Disponível nos endereços:
http://contextohistorico.blog.terra.com.br/files/2009/12/zequinha-barreto-um-revolucionario-brasileiro.pdf
http://claudioautogestao.com.br/wp-content/uploads/2014/04/A-OPOSI%C3%87%C3%83O-SINDICAL-NO-EX%C3%8DLIO.pdf
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por Ibrahim e Zequinha Barreto 1968
Companheiros, Conscientes de que
vivemos sob uma ditadura de classe que precisamos destruir. Conscientes de que só com a violência justa
dos explorados,contra a violência injusta de que somos vitimas, e que iremos
destruir a ditadura dos patrões e implantar uma sociedade sem classes. Sabendo que para atingir o nível de
organização que precisamos, temos que a cada momento analisar criticamente
nossos trabalhos.
Reconhecendo ainda a superficialidade deste documento,que só
visa incentivar a discussão,informamos que estamos preparando um balanço sobre
nossas experiências nos comitês de empresa,no sindicato,sobre a organização de
greves e ocupações de fabricas.
Conclamamos todos os
companheiros a discutir nossas experiências,esperando com isso,além de receber
criticas,iniciar uma proveitosa troca de experiências,para a organização da
classe operaria,que possa ,aliando-se aos camponeses conduzir o proletariado ao
poder.
A LUTA ANTI-ARROCHO E A GREVE DE OSASCO
Considerações sobre
o arrocho. O arrocho não surgiu com o golpe de 64. Antes de 64, o poder
político representava os interesses dos patrões e era dominado pela minoria
totalitária patronal. Acontece, que com o golpe, o arrocho apenas centuou-se. Ele
não se manifesta somente na política econômica-financeira do governo,mas em
todos os setores da vida nacional , e todas as formas de repressão,quer o
terrorismo cultural,quer o arrocho salarial,quer a Lei de Segurança Nacional,o
acordo Mec Usaid,a lei Suplicy,etc,são formas de arrocho. Em suma, arrocho é o
termo que o povo brasileiro encontrou para caraterizar a ditadura dos
patrões. Vejamos alguns objetivos e
características dessa política;
a)contenção da inflação,tomando-se por base que o ‘aumento dos níveis
salariais é que inflaciona a economia do pais’; b)jogar nas costas do povo o ônus da crise
do capitalismo; c) o congelamento dos
salários é uma forma de aumentar a taxa de lucro dos patrões sem acarretar
grandes aumentos nos preços dos produtos;
d) enquadramento do pais dentro do esquema do capital internacional e
submissão de nossa economia dentro do espírito de que ‘o que é bom para os
Estados Unidos é bom para o Brasil”.
Essas medidas são
necessárias ao capitalismo, em sua fase mais adiantada, o Imperialismo, para
sustentar materialmente a repressão necessária contra a revolução proletária
mundial,como exemplo disso temos a agressão de que é vitima o histórico povo do
Vietnã. Por outro lado as mesmas medidas intensificam as contradições entre as
massas exploradas e a classe dominante.
Logicamente, essas medidas que vieram adaptar o pais dentro da realidade
internacional do capitalismo, tem as suas conseqüências no plano interno: a)
diminuição do poder aquisitivo do povo e conseqüentemente a estagnação do
mercado interno. b) Proletarização da grande parte da pequana burguesia. c)
Falência das pequenas industrias,que vão sendo engolidas pelos grandes trustes
internacionais.
O REFORMISMO E O MOVIMENTO ANTES DE 64
Antes de 64, a
chamada ‘burguesia nacional’ reformista e liberal, acenava com reformas de base
e as massas dirigidas por elementos conciliadores e também reformistas iam à
reboque. A burguesia reformista atrelou a seu carro instrumentos de lutas das
massas como o PC, os sindicatos, etc, e moldou lideranças hoje reconhecidas
pela massa como pelegos, traidores e reformistas. Esses conciliadores não
necessitavam organizar a massa para fazer sua ‘jogadas’ nas cúpulas e ‘não
entenderam’ que as contradições existentes na sociedade capitalista só podem
ser resolvidas pelo proletariado, sob a condução da vanguarda, com um programa
socialista e revolucionário, sendo pois necessário educá-lo, organizá-lo e
conduzi-lo para estas tarefas. A burguesia reformista queria resolver sua
contradição com o imperialismo sem mudar a estrutura social e a liderança
revisionista mais uma vez ‘não compreendeu’ que essa contradição é secundaria e
nunca poderia chegar a uma forma de antagonismo, pois a contradição fundamental
reside entre o capital e o trabalho, sobre as forças que produzem as riquezas aos
operários) e aquelas que detem os meios de produção (os patrões), entre o
caráter social da produção e a apropriação individual dos produtos do trabalho,
e que com o avanço do movimento de massas os setores mais reacionários da
burguesia procurariam cortar esse processo antes que surgisse do seio da massa
uma nova liderança capaz de dirigir-la para objetivos superiores aos da reforma
dentro da estrutura capitalista.
MOVIMENTO OPERARIO APÓS 64
Após 64, com o golpe
militar de direita, o reformismo, representado pela ‘burguesa nacional’ e cujos
órgãos PTB, PCB, PSB, Sindicatos, etc, eram sua base social, é alijado
praticamente do cenario político. Desencadeia-se no Pais uma campanha ‘fascistoide’
de perseguição aos elementos tidos como subversivos. Muitos fugiram, outros
caíram presos, houve aqueles que foram assassinados. O governo teve nesse
primeiro momento a intenção de golpear profundamente a classe operaria. No
entanto, impossibilitado de realizar tal política, eis que não tinha base
social de sustentação (a pequena burguesia que dois meses antes tinha marchado
com deus, pela família e pela liberdade, abandonou Castelo Branco sozinho na
Praça da Sé no primeiro de Maio). E além disso, tendo em vista a necessidade de
órgãos que sirvam de válvulas de escape aos reclamos do povo, numa tentativa de
evitar a organização clandestina da classe, permite eleições nos sindicatos. A
liderança que teve condições de participar das primeiras eleições sindicais foi
apenas aquela que trazia as mesmas posições conciliadoras de antes de 64. Agora
havia uma diferença: não tinha mais a burguesia reformista para se apoiar e o
proletariado, devido às amargas experiências do passado, aprendeu a lição. A
primeira tentativa dessa ‘nova liderança’ no sentido de poder aparecer perante
a massa como alguém que luta por seus interesses foi na campanha pró-estabilidade
e contra o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Uma outra coisa foi a
resistência que os trabalhadores fizeram para não assinarem a ‘nova lei’, percebendo,
inclusive, as razões pelas quais os patrões tanto se interessaram na opção pelo
FGTS. A experiência ensina à classe que se o patrão diz que determinada lei é
benéfica aos operários, o correto é exatamente o inverso da moeda, isto é, o
que é bom aos olhos do patrão é nocivo aos trabalhadores. A queda da
estabilidade, que havia sido conseguida à custa de luta, contrariou, profundamente
os operários, porem, os pelegos não organizaram as massas, daí não se ter tido
condições para movimentos capazes de derrubar o FGTS. O arrocho salarial já
fazia sentir as suas conseqüências funestas para os trabalhadores. O desemprego
e arbitrariedades patronais acentuavam-no. A classe movimenta-se sem encontrar
ainda uma centralização. Surge nova oportunidade de os pelegos aparecerem
perante a massa. É criado o MIA órgão inter sindical de luta contra o arrocho. Porém,
os pelegos são derrotados macio e seus métodos de luta conciliadores, portanto
insuficientes para conduzir a luta de classe, tais como abaixo-assinados,
telegramas, entrevistas com as autoridades, etc. Em cada concentração operaria,
a vanguarda surgida nas fabricas aparece com palavras de ordem de organização
pela base através de comitês de empresa pregando a greve como forma de luta
contra o arrocho. Essa vanguarda aglutinou-se objetivamente em torno do
sindicato dos Metalúrgicos de Osasco.
Os metalúrgicos de Belo Horizonte responderam a essas palavras de ordem
com a greve de onze dias, que se iniciou na Belgo-Mineira, estendendo-se a
16.000 operarios.
