim a gente... A história é engraçada, nós somos os únicos dirigentes que não ganhamos sindicato, e até hoje... Não, até hoje nós temos um conhecimento assim, dentro, como os dirigentes sindicais, os mais antigos assim, temos um respeito assim, muito grande pelas direções sindicais, porque muitos militantes nossos foram para outros Estado, começou a ganhar sindicato, criar oposições e tudo assim, de um trabalho que a gente começou por aqui né.
Porque os piquetões, eles nasceram e morreram em 1979, que ai já vem várias outras situações, ai já veio o outro estado de greve, o ABC já estava muito, já estava bem no ar. Assim, ele já estava ofuscando São Paulo, São Paulo já não aparecia, porque São Paulo não tinha sindicato só tinha Oposição. Então aparecia bem mais os metalúrgicos do ABC, greve nas montadoras, ai já vinha toda questão das reivindicações gerais, eleições assim, ai já veio o pessoal do ABC, que já... já estava com a idéia de criação de partido, criação do PT. Ai já entra para os anos 1980. Porque ai ja vem, assim, vem a preparação, tudo para as eleições em 1981.
E onde surge as interfábricas nisso?
As interfábricas surgiram a partir de 1979. Porque ai, o que que acontece, nos anos 1980 a gente percebe assim, que nenhuma fábrica sobrevive sozinha. E ai já começa o inter-categoria, inter-fábrica... A gente pegava assim... começamos a fazer em São Paulo, pegava pessoal em fábrica da Região Sul para trocar experiência com a Região Leste, com a Região Norte, com a Moca, com a Região Oeste...
E essas reuniões serão onde? No sindicato?
Não. Sempre em salões, ou salões de Igreja, ou outros locais.
Ai entra a importância das pastorais...
Ai onde entra a importância da Pastoral Operária, o pessoal sempre aqui na logística, no espaço, sempre contribuiu para isso. Vários salões da Igreja em vários locais... Só era em sindicato quando foi assim... a gente começou a ter interação com o pessoal do ABC, ai era mais o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Ai usava o espaço do sindicato dos metalúrgicos. Mas o Sindicato do Metalúrgicos de São Paulo, nunca foi feita para fazer inter-fábricas, primeiro porque eles eram contra, eles não permitiam, a gente fazia isso tudo via pastoral operária. Porque ai vinha... ai no ano de 1979 já veio a preparação, veio os anos 1980 e a preparação para as eleições de 1981.
Nos anos 1980 a gente já veio a preparação para 1981... Em todo esse movimento de 1979, o que que surgiu na região? Nós conseguimos assim, eleger dois deputados na Região, foi o Aurélio Peres e a Irma Passoni. Isso veio do movimento de bairro, do movimento custo de vida e do movimento operário na região. Nós conseguimos eleger o Aurélio e a Irma, ai com o passar dos anos 1980 veio a... preparação para as eleições de 1981, o pessoal do PC do B junto com o Aurélio, ai eles exigiam a cabeça de chapa, porque o Aurélio tinha que ser o cabeça de chapa. E pelo nosso trabalho assim, pela nossa concepção...
O Aurélio era da Oposição também?
Era da Oposição, era do mesmo grupo. Então, ai foi uma decisão política do PC do B... Na época eu era muito próximo do PC do B, tinha muita interação com o pessoal do PC do B, até que todo mundo achava que eu era militante do PC do B, eu era área de influência. Ai, a decisão que eles tiraram era que só aceitava com o Aurélio na cabeça de chapa, não aceitava o Waldemar Rossi, não aceitava o Fernando Ó, assim, começou a vetar pessoas, porque eles achavam que eles eram os... Ai, um dia, a gente com a nossa política de trabalho de base, que a gente... 'Tudo bem, aceito, mas, só que tem que ir para uma convenção, ganhou na convenção leva'. Só que eles: 'Não queremos convenção, queremos a cabeça da chapa. Então não adianta ir para convenção porque chegar na convenção vocês ganham'. E logicamente a gente ia ganhar porque a gente tinha muito trabalho de fábrica. E eles: 'Não, a convenção é só para legalizar'. Ai, ai limou, ai...
Mas ná época o sr. apoio a posição do PC do B?
 Não. Eu fui assim, o que mais bateu de frente com a posição do PC do B, eu era área de influência, porque eu tinha ainda pouca experiência na militância política. Ai eu fui em uma reunião com o Waldemar Rossi...
O Aurélio Peres tinha sido eleito para o que?Vereador?
Não, deputado federal.  [...] Foi no finalzinho de 1979. Ele e a Irma, foram eleitos por nós aqui, assim, principalmente a Região Sul.
O Aurélio Peres era do PC do B?
Não, não existia naquela época, na época era o MDB. Só tinha a Arena e o MDB né. Foi um fato histórico na época... Qual foi o tema de campanha que nós demos? Tinha: 'O tostão contra o milhão', 'Não vote no patrão vote no peão', esse era o nosso slogan. [risos]. E nós elegemos o filho da**** do Aurélio Peres. Só que em 1980, em 1981, para a eleição de 1981 assim, ai casualmente eu fui participar de uma reunião lá no comitê do Darci Passos lá, ai eu assisti a cena, assim, o pessoal exigindo... Porque eu bati de frente com o pessoal do PC do B, com o Aurélio, com todo mundo. Ai, até numa época eu falei para o Aurélio, era a ultima eleição que ele ia se eleger, porque se dependesse dos votos da Região Sul ele estava... Tanto que na próxima eleição a votação dele caiu. [risos]. Ele ficou muito puto comigo... Eu bati de frente mesmo porque eu achei aquilo uma sacanagem, assim, que vem contra todos os princípios, ai aeu falei: 'Vocês não querem negociar, vocês querem impor a política de vocês'. Se a partir de um momento senta à mesa para se negociar, os dois lados tem que ceder e o lado de cá já cedeu, o lado de cá está muito claro, é o pessoal assim, que está aqui com o Wademar Rossi, tudo bem, vai para a cabeça quem a convenção decidir, então assim, se vocês, que se dizem os donos da democracia operária, precursor da luta do... Que porra que é essa, que luta de classe, que democracia operária que vocês estão defendendo? É a democracia de vocês ou é a democracia da classe? Porque ai vocês estão privilegiando a democracia da porra do partido de vocês. Então o que que prevalece? Ai foi paulera véi...
