terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Entrevista Stanislaw Szermeta - "Osasco 1968" e Oposição Metalúrgica de São Paulo

Elaboração, coleta e transcrição da entrevista: Alessandro de Moura.
[Falta revisão]



Entrevista realizada em 09/09/2013 em Campo Limpo

Nasceu na Alemanha Ocidental em 1945. Migrou para o Brasil em 1949, na Vila Iara-Osasco. Seu primeiro emprego foi aos 14 anos, na indústria de máquinas de costura Leonan, na Lopoldina. Depois foi trabalhar numa industria de madeira no Jaguaré, e um ano depois empregou-se na Bras-eixos no final de 1959, onde trabalhou até fevereiro de 1968. Participou da greve do abono em 1963, greve geral pelo décimo terceiro completo. Em 1967 começo a participar do movimento estudantil em Osasco, onde conheceu os principais dirigentes operários e estudantis da cidade. Começou a militar como ativista em 1966-1967. Começou a militar no POC depois da greve da Cobrasma. Em 1969 empregou-se na Sofunge, onde trabalho até 1970. Depois disso passou por várias outras pequenas fábricas. Foi preso em 1971, permanecendo nessa condição até 1973. Em 1974 empregou-se na Caterpillar. A partir disso, voltou a organizar os Grupos de Fábrica em São Paulo, tomado parte na formação da Oposição Metalúrgica de são Paulo, onde atuava na organização dos Grupos de Fábrica, Comissões de Fábrica, no Inter-Fábricas e Comandos de fábrica. Militou no POC de 1968 a 1973. Participou das principais campanhas políticas e eleições sindicai durante a década de 1970 contra o peleguismo.

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O POC teve bastante contato com a luta armada, "até porque entendia que esse processo da resistência armada era necessária, como um conjunto de coisas. Não era só por questão da luta, por questão do aprofundamento do processo da luta mais geral impunha determinados tipos de profissionalização. Então esses companheiros que foram mais para a luta armada acabaram se aproximando e se envolvendo mais com esse negócio de falsificação de documentos, armas, um conjunto de coisa".

Stanislaw afirma que o POC não tomava parte em ações armadas como seqüestros, assaltos a bancos e ataques as forças armadas. Mas que o POC "tinha aproximação no sentido da resistência dentro das fábricas. No sentido da resistência dentro das fábricas, o POC tinha, como corrente, entendia que não tinha saída a não ser também trabalhar essa proximidade e assimilar essa experiência da luta armada".

Mesmo na época, a luta é sempre assim, você vai trabalhando essa questão, no conjunto da resistência dos trabalhadores, dentro das fábricas depois de 1967, se criou uma grande discussão sobre a questão do arrocho salarial, que era muito grande, bem antes do MIA, tanto o sindicato quanto a oposição, já fincada como entidade, desenvolveu uma campanha muito grande sobre essa questão da resistência contra o arrocho, e depois tinha a luta contra a obrigatoriedade do Fundo de Garantia, que era a perda da estabilidade. Então, o sindicato era... essas lutas passaram dentro das fábricas em 1967-1968, essas luta passaram... E passaram, dentro de um momento, aonde nessa combinação da luta dos trabalhadores, no seu conjunto, mesmo que era uma luta que não dava para ser feita aberta, todas as formas de organização eram perseguidas, se fez, estava no centro de lutas ideológicas. Tinha a divisão do mundo entre socialistas e capitalistas, e você tinha duas coisas importantes em curso: uma era a vitória da revolução cubana, e outra era a resistência do Vietnã. Então tudo isso, era um clima que gerava uma sedução na militância. E nisso, você tinha uma luta anti-imperialista. Essa luta anti-imperialista demarcava já o campo.

O que se lia sobre revolução cubana e Vietnã?

ah, lia o que estava na linha de ponta: Revolução na revolução do Debret, tinha os escritos do Guevara, e tinha os informes, os escrito sobre o Vietnã, da resistência no Vietnã. Tinham cursos, por exemplo, o CEU - Circulo Estudantil Osasquence, eles davam esses cursos. Esse pessoal todo, tanto o Ibrahin como o próprio Espinosa, e todo o pessoal do Circulo, da direção do Circulo, eles, o Barreto, eles davam esses cursos. (...) Cheguei a participar desses cursos, não com tanta tregularidade... Era na boca da noite, então era coisas que primeiro tinha que esvaziar, para depois fazer a reunião... A confiança era relativa, então você tinha que correr os riscos da melhor forma possivel, com mais cuidado possível. Você tinha, principalmente do pessoal que vinha do movimento estudantil, pessoal alfabetizado, tinha uma carga muito grande de marxismo na cabeça. Tinha uma carga muito grande sobre a exploração capitalista... 

Então era assim, as lideranças, e foi bom porque era todo um conjunto de liderança estudantil que vinha do movimento secundarista, estava já encaminhado para o movimento universitário e que voltava, e que fazia esse link, fazia essa vinculação das lutas. Então, toda essa situação era dada de, era muito clandestina. Então, a vezes as pessoas, depois de muito tempo ficava sabendo de alguma coisa que era perto e não sabia. Também não tinha muito interesse em saber entende? Então, a luta era muito clandestina, então as conversas nesse período são muito picotadas, muito, muito, muito. E o recrutamento era muito selecionado, muito criterioso. Então as pessoas tinham também que, de certa forma, dar uma demonstração que estavam mesmo querendo né. Ou participava de uma greve, ou participavam de uma panfletagem. Então tinha que se expor. E todas essas exposições eram muito vigiadas pela repressão. Então, logo, qualquer coisa que você fazia, você já logo saia meio marcado pela repressão, essas coisas todas.

O senhor falou da questão da estabilidade, que foi colocada em 1968. Qual era a principal critica que o movimento operário fazia a essa questão? Porque hoje, o FGTS é visto como uma conquista. 

Não, não era bom não. É que é assim, como é que um operário que não participou de nada, vai entender que é bom, que era bom o fundo de garantia? Antes você, cada ano que você era mandado embora, você tinha... Então você tinha dois anos, então se você era mandado embora você tinha dois meses... Você recebia o aviso prévio mais dois meses, um mês por ano que você tinha. Então chegava no décimo ano, você tinha vinte meses. Então não era uma estabilidade, mas era uma boa indenização. Agora dizer para o pessoal hoje, muito mais ligado com necessidades imediatas que ele tem hoje, fica meio... Porque ele não conhece, não tem idéia, ele não tem idéia do que era. Porque o que ele recebe hoje de fundo de garantia, era o que ele recebia, melhorado inclusive com as situações. Você recebia do ultimo salário, então se você trabalhava três anos, você entrou com 1.000, você estava com três mil, você saia com 9.000. Você saia mais do que o fundo. Era o ultimo salário que retroagia. É que o governo passou a idéia de que esse fundo de garantia seria aplicado para fazer o BNH, ia fazer casas para os trabalhadores, os trabalhadores teriam mais condições de ter crédito, crediário e essas coisas. Então, houve uma luta muito grande. Bom, mais também que grande luta, se o parlamento, se tudo era travado, entende? Então passava o que o governo queria. Perdia a estabilidade dos 10 anos. A estabilidade funcionava, dentro das regras, dentro da leis, mas o mundo era outro, não era o mundo globalizado, não era o mundo precarizado. Não era essas coisas. Você tinha todo esse processo da CLT funcionando, você fazia experiência, você fazia até um ano, era um pouco diferente, mas, mais ou menos isso.

Em linhas gerais, como o senhor via o MIA?

O MIA era o seguinte. Era problemático o MIA. Porque, na verdade, aparecia como uma idéia de unificar as lutas contra o arrocho, mas ele começou a ter limitações, começou a ter dificuldades de se organizar, começou a ter dificuldades mesmo de manifestação, a ditadura começou a impedir o processo da unificação. Então você tinha um monte de policial... Então o MIA teve um papel muito... criou uma expectativa... A gente tem que entender que os sindicatos eram na época, noventa por cento era pelego. A representação do MIA, tirando Osasco e algumas outras cidades, era sofrida, a luta era sofrida, tanto é que eles não conseguiram organizar muitas coisas. A idéia em si era importante, mas a prática em si, não avançou no sentido de unificar o movimento, de criar resistência, isso foi criado pelos sindicatos que estava mais avante, mais combativos.

Você participou das assembleias do MIA?

Participei... Eu participei em duas, uma em Osasco e uma em Campinas. A ultima, acho que foi em Campinas. Se depois teve outras, eu não participei. Se teve no Rio de Janeiro ou outros lugares. Essa de Campinas é mais representativa, porque Osasco se envolveu na constru... nos ônibus, no processo de ida ao Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas. Lá foi muito importante... levou o pessoal para lá, nem sei quantos ônibus eram, 3, 4, 5... Para época era bastante coisa. Encheu aquilo. Luta contra o imperialismo, luta contra o arrocho. Lógico, quem falava, era só liderança. Só que falava eram as diretorias. Até porque ninguém queria falar também.

Mas essas assembléias foram importantes para organizar o 1º de maio de 1968?