O surgimento da
vanguarda operaria nas fabricas, merece um estudo mais profundo,pois ela é
produto da necessidade da massa nesta etapa, apesar de exprimir-se ainda de
maneira obscura. Como vimos, a liderança pelega não convenceu. A contradição
entre o caráter social da produção e o caráter individual de sua apropriação, isto
é, a necessária concentração de operários para produzirem em grande escala e de
forma organizada, onde cada um cumpre a sua função, e a maneira desorganizada
de como os produtos são distribuídos na sociedade, onde a minoria patronal fica
com os lucros, gera uma luta constante e intensa entre os operários e patrões
que vai desde as formas mais simples até os choques mais diretos e violentos, em
torno dos inúmeros problemas que variam desde as reivindicações especificas de
cada secção até as lutas que atingem toda a classe. A massa com seus inúmeros
problemas encontra as mais variadas formas de exprimi-los, que vão desde os
contatos individuais até as formas coletivas e mais amplas de discussões nas
fabricas. De lutas como a preservação do 13º salário em 64, por problemas
específicos em cada fabrica (segurança, higiene, etc) levando os operários à
greves parciais, inclusive, logo após o golpe, surgem aqueles que por melhor
absorverem e entenderem as necessidades da classe e por se destacarem na
condução destas lutas, passam a merecer a sua confiança e a partir disso são
impulsionados a conduzi-la para a solução de suas necessidades e problemas do momento.
Esse processo de luta é a “escola de guerra”. Nas reivindicações da classe
operaria manifestam-se sempre as contradições dela com sua antagônica no poder.
Neste processo, a vanguarda, tem consciência que o que interessa a classe
operaria não são apenas as concessões dos exploradores, na medida que
continuará sendo explorada, mas a destruição de toda a estrutura social que
possibilita a exploração. Entretanto, a vanguarda organiza a classe, a educa, e
ganha sua confiança nestas lutas parciais. As vitórias obtidas nestas lutas
estimulam a classe a prosseguir com reivindicações mais avançadas e dá
confiança a esta mesma vanguarda, que compreende, também, a necessidade de uma
organização da classe que vise a tomada do poder pela classe, com uma visão do
contexto social capaz de avaliar as forças e capaz de conduzir a classe em
todos os níveis de sua luta até a tomada do poder. A tradição da luta da classe
operaria brasileira é quase que só em torno do movimento sindical e, a
vanguarda que surge, dada a ausência de uma organização de classe sob um
programa revolucionário capaz de desenvolver as formas de luta que a conduz ao
poder, acerca-se dos sindicatos e ai então surge o choque entre as direções
sindicais pelegas e aquelas que têm ligações com a classe. São as chamadas
oposições sindicais. As oposições sindicais lançam as palavras de ordem de
organização pela base e através dos C.E. empreendem vigorosa campanha contra os
pelegos sindicais. Muita coisa já se conseguiu de concreto com o trabalho das
oposições, principalmente, nas assembléias anti-arrocho programadas pelo MIA e
na comemoração do último Primeiro de Maio na Praça da Sé. Essas palavras de
ordem, por não virem acompanhadas de uma teoria programática que apresentasse
concretamente as perspectivas e a concepção de tais formas de organização na
pratica, caem no vazio. Nos setores onde existem os C.E., estes não funcionam
como devem, isto porque foram formados na ‘base’ da improvisação, contendo uma
serie de desvios, o que prejudica muito a objetividade de luta. Temos vários
exemplos que demonstram por um lado o espírito de luta e o sentido
revolucionário da vanguarda e por outro mostra a sua imaturidade política e
inexperiência na organização da classe.
A GREVE DE OSASCO – BALANÇO CRITICO
Antes de analisarmos
o que foi a greve de Osasco e o que ela representou para o M.O.,é necessário
definir o que é uma greve.
O operário recebe um
salário pelo trabalho que executa para o patrão. É lógico que o interesse do
patrão é pagar menos salários para que seu lucro seja maior. Por outro lado, o
operário, que só tem a sua força de trabalho para vender, procura vende-la pelo
preço mais alto. Um operário isoladamente não tem condições de fazer frente á
ambição patronal e a única forma de evitar que seu salário seja rebaixado ou
conseguir que estes sejam aumentados é unir-se com outros operários que são
vitimas da mesma exploração.A forma de se encaminhar esta luta é paralizando o
trabalho para conseguir as reivindicações. As greves surgem da própria sociedade
capitalista, é uma forma bem simples em que se expressa a luta de classes. As
greves mostram aos operários a sua força e também as do patrão. Mostram que o
patrão é o seu principal inimigo e que o governo protege sempre os patrões e
que também a policia existe para impedir as greves ou evitar as suas
conseqüências. A colocação da palavra de ordem ‘greve’, mostrou para a
vanguarda operaria de Osasco o estado de revolta da classe, motivado pelas
conseqüências do arrocho salarial e alta constante do custo de vida e que
realmente haviam as condições objetivas para deflagrar o movimento. Todos
lançaram-se na organização da greve empiricamente. Os C.E.,recém-organizados, com
exceção dos da Cobrasma, tinham a principal responsabilidade nessa tarefa. Reivindicava-se
aumento salarial de 38%, aumento de três em três meses do acordo com a elevação
do custo de vida, contrato coletivo de trabalho por dois anos, e reivindicações
especificas de cada fabrica. A vanguarda baseava-se nas necessidades imediatas
da massa, por isso as reivindicações acima citadas, mas, por outro lado, se
explicava que o sentido mais importante da greve era o político, na medida em
que se lutava contra a lei do arrocho salarial e contra a própria lei de greve
e que aquela ação era apenas uma parte da longa luta pela derrubada da ditadura
dos patrões. Evidencia-se inexperiência dessa nova liderança na medida em que
essa não soube conduzir no mesmo nível a propaganda junto às massas e a
organização da vanguarda. Este descompasso entre a propaganda e a organização
precipitou as condições objetivas para a greve. Empolgada com a receptividade
das massas a vanguarda acaba por ficar a reboque destas, e ao invés de proceder
uma analise do movimento político nacional, baixou a palavra de ordem de greve
e de ocupação das fabricas, sem estar subjetivamente em condições, antecipando
mesmo uma posição anterior de se tirar a greve por ocasião de dissídio
coletivo. Dado o caráter ainda bastante limitado dos C.E.,visto que funcionavam
sem uma perspectiva clara e definida, estes passaram a se apoiar mais no
aparelho sindical do que na organização da massa. A falta de clareza teórica
causada pela falta de discussão política levou a vanguarda a não se preocupar
em organizar uma estrutura clandestina paralela ao sindicato para dar
continuidade à luta na clandestinidade. Na pratica, subestimou as forças da
repressão, achando que o governo iria negociar e não reprimir violentamente, inclusive,
intervindo imediatamente no sindicato. Comparou-se o M.O. que tem conseqüências
imediatas na economia e prepara a classe revolucionaria para assumir a direção
do pais, e por isso é bastante temível pela reação,com movimentos de setores da
pequena burguesia (estudantes, artistas, etc) que por maiores perigos à classe
dominante. Esse imediatismo foi sentido em todos os momentos posteriores e que
obrigou a improvisações. A ocupação das fabricas devido à falta de clareza, à
não planificação foi também improvisada, deu a greve um caráter insurrecional, quando
a mesma era localizada e feita a partir de reivindicações da classe e não a
partir de imposições que a colocasse num enfrentamento definitivo com a burguesia.
