quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Entrevista Cloves de Castro - Oposição metalúrgica de São Paulo

Elaboração, coleta e transcrição da entrevista: Alessandro de Moura.
[Falta revisão]


Nasceu em São Paulo/capital, em agosto de 1939. Seu primeiro emprego foi aos 12 anos como office-boy em um escritório, trabalhou ainda em uma loja de calçados e aos 15 anos ingressou no trabalho industrial no ramo metalúrgico, onde permaneceu até 1959. Fora da indústria, consegue empregar-se no setor público, na Diretoria de Obras Públicas. Em 1959, aos 18 anos ingressa no PCB, partido onde milita até o inicio de 1968. Dentro do partido desenvolve trabalho importante junto às Comunidades de Bairro, criando a Sociedade amigos de Vila Moraes, próximo ao Bairro Jardim da Saúde. Desta forma, Cloves Castro construirá o PCB nessa região tomando por base as reivindicações básicas dos moradores, como  asfalto, transporte, energia elétrica, calçamento, mas também a luta contra a carestia. No início de 1968, juntamente com a Fração Marighella, rompe com o PCB e inicia a construção da ALN, um dos principais grupos que empregava a luta armada como estratégia de derrubada da ditadura militar-burguesa. Em 14 de dezembro de 1969 é preso pelo DOPS, torturado por mais de um mês e transferido para o presídio Tiradentes, por fim é transferido, juntamente com outros presos políticos, para o Carandiru, onde permanece encarcerado até maio de 1972. Uma vez reconquistada sua liberdade, emprega-se novamente no setor metalúrgico, retomando também suas atividades políticas na ALN. No inicio da década de 1970 passa a integrar e construir a Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo. Permanece na ALN até sua dissolução no PT. Com isso passa à construção do PT e da CUT.
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Como o senhor chegou à essa metalúrgica?
Ah, era... pegava muito menor né, muito, muito menor, então era fácil né...
Mas ninguém te indicou? Você foi procurando?
Não... outros amigos que trabalhava lá e tal: 'Olha, estão precisando, vai lá' e tal... Ai eu fui né...
Qual era o nome dessa primeira metalúrgica que o senhor trabalhou?
Metalúrgica... era Metalúrgica Rossi, acho que até fechou, era lá no Bosque da Saúde...
Existiu até pouco tempo, não?
Não sei... parece que não viu... Pode ser que... a que exista hoje pode ser que está com outro...
O senhor ficou quanto tempo nesta metalúrgica?
Eu fiquei, praticamente 3 anos...
Até os 18 anos?
Isso. Ai, depois vem aquele período... era o seguinte... quando você estava com 17 anos ai, tal, as empresas te mandavam embora para evitar que você servisse  e eles tivesse que pagar, né... Ai, eu não servi... fui mandado embora e tal, não servi [ao exército], ai o meu padrasto era funcionário público, certo... Ai, ele me arrumou... eu fui trabalhar no... na época, na Diretoria de Obras Públicas. Num primeiro momento, eu fui para as obras mesmo [risos]. Fui para as obras mesmo, peão né [risos], peão. Ai depois eles me puxaram para trabalhar na secretaria, ai e vim para a Secretaria de Viação e Obras Públicas, onde funcionava o D.O.P - Diretoria de Obras Públicas, a que mais tarde passou a Departamento de Obras Públicas. Eu fiquei praticamente, deixa eu voltar um pouquinho no tempo aqui... Antes disso... é isso ai... bom...
Então, depois da primeira metalúrgica o senhor foi para o emprego público?
Isso, fui para o emprego público, no qual eu fiquei até a época que eu fui preso, em dezembro de 1969.
O senhor começou a militar quando?
Comecei a militar, organizadamente, no final dos anos 1950, onde eu entro no Partido Comunista Brasileiro [PCB]...
Nesse período o senhor ainda trabalhava na metalúrgica Rossi?
Exatamente.
Com quantos anos o senhor ingressou no PCB?
No final de 1959... Eu já tinha 18 anos...
Quem ganhou o senhor para o PCB
Rapaz, isso ai foi um misto...  um misto do... de vocês estar acompanhando o dia-a-dia da política, tá certo, isso, corria muita informação... desde a época da metalurgia... Foi um misto... assim... dessas conversas e... um Diretor de um... ele era... João Camargo, professor João Camargo, ele era Diretor de uma Escola Estadual, era Diretor de uma Escola Estadual, era um Diretor... como se diz, provisório, substituto, Diretor provisório e tal... e nós passamos... nos conhecemos né... a gente, de manhã ia... aos domingos de  manhã, ia assistir o futebol, no campo lá, ou jogando e tal... E, após o futebol, a gente ia para o bar... aonde eles travavam grandes discussões políticas, né... e, nesse período ai que eu conheci o João Camargo, certo... João Camargo e tal.. E, um belo dia, após uma conversa de buteco... ai ele pegou e falou assim: 'Cloves, eu gostaria de continuar conversando com você, vamos no outro bar? Porque ai a gente fica mais tranquilo e tal'. Falei: 'Legal, vamos lá'. Ai ele falou o seguinte para mim: 'Cloves, eu tenho acompanhado você... você participa das discussões e tal... entendeu... políticas, coloca, por exemplo, o Grêmio Operário dentro de campo (que era o nosso time lá), você gostaria de transformar o Grêmio... não só através do futebol, mas que também fosse um momento de que, usasse a sede social para promover um debate, política, etc... E você também falou numa revolução branca, numa revolução sem sangue... não é?'. Ai, ele pegou e falou o seguinte... foi bem... com bastante ênfase...
Ele achava que o senhor era pacifista? Por que revolução branca?
 Não, não era pacifista. A revolução branca  é... através do voto... tá certo... através do voto, não era pacifista, mas, através do voto... essa coisa toda né... Ai ele falou o seguinte, com bastante ênfase:
'Pô, você não teria coragem de derramar o seu sangue pelo Brasil?...".
Falei:
'Ah, claro!... sabe... Claro que eu queria'...
Certo... ai, ele começou... continuou o raciocínio, falou:
'Poxa, veja bem, como são as coisas... quer dizer... os Estados Unidos mandam no Brasil... manda praticamente no mundo... Você, veja como soa bem: Brasil para os Brasileiros... Argentina para os argentinos... e assim sucessivamente'... e  tal, tal, tal...
E eu acompanhado o raciocínio dele... e num dado momento, eu perguntei para ele:
'Seu João, posso fazer uma pergunta?'
Ele falou: 'Pode'.
'O senhor é comunista?'.
Ele falou: 'Sou'.
E eu falei para ele:
'Como é que a gente faz para entrar para o Partido Comunista?'.
Ele falou: 'Você quer?'
Eu falei: 'Quero'
Ai ele abriu o jogo, falou:
'Olha, eu vim para o colégio aqui, sou Diretor provisório né... não sou efetivo e a gente já constituiu um núcleo, uma Célula do PCB na escola, onde tem professores e tem alunos... entendeu... Então eu vou, quando tiver uma reunião do Comitê Distrital, eu vou te levar'. Ótimo, ai, num sábado, eu fui à reunião, fui apresentado: 'O companheiro Cloves  e tal [imita Voz de cerimônia]... fui apresentado então... entendeu... Ai que eu passe a tomar conhecimento e a participar do Partido Comunista [PCB]. Isso em 1959. 1959 para 1960. E me integrei... Ai fundamos uma célula no bairro... o nome da célula era Rui Facó... certo...
Qual era o nome do colégio?
É... Julho Ribeiro. Ai fundamos um célula no bairro, da qual eu passe a participar da direção dessa célula, certo...
Quem era o Rui Facó?
Rui Facó, ele era comunista, morreu em um acidente de avião, ele tem um livro interessante, aquele: Cangaceiros e fanáticos, muito bom o livro viu.. E passei a ter essa atuação no partido, no PCB e também no bairro. Ai, ele coloca também o seguinte: 'Pó, você fala ai do Grêmio e tal, pô, porque que a gente não funda... Vamos fundar a Sociedade Amigos de Vila Moraes, que é muito mais amplo e tal'... Falei: 'Tá bom'.
Uma associação de Bairro?
É... chamava: Sociedade Amigos de Vila Moraes mesmo... E começamos trabalhar em torno da fundação da Sociedade Amigos de Vila Moraes...
Na Saúde?
Na Saúde, certo... Começamos a trabalhar, chamamos umas duas reuniões, convidamos várias pessoas, e, politicamente, ali era dividido em.... seguinte: entre Adhemaristas e Janistas, certo? Tinha uma ala Janista e outra ala Adhemarista, tá... depois de 3 reuniões...
A ala Adhemarista era a mais conservadora?
Na realidade era os dois, sabe... eram as duas na haver... E, o João Camargo conversou comigo, falou: 'Cloves, é o seguinte, vamos fazer uma chapa, o presidente sou eu, o vice você, certo, o vice é você. Porque que eu estou colocando isso, porque, por exemplo, eu não sou efetivo aqui na escola, amanhã eu vou embora, certo, o presidente é você'. Ele era de Itapeva. Ai eu fiquei meio assustado, né... fiquei meio assustado, afinal de contas, do outro lado tinha o Adhemarista lá que era o Bernardo... Bernardo Filho, era advogado, essa coisa toda... Eu falei: 'Pô, mas e o Bernardo?'. Ele falou: 'Que Bernardo o que!'. Ficou bravo comigo: 'Que Bernardo o que rapaz! Entende... tem que ser você... O vice-presidente tem que ser você, por isso... em cima das questões que eu levantei, tal, tal...'. Ai eu topei. Ai, teve três chapas, das três chapas, o João Camargo era presidente, certo, e, as outras duas chapas tinha de vice eu, o Bernardo e um outro cidadão que eu não me lembro o nome. Enfim, fomo eleitos. Tá certo, fomos eleitos, começamos a trabalhar dentro de uma perspectiva, de uma visão que o papel da Sociedade Amigos de Bairro não era apenas as reivindicações locais, tinha que haver uma preocupação com o geral, com a política, com a questão do 'Custo de vida', tal, essa coisa toda. E a gente tocou a Sociedade nessa linha, certo... Ai, veio o golpe, 1964, vem o golpe...
Então o senhor participou da greve geral de 1963?
1963... Sim, participei...
O senhor se lembra de como foi isso?
A greve geral de 1963 foi em torno do 13º... participei... foi uma movimentação intensa, ta certo, na cidade... com paralisações, paralisação dos transportes, dava muita polícia também... cavalaria... E, bom... veio o golpe, veio o golpe... demorou mais uns 4 meses, mais ou menos, uns 5 meses após o golpe, o João Camargo deixa a direção da escola, certo, deixa a direção da escola...
Então, na verdade ele ficou 3 anos na Direção da escola?
É isso ai... Ai ele deixa a direção da escola... ah... nesse período, eu estudava no SENAC, tá certo, no SENAC... Ai ele falou assim para mim: 'Por que que você não transfere para cá?'.
Ah, sim, porque você estudava em outra escola, tinha conhecido ele no bar...
É. 'Por que que você não transfere para cá?'. Ai que ele me falou que tinha célula, tá-tá-tá...
Esse SENAC era onde?
Na rua Galvão Bueno... E eu transferi... tá, para fazer... me integrei na política da escola, certo, na escola, com a célula lá e tal... E, ao mesmo tempo que nós tínhamos os professores de esquerda, tinha direita também... entendeu... e a gente vivia nasala do João Camargo, o João Camargo não era... era um... era uma pessoa assim... um excelente cara né... Ele não ficava na sala dos professores, certo, ele ficava na sala dele e a sala dele cheia de alunos. [risos]... de alunos e tal, né... E tinha os professores de direita véi... direita mesmo... Ai, com a saída do João Camargo, assume a Direção da escola, um fascista, eu não me lembro o nome do velhinho lá, era um fascista mesmo.
Isso já era depois do golpe?
É uns 4, 5 meses depois que o João Camargo saiu, ele veio. O cara era um fascista. Num primeiro momento, ele foi de sala em sala e falando: 'Olha, teve uma revolução, blá-blá-blá e tal... entendeu... e se eu souber de algum movimento na escola, não tenham dúvida que eu... certo... vocês conhecem aquele... não tem aquele DROPS, aquelas balas de DROPS, é o DROPS, que vinha embrulhadinho, eu chamo o DROPS'. Chegou ameaçando, 'sabe como é, houve uma revolução e tal, no país, ta-ra-ra', e colocando que estavam suspensas uma série de pessoas. Ai eu fiz uma pergunta para ele: 'Oh professor, o senhor me permite uma pergunta? Porque agora é o seguinte, um novo Regime, tal, que não... cujas regras desse Regime são realmente no sentido, assim, de cercear o anseio do povo, tal-tal-tal'. Ele falou:'Não é bem assim, certo, não é bem assim' e tal... Ai, diz que depois, eu soube que ele fez comentários na sala dos professores: 'Ah, um aluno, ta-ra-ra, ta-ra-ra'... Os professores de direita falaram: 'Ah, aquele é o Cloves, aquele é o mentor intelectual da'. Porque o professor Assis, professor de português, que era um provocador, ele era dessa mesma linha que esse professor, acho que era Amir o nome do Diretor, ele disse: 'Antigamente, tinha uns alunos que mandavam na escola (e entre nós, a gente mandava mesmo), e o recado era para mim, entendeu... Tinha aquele monte, tinha o La Torre, também um professor de história, também outro facistão, entendeu... um fascistão mesmo, né... E, as provocações continuando... A gente preocupado com o desenrolar do golpe, o que que ia acontecer... o que não ia acontecer... então eu já estava faltando muito [das aulas], estava faltando bastante e tal, em função de reuniões... aquela série de boatos que surgiram pós-golpe, sabe... de que tal dia ia haver um levante dos sargentos e tal, tal... E, a gente ficava nessa espera e nunca aconteceu, entendeu... e eu já não estava mais aguentando ai provocação na escola. Ai eu abandonei, certo, abandonei a escola e nestas altura eu já era Dirigente Distrital do Partido Comunista da Saúde... Era dirigente Distrital, certo... Tinha bastante células, tinha mais ou menos, deixa eu ver... a Eui Facó, a 7 de setembro, a Deoclécio Santana, Olga Prestes, Maria Quitéria, Jorge Pulitzer... ai então, nós tínhamos por volta de umas 8 células a nível da sociedade amigos de bairro.