O clima para o 1º de maio foram, foram importantes. Porque reunia todo o conjunto, todos os sindicatos que estavam afim, Santo André, São Paulo, Guarulhos, o ABC, Osasco. Então todos os sindicatos estavam envolvidos nesse processo para o primeiro de maio. Agora, quem vai dar o tom é quem tem proposta, que tem política. Não era uma coisa para, vamos dizer assim, pedir benção ao governador, não era para pedir licença para a ditadura para lutar entende? Era no sentido mesmo de ir, organizados e demarcar uma política, um processo de luta.

Pode se dizer que existia um atrito entre a base e a direção do MIA?

Isso não afeta muito as bases. Isso é mais na luta dos sindicatos, nas diretorias, nas direções sindicais, que ainda vinha de um modelo de base e direção criado pelo PC, o PC nunca, mesmo com todas as propostas que tinha de melhorar o processo de organização interna, dentro da fábrica, com os delegados sindicais. Era muito mais ligado a uma proposta, vamos dizer assim, mais de vanguarda, ou qualquer coisa assim, porque para participar mesmo não era coisa simples. Esse pessoal que veio, era um pessoal já definido com algumas coisas. Amparado na luta mesmo, amparado na luta.

Claro que o período de 1962, 1963 era um período muito mais amplo, mais o domínio do PC, nessa fábricas mais importantes era muito grande em 1962-1963. Em 1967 não tinha quase. Em 1967 o PC não tinha... Já era um processo diferente. Pode ser que tivesse aqui ou ali. Mas no centro político, ou eram os pelegos, que estavam se rejuvenescendo... O Joaquim dos Santos Andrade, era interventor e foi eleito. Em Osasco o Henos Amorina, não foi interventor mas foi eleito, mas não tinha essa relação com a luta. Houve uma requalificação, porque as oposições não conseguiam participar. Então dava naturalmente... o que foi anormal foi a vitória em Osasco, da Chapa Verde. Porque o Henos Amorina, não houve um acordo no sentido da participação em 1965 e o pessoal se retirou, e começou a fazer trabalho de base. Trabalho de fortalecimento do trabalho das comissões, trabalho dos grupos de fábrica e trabalho das comissões. Quando chegou em 1967, ai já tinha reforçado um monte de grupos dentro das fábricas. Você tinha gente na Brown Boveri, na Charle-roy, tinha gente na Osram, na Cobrasma, na Bras-eixos. Que foi uma... Também não foi uma vitória, assim, fácil, porque a máquina, essa coisa toda, a máquina sindical, ela era terrível. Mas teve uma vitória retumbante na Cobrasma. Essa vitória que deu a vitória. 

Mas a que se deve a formação dessas novas camadas de militantes nas fábricas?

Se deve ao movimento político revolucionário, que nos estávamos.... Se deve a uma mudança no processo da qualidade do trabalho de fábrica. Foi o avanço das lutas parciais. A construção da consciência mais combativa. Houveram mudanças, entende? A conjuntura ajudou muito. Não é que ajudou muito, é que houve uma... por uma felicidade, de uma grande quantidade de militantes se dedicarem a esse processo de luta. Essa combinação dessa luta dos operários que de dia eram trabalhadores e a noite eram estudantes. Isso tem uma influencia muito grande nesse processo da luta. Então, vamos dizer assim, dá um rumo diferente para o processo de luta. Isso ai é que vai criar esse clima de que 'oh, é uma bucha muito grande, mas agora nos estamos com a diretoria, agora nós estamos com um grau de forças acumuladas que vai dar para a gente pressionar', entende? Agora, não era uma coisa simples, era uma coisa... debaixo de ditadura.. Era mandado embora, desarticulado...

Não havia ainda esse clima tão, vamos dizer assim, como eu posso dizer... de... duro de perseguição. Só depois mesmo da greve de 1968, só depois do golpe, só depois do Ato IV, só depois do acumulo de vitórias que a ditadura começou a ter, crescimento do Brasil, essas coisas, é que deu mais forças, entende? E fez uma mudança quantitativa dentro dos setores. O Brasil saiu de uma recessão em 1969, final de 1968 para começo de 1969. E em 1970, voce já tinha, vamos dizer, vislumbres de que a coisa já caminhava para um determinado diferencial, porque ai você já tinha anos de arrocho salarial, você tinha anos... E voce tinha todo o processo de concentração das industrias. Então o trabalho que se colocava, era... vamos dizer assim, o trabalho dentro das fábricas era trabalho clandestino.

Então Osasco nesse sentido, serviu para, para um conjunto... depois dessas lutas de 1968, com a greve e com esse enfrentamento e essa dispersão, criou condições de assentar um pouco a cabeça dos lutadores, dos lutadores de esquerda. Porque os sindicalistas, eles continuavam na mesma batida, 1968, 1969, 1970, 1971, 1972. Ao contrário, eles começaram a se a-pelegar. A foi... O bando voou... Porque ai foi os sindicatos basicamente eram ambulatório médico, e era o clube de campo... E aumentou o número de filiados... Essa coisas só vão dar um vislumbre diferenciado a partir de 1973 para 1974. Ai que começa a idéia da resistência dentro da fábrica. Já não é mais a proposta da comissão. Não tinha mais clima para falar de comissão. A luta armada já tinha esgotado. E como a classe operária não tinha os sindicatos, basicamente essa relação, só as organizações. 

Então a partir do final de 1973, começo de 1974, começa... A grande crise começa a girar em torno do petróleo, uma crise internacional, e começa a despontar grupos e resistência dentro da fábrica, com a proposta de grupos de fábrica. E ai que se dá o início do processo da resistência dos trabalhadores, que é grupo de fábrica. Isso é assim... Uma coisa muito difusa, que precisaria ter um... Eu não tenho uma visão... Mas era uma proposta, a gente pode dizer assim... Nacional nos núcleos, nos lugares onde houve um crescimento econômico, nas grandes concentrações de grandes empresas. Então você vê Osasco, você vê São Paulo, Guarulhos, São Bernardo, Santo André, Rio de Janeiro. O conjunto desses lutadores começa a gestar uma idéia da construção de grupos de fábrica, mais ou menos final de 1973 e inicio de 1974.

O primeiro de maio na Praça da Sé

Participei... Olha, o primeiro de maio foi... porque cada um participa de um jeito... Eu participei mais como figurante...Não tive expressão... Fui lá, vi... essa coisa toda. Olha, isso foi um negócio organizado... bem organizado... pela direção do sindicato, não só Osasco, o de Osasco foi um dos... O sindicato do ABC, todos os sindicatos combativos, que estavam na linha... Santo André, São Bernardo... 

Porque o que se diz que quem organizou o 1º de maio foi o Joaquinzão e o PC...

Sim... Eles eram os... Era o pessoal mesmo que ficou lá no [sindicato] dos metalúrgicos, infiltrado...Nada de expressão, nada de expressão maior. era mais militante mesmo, tinha ascendência política mas não tinha essa relação... O primeiro de maio foi uma coisa por cima... Porque o pessoal começou a perder... Não tinha essa relação. O Ibrahim não podia nem sentar, nem aparecer... Então, essas coisas todas, a greve... O primeiro de maio de 1968 a gente pode dizer que foi diferente dos outros 1 de maio porque teve esse acontecimento, teve essa atitude política, e foi muito importante no sentido de mostrar a resistência dos trabalhadores. Isso é que foi importante, porque em Osasco eles organizavam tanto os trabalhadores como os estudantes. Então em Osasco ele teve uma característica... eu não sei se em outros lugares também, também não me debrucei para ver essas coisas, se em outros lugares... possivelmente em são Bernardo, possivelmente em Santo André... Tinha essa relação... Não era uma relação só de Osasco, era uma relação do próprio crescimento das forças produtivas no Brasil. e esses centros, eram centros mesmo. Inclusive Santo André e São Bernardo, eram cidades que estavam, também crescendo. E é o esmo esquema de Osasco, de operário, dos trabalhadores, o mesmo esquema... de uma forma diferente aqui, ali e tal...

Então o 1º de maio foi expressão de uma nova vanguarda que estava surgindo das bases, e se chocou com essa velha tradição do PC, por cima... Do Joaquim de Andrade...

Isso, isso. Agora, não é nada assim organizado. Porque estava recém saído... A diretoria do sindicato de Osasco [chapa verde], não tinha um ano, não tinha um ano ainda e já tinha tido 'paus' assim... Porque o sindicato, ele tem que ser entendido como uma reunião dos trabalhadores... E assim... Como o sindicato não tem veto, ele pode ser o católico, o protestante, espírita, comunista, neoliberal... Se ele está afim de fazer o processo da luta, e ele for eleito na base dele, não tem jeito, o que você vai fazer? Principalmente naquele momento. Então toda essa construção foi muito rápida... E fazer uma observação de que foi esquerdista, ou que foi precipitado, essa coisa toda, é meio problema. Porque foi também... era um momento de mudança, de renovação. Então era um momento que você ia trabalhar muito com a nova turma. Os novos companheiros, novos quadros, que tinham alguma resistência, que tinham alguma capacidade de organização dentro das fábricas mas não tinha ainda todo... O Sindicato de Osasco, nesse sentido, com a diretoria [chapa verde], acaba tendo um papel importantíssimo porque acaba sendo uma articuladora do processo das lutas. Mas precisava também fazer a luta específica, a luta da sua base. Não adiantava gargantear sem apresentar a fatura, apresentar o processo de luta. 