Com isso não queremos dizer que nas próximas lutas a tática de ocupação de fabricas
não deva ser utilizada. No passado, antes de 64, a pelegagem decretava greves e
mandava os operários para suas casas. Agindo assim desmobilizavam a classe
evitando que ela mantivesse unida e discutindo problemas que lhe estavam
afetos, para que os conchavos com os patrões não encontrassem resistência nas
bases operarias. A outra importância da ocupação está no fato que as greves com
ocupações de fabricas, experiências recém iniciada no Brasil, ultrapassam os
limites das reivindicações normais dentro do capitalismo. Independentemente das
reivindicações grevistas a ocupação temporária das empresas acerta um golpe no
ídolo da propriedade capitalista. Toda greve de ocupação, independente do
objetivo reivindicatório que a determinou, coloca na pratica o problema de
saber quem é o dono da fabrica: o patrão ou os operários. A ocupação poderia se
dar com prazo determinado, objetivando discussão política com toda a massa no sentido
de se ter consciência do próprio significado das ocupações, sobre os objetivos
da greve e a necessidade de sua extensão a outras fabricas. Quando as fabricas
fossem desocupadas a massa deveria sair mobilizada para ações praticas como
piquetes, panfletagem, etc, em outras fabricas ainda não em greve, e através da
organização por bairros permaneceria em constante mobilização, objetivando
discussão política, em grupos pequenos se assim o exigissem as condições de
segurança. A greve de Osasco mostrou que é possível conduzir a classe para um
enfrentamento com a ditadura patronal, sendo para isso necessário organiza-la. Significa
uma nova e grande experiência para todo o movimento revolucionário brasileiro. Apesar
de ter sido propagado pela imprensa burguesa e alguns oportunistas de
‘esquerda’ que a greve de Osasco não havia conseguido nenhum de seus objetivos,
há fatos que falam bem alto para a massa: os aumentos recebidos pelos operários
de varias fabricas (Cobrasma de 15 à 35%. Cimaf 10%, etc), indenização aos
companheiros demitidos, e o atendimento das reivindicações especificas como:
higiene, segurança, insalubridade, enfermaria, etc, que vem se dando à partir
da greve, deixa claro aos operários que: isto são vitórias parciais da greve; a
greve é uma forma de luta para conseguirmos as nossas reivindicações; pois se
obtemos melhores resultados em nossa luta necessitamos elevar o nosso nível de
organização, e aumentar as discussões políticas para despertar a consciência de
luta nos mais amplos setores da massa. Com a greve, o sindicato caiu na mão de
policiais, centenas de companheiros foram presos, dezenas perderam seus
empregos, grande parte perdeu seus dias de trabalho, muitos companheiros estão
na ilegalidade e apesar disso tudo ninguém se arrependeu de ter aderido à
greve, aqueles que não aderiram ao movimento são desprezados pelos
companheiros, o que não significa que para as próximas lutas não se deva
discutir, e aprofundar com eles no sentido de que avancem e participem do
movimento. Ficou claro para as
lideranças que: 1) Apesar da repressão brutal que impossibilitou a extensão e
continuidade da greve, a demonstração do nível da luta de classe, fez os
patrões cederem em varias reivindicações. 2) A brutalidade da repressão foi
prejudicial para o movimento em si, porém benéfica a longo prazo, dado o avanço
político da massa, com o desmacaramento da ditadura, deixando claro que
reprimirá violentamente qualquer luta justa da classe trabalhadora. 3) Na luta
a classe elevou o seu nível de cosnciencia devido a realização de assembléias,
discussão política possibilitando maior aceitação das palavras de ordem das
lideranças, e o surgimento de novas lideranças o que facilitou a organização
dos mais amplos setores da massa, que vem se dando através da formação de
núcleos clandestinos para discussão política e realização de ações praticas.
Apesar de tudo o que houve a disposição de luta continua e isso nos permite
dizer que ‘os homens que se sujeitam e resistem a tais calamidades para quebrar
a resistência de meia dúzia de burgueses, saberão sem duvidas também quebrar a
força de toda a burguesia”.
PERSPECTIVA PARA O FUTURO DA LUTA
Os setores conscientes
da classe operaria, sua vanguarda, não podem ter mais duvidas quanto à
existência das condições objetivas de se fazer greves. Só falta criar condições
subjetivas, que se resumem na organização da classe. Aproxima-se o dissídio
coletivo para todas as categorias, sabemos que dentro das leis do arrocho o
aumento não corresponde nem a metade da elevação do custo de vida no ano de 68,
isso sem contar o que perdemos nos anos anteriores. Os pelegos sindicais,
percebendo a disposição da classe, mais uma vez farão, manobra para engana-la, dizendo
que ‘não entraremos em dissídio, exigiremos um aumento salarial digno e se não
for concedido entraremos em greve”. Essa tática oportunista já é velha e também
conhecemos a sua saída. Se o sindicato não entra em dissídio o patrão entra, e
daí eles dirão que ‘não estamos preparados para a greve, que ninguém tem o
direito de, numa aventura, jogar pais de família no abismo, etc”. Os pelegos
para sobreviverem se apóiam na desorganização da classe.A vanguarda para ser a
direção autentica da classe deve organizá-la e apoiar-se na sua organização.O
arrocho salarial está ai´. A tatica para combate-lo é a greve. No processo das
greves, a vanguarda amadurecerá como direção e a classe compreenderá que o
arrocho é apenas uma faceta de poder patronal e que só ficará livre dos
arrochos quando derrubar esse poder numa luta prolongada, debaixo de um
programa socialista revolucionário de libertação. A tarefa da vanguarda de cada
categoria, de cada fabrica é preparar as condições subjetivas de organização, para
com ou apesar dos pelegos, lutarmos concretamente por o aumento salarial menos
injusto. Desde já deve-se iniciar a formação dos comitês de greves por secção,
por fabricas e por municípios. Não devemos nos iludir nesta etapa com uma greve
geral. Devemos sim, concentrar nossas forças nas fabricas onde existam melhores
condições de greve. Lembrem-se que a greve de 16.000 metalurgicos mineiros, até
o 6º dia só acontecia na Belgo Mineira e em Osasco, a greve iniciou-se em
quatro fabricas, estendendo-se só a partir do dia seguinte. Uma greve apavora
os patrões para trabalharem para eles próprios na medida em que lutam por seus
interesses, ela coloca em duvida aqueles que se julgam senhores onipotentes dos
meios de produção, ela leva os patrões a fazerem concessões e arrasta
companheiros de outras fabricas à adesão, não somente em solidariedade, mas
porque são vitimas da mesma exploração e são encorajados a tomar posição. Os
grevistas de Osasco e a sua vanguarda levam as seguintes reivindicações de
caráter geral e as propomos a outras categorias na certeza de que vão ao
encontro dos interesses de toda a classe: a) aumento salarial de acordo com a
elevação do custo de vida. b) Contrato coletivo de trabalho, isto como forma do
combate ao desemprego. c) Aumento salarial de três em três meses. As
reivindicações especificas de cada fabrica devem ser levantadas ‘in loco’ pelos
companheiros,pois ajudará muito na mobilização da massa.
PARALIZAÇÃO
A paralisação de
cada fabrica deve apoiar-se na organização dos Comandos Clandestinos internos. A
forma da paralisação através de piquetes nas portas de fabrica está superada, o
piquete deve ser fator de estimulo para que outros adiram ao movimento e não
como fator de imposição no sentido de se aderir à greve. A pratica demonstrou
que a forma mais correta e educativa para a massa é a greve partindo da
organização interna através dos comandos clandestinos de cada secção, parando
uma a uma, com a massa de cada secção para engrossar as fileiras e indo parar
as outras. Isso funciona se existir organização, estimula os vacilantes e
impede a identificação dos lideres. A saída das fabricas deve ser em massa pois
grupos isolados tornam-se fáceis para a repressão. Os comandos clandestinos da
greve devem ser organizados ao nível de cada secção, cada fabrica, cada
município. Com o avanço do processo, será necessário a formação de comandos
gerais a fim de coordenar a luta em nível nacional. Esta é a experiência dos
trabalhadores de Osasco. O objetivo deste documento é fornecer dados de analise
a toda vanguarda revolucionaria brasileira na luta pela transformação social,
pelo socialismo.
JOSÉ IBRAHIN
JOSÉ CAMPOS BARRETO
OUTUBRO DE 1968.