Cada célula tinha quantos militantes, mais ou menos?
Uma média de uns 10 militantes.
Dava, mais ou menos, uns 80 militantes na região?
Exatamente. Fora os simpatizantes, que era o pessoal que contribuía, que comprava o jornal Voz Operária e eram simpatizantes mesmo do partido. Não reuniam com o partido mas eram simpatizantes. A nível da Sociedade Amigos de Bairro, a gente, trabalhando e bastante, ainda, existiam condições... o Regime não tinha endurecido muito né, e a gente está fazendo esse trabalho. E, na região, tinha o Plenário... Plenária da Sociedade Amigos da Zona Sul, que ela se reunia uma vez por mês e congregava todas as sociedades amigos do bairro da região, tá certo, onde eram discutidos problemas da região e tal. Quem realmente introduziu, que introduziu o novo, uma nova forma... fomos nós, na Vila Moraes, fui eu praticamente, fui eu... Entendeu, que sempre estava levantando problemas relacionados com o dia-a-dia. Não só a questão do asfalto, do transporte, da luz, do calçamento, tá certo, mas comecei a levantar a questão do custo de vida, essas coisas todas, enfim.
Tornando mais político o movimento?
Exatamente. Cada mês, era convidado alguém de fora para ir nessa plenária e eram todas pessoas ligadas à prefeitura. Na época o prefeito era o Faria Lima, sempre alguém ligado a esse público, tá certo, a essa... a esse setor, tá certo, a esse setor ai e tal. E, essa plenária, ela era bastante heterogênea, tinha comunistas, tinha desde quem não era porra nenhuma e tinha fascista também...
Eles também iam nas plenárias?
 Tinha sim... Tinham fascistas também,,, Então eu já era um cara manjado lá... Quando o Cloves pedia a palavra, já sabia que vinha bomba. Tanto que, em 1967, era uma antevéspera de 1º de maio, certo era uma antevéspera de 1º de maio, eu pedia a palavra... essa plenária foi na Sociedade Amigos de São Judas Tadeu, lotado de gente rapaz... eu pedia palavra e comecei assim o meu discurso, disse: 'Olha, nós estamos as vésperas da comemoração do 1º de maio, 1º de maio esse que em muitos países é um dia de festa, mas que no Brasil, é um dia de luto. De luto por que? Pela perda da estabilidade do trabalhador'... ai, puta.. aquela ovação... 'A perda da estabilidade do trabalhador, ta... O direito de... não eleger os seus governantes, a perda de desempregos, emprego', e fui por ai afora. Puta, a plenária veio abaixo. Veio abaixo e ai votou. Foi votado né... A Plenária unanimemente... E a Ultima Hora, o jornal Ultima Hora dava uma cobertura... porque o jornalista o Cavalcante...
O senhor tem uma idéia de quantas pessoas tinham nessa plenária?
Ah, uma 300 pessoas, eu estou, inclusive, eu preciso até dar um pulo no Memorial, no Memorial não, aqui no Arquivo, no Arquivo aqui na Cruzeiro do Sul, para pegar esse jornal, que é o jornal Ultima Hora... Então, o jornal, o Cavalcante pedia o seguinte: 'Olha, eu queria fazer uma foto, para o pessoal votar de novo'. Ai, a manchete do jornal na segunda-feira foi.. Zona Sul... 'Plenária da Zona Sul defende a estabilidade'. Puta que pariu, ai veio todo o meu histórico né... 'Presidente da Sociedade Amigo de Bairro Cloves de Castro...'. Bom, Foi uma vitória, assim...entendeu... E como nós estávamos já, internamente [dentro do PCB], dentro de um processo de luta interna dentro do Partidão, do Partido Comunista, mais, politicamente mais correto falar, no Partido Comunista, alguns companheiros votaram, evidentemente, mas não gostaram, realmente não gostaram.
Os militantes que estavam presente na plenária votaram favoráveis mas não gostaram da proposta?
É lógico, não gostaram, tá certo. Não gostaram da minha... da proposta, de eu ter falado isso e tal, tal, tal. Porque achavam que isso era uma forma de colocar em risco a nossa segurança, essa coisa toda, né... E eu frisava bem. Nesse dia foi um Deputado Federal que era presidente dos trabalhadores da Telefônica, não lembro o nome dele, era um Deputado Federal, e, eu falei o seguinte: 'Queria que o Deputado fulano de tal fosse o porta-voz dos nossos anseios'... E o cara, na fala dele, falou que seria realmente, né... 'Um porta-voz junto ao Congresso', essa coisa toda né. Bom, ai o Regime endurecendo. Começou a endurecer, até que eu, no começinho de 1968, não estou mais participando dessas plenárias, entendeu...
Para não ser preso?
Não, para não... Até para não ser preso, mas também para não me expor muito mais. Nós já estávamos em vias de rachar com o PCB. Tá, nós já estávamos em vias de rachar com o PCB. Já havíamos... já havia feito os Congressos... o Congresso Municipal... Estávamos convocando o Sexto Congresso. Então, o Congresso Municipal já havia sido realizado, certo, do qual a ala Marighella ganha de lavada, certo... Nós estávamos caminhando para o Congresso Estadual, tá... que já estava.. meses após ele iria ocorrer.
Volta um pouquinho, essa coisa do PCB, como que Partido recebeu o impacto do golpe? Qual foi o impacto nos militantes?
Ah, foi... o impacto nos militantes foi o seguinte: Que nós estávamos, nós pensávamos realmente que nós estávamos preparados para resistir ao golpe.
Por que achavam isso?
Certo. Porque, por exemplo, a fala do Secretário Geral, o Luiz Carlos Prestes, uma semana antes do golpe, tá certo, era que... foi numa festa no Ginásio do Pacaembu, que era aniversário do jornal Novos Rumos e também aniversário do Partido... e ele colocou, o discurso dele foi o seguinte, que: 'Se dessa vez a reação pusesse a cabeça para fora nós a cortaríamos'. E, o golpe estava em marcha. Tá certo... então, reagimos, assim, com... entende... 'Como? Como que não aconteceu nada? Como que não foi chamada uma greve geral? Cadê o PDT, cadê os sargentos? Cadê o dispositivo militar do Jango? Entendeu... Então isso causou um puta de um mal-estar.
Tem uma leitura de que estávamos em o período pré revolucionário entre 1962-1964, o senhor acha que estava?
Não...
Isso por causa das Ligas Camponesas, a revolta dos sargentos, a greve geral de 1963...
Não, eu não acho que nós estávamos em um período pré-revolucionário, tá certo, mas que havia condições de resistir ao golpe, havia, por essas pessoas que você levantou, certo: Ligas, a CGT, né... os setores sociais organizados, né... e isso não acorreu. Quer dizer, a partir de então, já começa uma puta de uma...
E qual foi, para o senhor, o principal motivo do golpe?
E acho que foi realmente a... primeiro o confronto... a organização dos movimentos no seu conjunto, tá...
Assustou o Regime?
Não, assustou as forças reacionárias. Assustaram os caras, ou seja, as reformas de base, o voto dos analfabetos, voto aos cabos e soldados, o direito deles votarem e serem votados, tá certo, a reforma agrária, o ato de assinatura do João Goulart das terras indevolúveis... tá certo... a Lei de remessa de lucros... Quer dizer, tudo isso enfureceu a direita, tá certo, tendo como sustentáculo, tá certo, os Estados Unidos... tendo como sustentáculo os Estados Unidos. Entendeu... então, isso ai, foi realmente, as causa do golpe. Aliás, golpe esse que vinha sendo tramado desde o suicídio de Vargas, o suicídio de Vargas, a eleição de Juscelino... O governo Juscelino, houve duas tentativas de golpe... Na renúncia do Jânio, do qual esse mesmo... Você veja bem, os Ministros Militares do Jânio, são os mesmo golpistas de 1964, sabe... Então com a renúncia, porque o Jânio achava que, ele renunciava e ia para os braços... o povo o faria retornar nos braços, etc, etc, etc... e o que, na realidade, saiu pela culatra. O impedimento da posse de João Goulart, aquilo tudo foi uma tentativa de golpe... tá, só não se realizou por pressão, realmente, popular, certo. A pressão popular impediu que o golpe fosse dado. E mesmo assim, o Jango, as forças de esquerda e as aliadas, etc, tiveram que engolir a proposta de parlamentarismo. Acho que mais uma vez... o parlamentarismo não dura... acho que não durou 6 meses, né... então o volta ao presidencialismo e tal. Então, tudo isso assustava as classes dominantes, sabe... Que via em perigo os seus lucros... entendeu. E, internamente, começa a travar uma discussão intensa dentro do Partido Comunista.
Mas o PCB tinha idéia de que ia haver um golpe?
Ah, devia ter... não é possível não saber, pô! Sabe... eles acreditavam, a direção acreditava que poderia frear o golpe, mas pô, não é possível não saber pô. Não é possível não saber que o golpe estava em andamento. Não é possível pô. E depois, veja bem, em São Paulo: A marcha com deus pela família e tal, aqui em São Paulo no dia 19 de março... em São Paulo... e nos outros Estados...
Já indicavam?
Exatamente. Então não era possível não saber que estava em andamento. Na realidade, existiu a ilusão de que o dispositivo do João Goulart segurasse, entendeu... e o que não ocorreu. E com isso, começa a travar uma puta... uma intensa luta interna, que acaba chamando a convocação para o Sexto Congresso, onde a maioria da lideranças do PCB, a maioria da direção do PCB continuava realmente acreditando que a derrubada da ditadura se daria através do acerto com setores da burguesia nacional, com setores nacionalistas das Forças Armadas, essa coisa toda ai.
Então eles achavam que reverteriam o golpe negociando com esse setor?
Exatamente, tá... Participando, participando, até 1966 houve eleições...
É reverter sem luta armada? Sem enfrentamento?
Exatamente. Sem enfretamentos maiores, tá certo. O Sexto Congresso, ai, chama-se o Sexto Congresso, do qual começa um debate intenso no Brasil todo, do qual...
Nessa época, pós golpe, tinham quantos militantes no PCB?
Ah, tinha uns 4.000 militantes organizados... ou mais, tá... ou mais... As teses, as discussões pelos Estados, caminhavam realmente em crítica, certo, a não resistência ao golpe, tá, em críticas as teses que estavam sendo apresentadas, no sentido da derrubada da ditadura por outros meios. Enquanto uma outra ala, que era MAJORITÁRIA [ênfase], que era MAJORITÁRIA nesse momento, MAJORITÁRIA nos Estados, que o combate à Ditadura Militar, a derrubada da Ditadura seria através de métodos violentos.  Quer dizer, então nesse período de 1967...
A maioria da bases acha isso?
Isso ai! A maioria das direções, das bases...
As direções também?
E das direções municipais, estaduais...
O Comitê Central não?
O Comitê Central Não. Parte do Comitê Central.
Mas a minoria?
Minoria. Minoria, a minoria. Bom, isso... convocado os congressos... os municipais, as Teses lideradas por Prestes estavam sendo... foram... acho que no Brasil todo, unânime, foram derrotadas, tá certo...
Teses da via pacífica?
Exatamente. Ali foram convocados os Estaduais, tá certo, também sofreu derrotas. No estadual você tirava delegados para o Sexto Congresso. Então, nós tínhamos, nos tínhamos maioria de delegados. Nós tínhamos a maioria de delegados. Então, o que que começa, começa um processo de expurgo.
Como não conseguia ganhar nos votos, começou a expulsar?
Expulsar... Primeiro começa com Carlos Marighella, que vai ao... à Conferência... a OLAS, né... Vai à OLAS - Conferência Latino Americana em Cuba, da qual o Partido não mandou nenhum representante, porque não concordava, certo. Mas quando o Marighella vai e faz um pronunciamento, eles mandam um emissário dizendo que Marighella não estava lá representando o Partido Comunista. Marighella dá o troco, fala que de fato não estava, que o Partido Comunista deixou de ser um partido revolucionário, o partido que quer, que queria fazer a revolução e tal e tal. Nisso o Marighella já é destituído, sabe... da Comissão Executiva, certo... é destituído da Comissão Executiva. Outros companheiros, que também...do Comitê Central, também são afastados, como o Câmara Ferreira, Mario Alves, Apolônio de Carvalho, o Jacob Gorender, enfim... centenas... algumas centenas de companheiros, assim, 'de peso' né... foram afastados... caçando os mandatos dos delegados... Convoca o Sexto Congresso, mesmo assim, muitos dos delegados não haviam sido caçados, mas, por outro lado, não recebem o ponto [de encontro] para esse congresso... quer dizer, ai já não tem saída. E ai, o que faz a 'Ala Marighella?