Então essa questão da construção era uma coisa de duas mãos. Uma mão era trabalhar a luta política, na porta de fábrica, a luta da propaganda.. E outra coisa era a luta real, a conquista... Ia ou não ia quebrar o arrocho? Essa demanda é que fazia com que a luta dentro das direções... E era uma luta que estava começando a abrir as portas do sindicato para o movimento popular... O sindicato de Osasco ajudou muito, trabalhou muito, cedeu muito para ajudar as organizações que surgiam na época, amigos de bairro, conquistas populares... então tinha todo um...O sindicato precisava ser de esquerda mesmo para absorver toda essa mão de obra, para não dizer 'não, aqui é a luta dos trabalhadores', porque normalmente tem um pouco isso né... Separa o sindical... Podemos dar um carro e tal... mas não nos misturamos...

Então, a luta de 1968, o que ela trás de importante é que ela abriu um espaço muito grande para, vamos dizer assim, para a luta. Porque ela marca, ela marca, um enfrentamento com a ditadura... Que já vinha um pouco antes... com Contagem em abril... Contagem vem em abril... E influenciou, porque teve o problema do abono, dos 10% de abono que foi dado em 1968. Então, teve todo um processo de resistência... mas é que em 1968, na quebra da relação com qualquer pretensão do governo de dar uma amainada... e essa coisa toda quebra né... Porque quando o Governado é tocado do palanque... Quando a pelegada já vai para lá... Acaba tudo... Acaba com tudo... põe a luta em outro negócio. Depois vem a greve de 1968... Ai essa situação da greve de 1968... É uma discussão meio pesada... Porque eu não participei da discussão efetivamente... Porque é uma discussão que foi feito dentro... A decisão, não a greve em si, 'vamos fazer a greve', que dia que vai ser e tal, o sindicato... Mas a decisão da greve foi uma decisão muito política, e tirada em um grupo restrito do... Então eu não tenho muito... Não participei dessa mobili... Isso ai era para a diretoria e para o pessoal que estava bem próximo, possivelmente, alguns dizem inclusive que nem participaram [da decisão], que estavam nas comissões. Que já tinha, em Osasco já tinha os embriões, tinha uma comissão formal da Cobrasma, mas tinha a Bras-eixos, tinha a Cimaf, tinha a Osran, e fábricas menores, era um caldeirão de vontades, era uma ebulição para criar as condições.

Essa história se perdeu... Um bom pedaço dessa história se perdeu. Porque as pessoas foram fazer outra coisa na vida. E esquece-se muito... Porque.. O Espinosa foi um dos batalhadores incessantes no processo da construção da greve. Inclusive eles tinham a idéia dessa greve, dessa articulação, estourar em outros lugares, o que não aconteceu. Quer dizer, ai o isolamento da greve... difícil saber... Por causa de que a gente estava em um processo de ditadura... E você não conseguia.. depois por exemplo, como Osasco foi cercada, por exemplo, foi quase que você não conseguia andar, não conseguia se movimentar. Tem coisas que não... Mas eu digo assim, o papel importante que as pessoas tiveram, por exemplo, em janeiro, fevereiro, março, abril de 1968, a gente... Mesmo com sindicato, essas coisas todas, não era fácil. Nos distribuímos material nas portas de fábrica, eu fui várias vezes com o Espinosa distribuir material, seja dos estudantes, seja daqueles... e era assim... muito problema... Você podia chegar lá e ficar 10, 15 min e... Ia pendurando material nos arames para o pessoal passar e pegar... Eu não teria convicção [para um balanço conclusivo]. Eles é que estavam na frente... E a influencia era do foquismo... 

Todos os erros posteriores, hoje dizendo, com todas as insuficiências, era justamente desse, dessa visão... de que... dessa limitação de você poder se deslocar, de você poder conversar, de você poder mobilizar. Então, ai, no caso, a luta era para irradiar... E não irradiou. A repressão se adiantou, a repressão se adiantou. Porque você tinha todo o clima criado... Eu não posso... Eu não posso... Falando na época... sendo fiel a época.. Também não tenho essa compreensão... Mas você tinha um clima que não era só guerra do Vietnã e Cuba, você tinha um clima de massa, você tinha a passeata do Cem mil no Rio de Janeiro. Então você tinha clima. E aqui em Osasco tinha vários grupos de fábrica, então você tinha várias lideranças, você tinha uma construção... Isso ai também era um fator que criava essa interpretação de que haveria resistência. E nos vimos que a repressão se adiantou mais. Falou 'A brincadeira aqui acabou! Agora aqui é gente grande, tanque e pau!, e logo em seguida você já tem o Ato V, entende? Então essa é a, vamos dizer assim, a questão básica. Depois, de 1968 o movimento refluiu, ai você não tem mais clima para fazer nada em Osasco.

Depois da Bras-eixos meu emprego foi aquela Fundição da Vila Anastácio, na Sofunge. Já era São Paulo. Eu fui militar em São Paulo e, nos estabelecemos em Osasco. [continuou morando em Osasco]. Depois de 1968 ai deu um período, deu um intervalo... Então ai nos, mas já como partido, nos fizemos uma célula em Presidente Altino e uma célula na Bela Vista-Osasco... Isso em 1969. Era pouca gente, em Altino acho que tinha 6 ou 8 pessoas, um negócio assim... E da Bela Vista tinha 5 pessoas. Mas tinha mais, o que rodava em torno tinha mais, os contatos, os assessores.... Uma quantidade razoável.. Não tem um número... Gente que vem nova, gente que sai...

O POC se formou como?

O POC é uma dissidência da POLOP, Política Operária. Se separa em 1968. Acho que é em 1968 que se separa... 1967-1968. Formou-se duas tendências, a principal questão era a luta aramada. Não é bem que ia para a luta armada, é uma aproximação que se tinha com a luta armada, e a perspectiva que isso falava é que com o tempo privilegiaria a luta armada ao invés das comissões de fábrica. Os dois propunha as comissões, só que um propõem um coisa mais pura: não relacionamento com os movimentos a luta armada. E o outro propunha o relacionamento com a luta armada.

O POC é o que quis se aproximar da luta armada. A Organização de Combate Marxista Leninista Política Operária é a que colocava que a questão ainda... era mais uma questão de estruturação dos grupos de fábrica, da resistência, de mais propagandista e tal. Não é que era mais passiva, era propagandis... Tinha uma etapa a ser vencida. Que era a etapa da organização, etapa da preparação...

O senhor chegou a ser preso?

Sim. Em 1971. Nesse processo todo de desenvolvimento do trabalho, eu não cai pelo trabalho de fábrica, cai pela organização (POC). Eu trabalhava a noite, eu trabalhava de dia e de noite. Trabalhava no sentido de fazer a propaganda.. Porque a gente tinha a ideia de fazer não só o trabalho, como o chamado também 'Ações exemplares', não deu muito certo também. Você tinha o trabalho dentro de fábrica, trabalho de propaganda, a busca de contatos para lutas específicas, para ir trabalhando a luta econômica, essa coisa toda. E depois você trabalhava o... Você fazia o levantamento da fábrica e isso passava para a organização para fazer uma 'Ação exemplar' lá, uma ação armada. Ai você vinha, porque você não podia fazer uma... Não era para atirar, mas era para demonstrar força, que havia uma resistência. Então você fazia um panfleto, um material denunciando as questões específicas da fábrica e o Regime [Ditatorial], 10, 15 min, e ia embora. E o pessoal ia armado, o pessoal ia armado. Mas não deu muito certo porque o pessoal acabou caindo. 

Não posso nem te dizer... Porque essas eram idéias. Eu inclusive fiz o levantamento onde eu trabalhava, eu fiz o levantamento do horário, saídas, quantos trabalhadores tinha, almoço. Tudo. Fiz o levantamento de tudo isso. Não deu certo, entende? Eu cai em 1971, agosto de 1971. Eu cai porque o assessor que dava... que fazia assessoria né, ele foi preso e acabou abrindo. Eu levei ele para fazer várias reuniões em casa, é uma coisa que você não pensa na hora. E o pessoal caiu e eu fiquei sabendo por intermédio de coisas que... Que tinha sido preso e que minha casa tinha sido invadida... Só que eu não morava em casa, morava no aparelho, chamado aparelho na época né... Morava no aparelho.

Vocês tinham quantos aparelhos?

Há, não tenho idéia... Vários. Em Osasco tinham dois, Presidente Altino e.... Que era a casa onde a gente se reunia. 

Mas vocês tinham quantos militantes em 1970?

Não tenho idéia. Bastante. 

Mais de 100?

Acho que sim. 

Menos de 500?

Possivelmente menos de 500. Mas se juntasse tudo, a PO, acho que dava mais de 500. Bastante, bastante.

É porque, o pessoal fala do POC como se tivesse tido 80 militantes, 50 militantes, ai não dá pra ter uma idéia muito próxima...

Não, não, nao. É mais. Eu acredito que fosse mais. E o POC não era trotskista. 

Mas o Merlino era trotskista?