E ai naquele dia rachou. A oposição rachou, o pessoal do PC do B foi e montou a chapa deles em 1981 e nós montamos a nossa. Ai nós montamos a chapa com o Waldemar Rossi na cabeça, fomos para... Fizemos a convenção normalmente como estava programado. Ainda abrimos espaço para  assim, se eles quisessem participar da Convenção o espaço estava aberto. E nós fomos para a convenção, tiramos a chapa, a chapa foi muito bem votada nas empresas, sei que foi lavada. Ai não deu quórum no primeiro turno, que ai veio o segundo turno das eleições...
Não deu quórum?
 A chapa vencedora tinha que ter 50% mais 1%.
E nenhuma das três chapas tinham, né?
Nenhuma das três né. A nossa, apesar de ter sido muito bem votada, não aconteceu o quórum porque que é... A chapa do Aurálio Peres tinha poucos votos, mas, junto dom as nossas dava... Então, ai veio o segundo turno, ai o pessoal teoricamente apoiou a posição, mas... é, perdemos no segundo turno.
A chapa Aurélio Peres estava com o pessoal do ABC, que foi apoiada pelo Lula?
Não. O Lula nunca apoio, o Lula sempre apoiou a chapa da oposição em São Paulo. Sempre apoiou a nossa chapa. Então, mesmo com diferença, mesmo com críticas, o Lula sempre apoiou a chapa da Oposição em São Paulo. O PC do B, isso foi na eleição depois que houve a cassação dos metalúrgicos do ABC, o PC do B lançou uma chapa no ABC contra o Lula, que foi encabeçada pelo alemão e o pessoal lá. Mas em São Paulo, assim, e no ano seguinte, ai o PC do B já estava junto com o Joaquim.
Isso em  1982?
Depois de 1981 foi 1984 porque era de 3 em 3 anos, que foi a chapa encabeçada pelo Hélio Bombardi né. Ai o PC do B já estava junto com o Joaquim contra nós. A história, ele vai num processo bem dinâmico.
O Stanislaw falou na entrevista que tinha um certo atrito com o pessoal do ABC por causa das comissões de fábrica...
O problema, sempre teve um mal entendido [...]. Alguns dirigentes sindicais do ABC falava que a gente praticava o sindicalismo paralelo, que a gente não atuava dentro do sindicato...
Tem entrevista do Lula falando isso...
Tem, tem. Então, eles falavam assim, que a grande falha nossa era que a gente não atuava dentro do sindicato, e assim, o que que a gente fazia? A gente atuava dentro e fora. Porque os primeiros, assim, os dirigentes, os militantes nosso que ia para dentro do sindicato, a própria direção do sindicato dava um jeito de cassar a gente dentro da fábrica. Então, a gente só, assim, usava... Nunca usava a estrutura do sindicato para mobilizar os nossos militantes. Sabia que era colocar o pescoço na forca.
E eles não permitiam usar o sindicato...
Até permitia, mas assim, só que identificava toda nossa militância. E como o pessoal jogava no time do Regime, identificava nossa militância, pegava lá, pegava o nosso pessoal e jogava na boca do leão, velho. Por isso assim, que o pessoal do ABc nunca entendeu isso porque lá eles tinham o sindicato e aqui o sindicato jogava contra a classe. Então, assim, até o Lula uma vez falou isso... Ele já conversou várias vezes com a gente aqui, nessa questão de atuar dentro do sindicato, porque ele falava que não entendia porque a gente não atuava lá dentro: 'Mas a gente atua, só que...' 'ganhamos várias vezes...
Mas sempre assim, mesmo com diferença ou com divergência, o pessoal do ABC, principalmente o Lula, eles sempre nos apoiaram. Eles nunca apoiaram outra corrente aqui em São Paulo, então isso é fato, né. E no... nessa questão do movimento operário, assim, ele começou, basicamente começou em 1978 foi em 1979 ai veio os anos 1980...
E a derrota da greve do ABC de 1980, teve impacto aqui?
Na verdade assim, não foi uma derrota, a greve dos anos 1980 do ABC, que foi 40 e... foi assim... O que que foi organizado naquele ano? Foi organizado comitês de greve, foi usados grupos de apoio, foi feito assim, um dos maiores fundos de greve que não existia no Brasil para sustentar a greve e foi um impacto, assim, não só no ABC, foi assim, a nível de Brasil. então, isso ai... assim... como o pessoal considera derrota, eu acho que foi um dos maiores avanços e vitória do movimento operário, porque até aquele momento, ninguém sabia que existia metalúrgico, ninguém sabia que existia ABC, ninguém sabia que existia montadora, ninguém sabia o que era operário, ninguém sabia o que era metalúrgico. Então, a partir do momento que eles cassaram a direção do sindicato, que depois o pessoal retomou e voltou a dirigir, a tomar a direção de fato, ai que os metalúrgicos a nível de Brasil começou a ter visibilidade, ai que você vê que a partir dos anos 1979 e dos anos 1980 se eclodiu movimentos em todos os cantos do Brasil, desde pequena cidade onde existiam fábricas, não só metalúrgicos, como todas as categorias. Ai, como a gente já tinha nos anos 1980, com toda experiência acumulada, a gente já tinha idéia do trabalho geral, não só das inter-fábricas, mas da inter-categorias, não só de metalúrgicos, nós temos plástico, nós temos químicos, nós temos peças, nós temos coureiros, tem vidraceiros, nós temos sapateiro, nós temos frios,  nos temos tecelões, então, tem uma cadeia produtiva.
Porque assim, como assim... na linguagem do cara, do Marx, o capital não tem pátria? Por que que o movimento operário vai ter só... ficar só restrito numa categoria? Então isso tem que se expandir por outras categorias. Ai nós começamos, assim, com a idéia da criação da CUT, a CUT foi criada na prática, não foi criada assim no... hoje existe com decreto...
Como na prática?