O ponto que o senhor fala é o custeio da viagem?
Não, o ponto é o local para te pegar, onde vai pegar o delegado e levar para o congresso.
Então, isso era um boicote mesmo?
É claro que era. Era um boicote mesmo. Pois é, então, entende... Aqui em São Paulo cria-se o Agrupamento Comunista de São Paulo, que mais tarde originou a Ação Libertadora Nacional - ALN. Outros setores da dissidência, Mario Alves, Apolônio de Carvalho, Jacob Gorender, eles concordavam com a via armada, porém, colocavam uma questão: Tinha que ter um partido. Enquanto, a ALN não, o Marighella dizia o seguinte, que: 'Não se poderia repetir os erros do passado', ou seja, ter um partido, tá certo, uma organização pesada, com seus comitês centrais, seus comitês municipais, estaduais, destritais, etc, etc. era um peso muito grande, além de custo também, ta certo. Teria que ser um pequeno agrupamento. Um pequeno agrupamento que organizasse a revolução. E 'o partido iria surgir no frigir dos ovos'. Enquanto a ala, os dissidentes que também saíram do Partido, Apolônio, Mario Alves, Jacob Gorender, achavam que tinha um partido para dirigir a revolução... embora houvesse concorrência nas ações, na critica ao PC, na forma da derrubada, etc., tá... eles queriam um partido, então fundou-se o PCB-R - Partido Comunista Revolucionário. Certo... que participaram de muitas ações junto com os grupos... com a ALN...
E ALN e o PCB-R serão os maiores dissidentes, os que vão ter mais militantes? Ou não?
 Sim. A ALN era maior...
Era maior que o PCB-R?
Muito maior. Muito maior.
Porque o Marighella era conhecido, era figura pública?
Não, os outros, o Apolônio de Carvalho também era... O Apolônio era o herói de guerra, pô, participou de duas guerras civis, pô. O Jacob Gorender, o Mario Alves, o grande intelectual comunista pô, o Jacob Gorender... né... Pois bem, ai, nesse período, começa a surgir também outros  grupos armados, tá, a VPR...
Mas quando que a ALN decide que tem que ser armado? Já nessa divisão?
Em 1968, já... 
Já nasce com este pé na luta armada?
Já nasce, já nasce... em 1968 começa a surgir, sem identificar, as primeiras ações armadas de expropriação... expropriação de bancos, de armas, tá certo... de armas... sem identificar... entendeu, começa a surgir... que se intensifica em 1968... No ano já de 1968 começa a se intensificar. Tanto que ai vem o AI5.
O senhor participou da Marcha dos 100 mil?
A marcha dos 100 mil, isso foi no Rio de Janeiro, não fui.
O PCB participou?
Participou, claro, participou. As correntes também participaram, certo... foi lá no Rio de Janeiro...
Mas aqui em São Paulo também teve, não? Sei que em Osasco teve...
Teve, teve as marchas, lideradas mais por estudantes, não foi como no Rio... que foi...
E as greves de Minas Gerais/Contagem, impactaram aqui?
Impactou, impactou sim, Tanto Osasco, como a de Mina Gerais...
Vocês tinham um balanço sobre a greve de Minas e a Greve de Osasco?
Ah sim, oh, um balanço positivo.
Vocês não acharam que foi uma ultra-esquerdada?
De jeito nenhum. De jeito nenhum...
Porque um setor do PCB achou, né...
Um setor do PC achou, mas nós não estávamos mais no PC pô... Nós não estávamos mais no PC... Nós, por exemplo, a gente já organizou o 1º de maio de 1968... participou Osasco, todo...
O senhor lembra como foi esse 1º de maio?
Lembro... Me lembro o seguinte... de uma conversa que eu tive com o Câmara Ferreira, uns 2 meses antes e falava para ele:' Toledo [codinome de C. F.], os pelegos estão convocando o 1º de maio para a Praça da Sé, certo, eu acho que nós devíamos estar participando dessa manifestação, com toda nossa força e tal'. Ele olhava para mim assim, né, [risos].
Ele tinha quantos anos?
O Toledo? O Toledo tinha... puts, ele morreu muito novo...  ele tinha 56 anos pô [na data da morte], ele devia ter uns 54 por ai... 54 anos... Ai ele olhava para mim assim, né: 'ah não, tá!'. Mas, é claro que aquilo já estava sendo gestado né... E ai a gente começa a convocação para o 1º de maio, a gente já ia... fomos para as portas de fábricas chamando para o 1º de maio, com dispositivo armado, já panfletando com dispositivo armado e tal.
Então, a ALN não eram um grupo fechado e isolado do movimento operário?
Não, lógico que não, lógico que não... Osasco fazendo a mesma coisa, tá. Na grande São Paulo também, tá, convocando o povo para o 1º de maio, certo... Bom, ai a gente entra na Praça da Sé e o palanque montado, certo, você via uma puta cobertura da mídia, entendeu... cobertura da mídia, do lado direito, a câmera de televisão, do lado esquerdo quero dizer, onde tinha o Cine-Santa Helena e tal... do lado direito... do lado esquerdo de quem está virado para a Catedral, em frente a Catedral. Ai começa as falações, quando começa as falações...
Quem compunha o palanque, o senhor se lembra? Tinha o cara dos bancários...
O Brandão...
O Brandão era do PCB?
O Brandão era do PC... O Joaquinzão...
O Joaquinzão era próximo do PC nessa época?
Não. Nunca foi próximo não pô, ele era pelego, pô... Nunca foi próximo não.
Mas foi próximo quando ganhou o sindicato nos anos 1980, não?
Setores, setores, alguns setores do Partidão estavam inclusive na Diretoria, pô...
Mas isso já nos 1980, no 1968 não?
No 1968 não. De jeito nenhum...
Não tinha nenhuma relação?
De jeito nenhum.
Ai estava o Brandão pelo Sindicato dos Bancários...
Os bancário, o Joaquinzão...
Dizem que o Geraldo Vandré ia tocar nesse dia ai, é verdade?
O Vandré estava sim!
Já estava em cima do Palco?
Estava, estava o Vandré, o Abreu Sodré, o governador... 
Que levou a pedrada, o ovo...
Foi uma pedrada... Foi pedra, tá... E outros dirigentes sindicais ai que eu não... no momento assim não lembro, certo.... Ai, corta-se os... tem um grupo já, que chegou lá, comandado pelo Marquito, Marquito foi o primeiro companheiro morto... do primeiro GTA - Grupo Tático Armado, da ALN, comandado por ele, o pessoal vai lá e corta o som, e começa, começa vaia, cortou o som do microfone, ai começa as vais, o pessoal indo para cima, tá certo, indo para cima, uns caras correndo, o Abreu Sodré subindo a escada [da catedral da Sé] de gatinho [engatinhando], porque ele caiu...aonde ele toma uma pedrada... para dentro da catedral... Ai tomamos o palanque, ficamos, acho... não ficamos nem 10 minutos, falamos e tal, e, nos dirigimos á Praça da República...
E tinham quantas pessoas neste ato, o senhor tem uma idéia?
Calculo que tinha umas 10 mil pessoas. 10 mil pessoas...
[relato a Cloves sobre o grupo da VPR que, como afirma Espinosa em entrevista que nos concedeu, havia um ninho de metralhadora disposto em cima de um dos prédios, preparado para um enfrentamento armado contra as forças da Ditadura - ao que Cloves responde que não sabia]
Ai, nós nos dirigimos à Praça da República, cento, passando ali pelo Vale do Anhangabaú, Avenida São João, ali né, ai cortamos a Avenida São João... ali tinha, na Conselheiro Brotero, tinha o Quartel da PE ali, da PE - Policia Especial... só que não eram eles que estavam lá... quem estavam la na rua assim... na frente... é, na rua assim, entende, acho que para impedir de passar por ali... porque tinha um grupo [de militantes] que gritava...  Era uma cara de mais de 2... mais de 2 metros de altura, que era a Polícia Marítima, com aqueles cassetetes deste tamanho [faz gesto de comprimento]... a gente: 'Não, o que é isso, vão fazer enfrentamento com os caras, porra, vamos passar, né'... e passamos e fomos para a Praça da República, onde houve várias falações e tal, tal, tal... Depois dali se dispersou. Ai começa realmente o processo de endurecimento do regime. O processo de endurecimento do regime.
E qual foi a importância do MIA teve na organização desse 1968?
Ele teve a sua importância, teve a sua importância... E, ali nós nos dispersamos, ta, e foi incendiado o palanque na Sé, ai, depois que a gente acabou de falar e tal, entendeu, ai fomos para a Praça da República, ai uma meia hora de falação e dispersou. Então, não houve confronto, tá certo, embora houve... quem ficou... ficou um grupo de pessoas na Praça da Sé [risos], porque acabou, algumas pessoas acabaram sendo presas na Sé, mas por besteira... não gente de... entendeu... Ai começa realmente todo um processo organizativo... Ou melhor, começa não, dá continuidade ao processo organizativo a nível da organização na fábrica, certo, do qual Osasco tem, assim, uma história muito boa, né, e São Paulo... E intensifica ai as ações armadas, cria-se, já surge a VPR, mais tarde tem o racha da VPR e vem a Var-Palmares, sabe... pequenas organizações armadas, tá certo... pequenas organizações que surgem também, como a REDE...
Aqui em São Paulo quais eram as mais importantes?
A ALN.
As 3 mais importantes eram quais?
a BR, a Var-Palmares né... aliás a VPR e depois eles racham...
A BR era o que?
BR é o PCB-R, a gente abrevia... Ai depois surge pequenos agrupamentos militares, agrupamentos que também optaram pela luta armada. A REDE mais tarde se dissolve na ALN... que era o Bacuri.
O Bacuri veio do PCB?
Não, o Bacuri não veio não. O Bacuri acho que chegou a estar na VAR-Palmares, na VPR, chegou estar na VPR né... Ai deu o racha do PCdoB, tem a Ala-Vermelha... Mais tarde a Ala Vermelha também tem um racha, que é o Movimento Tiradentes, que era favorável a luta armada... entende... E o endurecimento do Regime... Ai veio o assassinato de Marighella, que foi um baque muito grande...
Em 1969...
No final de 1969, 4 de novembro de 1969 e foi um baque muito grande, não só para a ALN, mas para todas as organizações revolucionárias...
Nesse período de 1968, até a morte de Marighella, quais ações mais importantes que o senhor participou?
Ah, eu participei de várias ações, porque até o momento, por exemplo, até a época que eu fui preso, embora eu já estava em vias de cair na clandestinidade, pela proximidade das quedas, tá certo, e a vulnerabilidade minha também, estava um cerco muito grande em torno de mim, entendeu. Mas estava muito voltado para o, como é que se diz, o... organizando o... dentro de uns grupos de mobilidade tática... entendeu... e participava de algumas ações, né, como ações de propaganda em porta de fábricas, ações armadas, ações... Nós fizemos uma... foi feita em toda São Paulo, um dia de solidariedade ao Vietnã, houve uma ofensiva vietnamita, tá certo... então, em São Paulo, a ALN organizou ações em toda cidade de São Paulo, em toda cidade de São Paulo, levantando, primeiramente levantava casas de, casa de... residências de diretores de empresas americanas... do qual, a gente ligava antes, confirmava se o cidadão morava lá e confirmando, sabe... a gente... Eu por exemplo, eu participei de uma aqui na Avenida...
... psicológico, as lâmpadas cheias de pixe, uma meia dúzia de lâmpadas cheias de pixe, então a gente atirava na fachada e dava aquele bom... [faz som de estouro] e no fio de alta tensão, jogamos a bandeirinha do vietcong, e, ao entorno da casa, do bairro, das casas, a gente panfletou o porque nós estávamos fazendo isso e ao final, ao final da ação, dispensava o carro né, e, por exemplo: então, se a ação foi feita, um giz ou um traço vertical, se não foi, um traço horizontal. E em seguida disso, você ligar para o jornal Notícias... Diário de Notícias, então, devia ser um jornalista ligado a gente, dizia: 'Olha, eu sou morador da Rua 'X', onde eu fiz a ação, 'estou ligando, houve um atentado...', certo, isso deve ter sido publicado, pequenas notinhas na imprensa e tal, tal, [...] em vários locais. E também participava de, assim, de ações... participei de várias ações, se bem que não cheguei a participar de grandes ações... entendeu... tá certo... Tudo isso... em torno ai... da gente....
Esse ato em solidariedade ao vietncongs foi em que ano?
Em 1968. Então, como eu disse, então... não tinha, até então, participado de grandes ações, tá certo, porque eu ainda estava 'legal', certo, e com a responsabilidade de você estar ajudando na montagem da infra-estrutura, certo...
Então, o senhor não chegou a partcipar de ações armada junto com o Marighella?