Artigo publicado no Cadernos do Presente, 1978. Uma coletânea de artigos que, depois de 10 anos, fazia o balanço dos processos de 1968. Retirado do site:http://www.centrovictormeyer.org.br/attachments/104_Greves%20de%201968.Cadernos%20do%20presente-2%2007.1978.pdf
A história do movimento
de Osasco
José Ibrahim
Eu considero o sindicalismo brasileiro bastante
limitado até mesmo para conduzir as lutas econômicas da classe operária. É um
sindicalismo paternalista, atrelado ao Ministério do Trabalho, fora da massa.
No entanto, se remontarmos ao período anterior a abril de 1964, vemos que o
Partido Comunista Brasileiro, que detinha a hegemonia do movimento operário, e
estava à frente de quase todos os sindicatos, não só aceitou essas limitações, como
também aprofundou-as, em função de sua estratégia geral, de conquista do poder pelo
caminho pacífico. Esta prática fica bastante caracterizada durante o governo do
Jango, quando o movimento operário é utilizado como massa de manobra do
populismo. Apesar disso, em determinados momentos, o movimento popular escapava
ao controle do Partido e realizava greves memoráveis, como a de 1953 e a de
1963. Nesta última a radicalização foi muito grande, com manifestações de rua,
nas quais foram incendiados carros de polícia. Ocorre que a força dessa
mobilização não refletia um elevado nível de organização da classe operária.
Este é um fenómeno perfeitamente explicável, quando se analisa a conjuntura política
daquele período. De qualquer forma toda aquela experiência de movimentação de massa,
ainda que limitada e não dirigida a criar uma organização pela base, foi assimilada
por um setor da classe operária, formado por elementos que participaram mais
diretamente das assembleias sindicais, das manifestações organizadas pela CGT
(Confederação Geral dos Trabalhadores) e dos piquetes destinados a garantir o
sucesso das greves. É bom lembrar que o piquete cumpriu a função real de
preencher o vazio criado pela ausência de um nível de organização mais elevado.
Foi, em certa medida, um instrumento utilizado pelo reformismo para suprir a
falta de organização nas empresas, embora contasse com a participação ativa dos
operários mais combativos, que seguiam mais de perto a orientação do Partido e
dos sindicatos. Quando ocorreu o golpe de abril de 1964, e o conjunto da esquerda
mergulhou em profunda crise, foi esse setor mais avançado da classe operária
que se voltou novamente para o sindicato, visto como o único órgão capaz de
canalizar o descontentamento da massa, pois não surgiu outra alternativa por
parte das forças de esquerda. Agora, procurava-se tirar as lições do golpe,
fazer uma autocrítica na prática. Foi a partir daí, que começaram a surgir as
oposições sindicais, e é assim que eu analiso a origem de nosso grupo em
Osasco. Nós surgimos de uma crise geral das esquerdas.
Nas fábricas, nasce uma nova
concepção de trabalho
Eu e alguns companheiros tínhamos ligações com
operários militantes do Partido, (jamais pertencemos à organização) que vinham
divergindo, desde antes de abril de 1964, de sua linha política e criticavam o
cupulismo e a falta de preocupação com a organização de base.
Em decorrência disso, haviam organizado por volta de
1962, 1963 um comitê de empresa na Braseixos, uma experiência pioneira,
criticada pelo Partido como prática divisionista; segundo a direção do Partido
os patrões poderiam envolver o comitê e tratar diretamente com ele e
desconhecer o sindicato. Sob a influência desses companheiros fundamos também
na Cobrasma, onde eu trabalhava desde os 14 anos (1961), um comitê clandestino,
que se dedicou à distribuição de pequenos panfletos, volantes que agitavam os problemas
existentes na fábrica e algumas questões políticas mais gerais. Eram colocados nos
banheiros, nos armários e dentro dos capacetes dos companheiros de trabalho,
que os passavam adiante. Era um trabalho miúdo, cujo centro era a atividade
sindical, embora mesmo antes do golpe tivéssemos uma atitude crítica frente ao
sindicato. Achávamos que o sindicato era um instrumento de luta importante, que
se devia atuar dentro dele, sem desconhecer, entretanto, suas limitações.
Assim, começamos a defender a necessidade de criação de uma organização
independente, mas sem negar a participação no sindicato. Era necessário negar o
sindicato a partir de dentro, pois era uma bobagem dizer "abaixo o sindicato,
viva o comité de empresa"! Essa posição sempre norteou nosso trabalho em Osasco.
Jamais a abandonamos, e pessoalmente, continuo com essa posição até hoje.
Na época em que iniciávamos essa experiência de
criação de um comité clandestino na Cobrasma que, se não me falha a memória,
foi por volta de 1962/63, surgia em Osasco um outro elemento que deve ser
levado em consideração, para qualquer análise sobre os acontecimentos
posteriores: a Frente Nacional do Trabalho, congregando elementos da Ação
Católica e da Juventude Operária Católica (JOC), e fazendo oposição aos
comunistas dentro do sindicato. Eles acusavam o sindicato de fazer muita
agitação política e esquecer os problemas dos operários nas fábricas. Tinham
uma visão cristã da questão operária e defendiam para tanto o diálogo entre
patrões e trabalhadores.
Assim, um núcleo de militantes da FNT que
trabalhavam na Cobrasma organizou, por volta de 1963, uma comissão de fábrica,
semi-legal, formada por 10 trabalhadores, e junto ao patrão reivindicaram sua
legalização. Este, a princípio não aceitou o diálogo e o pessoal mais combativo
da comissão foi inclusive, dispensado.
Enquanto isso, nós mántínhamos o comité clandestino,
e, antes do golpe de abril de 1964, decidimos nos aproximar da comissão, pois,
ao nível do trabalho de massa na fábrica, ela realizava um trabalho de agitação
semelhante ao nosso. Como eu não era "queimado" e tinha muita
mobilidade dentro da fábrica, por trabalhar no setor de controle de qualidade, fui
destacado para fazer a aproximação entre os dois grupos. Daí em diante, passei
a fazer parte das duas organizações. Isto é, do comité clandestino e da
comissão dos dez.
A comissão da Cobrasma: uma
experiência organizativa nova
Logo após o golpe ocorreu um fato que fez com que a
comissão ganhasse importância. Um dia houve uma explosão na fábrica e um
companheiro muito conhecido, que trabalhava na boca do forno, feriu-se
gravemente e morreu no hospital. O acontecimento comoveu todo mundo e a comissão
programou uma paralisação para a hora do enterro. No momento exato tocou-se o
apito da fábrica e houve um silêncio total, com todo o pessoal tirando os capacetes
em sinal de respeito. Durante cinco minutos a fábrica parou. Inclusive os
chefes e os engenheiros que estavam na produção.
Imediatamente os patrões procuraram estabelecer um
diálogo mais direto com a comissão, tentando envolvê-la e desmoralizá-la. Nós
reivindicamos então sua legalização, com imunidade para os representantes -
isto é , a garantia de que não seriam despedidos. De início a proposta foi
negada, mas finalmente a própria direção da empresa propôs que se realizassem
eleições dentro da fábrica, para que os membros da comissão fossem escolhidos.
A fábrica foi dividida em 19 setores, correspondentes
às 19 seções existentes, e cada um deveria eleger um representante e um
suplente para a comissão, que ficou composta por 38 operários (19 efetivos e 19
suplentes), representando mais ou menos 3 200 trabalhadores. A força mais
influente na comissão era a Frente Nacional do Trabalho, que contava com a maioria
dos representantes. Havia também operários independentes, iniciantes na luta
sindical, sem nenhum compromisso político. Eu fui eleito pelo setor de controle
de qualidade e era o único elemento de esquerda.
Na primeira reunião da comissão foi eleita uma mesa
diretiva, sendo que o presidente e o vice-presidente eram da FNT, o primeiro
secretário era um companheiro independente e eu o segundo secretário.
De acordo com os estatutos, a comissão deveria
reunir-se mensalmente com a diretoria da empresa e para isso eram feitas
anteriormente reuniões preparatórias, no sentido de elaborar uma agenda de
problemas, previamente enviada aos patrões. A ata da reunião era assinada pela
diretoria da empresa e pela mesa diretiva da comissão.