Não. O Merlino voltou trotskista. Nesse processo da crise, da coisa da luta, desse processo todo, o Merlino saiu daqui e foi para França, tal, e voltou trotskista. Merlino, a Angela, esse pessoal todo voltaram trotskistas. Mas eles não eram trotskistas. Eles eram anti-stalinistas. Que é diferente. E tinha bastante gente...

Então a gente fomos ai então, em 1968, 1969, 1970, em 1971 eu fui preso. Fui preso em 1971, e ai eu acabei tendo que entrar na clandestinidade. Eu fiquei uns 16 meses preso, até 1973. Eu ci na clandestinidade em 1970, em 1971 eu fui preso, fiquei 1972 inteiro, eu fui sair no começo de 1973. Dezesseis meses. 

Foi torturado o tempo todo?

Não. A tortura sempre inicial, depois você tirava cadeia. Para alguns, tinha o problema das ações armadas. que t inha o repique né... Então o cara ia preso, ia para a cade... Ai depois era retirado... Acontecia qualquer coisa com o nome dele, ai ele voltava, as vezes voltava para o pau de novo. Até falar, até as histórias fecharem. Ou aconteciam qualquer coisa, ou eles desistirem... Então... Só que eu não fui preso aqui, eu fui preso... eu acabei saindo de São Paulo e fui para o Rio grande do Sul, fiquei lá no Rio Grande do Sul nesse ano de 1970/1971, fiquei no o Rio Grande do Sul e fui preso no Rio Grande do Sul. Também cai, não pelo trabalho de base, mas pelo processo da Organização [POC]. Ai tirei cadeia e voltei para cá. Veio para cá e depois voltei para lá. Fui preso no Rio Grande do Sul no DOPS, do DOPS fui para OBAN, da OBAN fui para o Carandiru, do Carandiru eu fui tirar cadeia na Ilha, lá em Porto Alegre. Depois de Porto Alegre eu voltei para casa em 1973. Depois de 1973 eu voltei para casa. Ai retomei o trabalho. Retomei o trabalho junto com os companheiros do POC, mas ai já não era mais POC.

Mas lá também o senhor foi submetido à tortura?

Isso, no Rio Grande do Sul no DOPS... E depois na OBAN... E como eu era trabalhador, e como eu não tinha relação com a luta armada, então... Você tinha o serviço no Cinemar, tinha todo um complexo de... Quem era da luta armada, quem tinha mais relação, vamos dizer assim, com as direções... Eles pegavam pesado, entende? Agora que não era... Lógico... Você não pode dizer o que, qual o quê que era mais e o que era menos... A tortura era um processo que.. maluco... Entende? Vpcê fica... assim... é, sei lá, quinze, vinte minutos embaixo de choque, qual é a diferença para o seu corpo... essas coisas... Claro que quem fica no pau-de-arara se fode muito mais. Quem fica na cadeira do dragão se fode muito mais entende? Mas, o processo de desestruturação da pessoa é a mesma coisa. Põe o capuz e porrada. Depois te tira, põe no banquinho...Choque... Quer dizer... Lógico, eu acredito que... É que é assim, cada um sente de um jeito. Cada um vê de um jeito. E cada um tem a sua perspectiva de um jeito. Então você não tem ainda uma militância temperada. Essas situações específicas são de temperamento dos quadros, quem ficou.... alguns saíram, foram embora... Não fizeram mais nada... E alguns voltaram a fazer militância. Voltaram a fazer luta política. Fazer trabalho dentro de fábrica... Por exemplo, na greve de 1979 eu fui preso de novo. Ai já era normal, entende? Muitas vezes também, em muitos lugares eu não fui preso porque saia de casa. Abandonava tudo. A repressão vinha mas não me encontrava. 

Nessa ocasião que o senhor foi preso, você chegou a tomar choque e essas coisas?

Choque, pancada, essas coisas todas. 

Durante quantos dias isso aconteceu?

Não dá para saber quantos dias. Não era assim direto. Não era direto, perde a noção do tempo... Não tem mais tempo. Porque tudo o que fazem, você não tem mais tempo. De repente cai uma coisa, cai outra. vem isso aqui... Uma simulação aqui, 'Eu vou te matar'. Leva para um lugar, dá uns tiros de festim, é tudo um... são coisas que a repressão faz como ela quer, entende? 'Vou matar você, vou te leva para um lugar'. Ai chega lá, simula, dá uns tiros de festim.. É para ir te desestruturando mesmo. É para te convencer que aquele método de luta que você esta fazendo é um método que não... vamos dizer assim, que não... é um método que não avança entende? É um método que não tem eficiência, entende como é que é? Então eles querem dizer que o capitalismo... Se você com a sua inteligência, com a sua capacidade, se você se amoldar, se vocên entender que esse é um processo normal. Que você foi desvirtuado, que esses cara da direção [das organizações] são uns filhos-da-puta, comem bem e vive bem, são filhinhos-de-papai... Esse papo todo que a repressão sempre tem para desmoralizar você. Quer dizer 'você entrou numa fria', entende? Mas você tem chance de sair. 

Mas como eu não tinha luta armada... Não tinha nada em cima, então... assim não foi lá muito tempo... Não tenho idéia pra dizer quanto tempo foi... Porque foi de lá, depois foi para OBAN, então já perdi a noção do tempo. Não tem tempo mais... Dia e noite... Claro que, eu não para nenhuma solitária... Porque não tinha também... eu não tinha porque. Não tinha porque passar do limite da tortura comigo, como com muitos... Não tinha o que falar... Só se tivesse alguma coisa clara, por exemplo... saiu do país... Não era só que fazia ação armada, era quem tinha cargo de direção, quem ia para o exterior, tudo isso era ponto que depois, sei lá, Cenimar, essa coisa toda, o Doi-codi, esse pessoal era especialista né... Eles eram assessorados... bem assessorados... Pela CIA, pelos órgãos de repressão... Todos esse movimento internacional de repressão, entende? E principalmente pelos estados Unidos, que é onde eles mais bebiam... Eles também, não só bebiam, como eles também doavam muita coisa... Mais ou menos isso... 1971.

O senhor conheceu o Olavo Hansen?

Não. Esse pessoal conheceu, o Waldemar Rossi...esse outro pessoal conhece. O Hansen estava no POR. O POR em Osasco também tinha... Mas, era tudo... As Organizações, em si, não eram nada grandes... eram tudo coisas que... Com o tempo, elas foram acumulando... entende aquele negócio do processo da organização do movimento estudantil, do movimento operário... Eles foram incorporando... Então era a VAR, VPR, POC... O Poc mesmos, mas é esse pessoal que foi para a luta armada que deu e que mais aglutinou gente em torno. Então a partir de 1973 ai eu volto a militar, volto a militar já... Falsifico os documentos, essa coisa toda, pra não ter problema. A gente vai aprendendo como é que faz as coisas... Ai voltei a trabalhar, como eu era eletricista, eu voltei a trabalhar. 

Ai o senhor foi militar onde? Em que corrente?

Em São Paulo. era mais ligado a proximidade com o POC. Mas já não era mais [militante integral]... Eu já não era mais... Porque já não tinha mais... Esse processo todo já não... Não tinha mais... como é que pode dizer... assim....Se perdeu esse... esse tesão... Não sei... a prisão... Essa coisa toda... Então você já vinha com uma experiência de que era problema você voltar a se integrar totalmente com uma corrente. Então você se agrupava como tendência, com proximidades, como agrupamentos, mas não centralizado por uma organização. Então isso ai... E o que aconteceu, esses dados foram importantes porque foram os dados, que vieram depois com vários companheiros, formar o aprofundamento do trabalho dos grupos de fábrica. Esse trabalho dos grupos de fábrica se dá a partir do renascimento das lutas específicas dentro da fábrica. E ai o conjunto [da militância] pega essa proposta. Isso em 1974. Ai começa a fazer...

Então o senhor concorda que teve um refluxo entre 1970-1973?

Puta! Um puta de um refluxo. Muito, porque o crescimento do capitalismo, o desenvolvimento do capitalismo, ele superou aquele processo, vamos dizer assim, de ter só pequenas fábricas, ele se recuperou, e ele se... deu uma integração e fez grandes empresas. A maioria das empresas de fundo-de-quintal viraram grande empresas. Então você tem Metal-leve, todo esse processo de crescimento das auto-peças, e tudo, todas as fábricas foram concentradas e houve ai um grande 'bum', que eu não cheguei a participar completamente... Mas quando eu sai em 1973 ainda tinha. Você podia trabalhar onde você quisesse. Emprego era... era pleno emprego. Quase não. era pleno emprego, em algumas profissões, disputa entre os empresários para buscar... porque não tinha... Não era como agora com essa globalização. Foi crescimento mesmo, rápido e que não tinha a desestruturação que foi feita em 1964, 1965, 1966, 1967... Porque ali foi um re-arranjo, entende? A reestruturação das empresas se deu justamente por causa disso... Foi quebra, quebra e quebra, no sentido de juntar. Foi se juntando, entende? Fábricas foram se juntando, e formando grande empresas... De uma hora para outra você tinha uma fábrica com duas mil pessoas. Outra com três mil pessoas, outra com cinco mil pessoas. Então, esse processo de concentração, de fusão e todas essas coisas... Quando deu 1969 para 1970, ai que o bicho pegou. Na Sofunge eu fiquei de 1960-1970. Depois eu sai, e entrei.... Comecei a corre trecho [girar por várias fábricas]. Quando eu voltei, eu voltei para uma fábrica menor... porque não podia 'dar na cara', fiquei numa montador. A Sofunge tinha uns 1500, 1600, porque trabalhava dois turnos, turno da noite e turno do dia. 