Não. Nós íamos, logo no comecinho de 1968, a gente ia participa, inclusive, os caras falam que a ALN não tinha operário, não é verdade, [eles] iam participar, com a participação de uns 4, 5 operários. Acho que seria, talvez a primeira ação, tá certo, ai, eu não sei o que aconteceu, furou... ai nós saímos e tal, ba, ba, ba... não sabemos porque, não nos falaram o porque, furou, a gente voltou. Seria uma ação, estava todo mundo bem armado.
Em 1969, antes da morte de Marighella, quantos militantes tinha a ALN?
Não dá para falar no geral, porque... Pô, em São Paulo, militantes...talvez chegasse a ter uns, em torno de uns 100. Uns 100 militantes, fora os apoios né... porque tem os apoios...
A periferia política...
O pessoal que sediam a casa, sedia carro, certo... que eram os simpatizantes e tinham uma contribuição, né...
E qual era o programa da ALN?
Era, realmente, derrubar a ditadura. Certo... a derrubada da ditadura, certo, de forma armada, certo... e, depois, mais tarde, constitui um governo que nos levasse realmente ao... nos levasse a avançar tá... rumo ao socialismo.
Mas seria implantar um governo de esquerda, não seria implantar o socialismo de imediato. Seria?
Não. De jeito nenhum
A ALN pretendia construir um partido?
Ainda não...
Porque a ALN não era um partido...
Lógico que não... A ALN não era um partido, tá certo. O partido ia ser constituído no processo revolucionário, tá certo.
No embate com a ditadura...
Exatamente. Ai construiria. Ai surgiria... Ia surgir o partido. Certo, um partido que realmente nos levasse ao socialismo, à construção do socialismo. Mas, o caráter da revolução não era assim, menos acontecer como Cuba, certo... Então, ai o Fidel Castro imediatamente declara-se que a revolução, ta, ta, ta.
Então vocês pensavam algo mais parecido com o processo de Cuba?
Não, porque Cuba se colocou como uma revolução socialista, derrubou e tal...
Ah, vocês queriam fazer diferente?
Era todo um processo...
Mas focado no imediato, a derrubada da ditadura?
Exatamente.
E depois da morte do Marighella, como o senhor, pessoalmente, recebeu a noticias, acreditou nela?
Acreditei, acreditei entendeu... Aliás, eu era pra ter sido preso nesse dia, no dia 4 de novembro [de 1969], certo... então, eu ia para um aparelho central nosso, que era aqui na Cecunda de Pinhal, atravessa a Brigadeiro Luiz Antônio, onde tinha um companheiro lá, um zelador do prédio ali... era um aparelho central da gente, e, ele morava assim, no primeiro... no térreo assim, né... e ai, estava sempre abertas as janelas e tal... e eu me dirigia para lá, para encontrar uma pessoas lá, ai, olhei, a janela estava fechada, falei êpa, tem boi na linha, tem algum problema, ai, passei para a calçada do lado de cá, fiquei observando... Ai eu vi o porteiro, o porteirinho, que era amigo, tá certo, pessoa de confiança do zelador, e nossa né, ai, fui ao encontro dele, e, ele sorrindo e tal, ai, eu ia entrar pela porta dos fundos, porque eu era amigo, além de ser companheiro, eu era amigo também do pessoal da família né...  Ai, ele botou o braço aqui [no ombro] e falou: 'vai embora, vai embora porque o Genésio foi preso e o DOPS está ai dentro. Eu, friamente, saí, atravessei do lado de lá e fiquei fazendo sinal para o cara 'velho, eu quero falar com você', porque ali era um aparelho central, que vinha muita gente e ele conhecia, tá certo, acho que deu o horário de almoço do cara, ele veio atrás de mim, certo...
Você ficou esperando?
Eu fiquei... Não, eu fiquei andando, ele passando, falando, falei: 'O que aconteceu?', ele falou: 'O Genésio foi preso'... 'Alguém mais foi preso ai?'... 'foi, um Cavalcante', era um fuzileiro naval, um Sargento, fuzileiro naval do MR8... Ai, eu falei para ele o seguinte: 'Cara, não fique lá dentro, não fique sentado lá dentro, você conhece os companheiros, fique na porta, tá certo, ai você... alguém... você vai ao encontro certo, e fala, olha, vai embora, porque eu vou sair daqui e vou desativar isso aqui', entendeu. Até porque os caras, né pô, se o DOPS, o DOPS ainda não tinha... acho que não sacou...se eles tivesse posto um cara na portaria, pegava, me pegava, pegava outras pessoas, tá... Ai eu sai daquele.... saí de lá, ai fui em vários locais, tá, vários locais, sabe, falar: 'Olha, caiu o aparelho, caiu o parelho, caiu o aparelho. Se souber de mais gente avisa que o aparelho caiu e que o Genésio foi preso e tal, tal'... E com isso, com certeza, eu impedi que muitos companheiros fosse cair naquele dia...
Qual era o nome do Genésio?
Genésio Homem de Oliveira, grande figura, esse morreu... morreu de morte natural né... Bom, ai, o que eu faço... naquele clima né, tal... ai eu vou para casa... A minha vó, ela já estava um pouco meio esclerosada, mas ela falou o seguinte: 'Olha, veio um homem te procurar', entendeu... e eu falei: 'Como é que ele era vó?', 'Era um mulato, camisa vermelha, ele já veio aqui'. Ai eu falei: 'Caralho, que será? Será que era o Marighella ou o Tião?', certo, ai fiquei preocupado... Dai eu falei: 'Pelo Genésio não. Eu podia dormir na minha casa tranquilamente que não abriria de jeito nenhum, a minha mulher tinha ido para a casa da mãe dela, tá certo, tinha ido para a casa da mãe dela. ai eu fiquei um pouquinho no ponto de ônibus pensando, pensando, 'o que que eu vou fazer?'. Ai eu falei 'Vou até a casa da minha sogra'. Ai cheguei lá, todo mundo preocupado, já sabia da queda o Genésio, tal... Ai tava passando o jogo, Santos e Corinthians, ai eu já tava tudo... 'sair daqui vou dormir na casa de uma pessoa da família lá do... lá em... lá na Vila Mariana... Vila Medeiros, ai de repente interrompe[ a transmissão do jogo]: 'acaba de ser assassinado..., de ser morto (não falaram assassinado) o líder comunista Carlos Marighella', falei puta que pariu!'... Ai, tudo bem... vou para, atravesso toda a cidade né, vou para lá, vou para a cada dessa senhora ai, que é amiga da gente, da família, fico lá uns dois dias, ai vou direto para o meu trabalho, não tinha acontecido nada até então e a gente começa o processo de retomada das coisas, retomando ai e tal, o Câmara Ferreira estava fora, depois do sequestro do Embaixador americano, ele saiu né... saiu, foi cumprir umas tarefas fora e tal, e, a gente tentando retomar as ações e tal, retomar os contatos, certo... Ai veio o dezembro de 1969...
O senhor viu este ultimo filme sobre o Mariguella?
Vi, eu vi...
Gostou?
Uh... um pouquinho...
Podia ser melhor?
Poderia ter sido melhor, poderia ter sido melhor. Eu até vendi todos, não tem mais nenhum aqui. Preciso até pedir...
O que o senhor achou ruim no filme?
Ah, eu achei que podia ser mais... como e é que se diz, colocar mais a figura, assim, enaltecer mais a figura, 'quem era Carlos Marighella' e tal, uma das coisas... Entendeu... podia ser melhor... Pois é...
Ai, no dia 14 de dezembro [de 1969], na noite anterior, se eu não me engano, numa segunda-feira, porra, vou uma noite terrível né... que eu... uma subida e um descida né, eu senti assim... senti o carro subi, descer e não subir... falei, pô é agora né... isso na minha casa, dormia com o resolver aqui e tal... Então estava te dizendo... de campa... porque eu não dormia... porque eu não dormi essa noite toda, do dia 13 para 14, preocupado, você sentia o carro desce e não subir, você fala pô, é agora e tal... então foi aquela tensão do cassete e tal... Ai, pego o ônibus e vou trabalhar. Ai pensei se eu ia armado ou não e tal...
O senhor ainda estava trabalhando na prefeitura?
No Estado. Ai, eu optei por não ir armado, porque estava havendo batida em ônibus e tal, ai volto, deixo o revolver e vou para o meu trabalho, bom, ficou lá... Não tinha lido o jornal... ai quando eu abro o jornal da tarde, aliás, abro não, a manchete do jornal, 'Preso um técnico em explosivos, alemão, Hans  Rodolf Man, falei, puta que o pariu... esse Hans militou comigo no PCB, estava na ALN, me conhecia, sabia aonde eu morava, certo, sabia onde eu morava, depois que ele voltou de Cuba tivemos contatos, ai, duas páginas do jornal, que ele abre tudo... todo o esquema de saída, de entrada, tá certo, de entrada de companheiros e tal, tal, tal... falou tudo! Tudo, tudo, tudo! Eu falei; 'Caralho, tô fodido', ai eu fiquei preocupado. Legal... ai [no trabalho], o pessoal indo almoçar, ai eu chamo uma amiga minha, que não tinha nada com nada, aliás era muito direitosa, mas era minha amiga, falei: 'Beatriz, você conhece este Hans aqui, lembra dele? Ela falou: 'lembro e tal'... 'Como você está vendo, o cara foi preso e eu estou correndo risco, eu vou sair para almoçar e não volto mais, não volto mais... Você... vou fazer um negócio com você, eu vou te ligar, vou falar que eu sou o Paulo, ai você vai simplesmente me dizer: 'oh, meu amigo', eu vou te dizer: 'Alguém me procurou?', Você vai dizer: 'Não e tal', só isso. Basta isso. Eu não vou voltar mais', ela ficou preocupada e tal... Legal, a única pessoa com quem eu falei, né.. Ai eu falei: 'Eu vou dar mais um tempo aqui, para ir almoçar né, almoçar e cair no mundo... Ai, nisso, eu ouço no corredor, um cara perguntando: 'Oh, o Cloves de Castro trabalha aqui?'... coitado do rapaz, um porteirinho né véi, 'Não, trabalha sim, só não sei se ele está ai não, acho que ele foi almoçar, deixa eu ver'... Ele abriu a porta e tal, ai eu ouvi, saiu, de um balcão assim, ai ele falou: 'Ah, ele está aqui sim!', coitado do cara né... Ai quando eu vi, dois caras entrando. Falei: 'Ih caralho, tô preso'. Ai ele se identificou:
'Você é fulano?'
Falei 'Sou'.
'Então avisa o seu chefe que você vai sair com a gente pra fazer um'...
Falei: 'Ta bom'.
Ai eu entre na minha sala, falei: 'h caralho, se eu tivesse armado agora, eu voltava e metia bala nesses caras, vei.. [risos]... ai falei, agora fodeu né... Ai eu desci... Ah sim... ai eu entrei em uma sala assim [faz gesto de lateral], entrei numa outra, entre em outra, no fundo assim... ali, este prédio da Secretaria de Aviação e Obras Públicas, na Riachuelo, tem o prédio novo, aliás, o prédio velho e o prédio novo, certo... e você vai de um para o outro... ai tinha uma sala, assim, do Césio, desenhista, todo mundo sabia que eu era comunista né... Não tinha como não saber... desde antes do golpe... Ai eu falei: 'Césio, abre aquela porta para mim, que dá para o prédio novo, porque o DOPS está atrás de mim'. Ele tinha a chave, ele abriu. Ai, ele abriu, ai eu entro, passo aqui, tal, tal, tal... tinha o arquivo técnico aqui {desenha em um papel sobre a mesa] e vou para o prédio velho de novo. Ai, pá... atrás dos arquivos e tal, tal, aquele silêncio... Ai eu abro a porta, assim, os caras: 'Para ai!' e eu falei: 'Parai o caralho!', falei bem assim: 'Para ai o caralho!' e bati a porta, e, escada né... e o cara atirou, bom, não acertou...
Não te certou?
Não. Se acertasse eu estava... certo.. desci 8 andares correndo, gritando e correndo: 'Oh o DOPS, o DOPS, o DOPS, aquela zoeira, ai, quando chega lá no térreo, na Rua Riachuelo, eu fiquei indeciso, se saia pela esquerda ou pela direita, a ideologia falou mais alto, sai pela esquerda, me fodi... Se eu saísse pela direita, eu caia na Quintino Bocaiuva, dificilmente os caras iam me pegar ali, porque até eles chegarem lá embaixo véi, eu entrava no meio do povo lá, ninguém me pegava mais. Eu saí pela esquerda, ai, você entra na Brigadeiro aqui, ai tem um pátio, nesse pátio tem uma saída que dá para a Vinte três de maio... ai eu desci uma escadaria e sai na Vinte três de maio, eu me lembro que eu tinha 5 cruzeiros no bolso, porque a minha idéia era dar tempo de eu ir em casa, tirar algumas coisas e falar para a minha mulher: 'Tira essas coisas, vai embora porque'... Mas, ao chegar na Vinte e três de maio, o transito é muito intenso, eu demorei muito para atravessar. Ai que dei tempo também para os caras...
O senhor estava a pé ainda...