Embora participássemos dessa comissão, continuamos
mantendo organizado o comitê clandestino, e, através dele, pretendíamos
impulsionar a atuação da comissão, lutar para que ela avançasse e realizasse um
trabalho de base dentro da fábrica. Além disso, a comissão sempre corria o
risco de ser dissolvida pelos patrões e nesse caso o comité daria continuidade
à organização e ao trabalho clandestino.
Fortalecimento do grupo de Osasco
Como era de se esperar, as divergências logo surgiram
no interior da comissão . Ela passou a realizar um trabalho de cúpula, servindo
de amortecedor entre patrões e operários, o que correspondia à visão da FNT.
Apenas, os pequenos problemas eram resolvidos, os grandes não eram solucionados
e a maioria ficava em suspense. Aos poucos a comissão foi se desgastando
perante a massa , pois além de sua inoperância os patrões passaram a promover a
cargos de chefia os representantes eleitos.
Percebendo o que ocorria, nós do comitê clandestino,
começamos a combater essa tendência, lutando contra a burocratização e a
prática colaboracionista da comissão.
Passamos então a incentivar a mobilização na
fábrica, a organizar o pessoal por seção e a mostrar que nossas reivindicações,
tinham que ser conquistadas na luta, através da organização, da pressão e,
inclusive, da paralisação. Alguns companheiros da comissão começaram a
concordar com a nossa perspectiva, mas ainda de uma forma muito tímida. Com o
tempo a FNT foi se desgastando e nossa influência crescendo à medida que
dávamos um encaminhamento mais radical às reivindicações na fábrica. Dentro
dessa perspectiva em fins de 1966, organizamos uma operação tartaruga, como
forma de pressão para obter aumento salarial. A produção chegou a cair quase
30%, sem que os patrões conseguissem detectar a atuação da comissão. Quando nos
chamaram para conversar, dissemos que os operários ganhavam muito pouco e por
isso a produção não saía. A empresa terminou concedendo reajuste e apesar de
ser menor do que esperávamos, significou uma vitória parcial, que marcou a
atividade da comissão.
Por outro lado, a essa altura dos acontecimentos , a
posição de esquerda dentro da comissão já estava bastante fortalecida. Tanto é
que, por ocasião das eleições para a segunda comissão, todo o pessoal que vinha
sendo trabalhado pelo comitê clandestino conseguiu ser eleito. A Frente
Nacional doTrabalho não elegeu quase ninguém, e eu fui
reeleito
e escolhido presidente da mesa diretiva da comissão enquanto o companheiro
Roque Aparecido era eleito secretário da comissão.
Gozando das regalias e imunidades que havíamos
conquistado, intensificamos o trabalho de agitação e organização em todas a
seções e núcleos a elas ligados. Em nossa prática procurávamos não ser
paternalistas, não assumir uma posição de cúpula, não resolver os problemas
pela massa, mas fazê-la participar dando-lhe tarefas concretas.
Com isso, contribuíamos para o surgimento de novas
lideranças, que passavam a receber uma atenção especial do comitê clandestino,
no que diz. respeito a discussões sobre a situação política do País, e mesmo
sobre a questão do socialismo. Procurávamos nesse sentido, sempre ligar essas
discussões à situação concreta da fábrica, segundo nossas possibilidades e
nosso baixo nível político.
Ao mesmo tempo, como grupo de esquerda, nós nos
reuníamos de forma clandestina e acompanhávamos o debate político-ideológico
que se desenvolvia no conjunto da esquerda brasileira, embora continuássemos
mantendo nossa independência, porque não víamos nenhuma alternativa nas
propostas apresentadas.
Participar do sindicato, organizar
as bases. E preparando greves
É bom ressaltar que nunca abandonamos a atividade
sindical, embora de 1964 a 1965 o Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco
estivesse sob intervenção, sendo presidido pelo Camargo, um crioulo que sempre
fizera oposição de direita no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Os
membros da interventoria eram operários já bastante corrompidos, ligados a UDN
e ao Herbert Levy. Enfim, representantes do sindicalismo amarelo. Foi nessas condições
que começamos a fazer oposição no Sindicato, desenvolvendo uma luta por eleições
livres, apoiados na própria legisiaçao trabalhista. Mesmo com o fim da interventoria,
quando, através de uma convocação de última hora o interventor conseguiu organizar
uma chapa única, com o apoio da FNT, e, eleger o Henos Amorina, um operário da
Brown Boveri, nós continuamos dentro do sindicato. A segunda comissão da
Cobrasma, da qual eu era presidente, foi eleita pouco depois da diretoria do Henos,
que embora aceitasse o sindicalismo paternalista e assistencialista, não era
uma pessoa desonesta ou conscientemente de direita, como o Joaquinzão (Joaquim
Andrade, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo). O nosso
trabalho na Cobrasma nos deu uma grande autoridade para atuar nas assembleias
sindicais e atrair para nossas posições os melhores elementos de outras
fábricas. Muitos haviam sido do Partido, vinham de outras regiões do país,
tinham liderado greves e até mesmo estado na prisão. Assim, nós fomos nos
encontrando e aglutinando no decorrer da luta e em função dela, até se
constituir num importante grupo de esquerda, tendo como principal ponto de
apoio o pessoal da Cobrasma.
Nosso trabalho no Sindicato nos distinguia de todas
as outras oposições sindicais e eu acho que essa diferença explica porque fomos
a única oposição que conseguiu ganhar a direção de um sindicato. Ao combater a
atuação do sindicato, nunca dizíamos que a diretoria era pelega ou traidora, e
nem mesmo vaiávamos os pelegos. Apenas apresentávamos uma alternativa baseada
no exemplo da Cobrasma e da comissão de empresa. Além disso, quando eles diziam
durante a campanha salarial que era necessário reivindicar 30% de aumento,
porque de acordo com a tabelinha do governo o reajuste seria de 25%, nós afirmávamos
que essa era uma proposta incorreta, que o certo seria reivindicar 50%, para dessa
forma denunciar o arrocho e o aumento do custo de vida. No entanto, alertávamos
que não éramos capazes de conseguir o aumento porque estávamos desorganizados.
Era preciso se organizar melhor para ir à greve e que só através dela
conseguiríamos exigir mais.
Como se vê, nossa ascenção no sindicato foi um
processo, e, durante esse período, ocorreu um fato dentro da Cobrasma que
contribuiu decisivamente para desmoralizar a direção do sindicato. Nós
estávamos numa campanha por aumento salarial, dentro da empresa, e a diretoria
aproveitou para despedir, por justa causa, 40 soldadores da montagem de vagões,
cuja tarefa já havia terminado. O presidente e o advogado do sindicato e nós da
direção da comissão nos reunimos com a diretoria da empresa para discutir o
problema. Como os patrões se mostrassem intransigentes, o presidente do
sindicato disse apenas que iria entrar com um processo na Justiça do Trabalho,
solução ideal para a empresa, levando em consideração o tempo de duração do
processo. Da parte da comissão afirmei que não aceitávamos a solução proposta e
que paralisaríamos a fábrica, caso os companheiros não fossem readmitidos. Daí,
passamos à agitação na fábrica e realizamos duas assembleias no sindicato, que
contou com o comparecimento maciço do pessoal da Cobrasma. Na primeira assembleia,
denunciamos a posição assumida pelo sindicato e por ocasião da segunda a
diretoria não compareceu, ficando o sindicato em nossas mãos.
Demos um ultimatum à empresa e nos preparamos para a
greve. Na última hora ela recuou e alguns soldadores foram readmitidos e os
demais indenizados. Esse movimento aumentou bastante o prestígio da comissão da
Cobrasma e contribuiu para a desmoralização da direção do sindicato.
Oposição Sindical em Campanha
Foi em decorrência dessa vitória na Cobrasma que, no
início de 1967, começou a se espalhar o boato de que nós iríamos sair com uma
chapa de oposição para concorrer às eleições do sindicato, e que eu seria
candidato à presidência. Por essa época o grupo de esquerda já havia crescido
bastante e sua influência se estendia por várias fábricas. Para nós o
sindicato, apesar de ser um instrumento válido, era um órgão limitado e o mais importante
era a organização pela base, os comités de fábrica, legais ou clandestinos.