Só foi se recupera... A luta só foi se recuperar porque era um crescimento tão violento, mas tão violento que, por exemplo, os acidentes dentro das fábricas... Criaram um clima. O brasileiro era campeão mundial de acidente de perda de olho na produção, soldador torneiro. Não era só precário, é que o ritmo era tão intenso que... Os trabalhadores eram tão levados ao processo de produção, que eles tiravam todas, praticamente, todas as seguranças das máquinas, as máquinas eram moderníssimas, mas o pessoal tirava, para produzir mais. Era convencido que aquela parada que tinha que fazer, aquele negócio que tinha... Se fizesse mais rápido, mais... Inclusive, o pessoal teve uma época que ganhava por produção, por peça, então essa coisa... (...). Vai melhorar mesmo no final de 1973 e 1974, que começa a luta, e começa as idéias de implantação dos grupos de fábrica. Ai é que começa a luta dos grupos de fábrica.

Então teve um espaço que ficou perdido... de 1969-1973?

Ficou, ficou... Com o AI-V e com tudo isso, a resistência cada vez menor. A vigilância era maior... A vigilância era tão grande que você tem... Você imagina que foi instituído o 'cagueta'. Hoje não... Mas nos condomínios, a polícia... porque normalmente faz né... 'Olha, se entrar muita gente no apartamento, olha, vigia... Reunião noturna, você dá um toque, a polícia vai ver o que que é'. Então você imagina... Entende? Tudo isso foi... É lógico, foi se desmontando porque as coisas também foram se acabando. Então 1970-1971-1972, ai a luta era muito pequena. Porque o crescimento era muito grande, e a luta vai retrocedendo. Porque a luta armada passa a ter característica de guerrilha, característica mais de assalto a banco, punição ao capital... E ai também se envolve nesse processo todo, que eu não participei, não posso falar muito. Mas, cria uma grande dificuldade de se alastrar. Porque ela se limita a... As limitações dela não conseguem... E o final de tudo isso você já conhece né, que é a morte do pessoal do PCdoB no Araguaia [1973-1974], que é a ultimo grau de resistência que se colocava... Se bem que pouca gente sabia também disso... era uma relação que... 

Para mim a coisa vai se organizar mesmo a partir de 1974, ai vale a experiência de Osasco, ai vale a experiência dos grupos de fábrica, ai vale a comissão de fábrica. Então você tinha a idéia: Você vai para a fábrica, na fábrica você começa a fazer o que? As lutas especifica. Ai já começa a ideia da construção do chamado grupo de fábrica, no apontamento para... Que nem, no processo da luta, no processo da... Porque você tinha que entender que a gente estava em plena ditadura né... (...). Porque para participar do grupo de fábrica não precisava ter a consciência socialista, precisava ter disposição de luta... Ai começou todo esse... Ai a oposição metalúrgica de São Paulo começa a criar um processo de organização que era assim: atuava por região, e tinha uma coordenação.

A Oposição Metalúrgica se formou na luta contra o peleguismo em 1967. Tinha participado das eleições em 1967, e se mantiveram grupos. Osasco é que foi destruído. Esse processo de Osasco foi destruido. Ele só vem a se recuperar nessa fase, 1973-1974, também ele vem a se recuperar. Porque você imagina, o presidente era o Henos Amorina, era um pelegão... veio depois para o lado do PT... veio essas coisas mas ele não tinha relação com a esquerda... Ele tinha relação mesmo era com a questão social (risos), bem... Sindicato como... Tinha que resolver a questão institucional... Tinha que resolver a questão dos salários... Dentro dos marcos da estrutura sindical... E ai ele tinha essa questão. então Osasco começa a também se recuperar, é quase combinado: Osasco e São Paulo. Nessa fase de 1973-1974 é que começa a... Em 1975 começa a... Osasco vai um pouquinho mais para frente... Osasco com uma história diferente com a diretoria... Só que São Paulo não consegue. Em 1975 São Paulo não consegue ter chapa... Mas, a idéia de grupo de fábrica e a idéia de construir as comissões se fortalece. A partir de 1975, e vai até 1978, ai faz a chapa. 1978 faz a chapa. 1975, 1976, 1977 e 1978, consegue fazer a chapa de oposição. Nas oposições estavam todas as correntes diluídas.

Mas ai, esse processo todo, se dá uma coisa que se chama, no processo de atuação nas fábricas, se dá uma idéia que se chama: Frente de Trabalhadores. Esse é o cerne da construção das lutas dentro das fábricas. O que é a Frente de Trabalhadores? É onde está organizado, dentro da fábrica, a garantia da unidade. Não tinha vários grupos dentro da fábrica, tinha um grupo dentro da fábrica. Esse grupo se organizava no processo da construção da luta das reivindicações especificas e garantia a unidade. E garantia o programa, e garantia, por exemplo as reivindicações. Não era uma coisa fácil, você tinha que organizar, chamar os trabalhadores, reunir, fazer, por exemplo, um boletim. Esse boletim era distribuído dentro da fábrica. Quem fazia isso? A oposição. Ai você tinha um setor organizado da Oposição que fazia esse boletim, que era distribuído. Não pela gente, mas pelos trabalhadores, que iam lá e distribuíam. Ai era cacete, cacete nos patrões, cacete na diretoria, cacete no governo... E você tá no meio da ditadura. Então não era também fácil distribuir. A questão foi, depois, melhorando, entende? Mas por exemplo, tinha lugar que você tinha que distribuir e cair fora, porque os caras chamavam a policia. Você começava a distribuir o material e o cara chamava a policia. Você tinha 5 ou 10 minutos, para distribuir o material. Depois de 1978 é que a coisa foi ganhando... mas não tinha muita moleza.

O que foi a inter-fábricas?

Inter-fábricas era quando a gente reunia várias fábricas. Era praticamente um conselho, só que não era um conselho, não tinha esse nome, e também não tinha esse entendimento. Mas era, a idéia, você tinha que animar, você tinha que animar, mostrar para esses trabalhadores que não era só eles que estavam lutando. Eles não podiam ter a sensação de que só eles estavam fazendo. Tinha que ter a sensação de que a diretoria, o sindicato, não faziam esse papel. Esse papel das inter-fábricas era um papel tirado para animar, para dar motivação para as lutas ganharem mais unificação. Você tinha trabalho tanto na zona-sul, na zona-oeste, como no sudeste, zona-leste, Moca, você tinha um conjunto, toda uma estrutura, organizada pela base. Inclusive o pessoal do Lula, esse pessoal todo, nos acusavam de ser um partido. Porque eles falavam que a gente fazia isso mas não atuávamos no sindicato. E não é verdade isso. Quando tínhamos condições nos íamos para o sindicato, como foi feito em 1978 e 1979. Não procede, entende?

Quantas reuniões tiveram do inter-fábricas?

Centenas, centenas, centenas. Era um período, era um período que a gente se reunia. Sei lá, Carterpillar, tinha Metal-leve, as fábricas se reuniam em separado, fazia processo de luta. Agora, em determinados momentos era que se fazia, mas na proximidade das lutas mais gerais é que a gente se reunia. Mas as reuniões por fábrica...

Mas e essas reuniões dos conselhos, quantas o senhor se lembra?

Ah não. Essas reuniões eram específicas. Não tenho idéia não. 

As mais importantes?

Foi na construção da greve de 1978. As fábricas mais organizadas tinha os locais de reunião, e o pessoal movimentou, falou: 'Oh, vamos fazer uma reunião para decidir a questão da greve, o encadeamento da greve. Isso em 1978.

Em que mês, mais ou menos? Antes ou depois da greve da Scania de maio de 1978?

Era tudo muito clandestino. Os grupos se reunião clandestinamente. Todas as lutas que aconteceram, elas foram impulsionadoras de outras lutas, então precisava pegar os boletins das fábricas que faziam isso. Em 1978 era proposta mais ainda não estava concretizado. Quem fazia esse trabalho era a Oposição nos seus encontros. A Oposição, a Oposição Metalúrgica de São Paulo, nos seus encontros, ela tinha essa idéia de unificação dos trabalhos nas fábricas. Em 1978, quando vem a greve de 1978, da Scania nos estávamos em luta contra os pelegos para construção da chapa [contra Joaquim dos Santos Andrade]. Então nos, assim, greve de 1978, maio de 1978, então nós fizemos uma batelada de greves também em São Paulo acompanhado 1978. Essa construção da chapa de 1978 vai fazer... a proposta de greve de 1978, de categoria. São Paulo foi a primeira categoria a sair em greve geral de categoria em 1978, metalúrgicos. Sindicato dos metalúrgicos de São Paulo. Em São Bernardo era greve de fábrica por fábrica. A data base deles era em abril. A de São Paulo era novembro. Não deu para fazer unificada.