A pé, claro, a pé...Quer dizer, ai eu caio em um beco sem saída, estavam construindo a passarela ali da Rua Turgo Nascimento, fiquei encurralado num... no estacionamento... Ai os caras chegam, três caras... Começo apanhar ali... Ai os caras me levam para a Riachuelo, ai tem um taxi DKV, bem antigo... ai quando eu olho assim, o Hans, dentro do carro... 'Vocês já se conhecem né?!'... Ai os caras me algemaram junto com ele... Ai nisso, alguns amigos, companheiros de trabalho vinham vindo do almoço: 'Cloves, para onde você vai?', 'Eu vou para o DOPS!' e o cara metiam a mão em mim... Mas foi bom todo esse estrago que eu fiz, né... Ai eu chego, fui para Operação Bandeirantes,  certo... fui para Operação Bandeirantes, onde os homens battem... tomei um pau do caralho...
Onde ficava a Operação Bandeirantes?
Ali na Rua Tutóia, na Tutóia... Ai, um puta de um pau, porque os caras ficaram putos e o cara ficou mais puta ainda porque deve ter tomado uma enrabada por eu quase ter escapado... Ai os caras chegaram para mim e: 'Oh Castro, a gente falou que era polícia quando nós chegamos para te pegar?', falei: 'Não precisava falar...', falei mesmo assim, você não precisava falar, eu desconfiei... ah... e pau, pau... só que eu estava algemado com o Hans, os caras me chutavam e o Hans caia junto, e pau, pau... Ai veio o Capitão Mauricio gritando: 'Pára, pára, vocês vão quebrar o braço do alemão, o alemão está colaborando com a gente'... Porra, aquilo foi um banho de água fria... falei 'Porra!', o que eu pensei num primeiro momento, que o Hans me abriu [entregou], num puta de um pau... Ai, aquilo ali foi um banho de água fria... falei: 'Ih caralho'. Ai eles desalgemaram e do cara, ai eu vou para o pau...Vou pro pau, interrogatório com o Albernas, Manoel Albernas era um canalha, e isso ai foi até o final da tarde.
Que dia que era?
14 de dezembro... Ai me botam numa solitária, numa cela forte, porque eu era periculoso, fiquei lá numa solitária e você sabe, que o processo lá, eram 3 equipes, era pau 24 horas, e foi muito cassete, muito pau, muito, fiquei 20 e poucos dias lá no DOI-CODI, no OBAM, depois disso eu fui para o DOPS, do DOPS, na primeira semana não aconteceu nada...
Mas já tinha passado por tudo...
Sim... Cadeira do dragão, choque, porrada, 'telefone', maquininha de choque, pau de arara, enfim, tudo que eu tinha direito... serviço completo... Vou para o DOPS, do DOPS eu falei porra.. Era ir para o purgatório, sair do inferno e fui para o purgatório  né, a primeira semana não aconteceu nada... Ai eu pensei que eu não ia mais ser torturado e tal, entendeu... Na segunda semana eu subo para interrogatório, ai eu... bom na primeira semana não aconteceu nada, a segunda semana eu subo para interrogatório... desço do interrogatório, ai eu falei: 'Bom, acho que deu para enganar os caras'.
O DOPS ali na Luz...
É... na General Osório, onde é hoje o Memorial da Resistência, bom... ai, depois dessa semana ai, passo mais uma semana, ai um dia, eu já sabia né... o Genésio ficava fora né... porque lá não se fumava dentro da sela e tal... então, sempre tinha um companheiro nosso autorizado para ficar ascendendo os cigarros, entende... ascender o cigarro era o 'lob' só, mais para estar passando recado e tal: 'Olha, avisa o fulano lá, entendeu, que eu não falei nada dele, se ele for para o interrogatório, não tem nada, está limpo", tal, e ticava essa troca ali... ele ficava fazendo essas coisas. ai ele já sabia: 'Cloves, você vai subir'. Ai eu falei: 'caralho', ai já deu aquele frio na barriga né... Ai veio para a carceragem... os caras chegaram na minha cela antes né: 'Cloves de Castro, se aprontar, subir!'. Ai, eu pondo o sapato e tal 'Puta que pariu né', ai entra na carceragem, um policial lá...     Quando eu ponho o pé fora da carceragem, o cara fala: 'Seu filho da puta, você sabe pra onde você vai, né!', falei: 'E caralho'... ai o elevador não parou no segundo andar, aonde eu fui para o interrogatório, no intermediário lá né... ai entrei numa sala, tinha uns 10 policiais, e o Genésio pendurado, o Genésio já estava lá pendurado cara! Entendeu... a tinha uns 10 caras... e tal e pá... entendeu... 'Genésio, você conhece?', 'Não, o Genésio é meu amigo, não tem nada haver!' O Genésio é meu compadre... porque eu fiz um serviço lá nos prédios lá, eu e meu sogro, um serviço de pedreiro eu fui ajudar me sogro lá.. e ficamos nisso, não tem nada haver... nada, nada, nada e o pau... Ai tiram o Genésio do pau... Ai fui eu né, pá e pá, e pau daqui, pau dali, os caras me chutando... quebrei o relógio de um cara... ele me deu uma porrada, eu segurei, quebrou o relógio dele, ele ficou puto... falou:'Tem dinheiro seu na carceragem?Você vai pagar o relógio seu filho da puta'.
E o Genésio?
O Genésio desceu... Ai eu falei: "Caralho, eu vou cair, né, porque senão os caras vão me encher de porrada aqui... Mas, o cara me deu uma no fígado... ele vibrava: "Ah, eu acertei, eu acertei!!!'...Ai eu cai...guardando o saco... e pontapé, pontapé... enfim... eu desci... eu tinha subido as 2 horas da tarde, desci era onze e meia da noite... todo arrebentado né... Todo arrebentado, todo arrebentado né... Bom, minha costela moeu, trincou costela, ai eu vou.... passa mais um período...  mais uma semana, então a gente vai para o presídio de Tiradentes... em Tiradentes, fico incomunicável, sem receber vista ainda..
Desde a prisão até o Tiradentes, deu quanto tempo?
Um mês e meio, por ai... Um mês e meio de tortura... Ai eu vou para o Presídio Tiradentes, fico incomunicável, até sair... quando eu tive a prisão preventiva decretada, ai quebrou a incomunicabilidade, né, ai, eu acho que no final de fevereiro, começo de março, por ai... ai eu recebo visita né... as nossas visitas lá no pavilhão fechado, de sábado... ai eu recebo a primeira visita deste período todo, quase 3 meses né... Então, o presídio Tiradentes, tinha dois pavilhões: o pavilhão 1, só estavam, assim, os presos de classe média e o pavilhão 2, a gente ficava no primeiro andar, em baixo era o Corró, ficava os presos que passavam pela Corregedoria né... em condições precárias, cero... você fica em 8, 10 pessoas numa cela, uns 2 beliches, o pessoal dormindo no chão, só com colchão, entendeu... Num primeiro momento a gente comia a comida de lá, até que a gente se organiza e começa a fazer nossa comida, a família trazia as coisas e a gente faia, fazia a comida, aproveitava o que dava para aproveitar de lá né... e o resto a gente fazia e tal... Quer dizer, chegava, as vezes a gente ficava a semana todinha sem ir para o sol, muita manifestação, ai cortava as visitas... Bom, até que saiu o sequestro do embaixador... nesse período sai o sequestro do embaixador... do Cônsul japonês, depois sai com o sequestro do Embaixador alemão, do qual... do presídio sai um monte de companheiros... Como eu disse, as condições da cela, do Pavilhão 1, eram diferentes. Certo... as celas eram abertas, o pessoal circulava de uma cela para outra até um determinado horário da noite sem problema nenhum, sabe. então, tinha a cela 7, a sela 7 era enorme, tão enorme que chegava de domingo, de domingo o pessoal afastava as beliches, tinha, mais ou menos, uns 60 presos ai, entendeu... afastava os beliches, jogava futebol... a gente jogava futebol e tal... Ai saiu muita gente, ai o pessoal de lá, me pediu... pediu para me transferirem para lá. Tá certo, e essas transferências sempre tem a compensação... Então, o pessoal da minha organização disse: 'Traz o Cloves para cá', né... até para agente conversar, uma espécie de 'prestação de contas', né, o que aconteceu, como é que foi... como é que estão as coisas ai fora, as coisas que você tem conhecimento, se você tem 'guarda': armas essas coisas, isso caiu, não caiu, está aberto, não está aberto, enfim né... Ai eu fui para lá... entende... tinham condições melhores e tal... entendeu...mas durou pouco...
Em agosto, começa... depois da greve de fome do DGiorgio.... o Frei... ai começa um processo de tirar a gente de lá. Então, o primeiro grupo, foi um grupo para o Carandiru, um grupo de 5. Quinze dias depois, foi um grupo de 15... do qual... eu sou um dos presos que vai para o Carandiru... os caras alegavam que eram os cara periculosos né... Fui para o Carandiru... o Carandiru era fodido né véi...
O senhor foi em agosto?
É, em agosto de 1970... ai vem... ai, quando eu cheguei naquela porra de cimento armado, ai eu falei: 'Puta que pariu, agora eu tô preso', certo... ai eu tô preso. Você passa por um processo do cassete, de cortar o cabelo... bota a roupa de lá, entendeu... Ai vai para a cela né... Nós estávamos no pavilhão 8, no quinto andar do pavilhão 8 né... Nesse quinto andar tinham os presos políticos e os presos da Segurança Nacional que não eram políticos, assaltantes de banco, que na época eram inclusos na Lei de Segurança... Então era uma cela individual, toda disciplina lé da cadeia, a comida era de lá, horrorosa, o sol, assim, precária tomada de sol... um esquema do caralho.
E, no primeiros dias, assim, a gente vendo como que é que a gente ia se organizar dentro daquele esquemão, daquele cadeião lá né... e continuamos o trabalho que a gente fazia, manual, trabalho manual para passar o tempo... Lá no Tiradentes a gente tinha uma farta biblioteca, uma boa biblioteca marxista e tal.. Pra lá não, como a gente já tinha informações que não passava... na revista... a gente não levou... Levou pouca coisa e tal... Mas a gente continuou e começamos fazer um grupo, fazer um estudo, fazer um curso de topografia de campanha, tinha o Lobão que era geógrafo, geólogo, sabe... organizou um curso de topografia de campanha, desenhando, com desenho e tal.. e o curso caiu... Então, por exemplo, quem trabalhava na ala lá, eram presos comuns...
E esses cursos eram para que?
O curso era para a guerrilha né... para guerrilha... você vai para o mato, você precisa aprende a conviver com essa realidade né... como se localizar, entendeu... como se localizar... como... essa coisa toda né... E tinha o Alfredo, era um armeiro, esse curso a gente já tinha feito na sela, de 'armas', tá certo, as armas mais modernas, armamento estrangeiros, a metralhadora brasileira, a metralhadora internacional, como montar-la, poxa, os caras... era muito técnico nesse negócio mesmo né... desenhava as peças direitinho e tal, tal, tal... esse curso caiu... os dois... Então, a gente tinha avisado... 'O pessoal que trabalha é cagueta'... então, pra se manter na rua, solto, então, você tem que estar sempre atento para dar serviço, e passar ao seguinte "Nunca passar nenhuma informação através do faxina', passa pela 'tereza'. Então o cara batina na minha cela, ai eu saia na janelinha, ai tal 'Põe o braço', ai, com um pedaço de pano amarrado, ai via tal, 'uma informação' e tal, ou, o próprio curso era passado assim.
E o faxina estava entregando vocês?
Não, até ai não... Ai, numa bobiada, ai teve uma bobiada... ah, a moeda lá, na época, lá moeda era cigarro, no Tiradentes a gente tinha dinheiro, no Carandiru era cigarro, então, mesmo quem não fumava, tinha sempre 2 pacotes, 3 pacotes de cigarro... o cara me arrumava uma mesinha... arrumava uns caixãozinhos para fazer uma mesinha para estar guardando as coisas não perecíveis assim, que a família trazia, queijo, tal, porque tinha muita barata né... e uma mesinha pra você tá escrevendo e tal, entendeu... Assim, para ter mais condições né... e o Paulo de Társio Venceslau, conseguiu comprar um radinho... tá certo... então, todo o final de tarde, ele passava 'Notícias sigilosas', tudo o que acontecia no Brasil e no mundo, ações que apareciam, as ações, enfim, as coisas internacionais, no Vietnã... e sempre um observação, 'Não passar através do faxina'. Ai, um bosta de um companheiro nosso, lá rapaz, certo... acaba passando e por azar, deu azar que era o único, um dos únicos caras alfabetizados deles... Ai ele leu, tal e foi lá no chefe de disciplina do Pavilhão, e o cara falou: 'Continua passando. Certo, continua passando, continua, deixa passando e passaram. No outro dia de manhã rapaz, 7 horas da manhã, todo mundo para o sol, para o campo de futebol, o que era raro [ênfase]... entende... Todo mundo... foi aquela revista do caralho... quando você sai e tal... Ai, estamos lá, batendo uma bolinha e tal, quem não estava batendo bola estava conversando, fazendo ginástica... Ai os caras chama o Paulo Társio, ai fez uma rodinha em torno do Paulo, o Paulo negando e tal...  Os cara sai, ai pergunta: E ai Paulo, o que foi? Ele falou: 'É, acho que o rádio vai cair, o radinho vai cair, o radinho de pilha vai cair'.