Assim pensando éramos contrários à diluição do grupo no sindicato e foi por
isso que eu fui o único integrante dessa organização a sair como candidato à
direção do sindicato. O restante da chapa era formado por elementos da FNT e
independentes, que estavam sob nossa influência.
Apesar de sermos minoria na chapa resolvemos dela
participar, pois achávamos que o importante era o programa por ela defendido.
Era um programa de classe, que saía dos marcos do assistencialismo e levantava
a luta contra o arrocho, contra as leis antioperárias, principalmente a lei de
greve. Durante a formação da chapa entramos em contato
com a direção do PC, no sentido de incorporá-lo à composição. No entanto a
direção do Partido se negou, achando que era necessário marginalizar os
cristãos e compor com a situação. E mais, afirmou que éramos aventureiros, sem
nenhuma chance de ganhar, pois a situação contava com a máquina sindical.
Entretanto, as bases do Partido participaram de nossa chapa, enquanto a direção
ficou com a situação.
O ponto chave de nossa campanha sindical foi a discussão
do programa com as bases de todas as fábricas. Para isso contamos com a
participação de um grupo formado por cerca de cem companheiros, mobilizados
para divulgar o programa da oposição nas portas das empresas. Foi durante a
campanha que se criaram os embriões do que mais tarde seriam os comités nas
outras fábricas.
A vitória da Oposição. Suas novas
tarefas enquanto diretoria
As eleições se realizaram em julho de 1967 e nós
vencemos com maioria absoluta em primeira votação. Foi a primeira vez na história
do sindicalismo que uma chapa de oposição, concorrendo com duas outras e sem
nenhuma ligação com a máquina sindical ou com qualquer tendência política
tradicional no movimento operário, obteve uma vitória dessas.
Vale ressaltar que nós perdemos em todas as fábricas
e só ganhamos na Cobrasma, onde tivemos 99% dos votos. Só a chefia não votou
conosco.
No início de nosso mandato tivemos que enfrentar
sérias dificuldades. Havia muita descrença, pois os operários não tinham
grandes ilusões na direção sindical, nem no próprio sindicato. Apesar disso,
fomos ganhando autoridade no decorrer da luta.
Embora fôssemos contra o assistencialismo no
sindicato, nós não o eliminamos. Ao contrário, a assistência médica, dentária e
jurídica no sindicato até melhorou. Mas a ênfase de nossa ação passou a girar
em torno da luta económica e política. Para atingir esse objetivo voltamos toda
a máquina sindical, no sentido de criar uma organização independente, iniciando
um processo de mobilização fábrica por fábrica. A agitação de todos os
problemas internos na empresa abria caminho para a organização dos comitês
clandestinos.
No nosso trabalho de organização e mobilização
procurávamos esgotar, em todas as fábricas, os métodos legais de atuação,
utilizando o diálogo entre o sindicato e os patrões. Chegamos mesmo a convocar
mesas redondas, por fábrica, na Delegacia Regional do Trabalho, embora sabendo
que isso não levava a nada. Agindo segundo esses critérios, partíamos de um
princípio básico: não adianta radicalizar, apregoar a greve, se a massa não compreendeu
sua necessidade. Para que isso ocorresse foi que começamos pelas lutas parciais,
pelas lutas do dia a dia, ao nível de cada empresa.
Outro método de trabalho, por nós empregado, foi o
do exercício da democracia dentro do Sindicato. Nós deixávamos que as decisões
mais importantes fossem tomadas em assembleias gerais, onde a posição do grupo
de esquerda era sempre vitoriosa, obrigando, assim, a maioria da diretoria do
sindicato, sobretudo a FNT, a seguir a reboque de nossa orientação.
Ao mesmo tempo em que organizávamos os operários a
partir das fábricas, nos integramos aos movimentos mais gerais das organizações
sindicais, mesmo quando eles não correspondiam à nossa perspectiva para o
movimento operário. Foi o caso de nossa
participação
no MIA (Movimento Intersindical Anti-arrocho). que surgiu mais ou menos por volta
de setembro de 1967, com o objetivo de lutar contra o arrocho salarial. Seu
programa era convocar concentrações em vários Sindicatos, culminando com um ato
em praça pública. Foram programadas 5 concentrações: a primeira no Sindicato
tios Metalúrgicos de São Paulo, a segunda em S. André, a terceira em Osasco, a
quarta em Campinas e a última em Guarulhos. Somente os dirigentes sindicais
faziam parte do MIA, ficando os mesmos encarregados de convocar a massa para as
concentrações, nas quais eles eram os únicos oradores. Era uma tentativa de
dirigentes sindicais que não tinham massa, de aparecerem como nova liderança.
Seguindo nossas posições, defendemos no MIA a necessidade
de se agitar as palavras de ordem de organização pela base, formação de comitês
de fábricas e greve contra o arrocho, servindo de porta-voz das diversas
oposições sindicais. Na concentração promovida pelo MIA em Osasco, só falaram
representantes das oposições sindicais e nela foi aprovada a "Carta de
Princípios dos Trabalhadores de Osasco", onde aparecia todo o nosso
programa.
Foi nesse momento que houve a tentativa, por parte
do Ministério do Trabalho, de decretar intervenção no Sindicato dos Metalúrgicos
de Osasco. Eu cheguei a ser suspenso por 15 dias e o caso provocou uma grande
mobilização em defesa do sindicato, que contou, inclusive, com a solidariedade
de todos os dirigentes sindicais de São Paulo. A reunião de Guarulhos terminou
em conflito entre as oposições sindicais e os dirigentes pelegos, e nesse
processo o MIA extinguiu-se. Começou-se, então, a organizar o Primeiro de Maio
na Praça da Sé.
Bases participam do 10 de maio e
exigem a greve
Os dirigentes sindicais que integravam o MIA defendiam
a realização de um ato público com a participação das autoridades e convidaram
o governador Abreu Sodré, o Ministro do Trabalho e Franco Montoro. Nós, por
outro lado, achávamos que do Primeiro de Maio deveriam participar apenas
trabalhadores, sob pena de descaracterizar a manifestação e aparecermos
comprometidos com o governo. Como nossa posição não foi aceita, reunimo-nos no
sindicato e decidimos partici-par do ato publico, utilizando-o como forma de protesto.
Assumimos então a decisão de tomar o palanque e dele expulsar os pelegos,
autoridades e transformar a manifestação num ato autenticamente operário,
dominado pelas oposições sindicais, verdadeiras representantes das tendências
mais consequentes do movimento operário naquele momento. E asim foi feito.
Tomamos o palanque e logo em seguida saímos em passeata pelas ruas da cidade.
Eram cerca de 15.000 pessoas que desfilaram até a Praça da República, onde o
Barreto fez um excelente discurso, explicando a significação do Primeiro de
Maio e a ocupação do palanque.
Essa manifestação repercutiu profundamente em
Osasco, acentuando o nível de radicalização e de combatividade da massa. Era
uma época em que se realizavam pequenas paralisações por empresas e eram
frequentes as assembleias gerais no sindicato. Foi nessa ocasião que ocorreu a
greve da Barreto-Keller.
Os trabalhadores dessa empresa estavam reivindicando
aumento salarial, e os patrões haviam prometido atender suas reivindicações.
Mas no dia do pagamento o aumento veio apenas para alguns companheiros, numa
tentativa clara de dividir o movimento. Após o almoço, os operários
reuniram-se, cercaram o Departamento de Pessoal e disseram que só voltariam ao
trabalho quando o problema do aumento fosse resolvido. A seguir, telefonaram para
o sindicato e avisaram que estavam em greve. E eu segui para lá.
Formamos, imediatamente, uma comissão provisória com
os companheiros mais antigos na fábrica, para discutir a questão com os
patrões. A empresa não aceitou receber a comissão e disse que só discutiria
comigo. Rejeitamos essa proposta e a greve durou 7 dias. Um fato curioso: o
dono dessa fábrica, numa reunião, chegou a chamar-me de comunista que fazia o jogo
do imperialismo porque a sua empresa estava ameaçada pela Telespark e a G.E.