Quando estoura em 1979 é que se dá praticamente, assim... As greves, a organização, em 1979 ela explode. Ela toma um formato público, ela se abre. Então de 1978 a 1979 você tem lutas dentro das fábricas, e você tem essa articulação... E a Oposição trabalhava como articuladora de todas essas fábricas. Não tinha esse caráter de centralidade. Assim, alguém decide. Não há uma centralidade partidária. É uma concentração sindical. A Oposição era capaz de unificar todas as fábricas. Ela fazia os encontros da oposição. A inter-fábricas, a gente tinha uma idéia de que se reunia por região. A inter-fábricas se reunia por região. Por fábricas organizadas na região. Agora, tinha muito... Não era fácil... Você estava trabalhando para o conjunto da construção da resistência, mas você também estava trabalhando já com grupos, com forças organizadas. Então não era fácil assim, 'vamos organizar as coisas'. essa coisa só começou a ficar um pouco diferente depois da greve de 1979. Tanto a greve de 1978 como a greve de 1979 potencializou o processo de organização dentro da fábrica. Foi o processo onde se viu a possibilidade de poder avançar. E tinha toda uma discussão do processo da abertura...

Então, na sua visão não de tratavam de greves puramente espontâneas como coloca o Ricardo Antunes?

Não. Ele pode pegar o conjunto. Porque nós estamos falando de uma categoria específica, metalúrgicos. Agora, se ele está falando do conjunto, sim. Do conjunto sim. Por causa do clima, né. 1978 por exemplo, parou um monte de fábrica, 1979 foi mais ainda. Os piquetões, essa coisa toda, parava a fábrica que nem da categoria não era, foi parando, foi parando, foi parando. Quer dizer, mudança na compreensão, nessa coisa toda, entende? O que a gente tem que entender é o seguinte, o elo central desse processo de organização chama-se Oposição Metalúrgica de São Paulo, aonde se concentrava toda... Até 1979, depois de 1979 teve um racha e formaram dois grupos de trabalho dentro das fábricas. A Oposição fez um congresso, e esse congresso estava dentro da greve de São Bernardo, teve um estremecimento. Foi na época do Solidariedade (Solidarność - Lech Wałęsa)...

Qual foi o motivo do racha?

O motivo do racha... É um pouco isso... a compreensão do movimento político que nós estávamos vivendo. Como é que nos devíamos avançar, como é que a gente devia se organizar, como é que nos deveríamos estruturar a relação dos sindicatos... É muito tênue as diferenças. As diferenças são muito tênues. Como é que a gente pode dizer assim, a compreensão do processo de organização. Compreensão do processo de organização, a centralidade. Compreensão do que tinha que ter uma marca, tinha que ter um jornal. Então é todo um conjunto de diferenças que vão aparecendo pontualmente em cada lugar, entende? Quem filia mais para o sindicato, entende? Quem participa mais do sindicato... Discussões muito pontuais, entende? E que essa discussão do paralelismo, esse negócio, também embaça, entende como é que é?

É porque era um momento muito, o clima de abertura, muita gente inclusive vai para o pelego né, o MR8, o PC do B, mais tarde, o PC, o resto do PC, esse pessoal vai se aproximando do peleguismo, na eleição do Joaquinzão [dos Santos Adrade]. A Oposição vai ganhando força, vai ganhando musculatura. e ai tem um elemento estruturante que nos não colocamos, que é a Igreja. A igreja abre as portas para o pessoal da Oposição de organizar, que é o Santo Dias, o Anísio Batista. Esse pessoal todo que eram os expoentes principais da Igreja e que eram lideranças dentro da Oposição, de prestigio.

O grupo de metalúrgicos de São Paulo influenciaram no ABC?

Ah teve, teve. Teve inclusive com a proposta da comissões de fábrica, que foi uma proposta da Oposição de São Paulo. Aprovou no congresso do ABC. O companheiro que morreu, o Cleodon Silva foi convidado, ele faleceu, mas tem a tese da Oposição, ele foi defender as comissões de fábrica independente no Congresso dos Metalúrgicos [do ABC]. Quase apanhou. Mas foi aprovada. depois eles não levaram na prática. Num primeiro momento, tal, mas depois eles colocaram que as comissões de fábrica tinham que ser atreladas ao sindicato.

Por que essa fração do Lula era contra as comissões?

Porque eles achavam que criava uma organização independente... Que não ajudava no processo de unificação da luta. Que os patrões podiam cooptar as comissões. Que é uma discussão, entende como é? E o sindicato, inclusive o sindicato teve que lutar bastante. Nesse ínterim todo, eles sofreram uma forte pressão do patronato. Eles fizeram uma comissão na Volkswagen, uma comissão meio fora do sindicato..

Quem que fez?

A Volkswagen, a patronal. E ai deu...

A gente achava o seguinte, que não. Que se os interesses do sindicato não estavam em acordo com os interesses da comissão, a comissão jamais iria fazer uma discussão negativa. Agora o que acontecia era que esse processo de luta, dentro da fábrica, ele ia no centro da questão. Ele fazia com que a direção do sindicato, a luta sindical dentro da fábrica... E ai você tinha o que, você tinha o controle do conjunto da luta. Não digo da direção sindical, a direção do sindicato fazia sua luta. E o sindicato se tornava amigo da comissão. Não se tornava inimigo. ele se tornava inclusive o provedor de tudo, do boletim disso, daquilo... quer dizer, era um processo de renovar. Tinha toda uma luta, um processo inclusive de renovação sindical. Porque vvocê ia discutir acidente de trabalho, reivindicação... Você ia discutir o conjunto da luta dos trabalhadores. Não ia ser só o sindicato da porta para fora. Era o sindicato da porta para dentro. Como a Cobrasma era. Cobrasma tinha uma comissão, Cobrasma discutia mano-a-mano. E eu não vejo os caras falarem que a comissão da Cobrasma passou por cima da diretoria do sindicato. Nunca ouvi falar isso. e era uma comissão oficializada. Tinha estatuto. era essa comissão que nós... 

Em 1979 em São Paulo se registraram mais de centenas de comissões na greve. Então foi assim um negócio violento, violento. Mostrou que ali tinha condições, tinha ambiente para fazer as comissões. Lógico que nós precisava de uma roda maior para discutir esse questão das inter-fábricas... Porque a Oposição se virava com o negócio das inter-fábricas porque ela tinha... Ela centralizava isso, porque ela tinha uma coordenação, a Oposição. Só que não era uma coordenação político-partidária. Era uma coordenação político-sindical. (...). Todos os partidos estavam lá, entende? Todos os partidos estavam lá. Os partidos políticos estavam todos lá. Até a hora que estrebuchou, entende como é que é? Porque eles foram se organizando, o MR8 foi para o sindicato, o Mira, depois o PC do B foi também... O Aurélio Peres e o Vital Nolasco... Esse pessoal tudo foi ganhando outra interpretação do processo da luta sindical, até pra reforçar a sua tendência, até para o PC do B se legalizar... Tinha até isso no meio. No meio do caminho tinha esse processo. E como é que vai se legalizar dentro de um grupo de esquerdistas? Era muito duro, entende? depois começou a ter a concorrência que eles não imaginavam, que é a concorrência do PT. O PT vai se formando nessa construção, nessa coisa toda. 

E porque a tendência do Lula sai vitoriosa?

Essa é uma história pesada. Se você perseguir você vai achar. Mas é uma combinação política. Entende como é que é? É uma combinação política. Porque o Lula na prática, em 1977, 1978, o Lula tinha posição de direita. O Lula era contra os partidos, o Lula dizia que: os sindicatos... O padre na igreja, estudantes nas universidades, cada um... Não se mistura... Nasceu diferente de Osasco. Só que nesse processo todo houveram lutas maiores...

As comissões de fábrica dos 1970 tem como espelho o 1968 em Osasco?

Não só de lá. Elas tem como espelho o 1968 e tem também as Comissões Obreiras da Espanha, também. Mas Osasco era onde estava o Mana, porque Osasco era onde estava a comissão de fábrica legalizada. Uma comissão de fábrica que se construiu inicialmente como grupo, depois se legaliza como comissão e depois vira sindicato. Ela faz uma crescente. E depois do sindicato assume o papel político do sindicato.

Então em SP e ABC chocavam-se duas tradições uma pela base e outra por cima? 

O Lula veio por cima. O que acontece é que ele vem com um aparato... Porque as grandes greves é que acabaram tendo a centralidade, a greve de 1980. Centenas, 100 mil. Na greve de 1978 nos colocamos 30 mil, no dia da decretação da greve, 30 mil debaixo de chuva. Mas eles colocavam mais de 100 mil (...) Na assembléia para decretar greve. Tem a foto na Rua do Carmo.

Mas então, porque a tradição do Lula saiu vitoriosa? Vocês tinham base e tudo...