Ai, daqui a pouco eles voltam e pegam o Paulo de Társio, levam o Paulo de Társio na sala dele, porque eram os faxinas que abriam as celas né... levam os... chefes de segurança, chefes de disciplina... toda essa porra toda... Ai levanta o colchão do Paulo de Társio, o radinho está lá, ai acontece.... o que que acontece... o cara fica interditado né, fica uma semana, 15 dias sem receber visita, certo... fica sem receber visita e tal... então, a mesma coisa em relação aos cursos... o pessoal ficava interditado. E isso endurecia... não descia para o sol, enfim, era barra né... era barra pesada... Ai, vem outubro de 1970, que o Câmara Ferreira é morto, ai, no final da tarde, a gente escuta né... um companheiro gritou lá na frente: 'Viva o comandante Joaquim Câmara Ferreira!', falei: 'Ih, Caralho, o Toledo morreu!'. Ai foi aquele mal estar do caralho.
Em seguida sai o sequestro do embaixador suíço, ai os caras [da ditadura] começa a fazer aquele negócio de não quere incluir [na lista de libertos] o pessoal que tinha 'crime de sangue', no sequestro né... Ai troca aqui, troca ali, ai os cara divulgam uma lista que estava com o velho [Toledo/Camara Ferreira]... Então os cara divulgaram uma lista para dizer o seguinte 'O pessoal não se entende, as organizações não se entendem, o caralho e tal'. Era o mesmo sequestro do embaixador suíço... saiu uma lista totalmente diferente, uma lista, do ponto de vista militar, assim, do caralho velho, bom pra caralho, eu estava na lista, eu era o 15º da lista, certo, e o que aconteceu, acho que com a morte do velho, com a morte do Toledo, com a morte do velho, do Toledo, a VPR deveria ter participado, ia participar também desse sequestro, ele já estava... Ai eles falam: 'Ah, vamos fazer o sequestro', só que não tinham a lista do velho né... Ai foi aquele negócio, botava um monte de gente na lista que... pessoa inclusive que... os companheiros se negaram a ir... a sair e tal... e acabou, em janeiro, resolvendo o problema, ai o pessoal sai né... Sai o Takao Amano, que está no filme, entendeu... que está naquele filme Marighella [2012]... Bom, ai eu saio... isso em 1972, eu saio... então... Eu fui condenado né...  fui [...] no processo, certo...
Em que mês o senhor é solto?
Em... mais ou menos, fui posto em... acho que abril ou maio de 1972... de 1972... eu saiu da cadeia com ponto já, da minha organização, sabe...
Foram quantos anos de prisão?
2 anos e alguns meses. E, eu saio, eu saio com ponto para me re-contatar à minha organização... Nesse período eu retorno ao funcionalismo público, porque eu ainda não tinha sido demitido, certo... retorno... no meu retorno, tinha um novo superintendente lá, era um filho da puta, um fescistão Aurélio Araujo, rapaz... Ele era irmão do General Araujo que foi do II Exército e tal. Ai, um dia, ligou para a minha seção, a secretária: 'O Cloves já chegou?', 'Não, não chegou', 'Quando ele chegar fala para ele entrar em contato comigo, porque o doutor Aurélio que falar com ele'... ai tá bom... Ai, quando eu chego, o pessoal me dá o recado, eu entro em contato: 'É pra ele descer'. Quando eu desço, tal... lá na sala do superintendente, ai ele disse: 'Senhor Cloves?', 'Sou e tal'... Meu prontuário aqui... jornal do dia aqui [aponta pra a mesa]... tal e tal... Ai ele começa o seguinte: 'Seu Cloves, o senhor sabe que a situação do senhor não é boa'... falei: 'Ah, de fato não é boa, eu fui condenado em um processo do qual eu não tive o direito de me defender a contento, certo... Cujas acusações pelas quais eu fui processado, realmente não condizem com a realidade, sabe... É evidente que eu sou contra o Regime instalado em 1964, mas as acusações que me levaram a ser processado não condizem e ta...'. Ai , papo vai, papo vem, ele fala assim para mim: 'Seu Cloves, o senhor já leu os jornais de hoje?', eu já tinha lido, eu aprendi a lição que você tem que ler o jornal de manhã, cedinho né... eu já tinha lido. e tinha um pessoal de Pernambuco que havia se arrependido e foram para a televisão, escreveram carta de arrependimento e tal, entendeu... Ai, eu fingi que estava lendo né... ai, tal, ai ele falou: 'Seu Cloves, qual é o grau de instrução do senhor?', eu falei: 'Eu tenho o segundo grau incompleto', 'Ah, então o senhor tem condições de fazer uma carta do próprio punho, eu aconselharia que o senhor fizesse. Como eu disse já ao senhor, o senhor hoje é um homem visado pelos órgãos de repressão né, e, qualquer coisa que venha a acontece aqui ou no seu bairro, onde o senhor é um líder comunitário e tal, o senhor, sem dúvida, é o primeiro suspeito'. Ai eu fale: 'Puta que o pariu, é inédito né meu, o cara, depois de cumpri pena, desbundar deste jeito', né... eu pensei comigo, 'fazer uma carta de arrependimento por causa de um emprego?'... eu falei: 'Caralho, esses caras vão me levar para OBAM e me obrigar a fazer uma carta'... Ai eu falei... respirei e falei: 'Olha doutor Aurélio, como eu disse ao senhor, sabe, eu fui condenado em um processo cujo eu não pude me defender. Mas tem uma coisa, isso eu não faço não. De jeito nenhum. Eu não faço. eu quero continuar olhando de frente para a minha família, para os meus amigos que continuam presos... Isso eu não faço'.
[...]
Ai ele falou: 'Oh, o senhor é que sabe'. Ele falou: 'Senhor Cloves, o senhor está transferido para os nossos departamentos auxiliares'. Sabe onde ficava? A 500, 600 metros da Operação Bandeirantes. Entendeu... 'O senhor está proibido de receber e transmitir telefonemas, a propósito, que é o senhor fulano que te ligou?'. Era um amigo meu que sabia que eu tinha saído'. Falei: 'Um amigo de infância'... entendeu... eles estava ouvindo... me monitorando véio, me monitorando, até então... entende... me monitorando, tá... Bom, nessas alturas eu já tinha... já estava próximo a fazer contato com a minha organização, ai eu vou lá, me apresento para o meu chefe [risos], o diretor lá, o Álvaro Paschal Nassife Grabriele... Ai me botam numa sala lá, uma maquininha de calcular...
Isso perto da OBAN?
É...
Então o senhor foi para lá?
Eu vou, vou...
Mas o senhor não ficou com medo de ir trabalhar lá, do lado da OBAN?
Ora, o que que eu ia fazer? Eu precisava... ainda não dava para mim... eu tinha que preparar a vida para cair... vou cair na clandestinidade mas me preparar né, pô... me preparar, entende... e eu precisava também do dinheiro para sustentar minha família porque eu estava com 3 filhos, porra... Ai... ai foi um terror cara... foi o pior momento... nem na cadeia eu me senti daquele jeito, era um terror do caralho velho, as vezes eu precisava sair, ai eu tinha o meu chefe lá e tal, falava: 'Oh, estou precisando sair...', ele falava: 'Cloves, onde você vai? Cuidado Cloves', aquele terrorismo né velho, do caralho... Bom, ai, os caras me abrem um processo administrativo, me abriram um processo administrativo interno. Ai, eu peguei um advogado, um amigo meu que estava preso lá, que esteve preso comigo, ai... constituiu, num primeiro momento a gente... constituímos um advogado. Ai depois, o Renato falou: 'Cloves, porra... É mais uma farsa, nós vamos participar de outra farsa?, o teu Ato de Demissão está na gaveta do superintendente porra, vamos deixar essa porra correr à revelia'. Então foi o que eu fiz, tá, foi o que eu fiz. Um dia o Renato me ligou, queria falar comigo, a menina, telefonista, cortou. Ai eu fui bravo lá com ela, coitada, ela não tinha culpa, briguei com ela... não xinguei, mas fiquei puto né... 'Ah bem... eu não sou culpada bem... é o doutor Álvaro...'. Eu fui lá no doutor Álvaro: 'Doutor Álvaro, que negócio é esse doutor Álvaro?'... 'É... eu não sou culpado, o culpado é superintendente...' eu falei: 'Caramba, ninguém é culpado de nada e eu sofrendo este terrorismo aqui dentro... porra'. Ai eu fale: 'Ah velho, não tem mais jeito, né velho, tem que aguentar mais um pouco e cair fora'. Mas, 3 meses depois sai o Ato de Demissão, me demitiram 'a bem do Serviço Público'... Foi um alívio... foi um choque e ao mesmo tempo um alívio...
Nesse novo lugar, próximo da OBAN, o senhor ficou quanto tempo?
não cheguei a ficar sete... acho que eu fiquei seis meses...
É bastante, pela condição ainda é bastante tempo...
É... Então, e era mesmo... era mesmo, e eu  ia cair fora mesmo, quer dizer, o fato do Ato então, melhorou, falei: 'Ah, legal... foda-se... agora eu vou voltar... contatar a Organização e... mais dias, menos dias, me preparar para cair na clandestinidade, tá certo... Aonde, num primeiro momento após o nosso encontro com o companheiro... Em contato com a minha Organização, conversamos bastante, como está a situação aqui fora, uma série de coisas, o que fazer, o que não fazer, como é que vamos tocar o barco... No segundo ponto, ele colocou para mim que o pessoal estava avaliando o que seria melhor para mim, se seria me incorporar num Grupo de Fogo ou num Comando... num Comando de Massas né... se era num comando de massa... Eu falei assim: 'Olha, qualquer opção ai... para mim é... eu não tenho problema nenhum. Tá, então, num primeiro momento eu vou para um Comando de Massa, participando de ações em... de ações... assim... em porta de fábrica, tá certo... de panfletagem e tal, e chego a participar de Grupo de Fogo, tá... Onde participo... participei de umas 2 ações, certo...
Bom, eu perco o contato. O cara não foi... o companheiro não foi em um... num ponto, não foi na alternativa... ai ele caiu... Vi pelo jornal que ele caiu, certo... Ai eu tenho muita dificuldade em re-contatar a organização, tá certo... em re-contatar a organização, mas eu estava fazendo um trabalho de massa, de base, só fiz o trabalho de base, estava fazendo um trabalho... comecei a fazer um trabalho, volto... vou para a fábrica, sabe... Começo a me organizar junto à Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo...
Para qual fábrica o senhor foi?
Fui para a TELEN, no Ipiranga, tá, no TELEN, numa metalúrgica da TELEN... é... começa a... estou dentro da Oposição Sindical, da qual eu viria a ser um dos coordenadores... da Oposição Sindical... À noite a gente tem um trabalho de alfabetização de adultos num bairro em São Paulo, no Jabaquara... numa região de são Paulo, no Jabaquara, cuja prioridade nossa é trabalhar com operário... com operário né, seja ele metalúrgico ou qualquer outra... ligado à produção... É um trabalho muito bom, tá... do qual a gente consegue filiar muita gente... integrar os companheiros na Oposição Sindical, depois começam a participar de... nas assembléias sindicais... tá... Na TELEN, eu tinha muita regalia, sabe... Na TELEN, o dono da TELEN era um companheiro que esteve preso com a gente, entendeu... que esteve preso com a gente. Então, dentro da fábrica do cara eu não fazia porra nenhuma, quer dizer, não fazia nada no sentido de estar agitando... entendeu... normalmente eu estava para me resguardar. Podia sair para cobrir ponto, participar de algumas ações...
Ah, o senhor podia sair...
Sim... entende... Eu não ia falar para ele, para o Jaque: 'Oh Jaque, eu tô saindo' [risos]... Mas, contrapor o pessoal no dia-a-dia não... entende... acho que eu nem sindicalizar o pessoal eu sindicalizei, certo... porque era um disfarce eu fazer um trabalho destes numa fábrica aonde... entendeu... [risos], eu tenho um companheiro que foi para lá, organizou greve e o caralho... porra, é fácil fazer greve na fábrica do Jaque né, não tem repressão, não tem nada... mas eu não... eu não fiz isso não, entendeu... eu não, eu me resguardei mesmo... fiquei lá de 1972 a 1978, certo... de 1972 a 1978... não fiz... Como eu estava prestes a fazer uma viagem internacional, da qual eu sairia... como eu tinha um processo ainda... ele estava em curso ainda... pelo processo, eu não poderia sair legalmente [do país], tá certo... então eu ia sair com um passaporte frio e esta coisa toda... ia participar de um Congresso de trabalhadores na França e depois ia à Espanha, tá... contato com as Comissões operárias lá e tal, para conversar e et cetera. Então eu sai..
Você está falando da Comissões Obreira?
Obreira... Isso... Então eu sai, né... O Jaque me demitiu... assim... Pra eu poder receber... Mas ai estouram as greves... as greves de São Paulo... eu acabo não saindo. Ai vem as eleições Estaduais e a gente optou... sabe... ai nós vamos... nós não estávamos trabalhando com a Igreja, esse grupo meu não estava mais na Igreja. Nós tínhamos fundado um Centro Cultural, fazendo o mesmo trabalho, tá certo... de alfabetização, estas coisas... fazendo o mesmo trabalho. E nós apoiamos um... O Marco Aurélio Ribeiro, que era do MDB, é um cara bom, Marco Aurélio Ribeiro que foi advogado da Chapa de Oposição, certo... apoiamos o cara. Eu falei: 'porra, agora não é justo eu sair... agora... e deixar o cara na mão... ele nos ajudou... está ajudando a pagar este troço aqui [a sede]'. Então, legal... 'Então depois das eleições das eleições você sai'. Ai, depois das eleições...