Nessa semana mobilizamos toda a massa, realizamos assembleias gerais e criamos
comités de solidariedade. Um clima de greve tomou conta de todas as fábricas e
os operários ficaram esperando a hora de parar. Na Barreto-Keller, apesar das
ameaças de dispensa, os patrões terminaram concordando em ceder: aumento
salarial, melhoria nas condições de trabalho e legalização da comissão de
empresa.
Entretanto, os operários não queriam aceitar o
acordo. A greve fora organizada por um comitê totalmente independente do grupo
de esquerda e do sindicato. Diante disso, nós do grupo de esquerda nos
reunimos, analisamos a situação, convocamos os comités de empresas e explicamos
que não estávamos organizados para ir à greve; que ela deveria ser feita
somente em novembro, época do dissídio coletivo dos metalúrgicos. Argumentamos politicamente
e os companheiros da Barreto-Keller terminaram aceitando.
Isso ocorreu em fins de maio de
1968.
Era um momento de intensa agitação política. Os
estudantes estavam nas ruas e alguns grupos de esquerda intensificavam as ações
armadas. Vários companheiros do grupo de Osasco, inclusive, eram atraídos por
um desses grupos. A maioria dos integrantes do grupo de esquerda tinha a
perspectiva de ir para a clandestinidade e realizar um trabalho de outro nível.
Apesar da euforia da radicalização, nós sabíamos que
havia um grau de organização suficiente para tirar a greve, mas não para
sustentá-la. Por isso, nossa intenção era transferir o movimento grevista para
novembro.
A posição do sindicato e do grupo de esquerda não
correspondia, no entanto, às expectativas da massa. Começaram a aparecer nas
fábricas pichações pedindo greve e os operários só falavam em paralisar o
trabalho. Era voz corrente que todos estavam dispostos a ir à gpreve, menos o
sindicato. De um lado, nos sentíamos cobrados e pressionados, e, de outro,
fazer a greve era, há muito tempo, uma questão importante para nós que procurávamos
nos afirmar como uma liderança de novo tipo.
Nesse sentido o exemplo de Contagem, em Minas
Gerais, que havia parado em abril, calara fundo na liderança de Osasco. Eu
havia estado lá depois do movimento e voltei convencido de que tínhamos mais
condições do que eles para realizar a greve. E havia também um dado concreto:
lá não houvera repressão, e, em São Paulo o movimento estudantil não estava
sendo reprimido. Por fim, existia uma questão política que norteava nossa
atuação prática. Estávamos ligados ao movimento de massa, mas ideologicamente
nos encontrávamos bastante comprometidos com as propostas de luta armada que
setores da esquerda começavam a levantar. Em outras palavras, partíamos da
mesma análise de conjuntura que o restante da esquerda estava fazendo: o
governo está em crise, ele não tem saída, o problema é aguçar o conflito,
transformar a crise política em crise militar. Daí vinha nossa concepção
insurreicional de greve. O objetivo era levar a massa, através de uma
radicalização crescente a um confronto com as forças da repressão.
Foi essa concepção que nos guiou quando, em julho de
1968, decidimos desencadear a greve. Era uma análise errada de conjuntura -
comum a toda esquerda - e um fator subjetivo a nossa vontade de fazer o
movimento.
A greve de julho de 1968: ocupação
de empresas, do Sindicato e passeatas
Com esse propósito partimos para organização do
movimento. Fizemos um esquema para a greve e um cronograma para as
paralisações. No primeiro dia ocuparíamos a Cobrasma e a Lonaflex,
paralisaríamos a Barreto-Keller e a Fósforos Granada, cujos operários tomariam
o sindicato. No segundo dia, seriam paralisadas Brown Bolveri e a Braseixos.
No terceiro, estenderíamos o movimento ao restante
das fábricas. Em três dias toda Osasco estaria em greve, e nosso plano era
estendê-la a São Paulo, só não contávamos com a repressão no primeiro momento.
Para isso nos baseávamos nas atitudes de Sodré, em relação ao movimento
estudantil e na posição adotada pelo Ministério do Trabalho por ocasião da
greve de Contagem.
A ocupação da Cobrasma foi detalhadamente planejada,
devido às dimensões da fábrica. Foi pensada a melhor maneira de impedir a
infiltração policial, a saída do pessoal, como reter os funcionários da
administração, dominar as vias de comunicação da empresa e como organizar
grupos para explicar à massa as razões da ocupação. Essa ação englobava, ao todo,
cerca de 200 companheiros pertencentes aos setores mais avançados da Cobrasma. Esse
mesmo esquema foi montado em relação à Lonafex e nosso principal ponto de apoio
eram os comités e núcleos clandestinos, que atuavam em cada fábrica. Para coordenar
o movimento foi formado um comando geral da greve, ao qual estavam subordinados
os comitês a nível de empresa. Somente os companheiros que integravam esses
comandos sabiam o dia e a hora do movimento.
A Cobrasma parou às 8:30, quando um companheiro do
Comando Geral, que trabalhava no setór de fundição, parou seu maçarico e
gritou: "PESSOAL, Ê AGORA!" Com essa palavra de ordem foram parando
seção por seção e o pessoal que deixava o trabalho passava a engrossar o
piquete. No mesmo dia às 13 h e 45 m parava a Lonafex.
Durante
a ocupação da Lonaflex houve alguns incidentes, pois entre os técnicos e o
pessoal de escritório havia grupos ligados à TFP, os quais tentaram atravessar
os portões, agredindo os companheiros que ali se encontravam. A massa veio em
seu auxílio e deu uma grande surra nos técnicos e sobretudo nos elernentos
pertencentes à diretoria da empresa.
O movimento grevista foi se estendendo e já de manhã
haviam sido paralisadas a Barreto-Keller e a Fósforos Granada. Eram duas
fábricas vizinhas, pertencentes ao mesmo dono, embora só a primeira seja
metalúrgica. A Granada tinha cerca de 400 operários, dos quais 350 eram
mulheres e menores, o que tornava o trabalho de organização bastante difícil.
Foi com a ajuda dos companheiros da Barreto Keller que conseguimos organizar um
grupo de companheiras mais avançadas, dispostas a criar condições para que a
Granada aderisse ao movimento. As duas fábricas pararam e os trabalhadores
desfilaram em passeata até o sindicato.
Depois de organizar a atividade no sindicato fui
para ia Cobrasma. A fábrica tinha dois portões: o da frente que conduzia ao
escritório central e, a seguir, um outro que dava acesso direto ao interior da
empresa. Como só este último havia sido tomado pelos companheiros, quando
cheguei aí, fui barrado pelos guardas da segurança que não me deixaram entrar,
dizendo que eu tinha de pedir autorização ao diretor da empresa. Este, da janela
do escritório, me chamou para conversar. Eu respondi que não tinha por que lhe pedir
autorização, pois a fábrica estava em nossas mãos e se os operáros me dessem ordem
para entrar eu pularia a cerca. E foi o que eu fiz. Os companheiros então me
levaram nos braços ate a assembleia, enquanto os patrões olhavam pela janela
prostrados.
Já
não mandavam na empresa.
Intervenção oficial: negociação e
repressão
A essa altura o Ministério do Trabalho já tinha
declarado a greve ilegal, decretado a intervenção no sindicato e designado
representantes para ir a Osasco discutir com a direção sindical e os grevistas.
Chegaram com tom conciliador, tentando me envolver e dizendo que se parássemos
a greve e desocupássemos as fábricas eles garantiriam o início de conversações
com os patrões. Mostrei que a greve havia começado nas fábricas e nós como direção
sindical a apoiávamos incondicionalmente. Além do mais, não estava autorizado a
realizar qualquer tipo de negociação. Por fim, falei que se eles quisessem,
poderíamos discutir com os companheiros das fábricas e com a assembleia dos
operários no sindicato. De fato, na Cobrasma, realizou-se uma assembleia, da
qual participaram os representantes do Ministério e um representante dos
patrões. Em nome do sindicato eu disse que a greve continuava firme e que
contávamos com um grande apoio; o representante do Ministério tentou defender o
governo, recebendo uma estrondosa vaia e o emissário dos patrões manteve uma
atitude conciliatória, dizendo que a empresa estava estudando o problema. Quando
saíamos dali a massa estava convencida de que o Ministério e os patrões inclinavam-se
a negociar.