Não. Foi criada na prática assim, na ilegalidade, não existia, era contra, era ilegal, não podia criar central sindical e nós criamos, junto com vários sindicatos, criamos a central única dos trabalhadores. E não só se limitamos a criar assim, de nome, começou a existir na prática, nas inter-categoria, um dos grandes que a CUT fez, que ainda era clandestina, foi em 198... no final de 1984, aonde nós organizamos assim, aqui em São Paulo, a campanha salarial unificada. então, o que que nós fizemos? Todos os sindicatos que tinham campanha salarial em novembro, em todas as categorias, reunimos todos e conseguimos fazer, assim, três dias de greve em São Paulo em todas as categorias, em 1984, comandado pela Central Única dos Trabalhadores que não existia legalmente, mas na prática existia. É tanto que foi fato noticiado em todos os jornais de todo o Brasil, assim, a campanha salarial unificada das categorias de São Paulo.
O Sindicato do Metalúrgicos participou. Porque ele já estava assim, ele já estava... o... Luis Antônio Medeiros, o pessoal do PC do B, o pessoal do PC já estava tudo dentro do sindicato já. O Joaquim ainda estava na diretoria, mas assim, o sindicato, praticamente, estava sendo comandado pelo pessoal do PC do B, do PCB e do MR8, e eles participaram da campanha unificada, o sindicato dos metalúrgicos participou junto conosco, com os químicos, com os plásticos, com os coureiros e com os vidreiros. Ai então, a partir da... a CUT ganhou visibilidade  a partir daí...
Então a Oposição tem uma grande influencia nesse processo de formação da CUT?
A articulação foi toda feita pela Oposição. Foi toda feita pela Oposição. Como a gente tinha muita influencia no sindicato dos químicos, dos plásticos, dos coureiros, foram diretorias criadas por nós dentro das categorias para ganhar esse sindicato, foram todos militantes metalúrgicos que foram para outras categorias... Ai, a gente pegou todo esse pessoal, pressionando as outras categorias que estava com os metalúrgicos, para entrar na greve geral unificada e teve um bom resultado naquela época...
Foi a primeira greve geral unificada?
Foi a primeira greve geral unificada. Que ai, depois veio a greve geral, depois veio vários movimentos, mas assim, a primeira experiência de unificação de categorias foi no final de 1984... no começo... bem no finalzinho do ano...  novembro de 1984, foi aquela campanha salarial unificada, ai que o pessoal começou... as outras categorias a partir daí todo mundo começou a descobrir que podia juntar outras categorias além de metalúrgicos, só se falava em greve de metalúrgicos, greve de metalúrgicos, metalúrgicos estão em greve, e a parti daí que a gente começou... Começou a dar visibilidade a outras categoria a partir daí...
E a Oposição tinha uma posição fechada para as diretas?
Não era assim uma posição fechada da Oposição Metalúrgica...
Não saiu nada?
Assim, pela questão institucional a Oposição pecou muito, porque a gente foi muito sindical e menos assim... tivemos pouca influência na criação de partido, na criação do Partido do Trabalhadores a atuação foi individual, não foi uma atuação coletiva, não houve uma discussão coletiva. Assim, a maioria dos militantes nossos foi, se filiou ao partido, atuou, mas tudo em posição individual...
Então nessa área dava para ter tido uma política mais organizada?
A gente, assim, se a gente tivesse uma política organizada hoje o quadro poderia ser outro. Porque, como a gente não tinha posição fechada, então cada qual dispersou nessa, assim em nível de eleição cada qual fez o que quis. Não tinha uma posição fechada a respeito de partido, a respeito assim da Constituinte, a respeito de eleição para o Parlamento. Então, não havia uma posição a esse respeito, sabe? Havia, assim, posições em relação a questão sindical, a gente se voltou muito para o sindical e esqueceu a política institucional, a política partidária. Então, é uma das coisa que...
Acabou deixando o espaço para o pessoal do ABC?
É. Exatamente. Que capitalizou... Uma das coisas que a gente nunca discutiu entre nós, até para fazer uma crítica ou autocrítica, foi uma falha histórica. Nós tivemos muitos acertos, mas também tivemos muitos erros.  Esse da questão político-partidária foi um. Nós voltamos muito para o sindical, para central única do sindicato, para central única dos trabalhadores, para central geral, só que nós esquecemos um detalhe muito importante: sindicato, central não muda. Não muda o Estado, não muda o Regime. Elas influenciam, mas que tem projeto político de mudança, são os partidos. E nós, a nível de Oposição, não discutimos isso e nem interferimos.  E o pessoal, nessa ai, o pessoal do ABC capitalizou assim... geral, a questão do partido e a gente correu por fora. Se filiamos, ou filiamos vários dirigentes, mas assim individual, não foi um coletivo. Então foi isso que deu. Ai a situação mudou, a democracia mudou, mudou... ai... E nos anos 1990 a Oposição acabou dispersando e foi o ultimo suspiro...
É, nós estamos atuando hoje em várias frentes, hoje a gente atua com o projeto memória, na reconstituição...
Que é o IEEP...
O IEEP é o arquivo, assim, mas a gente reuniu assim, a maioria dos dirigentes para escrever, contar a história, que é o Projeto Memória, que nós já temos escrito já para lançar tem o livro, um DVD, já com uma documentação muito grande onde a gente conta... Vai ser lançado agora no final do ano, onde  a gente define, assim, depois de todos esses anos que acabou a Oposição, de atuar enquanto bloco na categoria, enquanto grupo, assim... Mas até a Oposição acabar, assim, teve uma história. e o que que nós estamos reunindo... nós reunimos dirigentes e militantes em todos os bairros, assim, pros militantes contar a história, para buscar documento, todos os documentos que o pessoal tinha em casa... o pessoal... É tanto que surgiu tanto documento, assim, nunca vi uma... tanto documento aparecer.... Nessa ai também, o que que nós causamos? Quando a gente reuniu para contar história, criar a história da Oposição Metalúrgica, vários sindicatos também começou a fazer isso, vários, vários outros chamou a gente para mostrar a experiência como é que nós... è tanto que hoje, na Comissão da Verdade, o documento base da Comissão Nacional da Verdade, é o nosso documento. Aquele documento de contar a história e pesquisar, é o documento do projeto memória, o nosso documento que hoje foi encabeçado pela Comissão da Verdade. Tanto que o [Sebastião] Neto está ajudando bastante o pessoal da Comissão da Verdade, o Nacional. e foi baseado no nosso documento. Assim, a maioria dos documentos que a gente começou a pesquisar no DOPS, começou a pesquisar no SNI, começou a descobrir documen... O que que a gente queria provar?