Esse troço que você falou é a sede?
É estava alugando... estava ajudando a pagar a sede. Porque acabou tendo um período que foi o comitê dele, durante a campanha, depois nós montamos o centro cultural. Pois bem, ai vem 1979, que a viagem ia se concretizar, ai um companheiro falou... tinha um pessoal que a gente trabalhava junto, certo, que 'prepara para viajar'... ai, mais uma vez deu zebra né... porque as greves de São Paulo... que eu estive em bastante evidência, comando de greve, comando de piquete... Ai o pessoal achou que não devia... 'Não, melhor não sair, você vai sair clandestino, você pode ser pego ai num país ai'... Eu ia sair pela Bolívia né...
Iria direto para a cadeia né...
Não tem dúvida... Sair ainda com o passaporte frio, ainda era... pô... ainda era o período... era... 1978/1979 a ditadura não era mais aquilo, mas pô, ainda era ditadura... Acabei não saindo, cento... então a gente participa esse período todo da Oposição sindical... em 1981 a gente concorre com chapa... dessa vez eu estou na chapa, quase que a gente ganha as eleições, fomos para o segundo turno... certo... Eu culpo, nós não termos ganho essa eleição, ao PCdoB. Porque eles saíram com uma chapa também, dividiu, ai no segundo turno o apoio foi só na garganta... entendeu... Não foi aquele apoio mesmo de... entende... de transferir os votos que eles tiveram para a nossa chapa e tal. Perdemos...
De 1972 a 1978, qual o trabalho mais importante feito pela Oposição?
Ah, a gente está organizando a Oposição... estar organizando as comissões de fábrica.
Porque, se fala muito no 1978, mas se fala pouco do período anterior em SP
Aconteceu. Uma série de greves aconteciam internas, dentro das fábricas. Tanto que em 1973 há um monte de prisões na Zona Sul. Em 1973, um monte de prisões na Zona Sul, certo, ligadas... que caem companheiros... entendeu... Então, tinham muitas greves internas, tal... muito processo de comissões de fábricas, legais e ilegais em São Paulo.
Quais as mais importantes que o senhor lembra?
A Arno, a Philips, a metal-leve... na metal-leve... em uma ali naquela região de Osasco... indo para a região de Osasco lá... a que trabalhava o Hélio Bombardi... ela deve estar até aqui [mais próxima ao centro de São Paulo]... tá certo..Chegamos a ter comissão na Villares... algumas destas comissões, a Philco... algumas destas comissões chegaram a ser legalizadas e aonde a gente não conseguiu legalizar eram onde atuavam clandestinamente... entendeu... E teve um monte de greves vitoriosas, sabe... que a gente... no final... acabava... o Sindicato acabava entrando né, pra formalizar né... Todo o processo quem dirigia era a gente. Em tão foi muito.... foi, assim, muito importante. Além da questão política também né, você... com a questão do Regime, da ditadura e tal. Tanto que em 1978 a nossa plataforma constava anistia... tá certo... a 'anistia ampla, geral e irrestrita'... e uma série de bandeira de luta, 40 horas semanais, entende.. enfim...  fim do imposto sindical, direito de greve, entendeu... pô, a gente tinha uma puta atuação...
Isso ainda antes das greves do ABC...
É, antes das greves do ABC, tá.... e depois, depois, nas greves do ABC São Paulo teve um papel fundamental na solidariedade, a gente organizava um grupo de companheiros para paralisar ônibus... os ônibus que iam para o ABC, que iam direto, aqueles ônibus para a FORD, para a Volks, essa coisa toda e tal, então a gente parava os ônibus...
E, o senhor acha que teve influência das greves de Osasco aqui em São Paulo?
Teve, teve sim. Claro, entende... Nos métodos de organização, teve sim. Muita.
A formação das comissões de fábrica...
Tinha. Claro que tinha. Claro que influenciou, lógico. Assim como nós influenciamos outros estados, entendeu... outros estados aqui... para organizar comissão de fábrica. Claro que teve pô, a de Contagem, teve... pô, fundamental pô...
E a militância de vocês, da Oposição Metalúrgica, influenciou no ABC?
Teve, até porque eram muitos operários de São Paulo que estavam lá... trabalhando lá. entende... trabalhando lá... já tinham uma experiência né... sabe... antes das greves do ABC, das greves de 1978 no ABC, sabe... tinham comissões de fábricas no ABC, nas grandes empresas, comissões clandestinas, jornal clandestino, tá certo, internos, tinha tudo isso pô...
Também as correntes políticas atuavam lá...
É, atuavam... entende... era o PCB, o PCdoB, a Ala Vermelha, certo... entende... a POLOP também...
Pois é... ai, em 1985, a partir de 1985 eu já não tive mais condições né...mais condições, assim, de estar trabalhando em fábrica, nem em pequenas...
Mas, uma coisa que eu fiquei curioso, do que o senhor estava falando. Que a ALN durou até 1976, o senhor falou...
Oh, na minha opinião... Isso não é... tem pessoas que acham que ela acabou...
Porque tem um pessoal que fala que ela acabou em 1972...
É, pois é... Tem um pessoal que fala que acabou em 1972, mas não acabou em 1972... ué... certo... Eu, na minha opinião, ela realmente termina em 1978/1979... a gente...
O que ficou da ALN, depois que o senhor saiu da prisão, quais ações importantes vocês fizeram?
A, pô... mesmo quando a gente... em 1973/1974/1975, pô, em 1973 a gente acaba perdendo quase todos os companheiros que nós tínhamos, pô, entendeu...
Por  causa da repressão...
Exatamente... sabe. Mas a gente mantém em 1974, nesse período todo ai, contatos com companheiros de vários Estados, para estar fazendo agitação de massa, não mas fazendo ações armadas, mas a gente mantinha, tá certo e muitos de nós participaram ativamente do processo de fundação do PT, pô, aonde ela [ALN] se dissolve.
Até 1978, que estava na ALN além do senhor?
O Paulo de Tarso Venceslau, certo... em 1978/1979 nê pô, que vem para o PT, tá... o Vanucchi, tá certo... o Vanucchi... daí, pessoas de menos nome né... de menos expressão, assim, conhecidos... assim... que... nos Estados, assim, eu não lembro... assim, de companheiros da ALN que... tinha um companheiro... o Fausto Jaime, que foi, inclusive, prefeito de uma cidade... de Cumari pelo MDB... e acho que, talvez, deve ter sido uma primeira prefeitura do PT, entende... o Fausto Jaime... Tem outros companheiros na Bahia, o Aloizio Valério, certo... que vem para o PT, certo... E tem uns... a Sônia Hipólito, o Carlos Lichtenstein, esse pessoal que era da ALN e vem para o PT, mas não tão assim... pode dizer... Desse pessoal ai que esteve em direção, que esteve na direção do PT a Sônia Hipólito, que foi da Executiva do PT, os demais não chegaram... O Paulo de Tarso foi Secretário da cultura em Campinas, foi Secretário em São José dos Campos, certo, o Paulo Vanucchi que foi Ministro né... Ministro ai, mas não foi... não chegou assim, a ser da Direção do PT né, mas participaram... Tem uma série de outros companheiros que eu não lembro o nome né...
E, em 1985, ai eu já não tinha mais condições assim, de estar em fábrica, né pô... de estar trabalhando em fábrica e tal, certo... mas ai é que eu continuo... ai continuo a minha atuação em nível do PT, né... A Oposição sindical também já não... foi até 1987... não existia... deixou também de...
Quando estouram as greves do ABC, em São Paulo, quando estoura esse monte de greves,  qual foi o impacto, o que o senhor achou?
Achei um momento... um momento assim, fundamental, que estava se rompendo com a Lei de greve na marra. Estava realmente metendo o pé na porta, sabe... abrindo espaço para que a gente ampliasse os horizontes da luta contra a ditadura militar, sabe, onde a gente consegue, onde vem a anistia, tá certo, onde vem a fundação da CUT, onde as oposições sindicais ganham um monte de sindicatos, inclusive sindicatos na área rural... então... tá, que nasce o Partido dos Trabalhadores, onde se legalizam os partidos comunistas, o PC o PCdoB, sabe... acho que tudo isso foi vindo deste momento em que a gente começa a a derrubar a ditadura.
O senhor achava que tinha alguma coisa de 'período pré-revolucionário' nesse 1978/1980?
De jeito... não... que isso pô...
Então nesses 2 últimos, nem no 1964, nem nos 1980, teve... Foram processos de massa, tudo, mas...
Lógico que não pô, é a luta pela democratização do país, mas pré-revolucionário coisa nenhuma [risos]... Não sei se alguém está viajando, ou viajava nesse período ai [risos], 'Oh, vamos fazer a revolução', mas não, o que isso pô... Tinha...
Mas tinham organizações que achavam isso?
Olha, quem achava, por exemplo, que... transformar as greves num momento, como se diz... numa insurreição, era o pessoal da POLOP, mas era muito... que achavam que as greves iam... certo... Assim, como O Trabalho falava, que 'A greve geral derruba o general'... Não houve a greve geral e não derrubou o general... general... o general não foi derrubado através de uma greve geral específica, não é...
E é em 1978 que surge a figura do Lula né...
O Lula surge em 1975 já né... em 1975, no Sindicato dos Metalúrgicos [do ABC], participa da primeira diretoria, onde ele está com uma outra visão já do sindicalismo né... e do mundo né... estava...
E o que o senhor achou dele quando o conheceu?
Achei que... pô... pô, falei: 'É uma puta liderança em formação'... sabe... uma puta liderança em formação...
Mas o senhor via alguma diferença entre o sindicato do ABC e o de São Paulo?
Bom, o sindicato, a maioria dos sindicatos de São Paulo, com exceção dos Bancários e da APEOESP, era tudo pelego pô, sabe... era tudo pelego pô... Então o Lula... isso ai, era a grande liderança poxa...
E a Oposição de São Paulo?
A Oposição de São Paulo... Tinha um setor mais próximo do Lula, tá certo, o setor mais próximo do Lula, era aquele setor que realmente colocava o seguinte; que a gente tinha que fazer oposição ao peleguismo, se organizar dentro das fábricas, mas, disputar espaço dentro do sindicato, certo... E tinha uma outra ala, que tinha realmente uma visão de um sindicato paralelo.
Quem era essa ala do sindicato paralelo?
Que era o pessoal que fundou... do racha da Oposição, que fundou o MOMSP, do qual eu não era... eu não participei. Eu não fui do MOMSP, eu fui da Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo.
Mas o MOMSP é anos 1980...
É, o MOMSP surge exatamente nos anos 1980...
Esse pessoal queria fazer oposição sem chegar no sindicato? O que motivou o racha?
O de fundar o sindicato paralelo. Um sindicato desvinculado de tudo, tá certo... não vinculado ao Estado, essa porra toda... tá certo... E um outro pessoal, por exemplo, então, em 1979 tem um congresso de Oposição Sindical que foi discutido na coordenação da Oposição Sindical, tá, de que um grupo de companheiros, ente eles eu, somos contra o congresso, porque avaliávamos que nós estávamos entrando em uma outra conjuntura, tá cento, que essa conjuntura nos dava condições de disputar o sindicato, tá, que a gente tinha que ir para dentro, exigir do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo que convocasse congressos, tá, e que a Oposição Sindical tivesse condições de poder participar com delegados e tal, tal, tal... e que pra isso a gente tinha que estar dentro do Sindicato, disputando com os pelegos...
Era sua posição essa?
Exatamente... disputando com a pelegada... e não abandonar o trabalho de fábrica. Nós nunca propusemos de abandonar o trabalho de fábrica, muito pelo contrário, tá certo, enquanto o... entende... ai nós fomos minoritários...  e foi convocado este congresso de Oposição Sindical, aliás, no mesmo mês, tá certo, no mesmo dia que estourava a greve do ABC [a de 1979]... Então nós falamos: 'nós não vamos ficar aqui fechados a quatro paredes discutindo um congresso de oposição, enquanto, sabe, estoura uma greve no ABC, nós vamos sair, sabe, e levar, se integrar... a solidariedade aos companheiros do ABC e tal'... entende... E o Lula via a gente com bons olhos.
E quem ficou no MOMSP então?
Ah, ficou no MOMSP o Hélio Bombardi, o Carlúcio, tá certo, o Carlúcio, quem mais... o Chico gordo que foi Deputado Estadual, o Vitto Gianoti, o Waldemar Rossi, o Anizio Batista...
Mas eles voltaram a disputar eleições em 1981, não voltaram?