Ao cair da tarde do primeiro dia de greve tudo
marchava segundo havíamos planejado. Eu circulava livremente no carro do
sindicato e não havia sinal de mobilização policial. A repressão chegou com a
noite. A tropa de choque da Força Pública entrou em Osasco trazendo cavalaria,
tatus, brucutus e atuando em consonância com o DEOPS e passando a controlar
todas as saídas da cidade. Os soldados cercaram as fabricas ocupadas, exigindo que
a massa saísse. Mas nenhuma medida foi tomada em relação ao sindicato.
Os companheiros da Cobrasma d i s c u t i r am o
problema e resolveram não abandonar a fábrica. Da rua, os soldados começaram a
fazer guerra de nervos. Foi então que o Barreto aproximou-se da cerca e fez um
discurso para os s o l d a d o s , conclamando-os a não acatar as ordens dos
oficiais e não reprimir os trabalhadores grevistas.
Foi uma cena impressionante. Toda a massa colocou-se
atrás dele e os soldados vacilaram. A oficialidade teve que falar com firmeza,
para fazer os soldados avançarem.
Era mais ou menos meia noite, quando começou a
invasão. Os tatus e brucutus romperam as barricadas e os companheiros, para se
protegerem, apagaram todas as luzes. A tropa de choque entrou na fábrica dando
rajadas de metralhadoras para cima e jogando bombas de efeito moral. Houve
muito combate corpo a corpo, pois os operários conheciam muito bem a fábrica e
valiam-se da escuridão.
Nesse momento a massa mostrou uma grande disposição
de luta e o pessoal do comando, liderado pelo Barreto, dirigiu a saída dos
grevistas. Foi aí que ocorreu um episódio pleno de tensão, envolvendo o
Barreto. Ele estava dando cobertura a um grupo que pulava o muro, quando surgiu
um pelotão da Força Pública. Então ele acendeu uma tocha, correu para perto do
depósito de gasolina e gritou: "ou vocês param, ou vai todo mundo para o inferno!"
Os soldados pararam, os companheiros conseguiram fugir, mas o Barreto foi preso,
quando tentava sair. Ao todo foram presos cerca de 300 grevistas, mas depois da
triagem feita na fábrica, somente uns 50 grevistas foram para a delegacia.
A Lonaflex também foi desocupada da mesma forma um
pouco antes. Só que lá não houve prisões. Depois de dialogarem com a Força
Pública e receberem a garantia de que ninguém seria preso, a massa saiu à rua
em um bloco único, que só se dispersou quando se havia distanciado bastante da
repressão.
Nessa
mesma noite também foi decretada a intervenção no sindicato.
Apesar de toda a repressão à greve, no dia seguinte,
a Brown Boveri parou. De acordo com o plano combinado, os companheiros mais
avançados deveriam reunir-se num determinado ponto da fábrica e desencadear o
movimento. Mas em decorrência da repressão na Cobrasma o esquema furou, pois só
uma minoria compareceu ao local combinado. Nesse momento um companheiro muito
combativo, não conformado com a situação, resolveu parar assim mesmo o seu
setor. Falou aos companheiros de trabalho e conclamou-os à paralisação, dizendo
que não era correto abandonar os trabalhadores das outras fábricas, que haviam
aderido ao movimento e sofrido a repressão. A massa aceitou a formou-se um grande
piquete para levar a greve às demais seções. Diante da ampliação do movimento
os diretores correram para a calderaria, o setor mais importante da empresa,
onde trabalhavam cerca de 600 operários. Caso esse setor continuasse
funcionando, não havia maiores problemas para a fábrica, mesmo com a
paralisação do resto do pessoal. Quando o piquete se defrontou, na seção, com
os patrões, a massa vacilou. Novamente o mesmo companheiro fez uso da palavra e
gritou que se o pessoal tivesse medo de parar as máquinas ele mesmo pararia.
Dizendo isso, saltou de onde estava e desligou a primeira máquina que encontrou
à sua frente. Em meio aos gritos de "Greve, Greve!" a seção parou. Depois
saíram às ruas e foram em passeata até o sindicato.
A fábrica seguinte a parar foi a Braseixos, que
ficava junto à Cobrasma. Mas esses companheiros abandonaram o trabalho e se
organizaram em grupos clandestinos nos bairros e nas igrejas.
Também nesta mesma noite o Sindicato foi cercado
pela polícia a qual ordenou sua desocupação. O interventor foi até a sede do
sindicato com um pelotão de soldados, para assumir as novas funções, mas não
conseguiu nem entrar no prédio. Quando a polícia invadiu o sindicato havia lá
dentro cerca de 80 companheiros e eram 22 h.
Final melancólico
No terceiro dia; nos reunimos para tentar articular
um esquema de organização por bairros. Mas embora a greve continuasse, não
havia se alastrado como se esperava. No quarto dia começou o refluxo: 50% dos
operários voltaram ao trabalho. A partir desse momento praticamente perdemos o
controle do movimento. Estávamos sendo procurados pela polícia, não podíamos
mais circular por Osasco. No entanto, a greve ainda continuou por mais um dia,
depois do qual cerca de 80% dos trabalhadores retornaram às fábricas.
Como era de se esperar, com o refluxo da greve, os
patrões negaram-se a atender qualquer reivindicação e começaram uma dispensa em
massa. Diante disso, retomamos a agitação, através de p a n f l e t o s , comi
cios- relámpago. protestando contra as dispensas e tentando articular uma nova
paralisação. Foi aí que os dirigentes sindicais de São Paulo, junto com a FNT e
a Igreja convocaram uma reunião com os patrões na DRT, onde chegaram a um acordo:
não haveria mais dispensa, seriam atendidas algumas reivindicações e as
empresas pagariam indenizações aos operários despedidos. Além disso, chegaram a
conceder reajustes salariais entre 15 e 20%.
Uma avaliação autocrítica e suas
Lições
Para terminar é necessário tirar algumas conclusões
dos acontecimentos. Um movimento de envergadura como a greve de Osasco, para
ser vitorioso, tem de levar em consideração uma série de fatores, como a
correlação de forças, o nível de organização, a disposição da massa. É preciso
sempre tentar obter vitórias parciais, para que se fortaleça a organização e se
eleve o nível de consciência da classe operária. Como eu já disse,
anteriormente, nós fizemos a greve num mau momento, pois se tínhamos condições
para mobilizar a massa, faltava-nos organização suficiente para sustentar o
movimento. Por outro lado, embora lutássemos sempre para criar uma organização
independente nas fábricas, os comitês que surgiram continuaram na dependência
do Sindicato. Não que tivéssemos intencionalmente fortalecido o Sindicato em
detrimento de nossa meta principal, mas porque se tratava de uma experiência
nova. Além disso, os comités também dependiam muito do grupo de esquerda, que
por sua vez controlava o Sindicato. Tudo girava em torno do Sindicato: era lá que
se realizavam as reuniões das comissões e dos comités. Jamais nos preocupamos a
sério em montar, nos bairros, uma infra-estrutura independente do Sindicato.
Foi por essa razão que quando a polícia ocupou o Sindicato e nós fomos
impedidos de circular em Osasco a greve entrou em refluxo.
Fora isso, existe o problema de nossa visão política
(nessa época bem militarista), que influiu na decisão de antecipar a greve, bem
como na forma de encaminhá-la. Essa posição nos colocava a todos no mesmo nível
de prática de um setor importante da esquerda brasileira, que se encaminhava
cada vez mais para as ações armadas. Entretanto, nenhum desses grupos oferecia
uma alternativa para o movimento operário, e nós de Osasco sem sermos um
partido, fomos levados pela contingência a assumir tarefas de direção política
da massa.