Então, mas nós éramos oposição. (risos). Nós não tínhamos o que eles tinha. Eles vêm desde sempre de dentro do aparato. Ele constrói com o Joaquim, ele constrói... Ele não tem... O lula nessa época era um olho no peixe e outro no gato. Ele era veloz nessa questão toda. Por exemplo, na greve de 1979, no 1º de Maio de 1979, um dos oradores foi o Joaquim no Estádio doa Vila Euclides. É a tradição do Lula né... Está falando da estrutura sindical. A história é a dos vencedores. Se conseguiu... A Oposição não ganhou... Esteve na boca pra ganhar o sindicato, mas não ganhou, entende como é que é? Pela situação criada em São Paulo. então isso também deve ter sido um dos elementos que não permitiu e fez com que o avanço da ideia da construção paralela, que a oposição era quase um partido... Osasco não teve essa coisa, porque Osasco perdeu... Criou resistência mas não foi... Havia similaridade nessa coisas todas, mas não é a mesma coisa. São Paulo estava enfrentando... Osasco, São Paulo e Guarulhos estavam enfrentando o inimigo central, que era o centro mesmo do capital. Claro, depois foi diminuindo a importância, mas São Paulo era muito importante nesse processo.

Então uma das coisas que possivelmente... que a vitória do Lula tenha sido , vamos dizer assim, que ficou na história que começa lá entende? É que ele conseguiu fazer essa capacidade... De unir não as oposições, mas o movimento sindical. Mesmo na formação da CUT, vai formar encima da Oposição. Inclusive a Oposição é praticamente, não dentro da CUT, mas na construção do processo que lutava contra os pelegos, praticamente foi varrida. Porque nós estávamos lidando aqui com um sindicato pelego, então tinha que ter abertura para as oposições, para aqueles que participaram das eleições, então você tinha que aferi coisas, como é que se dava. 

No Conclat, eles puseram uma clausura, de praticamente não participação das oposições, dos rachas. E ai, lógico, as coisas vão acontecendo. Então, a idéia de você procurar as inter-fábricas, precisa procurar sentar com mais gente. Porque na prática existia, mas não nessa forma de Comando. Essa forma de comando ficou mais clara a partir da construção das comissões de fábrica. Porque você tinha comissões na Asama, tinha comissão de fábrica na MWM, tinha comissão de fábrica na Barbara, na Toshiba... Se tinha um conjunto, ai começa a criar essa idéia de comissão de fábrica, a partir de muita luta. E na Asama, foi uma fábrica que, com o Geraldo... Então a minha participação é um pouco por ai, de trabalhar no processo da luta política, e no processo de organização da fábrica. Quando deu 1978 e devia estar na Barbara, uma coisa assim.

Você acha que esse período de 1978-180 foi um período pré-revolucionário?

Não. Pré-revolucionário não. 

Nem de crise revolucionária?

Não.

O senhor chamaria do que?

Um processo de intensa resistência mesmo. Um processo que possibilitava a queda da ditadura e abertura do processo democrático. Mas não... A gente até sonhava. A gente até podia sonhar, mas não tinha... Primeiro que não tinha partido né, tava muito fragmentado. Mas era um processo num campo... Estava fragmentado por causa da desarticulação (...). Então se eu fosse caracterizar o momento, era um momento de transição para um processo de luta democrática, que para nós se avizinhava no processo da construção de um partido, de uma central e abria as portas para um processo revolucionário. Mas não tinha isso... Tanto é que todas as tendências cresceram, se afloraram. Então era um processo de ebulição política, entende? Claro que a gente sempre sonhava que podia fazer outras coisas. Mas sabe que não é assim... Agora a crise que se deu foi que o esgotamento da repressão militar... Houve um esgotamento de toda atividade repressiva. Essa lutas ganharam e tomaram esse lutar. Pode ser que a gente até tenha sonhado em algum processo de ruptura institucional, mas não tinha né... Tanto é que as Diretas não passaram. Quando as Diretas não passam, ai dá uma... mostra que por cima... Como é que você vai construir uma coisa por baixo se você não tem essa relação que sustenta.

O senhor acha que teve refluxo depois das greves de 1978-1980 até as Diretas?

Não. Porque teve programas... 

Porque o que se diz a repressão à greve de 1980 gerou um refluxo no ABC

Lá foi diferente, porque lá as greves atingiram a diretoria, houve cassação... Não sei se eu diria... Mas como a luta estava ligada ao sindicato... Não tinha esse grau de presença política como nós tínhamos. Nos construído as greves, depois a CUT acabou, em 1985, 1986, as greves e tal, animou... Mas ABC não teve tanto refluxo... Bom... A luta dos trabalhadores sempre tem sobe e desce. Acho que a ultima luta que o ABC faz é a luta, grande luta mesmo, foi de apoio a Camassari, acho que 1984. A luta no ABC você não teve assim grande... É porque eram preparadas as lutas... Não tinha essa característica de luta por fábrica. Tinha luta por fábrica, mas era pequena. Tinha mais característica de luta de categoria. A luta no ABC era uma luta de categoria. Porque em São Paulo tinha que fazer luta por fábrica. Porque aqui é pequena e média empresa. São Paulo é pouca empresa grande. Não tem muita empresa grande. Sei lá 10, 20, 30. No ABC não... No ABC, na época, uma fábrica em 1978, uma fábrica tinha 40 mil, a Volkswagen. Você tinha fábrica de 10 mil, 8 mil, 4 mil, mas eram fábricas de peso, entende? Você tinha Scania, Mercedez, fábrica grande. Então eu posso dizer para você que essa construção... É difícil não estar com a certeza, mas a construção da Inter-fábricas, dos grupos de fábrica, das Inter-fábricas e das comissões, elas se dão no processo de 1977 a 1979-1980.

Qual foi a influência da Oposição na construção da CUT?

Ah, tem. Primeiro que ela era proposta também da Oposição, também tinha essa proposta de criação da CUT. Pelas experiências do partidão, questão da CGT... Porque sempre, a gente sabe que a unificação das lutas era... Porque tem vários caminhos que podiam ser trilhados né, desde a unificação setorial; Ford daqui com a Ford de lá, e tal. Havia iniciativas desse tipo, até pra trabalhar uma coisa e ser conjunta... Eu posso dizer que esse processo dessa construção da unificação dos trabalhadores, essa coisa toda, a base da idéia de unir é porque... complexo, tem essa ideia da cidade e do campo, mas a idéia da construção da CUT era para unificar a luta mesmo. Era para fazer inclusive com que uma Central se fortalecesse e começasse a ajudar as oposições a ganhar os sindicato, a desmontar o peleguismo. Uma das coisas é o desmonte do peleguismo... É o avançar da luta mesmo, é ser o farol. Não é atoa que a CUT até hoje tem os maiores, praticamente... Tem quantos sindicatos, 1800, 2000 sindicatos, sei la quantos tem.. [no site diz que tem 3.438]. E a Força Sindical, como foi formada pelo Collor, como foi formada na base da negociação, da moderação, para enfrentar a CUT mesmo, a Força foi feita pra enfrentar a CUT. Na realidade hoje eu não sei como está. Mas quando foi feita, quem se reunia com a Força Era o Collor. O Collor foi o cara que deu dinheiro para o Luiz Antonio, pro Paulinho, para formar a central. essa central foi formada para enfrentar a CUT. E o governo Collor foi isso né, o Paulinho, o Medeiros, e todas..

Essa base da Oposição que foi para a CUT chegou a ter peso influência?

Influenciava, mas não tinha força. Não determinava. Enchia o saco, mas não determinava não. O que a Oposição fez de importante foi apoiar a vitória de muitas oposições. A Oposição de São Paulo, ela tem nos seus registros, o apoio de centenas de oposições. Não sei se todas ganhavam, mas apóia fortemente os Químicos, apóia fortemente o Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas. E vai apoiando. Porque a proposta da oposição é uma proposta exeqüível. É um proposta de independência. O centro da Oposição é a quebra da estrutura sindical, e isso influencia a CUT politicamente. A quebra da estrutura sindical influencia a CUT. Mas não tem força para dar o tom que o sindicato, que o Lula deu com a estrutura, de criar um arco de forças muito superior. Então dentro da CUT nos éramos uma força, 20%, 30% não sei. E porque também eles [da articulação CUT] começaram a ganhar força com o pessoal do campo. O pessoal do campo vinha todo atrelado com o Lula, a figura né... Era uma figura na luta do sindicato, diferente, entende? Você vai discutir com... quando você vai discutir na base, você tem um... Como eu posso dizer assim... Você fica animado, mas depois vem organizado por cima, pela direção... Ai os caras fala: 'vem cá, vamos te dar 20 mil pra você fazer isso, vos te dar aquilo, aquilo. Não, isso não tem problema não, paga a passagem'. O sindicato né...

2:25mim.