Ah, voltaram. Não, eles não eram contra disputar eleições, pô, em 1981 nós fazemos chapa junto. O MOMSP e nós que tínhamos saído do... rompido... porque nós continuamos lutando pela Oposição também... então não houve um rompimento assim total... não... pô, discutíamos juntos nos momentos de dissídio coletivo, de chegar aproximadamente ao mesmo índice, de estar fazendo as mesmas coisas, de estar solidário na porrada... na porrada né... A única divergência era realmente essa né, que a gente não achava que abandonar a participação dentro do sindicato... Entendeu, então, do outro lado ficou eu, o Flores, os nomes assim, mais conhecidos, nomes de peso né, o Flores né, que faleceu, que era... que depois ele... depois ele, acho que até retorna para o Partidão [PCB], retorna para o Partidão e na outra chapa em 1981 ele não nos apoiou, certo e apoiou a chapa do Joaquinzão, sabe, do Joaquinzão... tá certo... Então eu, o Fernando do Ó, certo, que eram os nomes mais expressivos ai... ah, o Zico Prado, que é Deputado Estadual... nomes mais expressivos era a gente... ah, o próprio Jorge, o Jorge Preto, tinha outros nomes, eu não estou lembrando... mas os mais expressivos era a gente. Nós éramos chamados 'O grupo dos 15'.
Ah, eram 15?
Era, 'O grupo dos 15', soltamos inclusive... chegamos a soltar um jornal, que saiu só 1 número, o 'Pinhão' né... Depois, ai eu te vejo como entrar em contato com o Fernando do Ó, ele até saiu do PT viu... recentemente...
Com críticas?
Com críticas...
À esquerda?
À esquerda...
E qual era a crítica que a Oposição tinha ao Joaquinzão?
Todas! Era um agente da ditadura porra...
Continuava igual?
 Lógico pô, não mudou porra nenhuma cara, pô, é um pelego...
Porque no começo de 1980, o PCB de aproxima dele, o PCdoB se aproxima... Mas não é por mudanças do Joaquinzão para a esquerda, é o PCB e o PCdoB que vão para a direita?
O PCB, o PCB, veja bem... a posição do PCB era dúbia, eles tinham gente na Oposição, tá, e tinha gente na diretoria do Joaquim. Ela sempre foi dúbia, mas isso não quer dizer que o Joaquinzão se aproximava do PCB, nada disso, que isso pô, que isso. Engana-se o pessoal que achava isso, pô.
 E o movimento das Diretas... O senhor participou também?
Participei... porra... participei...
E como foi, como, a partir das fábricas se impulsionava isso?
A gente fazia isso a partir de panfletagem, de panfletagem, organizando o pessoal, chamando para vir para as manifestações, nos bairros...
Em congresso da Oposição discutia-se?
Não... depois eu não participei mais de congresso de oposição. Nem sei se houve outro congresso de oposição. Não houve.
Só o de 1979?
Exatamente, só o de 1979. Mas a gente panfletava os locais, assembléias,  a gente panfletava nos bairros, nos trabalhos de bairros que a gente fazia... e ai, participei muito ativamente no PT né...
Na sua opinião, a Oposição chegou a ter peso na CUT?
Teve, teve...
Chegava a influenciar algumas decisões na CUT?
Não põ, infelizmente não... tanto que a gente fica de fora né pô... agente fica de fora...
Como assim, fica de fora?
A gente fica de fora, por exemplo, a gente queria... por exemplo, ter condições de, mesmo não tendo mandatos, mandato sindical, tá... ter participação dentro da CUT, poder participar como dirigentes e tal... quer dizer, essa posição foi derrotada...
Essa proposta era da Oposição?
Exatamente. Nisso ai nós fomos derrotados. Isso ai a gente defendia...
Então existia algumas diferenças com a direção nacional da CUT?
Ah sim... tinha.
Quais eram as principais?
Não... essa era uma delas... é um ponto programático.        
E no PT, o senhor acha que a Oposição teve influência?
Ah, alguma né, por exemplo, muitos companheiros de oposição, que era da Oposição Sindical, num determinado momento, estão fora do campo majoritário né... do campo majoritário e tal, e inclusive, a gente... no começo do PT, o movimento sindical tinha uma puta força, tá certo, depois, a partir dos anos... acho que a partir de 1985, por ai... deixou realmente de ter força...1985, 1986, deixou de ter força...
Então de 1980 a 1985 tem uma certa disputa ali dentro do PT?
Sim. É isso ai. A gente... veja... por exemplo, a gente teve em 1982, em 1982 quem era o presidente, foi o presidente Estadual do PT, o... acho que foi o Djalma Bom, depois veio o Cicote, depois do Cicote foi o Devanir Ribeiro, certo, depois teve, por ultimo, o Paulo Okamotto, que é a direita da direita do PT... certo..
Então foi tendo uma guinada?
É... o Devanir também não é o... Mas com o Devanir e tal, a gente ainda tinha um peso no PT, né pô, com o Cicote... ai depois disso não tivemos não viu...
Hoje o senhor está em qual ala do PT?
Na Articulação de Esquerda.
É uma ala mais critica a atuação da Majoritária?
Ah sim... é... e não somos uma corrente de... nós somos uma corrente interna mesmo, né, não é nenhuma corrente que tem vínculos internacionais né, como o caso d'O Trabalho, tá certo, como o caso da DS, tá... como era a Convergência quando estava no PT, sabe... que tinha... todos eles tinham um vínculo internacional, em fim, era um partido dentro do partido. Nós somos de fato uma corrente que faz a disputa interna, dentro do PT.
E as eleições de 1989, qual é o balanço que o senhor tem delas hoje?
Acho que foi muito boa, sabe... ela foi muito boa. Foi realmente... acho que um momento superimportante... foi uma participação ativa né, de todos os setores sociais dentro do partido né... na luta ai... foi um momento muito bom... depois vou te dar um livro ai do... que o Vladimir Pomar escreve quase lá, o Vladimir Pomar, ele foi secretário geral e coordenou a campanha de 1989... eu tenho um livro dele ai, vou te dar...
Qual o senhor acha que foi o marco, tanto da CUT quanto do PT, Qual foi o marco da CUT e do PT para dar uma 'endireitada?Tem um pessoal que fala que é 1989, tem um pessoal que fala que é 1994, outros 2002...
O PT? O PT eu acho que começou a dar mais uma guinada para a direita, assim, em 1990. Em 1990..  em 2002...
E a CUT?
Eu não posso... eu não acho... como hoje eu estou um pouquinho fora do movimento sindical, tá... então eu não posso dizer o seguinte; que 'a CUT foi para a direita', eu não posso falar isso, entende? Porque, em relação às outras centrais, a CUT está na esquerda dessas centrais.
O senhor também deve ouvir muito que hoje em dia já não tem tantas diferenças entre as centras...
Não, tem diferença sim. Tem diferença sim, ainda tem diferença. E da mesma coisa como o PT, entendeu, tem as suas correntes internas. Por exemplo, nós estamos na... a articulação de esquerda está na executiva da CUT velho, cumprindo um puta de um papel. Nós temos 2 companheiros na executiva da CUT.
A executiva tem quantos membros?
Puta, muito.
Mais de 30?
Por ai... tá entendendo... e pô, e que faz essa disputa, assim, da mesma forma que a gente faz dentro do PT.
Mas como minoritários...
Como minoritários, mas influenciando bastante, por exemplo, na questão... por exemplo, a gente puxou... puxamos a CUT para estar participando das discussões em relação a Comissão Nacional da Verdade, de estar participando dos 50 anos da ditadura, ai, esse setor velho, tem um papel bastante importante, tá certo, no sentido de resgatar o papel que os empresários tiveram durante a ditadura militar... Então, e isso, a gente acaba trazendo a CUT junto, todo o conjunto da CUT para estar discutindo essa...
E que balanço o senhor fez do governo Lula, 2002 a 2010?
Bem, é aquilo que nós falávamos, sabe... no primeiro governo, nos primeiros 4 anos, deixou de... uma série de coisas né... deixaram assim de... de serem feitas, certo...
Quais as principais?
A reforma agrária, tá certo, a questão da reforma política, certo... e tem outros fatores também... Ai, nós da Articulação de Esquerda dizíamos o seguinte, que: 'era preciso que o governo... que embora ele tivesse tido muitas conquistas nos primeiros 4 anos do Lula, tá, mas que era necessário ser superior a esse período se nós quiséssemos ganhar em 2010.
E quais foram os pontos de acerto no primeiro mandato?
Não, por exemplo, eu acho, com todas as deficiências, tá certo, eu acho que se ampliou o número de terras... de assentamentos, tá certo, o número de assentamentos, sabe, eu acho que se ampliou...Acho que a gente não avançou em cima da questão da reforma agrária, mas ampliou, eu acho que isso foi um ponto positivo, certo, acho que isso foi um ponto bastante positivo, sabe. A outra questão, eu acho, a questão da ampliação da universidades, que deu condições a centenas e centenas de estudantes viessem a ter condições de estar em uma...participando de uma... estar em uma universidade, tá... acho que, por exemplo, aumentou o número de... caiu o número de desemprego, aumentou o número de emprego...
E no segundo mandato?
No segundo mandato acho que a gente foi bem melhor, bem melhor do que o primeiro, deu condições de ganhar em 2010.  E agora, como é que a gente vê isso ai... é... tanto que você vê aqui, a nossa revista aqui [lê o chamado da revista] 'Nem todos os caminhos levam a um mandato superior ao atual', por que que a gente coloca isso? Tá, a questão das alianças, certo, acho que a gente não pode, ninguém governa sem fazer aliança, mas aliança é uma coisa, fazer aliança é uma coisa, mas estes partidos influenciarem no nosso programa não. Isso não pode ser, sem concessões, tá entendendo, se não fizer isso, dificilmente... nós vamos ganhar... tá certo, mas vamos fazer um governo pior do que esse momento, certo, a reforma política tem que ser feita pô, entende, tem que fazer a reforma política... sabe... esse plebiscito ai, tem que jogar um peso muito grande em cima do plebiscito pela... da constituinte ai... tá entendendo...  porque pô, uma das contradições do campo majoritário... tá certo, então o Lula, no encontro nacional recente ai, ele fala o seguinte no discurso dele: 'Com esse Congresso não dá para ter uma Constituinte', mas no entanto, a base do campo majoritário, tá certo, acaba votando contra uma proposta que realmente avaliasse melhor a questão da alianças, etc, etc, etc, é uma contradição, tá certo... e mais uma questão, além da reforma política que tem que ser feita, tá certo, e avançar na questão da reforma agrária véi, temos que avançar nessa questão da reforma agrária, senão, 2018 já era... Eu acredito que a Dilma ganhe [em 2014], difícil vai ser uma eleição difícil, acredito que a Dilma ganhe... Mas, se realmente a gente não fizer um governo da forma como eu estou colocando, 2018 será mais difícil ainda, entendeu...
E como o senhor viu as manifestações do ano passado, o que o senhor achou?
Muito boa. Muito boa, quer dizer, você vè Alessandro, é uma juventude que teve uma série de privilégios que nós não tivemos, a 10 anos atrás eles estavam com 10 anos de idade, tá certo, tiveram condições de ir para a faculdade, sabe, se gerou uma série de... gerou mais empregos, tá certo, de melhor as suas condições e etc, mas acontece o seguinte velho, eles querem mais, estão reivindicando mais e com muita razão, querem reivindicar mais pô, tá, acho que foi positivo. A parte negativa, a parte mais negativa dessas mobilizações foi, também dentro desse espaço, alguns setores minoritários da direita, delas se aproveitaram. Então, aquele grupo minoritário gritando: 'Sem partido, sem partido!'. Não tem sentido, tá certo, não tem sentido: 'Sem partido, sem bandeiras'. Então, este pequeno setor, realmente, eles estavam com outros objetivo... mesma coisa de estar quebrando o patrimônio público, essa coisa toda e tal, tal... Mas eu acho isso muito positivo, é um alerta à esquerda no geral, que sirva de lição para a esquerda do PT, para a esquerda... para o PT né, que é um partido de esquerda, tá certo, para os partidos PCB, PCdoB, o PSOL, Convergência, PSTU, etc, que sirva de lição, tá certo, essas manifestações de julho do ano passado [2013]. E agora, que os partidos comecem a discutir internamente espaço, espaço para a juventude estar se organizando dentro dele. Porque senão... até que novos personagens, integrem esta luta né...
O senhor acha que teve um bom impacto no PT esses atos?
Teve, teve muito impacto. Sim... teve muito impacto... Não foi negativo não velho...
E valeu a luta, desde 1959?
Valeu, ah valeu pô... mas não... valeu... se valeu...  claro que valeu pô... entendeu... é isso que eu falo com algumas pessoas, antigamente, sabe, o período anterior ai,  três caras na rua conversando, estavam sujeitos ai... eram abordados pela polícia, tá... eram abordados pela polícia porque eram suspeitos de terroristas, esta coisa toda, hje nós estamos tendo a liberdade de estar discutindo os problemas deste país, entendeu... a gente tem que analisar que com todos os nossos erros desses 10 anos [de governo PT], foi importante pô, se não fosse importante, essa direita não estava fazendo o que está fazendo, tá... que tem na garganta né, que a classe trabalhadora fundou um partido, elegeu um presidente, reelegeu uma mulher, que é, que nunca na história do Brasil, tá certo, uma mulher foi Presidente da República, em fim, uma série de conquistas pô e que a gente te que continuar na rua, continuar organizando, continuar se organizando para também avançar nessa democracia, entende... o retrocesso vai ser ruim para o país pô... Então sem dúvida nenhuma valeu a pena, meus filhos são todos de esquerda pô... Filhos de outros companheiros que eu conheço estão todos ai na luta, são militantes de esquerda... sabe... acho que valeu a pena sim, pô.









 
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