É o Sebastião Neto?
É. O Neto é um dos nosso principais dirigentes.
O que que, assim, nesse processo todo da... o que que a gente queria mostrar para a sociedade? O golpe militar não foi só militar! Assim, a ditadura militar, assim, para ter um regime Militar tinha que ter uma base civil de sustentação. E qual base civil de sustentação é... de qualquer sistema? Quem tem o capital! Então, assim, principalmente assim, ele é duas somas: Intelectual e financeiro. Então a sustentação do Regime, além da sustentação intelectual por vários setores da elite, ele tem que ter uma sustentação financeira, quem fez a sustentação financeira? O empresariado! E nunca apareceu isso em nada! E nós conseguimos provar com documentos, assim, tudo cadastrado, que o empresariado participou ativamente, contribuiu e sustentou o Regime Militar por vários anos, e foi muito beneficiado por isso. E no nosso livro e no nosso DVD e na nossa documentação, que deu base para a Comissão da Verdade, tem tudo isso. Então, mais uma vez... tem 5 anos que nós começamos a desenvolver isso ai, esse trabalho. e hoje já estamos finalizando, mas tem 5 anos que a gente está fazendo isso. Juntou novamente esses velhos, agente fala assim: 'esses velhos dinossauros' e... para a gente colocar a nossa história para todos, e assim, a gente não pensava, jamais imaginava que ia... ter uma dimensão da forma que está tendo, né. Porque a gente queria uma coisa pequenininha assim, só os operários contando a sua história, mas assim, o troço cresceu tanto que hoje, assim, é base da Comissão da Verdade.
Vocês estão fazendo à parte, não é pelo sindicato?
Não, não, estamos fazendo... estamos sediados no IEEP e nós estamos fazendo.
O sindicato não está participando?
Não, eles estão contribuindo com documentos, essas coisas. Nós estamos buscando. Nós estamos buscando todo mundo. Não estamos excluindo ninguém. Assim, porque, assim, uma coisa é a divergência política que nós tínhamos, outra coisa é contar a história. Quando você conta a história, você não conta um lado... e o nosso objetivo não é mostrar um lado, assim, a nossa política, da Opo..., assim, a base é o trabalho da Oposição, nós mostramos, assim, tudo o que aconteceu na época. Então, assim, nós buscamos  via Oboré, que é o pessoal que tem a documentação do Sindicato, assim, o pessoal cedeu muitos documentos, muitas fotos, assim, todo o pessoal, mesmo o pessoal que foi contra nós.
Assim, é tanto... aconteceu uma... e vai acontecer outra agora em São José dos Campos, está acontecendo em vários, assim, é... onde nós conseguimos articular as 10 centrais sindicais para fazer um ato, foi feito em São Bernardo, em São Paulo, vai ser feito em São José, e foi tudo articulado, baseado nesse trabalho nosso, da Oposição. E o nosso pessoa que está puxando, via Neto, Djalma Bom, o Marinho lá de São Bernardo... Então, o pessoal do Conlutas, lá do PSTU, o pessoal da Força Sindical, o pessoal da CUT... Todo esse pessoal começou a...
Então, o que que a... assim, qual é o objetivo, assim, todo o pessoal que foi militante perseguido pelo Regime Militar, não importa em que posição está hoje, vai ser... vai sair...
É um livro grande?
É que tem limitações, nós vamos fazer um que vai ficar para a memória e outro, outra documentação que nós vamos criar um portal para deixar tudo... que já está sendo feito pelo pessoal ai da... da faculdade... lá da USP. O pessoal está dando... no.... abrindo espaço que é para a gente... ajudar a criar esse portal para deixar toda essa documentação num grande portal digitalizado, para ficar ai... E a gente... vai ser lançado agora no final do ano... Mas é muito trabalho e quando a gente começa a pesquisar, a gente pensa que está no começo, que está no fim, ai você descobre que... você volta para o começo... e falta, assim... que o nosso trabalho é [...], assim, não tem os recursos para fazer. Sempre, assim, a maioria do pessoal que trabalho conosco é trabalho voluntário, é um pesquisador, é o Murillo, é um escritor, o pessoal que se propõe a escrever: 'Não, eu ajudo vocês, vamos escrever!', porque nos conhece, vai lá e nos ajuda, tudo trabalho assim, voluntário.
O senhor chegou a militar no PT?
Sim. Eu sou filiado.
Até hoje o senhor é filiado?
Sou filiado ao PT.
E como o senhor vê o processo da fundação do PT
O processo, a fundação do PT foi um processo, assim, um processo muito bom, assim, a gente participou, onde as correntes... onde houve muito debate, muito de muito debate, muita divergência, até institucional, assim, hoje, assim, eu participo institucionalizado, mas, assim, o que foi... o objetivo era criado como um negócio de classe. Mas infelizmente, assim, muita militância deixou de participar e tal... hoje a gente participa meia-boca, a participação é muito pouca, então...
O senhor fazia parte de qual tendência dentro do PT?
É que a gente, assim, dentro da CUT... Só para você entender o processo... Quando a gente criou a Central Única dos Trabalhadores, nós criamos dentro da própria Central, assim, uma posição muito forte que a gente chamava CUT pela base, que era uma posição muito forte dentro da CUT, não era maioria, mas era o pessoal que fazia barulho, era o pessoal que...
Influenciava nos rumos?
Influenciava em todas as decisões. Então essa tendência, também era a mesma tendência dentro do PT.... Que ai entrava... O que é que tinha dentro dessa tendência... assim quais os partidos de esquerda: tinha o pessoal do Em Tempo, tinha o pessoal do... que foi o pessoal do PLC, o pessoal do... a ala, assim, da Convergência, d'O Trabalho...
A DS [Democracia Socialista]?