(Mudanças no PT)

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Agora se você me pergunta se a Oposição teve influencia na CUT. Teve influência na CUT do ponto de vista estratégico. Inclusive, no programa da CUT, está que a CUT ia em direção ao socialismo, que a CUT lutava pelo socialismo. Influencia da Oposição. A Oposição teve um papel significativo, significativo... Agora, perdeu na política, a gente pode dizer... Hoje eu não tenho nenhum problema de consciência, perdeu na política. Porque era oposição, porque não ganhou sindicato, porque não se firmou, porque não ganhou... As oposições não conseguiram, a postura... A política de ganhar os sindicato por uma proposta independente. Agora, você vai lutar contra quem, contra o MR8, o PC do B que querem apoiar o Joaquizão para destruir a Oposição. Essa era a proposta deles, era matar a Oposição. Desde o começo, matar a oposição... Ai no caso, é "dedar", é tudo... tudo que eles podiam fazer... era isso... Encontravam um nosso: dedu duro. Minha companheira mesmo, trabalhou na AVAPS, encontrou o Luiz Antônio, foi mandada embora... Não foi mandada embora aqui na Sharp, mas sofreu na mão do PC do B. Porque? Porque nós fazíamos o grupo de fábrica, logo, logo já fazia, o que? Um boletim. E já denunciava. e fazíamos com que o trabalho que nos estávamos fazendo, ele já ganhasse expressão de toda a fábrica. Ai já denunciávamos o chefe, denunciávamos as comissões de trabalho, denunciávamos a exploração... denunciávamos os acidentes de trabalho... Quer dizer, nós, os boletins, principalmente nas fábricas onde a gente mais tinha mais gente, não dava moleza para a patronal não... 

Ai o pessoal, o que acontecia. O pessoal fazia o trabalho e nós divulgávamos... Iamos lá entregar o boletim. Por exemplo, na Sharp a gente tinha um boletim chamado "Anteninha", era uma fábrica de mulheres, a maioria mulheres... O dia que nós fomos distribuir esse material, o pessoal saia dos ônibus, fazia fila para pegar o material, para pegar o boletim. Não fugia, a característica do trabalhador é ter medo. Tá na frente do cara, vai perder o emprego, o guarda diz: 'Ai, não pega não heim!'. Ai o cara pega! Ele vai agredir o guarda? Não. Ele está na rua filho... Agora, esse não era a visão dos que não queriam um sindicato combativo, eles queriam um sindicato mais... Para nós o sindicato era um frente de trabalhadores, por isso que nós conjurávamos com a idéia de fazer uma frente organização, mas com os trabalhadores. Não fazíamos reunião de partido para partido: 'vamos ver, vamos contar garrafa lá'. Porque a luta era sindical, entende? 

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E sobre as diretas, qual era a visão do senhor?

Nas Diretas nos fizemos campanha pelo voto nulo. Nem Tancredo nem Maluf... O Sarney era vice do Tancredo. Então, nessa disputa toda, nós estávamos: 'Voto nulo'. Fizemos campanha, distribuímos esse material. (...). Nenhum nem outro. Ai depois teve o Governo do Sarney né, porque o Tancredo ganhou no Colégio Eleitoral... Mas o trabalho na fábrica continuava. Essas lutas todas. 

E as greves gerais durante a década de 1980, que importância teve?

Elas não conseguiram uma amplitude de greves gerais, mas que oram importante foram. (...). Todo o lugar que a Oposição tinha bandeira fincada, teve uma boa de uma penetração as greves gerais.

E a Articulação Sindical, eles chamava as greves gerais, mas construíam?

Construíam não no local de trabalho, na máquina. Eles também sofriam influencia da base também. Porque também tinha muita gente que acreditava na proposta das comissões, tanto é na Volks, na Ford, nas comissões, foram comissões muito importantes. Muito importantes, na Ford a comissão era muito importante, a comissão da Volks, a comissão da Mercedez, era pessoal de esquerda também... Não era... É que a máquina é a máquina né, atropela o que vem. Nós, aqui em 1979 para 1980, a gente se reunia com o Lula, levava as comissões para conversar com ele. Nós tínhamos uma boa relação, nós sabíamos que era uma relação terrível né... Pegamos o Lula várias vezes de calça curta negociando com o Joaquim, mas nós não desistíamos, vai desistir por que? Não dava para desistir. O Lula, quando tinha chapa de oposição, buscava acordo com o Lula, era meio duro e tudo...

E quando começou a enfraquecer esse poder de pressão da Oposição?

Eu fiquei em São Paulo, e depois fui para Osasco... São Paulo, eu acho que começou a enfraquecer mesmo depois de 1984, depois das derrotas. Derrotas com no enfrentamento com a máquina sindical. Acabou desgastando. Porque precisava ter uma resposta. Não sei... Também não tenho essa avaliação que nós serimos 100% diferente. Porque você tá dentro de uma... Mas nós íamos fazer um trabalho diferente, ligado às bases. 

Se te perguntasse aonde a Oposição errou. Tem uma resposta para isso?

Não. Não tem. Não tem porque é de conjuntura né... e de estrutura... porque... Como dizer assim... porque a esquerda não... Agora, é meio difícil, porque é muito complicado... Uma hora você tem 100, desses 100, uma hora você tem 70, 30 vai para lá... Entendeu? Ai você enfraquece... Você tem o processo da luta politica, da luta ideológica, você tem toda uma luta que se estabelece, entende? Então não dá para dizer aonde nós erramos... Fizemos certo, entende... Pragmaticamente, fizemos tudo certo, mas para dar certo, você precisa criar as condições de alianças... Pode ser que ai... Eu não sei onde se dá essa inflexão...

Porque esse sindicato [do ABC] também não foram para frente. A gente pode dizer que eles foram vitoriosos, mas foram vitoriosos aonde? Até fazer as concessões do banco de horas? Fazer as condições para as demissões como São Bernardo está fazendo? Até fazer a flexibilização? Agora não dá né. Tudo tem limite. Até nossa força tem limite. Mas que nos éramos muito grandes, ocupávamos um bom espaço. O nosso pessoal, a maioria do pessoal, que teve capacidade muito grande de trabalhar, de ser referência, essas coisas todas. Não tem um erro específico. Onde o Zé Dirceu errou? Ai é fácil né! (risos)...

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A luta tem uma dinâmica, então você não tem uma verdade na mão. 'Olha, vai acontecer assim'. Não. Os Comandos de Santo Amaro, depois formaram os comandos, eles apareceram de uma reunião em Santo Amaro, que era a idéia dos grupos de fábrica, das inter-fábricas estarem separadas, apareceu os comandos: 'vamos fazer os comandos'. E o Comando foi assim, foi aparecendo... Como é que apareceram os Comandos primeiro ele foi ganhando essa característica de comando. Ias para as assembléias, ai cada um ia com um bracelete "comandante".Todo mundo comandante, em 1979. Comandante. Na frente de batalha, ninguém entrava numa fábrica para tirar os caras de dentro se não escutar o comandante. Gritava: "Comandante". Ele fazia assim: 'vamos fazer o seguinte, vamos eleger aqui um comandante então, porque eu estou fazendo outros negócios, vamos eleger um comandante aqui'. 'Conhece fulano? Conhece ciclano?, Você conhece ele?, Então ele vai negociar!'. 

Então existe um negócio chamado hierarquia dentro da luta, a luta não acontece... porque... essas coisas foram acontecendo por causa disso: 'Ah, eu conheço ele, eu conheço ele, eu conheço ele lá do sindicato é comandante mesmo. Já vi ele lá,, já falou lá.' É assim entende? Porque não é uma representação política organizada, mas é uma organização que está lá. Dois, três, quatro, cinco que está nessa assembléia: 'ah eu conheço ele, eu conheço ele, ele é o comandante'. Sobe já ergue o cara, já fala e acabou. Porque, é lógico que você pode caracteriza isso como um grau ainda de espontaneidade, porque ela não tem essa organicidade, entende? Eles não estavam chamando lá um cara do sindicato. Eles não estavam chamando lá o cara da direção de alguma coisa. Estavam chamando um comandante que se formou dentro do processo da luta, e que é reconhecido, e revogável a qualquer momento. Porque ali você está junto com os interessados. 

Então ai (...) Negociou com a patronal, negociou mal. O cara ia lá negociava, voltava, os caras escutavam... Esse era o caminho que as coisas aconteciam. Então você ia construindo isso, Comando, Comandante, as Inter-fábricas, tal... Claro, não foram coisas que tiveram uma atividade centralizada, foi uma coisa mais... como eu posso dizer assim, temporal, né... Não foi uma coisa mais fixa, mais estruturada dentro de uma máquina, dentro de uma organização e tal. Até porque a Oposição não era uma organização, era um movimento. O pessoal queria colocar a Oposição como um partido porque ela tinha esse negócio ai da centralização, mas era uma centralização política: 'Você representa o que? Você é da zona sul, é da zona leste, tal e tal?'. Ai você decidia se tinha um ou dois companheiros da coordenação. Ai fazia as eleições. 'Vamos fazer jornal, quem é a favor?'. Vamos fazer isso, vamos fazer aquilo. Mas você vivia em torno da luta concreta. Da luta concreta, entende? O cara ia para o comando, ele tinha que ter duas coisas, ou uma coisa importante: Ele tinha que ter um trabalho de base, e tinha que ter uma atividade política representativa. As vezes ele estava desempregado, mas ele tinha um conjunto de fábricas articulada que o bancava nos encontros. Nos encontros que a oposição tinha. Então as forças políticas apareciam... se fazia reuniões com 40 pessoas, 60, 80 pessoas... Já não tenho idéia assim... 20, 30... Mas tinham épocas, no inicio das preparações das greves, as coisas eram.... Os encontros da Oposição eram... Encontros grandes, entende... O racha da Oposição, acho que saíram 21, era minoria. Então você vê que a Oposição era grande. E a pelegada sabia que nós éramos grande. Nos tínhamos base, eles sabiam, ah, sabiam. 

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