A DS também tinha uma influência grande... E tinha toda... Juntava todo esse pessoal, assim, e tinha... todo pessoal e também estava... esse enfrentamento existia dentro do PT... que ai criou, assim, o pessoal da Articulação e o resto... [Risos]. Eu era do... participava do resto, nunca participei da Articulação... [Risos]. A gente participava da ala mais à esquerda, né, tinha todo esse pessoal ai, de esquerda...
E o senhor acha que eram quantos por cento? Quantos por cento somava essa ala esquerda?
Olha, a gente chegava assim, a 45% nas convenções.  Porque estatutariamente o partido, assim, é proporcional, a direção é colegiada. Então, se você... toda tendência que participava, tinha mais de... acima de 5% da votação, já tinha direito a participar da direção. Então, hoje, isso existe até hoje nos estatutos do partido, e isso foi uma posição nossa criada dentro do PT, a questão da proporcionalidade. Nós brigamos muito por isso e existe hoje... E dentro da CUT também existia a proporcionalidade. então todas as tendências que participava da CUT, nos Congressos, na direção, entra na proporcionalidade, não importa quanto... passou de 5% você tem direito. Então era contemplado todas as posições de esquerda na direção da Central Única dos Trabalhadores, era contemplado. No PT também foi assim muito tempo.
Até quando existiu isso na CUT?
Até no... até 2005 ainda foi... recentemente... Hoje não sei como está porque não participo mais dos congressos... Ai... mas, até 2005 ainda tinha a questão da proporcionalidade, né... Porque no PT também tinha, não sei como está hoje também. Hoje é partido de gabinete. Não existe... na prática a participação de base não existe.
E quando o senhor acha que foi mudando a participação da base no PT?
Eu acho muito difícil mudar isso...
Mas na década de 1980 a base tinha um controle maior sobre o partido...
Muito maior. A base assim... tanto...
Quando o senhor acha que começou a mudar isso?
Começou a mudar em 1995/1996... depois do... a ultima eleição antes de 2000, do Lula ser presidente... O Dirceu era dirigente... era o Dirigente Nacional do PT... O que é que ele fez, assim, acabou com todos os núcleos de base.
Isso depois das eleições de 1994?
Sim... Ai a base deixou de ter influência no partido porque o José Dirceu acabou com todos os núcleos. Ai, assim, começou as decisões serem tomadas pela cúpula e não mais pela base, a base deixou de ter influência literalmente no partido. Só ficou os diretórios, aquelas coisinhas bem chechelentas, diretórios controlados pelos candidatos de mandatos, quem tinha mandato controlava cada diretório e hoje ainda continua assim. E, assim, se a gente tem ilusão de mudar... Logicamente não tem. Porque a partir de agora, as decisões vão ser sempre feitas pela cúpula, então... mas ainda é uma coisa necessária, ainda acho que não esgotou o ciclo. Mas não temos nenhuma ilusão que o PT vai voltar a ser um partido dirigido pelas bases, porque não vai. [risos].
A a CUT?
A CUT hoje, as centrais sindicais, elas se igualaram pela super-estrutura, elas, assim, elas não são igualadas pela política, são igualadas, todas que estão montadas numa super-estrutura, todas sem base nenhuma...
Inclusive a CUT?
Inclusive a CUT, a CUT, principalmente a CUT...
Então não tem mais nada a ver com a CUT dos anos 1980?
Não tem nada mais... não tem mais nada a ver... Então, é uma grande central sindical que tem uma puta estrutura, mas base, de categoria, tem muito pouco, todas elas, né... a CUT também... Estão todas no mesmo vale comum... E tem essa micro ai, essas pequenininhas que também tá tudo no mesmo patamar, cada qual segura na sua estruturinha ali do seu sindicato e fica segurando ai, mas ... Hoje o movimento sindical, as centrais sindicais, elas estão muito institucionalizadas. Hoje elas só operam pelo institucional. Então opera assim... se mantém com o imposto sindical...
Quer dizer que ela não tem preocupação com a base, de ganhar gente, formar militantes, formar quadros?
Não. Eu não vejo isso.
Essa era um preocupação que se tinha na década de 1980...
Sim. Até o PT criou um centro de formação política em Cajamar, que é assim, uma coisa gigantesca, só que hoje é um elefante branco, não serve para nada, que era um centro para formar militância. E tá lá, uma estrutura enorme jogada para as traças, porque o pessoal está operando tudo no institucional, hoje passa tudo pelos gabinetes, nada passa por decisões de base. As centrais sindicais também estão no mesmo patamar, passa tudo pela direção. Então quando chega na base é só para levantar a mão. E assim, se a gente falar que está errado... até está, mas nós temos culpa disso, porque nós nos omitimos, nós nos afastamos de momentos importantes de mudança da sociedade, de mudanças, assim, na vida política institucional... Então... assim...
Em quais principais?
Principalmente aquele fato que eu te coloquei... na participação... A partir da constituinte, não só na constituinte... mas, assim, na questão institucional, é... assim... Nós demos pouca importância para eleger militantes operários para o parlamento. É tanto que hoje você não vê militantes operários, só tem pouquíssimos. Se você pega aqui (Santo amaro), vereador, só tem o Alfredinho que é um b... Mesmo no ABC, os dirigentes operários do ABC estão... cada vez mais diminuindo... Hoje nós temos, assim, tem o Vicentinho... E nas decisões política, assim, à nível institucional, a nível de parlamento,  nós não definimos assim: 'olha, nós vamos criar, preparar núcleos de operário que vão ser eleitos e atuar dentro do parlamento, nós vamos atuar nas direções do partido, nós vamos, assim, assumir e disputar direção política dentro do partido político', ou... dentro das... principalmente nos partidos, na Central [Única dos Trabalhadores] nos disputamos, tinha muitos dirigentes nossos que era dirigente da Central, na criação da Central eu fui eleito secretário geral da Central, onde os trabalhadores da grande São Paulo... Eu fui um dos dirigentes, fui secretário geral da Central Única dos Trabalhadores da CUT grande São Paulo. Na Central nacional, nós tínhamos vários dirigentes nossos, da Oposição, dentro da Central Sindical, como direção mesmo. E dentro do PT nós não fizemos isso. Nós tínhamos muitos militantes  ai, que poderia ser colocado, assim, o Anísio Batista foi Deputado, mas assim, nós demos muito pouca importância...
Foi um projeto individual do Anísio Batista?
Foi projeto individual. E vários, assim, outros militantes nossos que saiu ai, foi eleito prefeito, vereadores em várias Cidades, como a gente não tinha uma discussão ou um plano, um projeto para isso, então ficou tudo como projeto individual. Nós temos militantes hoje nossos até no Ceará, que foi militante da Oposição, que é o Eudes Deputado Federal pelo Ceará, foi militante nosso. E a gente não teve um projeto organizado para dar vazão ou, assim, dar organicidade a isso ai e criar dirigentes operários mesmo já que a gente defende uma política de classe. Não basta só defender, você tem que as condições reais para que isso aconteça. Nós não fizemos isso. Conseqüência disso, que, hoje nós temos um partido dirigido, na maioria, por burocratas. Se a gente acha ruim ou bom, nós vamos ter que aceitar, na maioria das vezes vamos ter que apoiar as decisões, porque nós nos omitimos delas... Entanto, assim, a situação se perdurar, hoje assim... a divisão de classes ela é real, mesmo assim com essa questão do PT sendo um partido institucional as suas direções, assim, tem vários desvios, mas a divisão de classe existe. Assim, a classe dominante, assim, eles não aceita ser dirigido por pessoas, assim, que veio de setores mais humildes da sociedade. Então, assim, eles podem até elogiar o Lula, mas você acha que os caras aceitam o Lula ser o presidente do Brasil? Não aceita velho! Por mais concessões que ele fez para todos os setores da sociedade, mesmo assim, o pessoal não aceita ser dirigido por um operário .
Como é que o senhor avaliou o governo de Lula, nos doi mandatos?
Teve vários avanços, assim, que necessário né, avanços sociais, assim, mesmo porque a proposta que o Lula foi eleito... assim, acho que ele cumpriu o papel da eleição dele... foi cumprido... Porque ele prometeu, assim, mudanças, assim, sociais básicas. Assim, o Lula não prometeu assim uma mudança revolucionária, e se alguém estava pensando que ia acontecer... Não prometeu isso. Então, assim, o que o Lula prometeu assim claramente foi: 'eu vou lutar para que todo trabalhador, todo brasileiro, todo cidadão brasileiro tenha direito a café, almoço e janta'. Essa foi a proposta do Lula e foi feito. Ele não falou assim: 'Nós vamos mudar radicalmente a sociedade, nós vamos fazer uma revolução social, nós vamos mudar o judiciário, nós vamos fazer uma nova constituinte para mudar a relação'... Não foi prometido nada disso. Foi prometido, assim, mudanças sociais que houve,as quais foram muito importantes, o nosso povo evoluiu. Insuficiente? É! Mas necessário e ocorreram. A coisa mais importante na eleição do Lula, não só o fato de ser o Lula, foi mostrar para o trabalhador que ele é capaz. Porque até então o trabalhador achava, assim, que ele tinha que ser dirigido por alguém, tinha que ter alguém com nível social e intelectual muito grande que era para poder dirigir. E o que é que mostrou com a eleição do Lula e de vários outros operários? Que o trabalhador além de produzir ele também sabe se auto-dirigir, se auto-administrar, ele consegue administrar bem aquilo que os próprios capitalistas não conseguem administrar.
Então para o senhor não foi uma decepção?
Não. Não foi uma decepção, muito pelo contrário.
Mas você acha que tem relação com o projeto dos anos 1980?
Muita coisa é do projeto que nós trabalhamos, muitas coisas que houve ai, que ocorreram, assim... social, nós batalhamos por isso...
Como quais?
Como a questão do trabalho/emprego, hoje, apesar da economia, assim, nós vivemos em pleno emprego. Era uma reivindicação, assim, desde os anos... desde 1978. Hoje nós estamos em pleno emprego. A questão da independência do... A independência financeira do capital internacional, do FMI, é uma reivindicação nossa. Então isso aconteceu. A questão... a questão social ai... vários projetos sociais, era reivindicação nossa. Agora coisa que não acorreu, assim, redução da jornada de trabalho não ocorreu. Melhorou as condições de trabalho? Melhorou. Mas não ocorreu a redução da jornada de trabalho. A questão da aposentadoria, que é o...
O INSS?
Isso não melhorou em nada. Então ainda o trabalhador tem que trabalhar muito e aposenta com pouco, perde muito. Tem a questão do fator previdenciário, então isso não ocorreu... São conquistas que ainda está no ar, mas isso não era o governo Lula ou outro governo que tenha um projeto de... O projeto da reforma agrária não ocorreu como a gente lutava, mas ocorreu, ou a fixação do homem no campo, assim, é um fato. Então, assim, não coloco que tudo foi em vão... ocorreu muita coisa boa, acorreu assim, houve desvios? Houve. Mas nós também temos culpa nisso.
Como o senhor recebeu o impacto da crise do mensalão em 2005?
Olha, uma coisa mostra pra gente, aquilo provou para nós, assim, o nosso pessoal, não é que é, nosso pessoal não é inocente, nosso pessoal não são bandidos, não são ladrões, eles cometeram erros... como a gente recebeu... principalmente dirigentes conhecidíssimos nosso, de caráter ilibado como o José Genuíno, o próprio José Dirceu como grande militante, o próprio Delubio e outros dirigentes do PT... esses dirigentes, eles cometeram erros, o que que... assim, onde a classe trabalhadora não se equipara as classes dominantes? Na questão da violência e da corrupção, porque eles têm anos e anos de experiência nisso, na questão de trapaça, na truculência e na corrupção.
Os nossos dirigentes cometeram uma falha, de querer entrar nessa área da arrecadação de capital via outros meios, cometeram falhas. Isso para nós foi chocante. Porque, assim, nós sempre defendemos a ética, a moralidade e o combate à corrupção, e, os nossos dirigentes pecaram, e o que é que as classes dominantes aproveitou: 'já que eles cometeram uma falha que a gente comete direto aqui e ninguém fala nada'... porque a elite, eles fazem isso, para eles isso é normal, assim: o desvio de verba, a captação de verba em todos os setores, então para eles isso é normal, e os nossos dirigentes cometeram um erro, aonde, deixar um dos nossos fazer essa captação. E o mais grave, o fato mais grave, eles deviam assumi publicamente que cometeram uma falha, para não ser linchado como estão sendo.
Deveria vir a público falar assim: 'Nós erramos.' Ai, o que é que eles permitiram assim, ao não fazer isso publicamente permitiram que a elite fizesse esse linchamento da forma mais escrota possível, onde coloca, assim, dirigentes que lutaram a vida toda, onde... doaram sua vida pelo bem comum e hoje são colocados como bandidos em uma prisão. Assim, a ponto de pegar... pega os tribunais: controlados pelas elites, controlado pelo capital, controlado pela mídia e foi feito linchamento público de dirigentes que se doaram a vida inteira pela causa pública... e houve assim... De outro lado também, o que que... assim, além, porque todo erro sempre sobra saldos... A contribuição que isso também propõem para a própria sociedade dentro da democracia dominante, eles foram espelho, pagaram caro, mas assim, agora também tem moral para ser aplicado para todos...
Então assim, a falha que o pessoal cometeu foi essa, foi de não vir à público assumir que cometeu uma falha, falado: 'Não, realmente nós fizemos caixa 2, isso é crime, isso é errado, nós cometemos essa falha', e dar a cara, ser julgado por aqueles que eles defenderam e não por aqueles que sempre nos condenaram. Infelizmente, assim, por não ser feito isso eles permitiram que a elite, a classe dominante e a mídia, principalmente a mídia, fizesse um linchamento público. Assim, onde trata vários fatos, coloca dirigentes como criminosos, e eles não são criminosos, foram dirigentes que cometeram erros e todo ser humano pode cometer erros. Então, isso foi a falha que chocou, assim, parte da militância. Agora, outro fato real, alguns... outro fato real assim, nessa, na última condenação, quando os nossos dirigentes foram presos, que muitos deles não tinha nem condições de pagar a fiança que foi cobrada, o que que a militância fez? Foi lá e contribuiu, mostrando, assim, para essa... para a imprensa e para a classe dominante, que nós julgamos, nós, assim, condenamos os nossos, mas nós sabemos ser solidários quando somos chamados à participar, para defender os nossos, e a prova, assim, que em poucos dias todos os nossos dirigentes, a militância foi lá e contribuiu para pagar a fiança, e isso mostra que nós, a classe trabalhadora, ela é solidária com os seus, ela jamais abandona os seus, mesmo cometendo erros. Ela é capaz de re-erguer, como foi provado nessa questão da contribuição para que pagasse, para que pudesse pagar a fiança. Então esse é o saldo que ficou. E hoje, apesar de tudo, assim, nós também temos moral para cobrar de todo mundo, assim também a questão ética, é para todos, fomos linchados, tudo bem, mas, assim, temos a moral para cobrar de todos também, exatamente igual para todos, mesmo sabendo que a lei nem sempre é igual. Então, isso é fato.
[...]
Foi em aqui, em Santo Amaro, que surgiram os comandantes de fábrica?
Ah, sim. Comandantes para nós... Isso ai, o que é que a gente fazia, porque a nossa segurança, sempre era feita por nós. Hoje, quando eu vejo, assim, as manifestações, o pessoal deixar se infiltrar por vândalos, mesmo militantes descontrolados que acaba... Então, a nossa, a nossa militância, quando a gente fazia um ato, qualquer coisa... assim, nós cuidávamos da nossa própria segurança, então em cada setor, em cada situação, a gente tinha um comandante nosso, que aquele ia ser a nossa voz para garantir a nossa segurança, então a gente identificava o pessoal, cada um tinha uma identificação, que eram os comandantes. Quando a gente fazia um ato na Praça da Sé, então... porque a gente sabia que tinha os Skin-Head, tinha os integralistas, tinha o.... o pessoal que a gente chamava... que era os Galinha Verde, os integralistas, tinha os Skin-head e tinha outro grupo, que era menos.... os Punk... E tinha também os, qu a gente não considera inimigos de classe, mas assim... que eram os anarquistas, que hoje eles colocam como Black-blocs.
Primeiro a gente tinha que controlar o pessoal, porque eles, os integralistas, os Skin-head, eles vinham para quebrar tudo, quebrar a gente, inclusive quebrar a gente, eles vinham para o enfrentamento pessoal. Então a gente já preparava pessoas para evitar um enfrentamento e afastar, se bem que se precisasse enfrentar, também, a gente estava preparado para o enfrentamento, já tinha uma comissão de frente para o enfrentamento. Não era enfrentamento com a polícia, porque a policia a gente conhecia e a gente já sabia que o enfrentamento com a polícia é inútil, porque primeiro assim, eles estão muito bem armados. O enfrentamento maior que a gente tinha era com esses grupos, eram os grupos para-militares que se infiltravam dentro das manifestações para jogar contra o movimento, para colocar todo mundo como baderneiros. E a gente, os comandantes nossos eram preparados para isso, para evitar essa situação. Se houvesse um militante nosso mais exaltado, assim, os nossos militantes iam lá e controlava o nosso próprio pessoal, sem precisar da interferência Força Militar... Agora, o fato é que a gente jogava sempre jogava na força coletiva, assim, na criação individual para transformar isso em força coletiva. Então na adianta, assim, o Jorge [Preto], ou Waldemar [Rossi], ou o Neto, serem dirigentes se não tem uma força coletiva , se não tem um coletivo para absorver e levar essas idéias para frente, por isso que a gente sempre joga, assim, o esforço individual a gente sempre procurou e procura canalizar para o esforço coletivo. Nós acreditamos nessa idéia, é uma idéia que não está morta, que é a idéia da libertação de classe. Ela pode estar um pouco adormecida, meio desacordada, meia sonolenta, ma, assim, a classe operária ela é imortal. Ela pode ficar um pouquinho quieta, um pouquinho parada, mas a própria situação de classe obriga o ressurgimento. E essas, esses militantes abnegados que passam anos e anos  trabalhando pela luta de classes, esse fruto fica. Podemos até não ver, mas talvez os nossos filhos, os nossos netos verão. E isso é o esforço que nós sempre joga, sempre a gente procura jogar o esforço individual para o esforço coletivo. A gente nunca, assim, esse, o adjetivo 'eu', a gente procura sempre estar no nós. se você ver a nossa documentação, um pouco da nossa história, a maior parte dos dirigentes, raramente ele fala eu. Ele sempre fala nós, ele sempre é um entre o todo, ele não procura ser sempre o eu e o todo, ele procura sempre estar entre o todo. Porque o grande dirigente, ele é aquele que está... é aquele que consegue transmitir idéias, ele não forma, ele consegue transmitir as idéias. essa é a essência do nosso trabalho e vamos continuar assim, espero que por muito tempo. Por aas coisas... se agora não está bom... mas a gente vai trabalhar e vai lutar para melhorar. Enquanto nós estivermos respirando e capacidade de pensar, nós vamos continuar. Essa é a essência da luta de classe.
O senhor ficou animado com os movimentos de Julho do ano passado [2013]?
Não, eu não fiquei animado. Assim, não me causou estranheza porque, assim, não é uma coisa nova.
Mas fazia tempo que não acontecia...
Fazia tempo, mas não é coisa nova. Assim, esses movimentos, eles são cíclicos, assim, o ultimo movimento desse que ocorreu, assim... foi nos anos...
No fora Collor?
Não, antes do Fora Collor, Fora Collor foi nos anos 1990.
Foi em 1992
Em 1992, nos anos noventa porque foi a partir de 1990, né. Mas nos anos 1980 houve uma situação igualzinha a que ocorreu agora em Julho, a explosão social. E assim, onde há um acontecimento, e ai repercutindo, vai em cadeia. Começou com um quebra-quebra em Santo Amaro, onde houve um saque de um mercado...
Que ano foi isso?
Foi em 1982, que surgiu, depois surgiu o movimento dos desempregados... existia muito desemprego, surgiu uma situação de saque. Naquela época a luta era por emprego. Essa ai [de 2013] é o pessoal por passe livre né...
E começou esses saques aqui em Santo Amaro?
Ai começou, houve uma eclosão, assim, foi para toda a cidade, não tinha controle, ninguém conseguia controlar nada... Fazia assim, explodia, depois explodia em um lugar, explodia em outros e em cada canto e ai... todos os dirigentes, dirigentes de partido, todo mundo ficou maluco sem saber o que era aquilo, como controlar isso, para onde vai? Para onde foi? Então terminou como acabou... E assim, quando eu vi esse movimento de julho, praticamente foi um... eu vi o retrato daquilo que aconteceu a vários anos atrás, onde era uma coisa sem controle, onde o pessoal não aceitava direção, não sabia o que queria, só queria... era uma explosão... assim, onde tem mil pessoa e cada cabeça é uma sentença... Entendeu? [risos]. Cada qual, assim, tem a sua reivindicaçãozinha, cada qual quer fazer a sua revolução...
Mas foi a primeira experiência de massa para essa juventude...
Para a juventude foi a primeira experiência de massa. Foi importante? Foi. Foi muito importante. Agora, assim, a nível de saldo político, muito pouco, igual em 1982... Então, a única coisa que sobrou de 1982 foi um grupo que formou um acampamento do movimento dos desempregados e acampou no Palácio dos Bandeirantes, depois acamparam á no Ibirapuera. A única coisa que sobrou foi isso, dessa explosão de 1982... e de julho foi a mesma coisa, porque o... a classe, como um todo, ela é muito influenciável, ela eclode e é passional. Nesses movimentos sem controle chega qualquer um maluco , fala assim oh: 'pega aquele lá e mata!' O pessoal vai lá e mata. Não quer saber se você é culpado ou inocente, não quer saber que você é. Porque alguém falou assim: 'Olha, pega lá!' Ai oh... e todo movimento sem controle, ele é um perigo para a sociedade. Assim, é bonito... assim, mas é um perigo para a sociedade, é um perigo, porque assim, pode ir para qualquer lado, ou pode não dar em nada, ele pode ir para a direita, para a esquerda, para o centro ou para lugar nenhum, porque não tem controle. E, a prática mostrou, não só o nosso movimento, mas como em todo o mundo, Primavera Árabe, no Oriente Médio, o que é que deu aqueles movimentos? Mudou para pior! O que mudou? Mudou para pior!
Mas o que se discute é que é um momento do mundo, assim, do Ocidente pelo menos que está acontecendo esse monte de movimentos, mas que na próxima safra de movimentos que surgirem... trabalha-se com a hipótese de que vão surgir outros e qu as direções vão ter que ir se consolidando dentro disso ai...
Isso é ótimo. E isso vai acontecer. O que ocorre, assim, muitas dessas direções que participaram disso ai, nos próximos o pessoal já está, já tem... já amadureceu para poder saber o que fazer... Se bem que pode demorar um pouco...
Mas assim, eu fiquei a principio, restou um pouco de preocupação por isso... porque tudo aquilo que nasce sem controle, ele pode morrer sem controle e acontecer qualquer coisa séria e por pouco não acontecia tragédias sérias nessas manifestações. E o que é que restou? Restou grupos localizados, porque assim, que pelas suas ações acabam jogando toda sociedade contra...
Mas o senhor não vê nada hoje que pode ser elemento de um germe de alguma coisa, de esquerda?

Não, o positivo, assim, a ebulição da juventude. Certo ou errado, eu concordando ou não, assim, essa coisa está em ebulição. E assim, independente da minha vontade ou de qualquer outra pessoa da minha época, assim, é uma juventude em ebulição. Esse é o fato positivo, assim, aquela vontade de mudar não morreu, ela está em curso de diversas formas, agora, lá na frente qual forma que vai ter, não sabemos, mas está em estado de evolução, e isso é esperança. Então eu concordando ou não, mas há um processo em curso. então cabe a gente, que as vezes costuma pensar, ajudar também, assim, a muitos dessa garotada, a pensar. Não precisa fazer mais nada, assim, ensinar filosofia... Não precisa nada disso, é só ajudar o pessoal a parar e pensar, que a partir daí, quando se começa a pensar você começa a transformar... Então não precisa, assim, colocar filosofia marxista ou maoísta ou seja lá o que for, não! Ensina o pessoal a para e pensar, que o próprio pessoal vai criar e descobrir o seu caminho. É isso meu caro. 

 
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