Elaboração, coleta e transcrição da entrevista: Alessandro de Moura.
[Falta revisão]
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Albertino começou a militar ainda
durante a década de 1950 no movimento pela emancipação de Osasco, destacou-se
como liderança neste movimento. Trabalhou na Cobrasma no período 1945-1964,
trabalhando nessa durante 19 anos. Período em que a fábrica já tinha cerca de
5.000 trabalhadores. Trabalhava no setor colarinho branco, uma espécie de setor
de RH. As mobilizações do período o colocava em contradição com a atividade que
exercia. Começou a interessar-se cada vez mais pelas atividades do movimento
operário, “o contato que tive com a periferia, e a situação social que havia,
aquilo me tocou muito” essa visão o “despertou para a luta social”, entrou em
contato com um ex-diretor do sindicato dos metalúrgicos. Isso porque avaliava
que esse trabalhador tinha uma postura “diferente do normal”. Porque quando
saiu da presidência do sindicato, esse trabalhador voltou para a linha de
produção, para a “bancada”. Albertino interpretou que esse operário, era “um
cara diferente, não era um sujeito que queria usar a posição [de dirigente]
para fazer degrau”. Esse trabalhador indicou-lhe dirigente sindical, antigo
dirigente da JOC “João Batista Candido”.
A partir disso, passou a
freqüentar as reuniões, atividades sindicais e militantes, principalmente na Igreja
Nossa Senhora da Conceição (padre Rafael), “a partir daí ouve uma evolução para
uma mudança de mentalidade”. Mario Carvalho de Jesus, então dirigente da Frente
Nacional de Trabalho. Em Santo Andre tinha um bispo muito atuante Don Jorge,
este ajudou a fundar a Frente em conjunto com Mario. Com isso, as mobilizações
de Osasco ligam-se e influenciam diretamente no ABC. A Frente nacional compunha
também o Movimento de Oposição Metalúrgica de São Paulo.
Por conta de todos esses fatores,
Albertino começou a proteger os trabalhadores. “Em virtude desse
relacionamento, a minha postura dentro da fábrica, em relação à militância
operaria mudou. Em vez de eu anular, eu passei a proteger. E eles conseguiram
formar um grupo dentro da Cobrasma”.
Numa determinada ocasião, houve
um acidente com um operário no forno da Cobrasma. O mesmo morreu carbonizado.
Os operários então passaram a lutar para dar visibilidade ao fato. Queriam
protestar como forma de demonstrar unidade. Combinaram de soar a sirene da
fábrica na hora do enterro para que desencadeassem uma paralisação da fábrica. Quando
“a direção da Cobrasma percebeu que havia uma organização” os operários já
tinham tocado a sirene para paralisar a linha sem que a administração soubesse.
A administração queria punir os
responsáveis. Albertino foi chamado pela administração, queriam que lhes
dissesse os nomes, mas Albertino recusou. A patronal intensifica a perseguição
aos operários de todas as formas possíveis. Albetino já trabalhava na Cobrasma
a 19 anos, por isso não podia ser demitido ao livre arbítrio da patronal, por
isso a fábrica optou por transferi-lo para São Paulo. Nesse período, pré-ditadura
militar (1964) “a política operária estava fervendo”. Em São Paulo Albertino
passou a ter mais oportunidades de se reunir com os ativistas, militantes e
dirigentes operários de diversas correntes, com isso intensifica sua
militância. Mesmo após desligar-se da Cobrasma, continuou a se organizar com os
círculos de operários. Nesse período alugou uma sala na vizinhança da própria
Cobrasma.
Essa sala, onde advogava, passou
a ser também a sede da Frente Nacional, sendo que Albertino continuava
advogando em São Paulo também. Toda sua atuação política, organização e
atividades sindicais eram orientadas por grupos da Igreja Católica. Os círculos
dos quais participava, orientavam-se com referenciais das alas esquerdas da
Igreja (Princípios para ação padre Lebret,
Encíclicas papais de João XXIII[1]). Com
isso, em pleno período pré-golpe, com auxilio dos ativistas e militantes da
Frente Nacional, formou-se a primeira comissão de fábrica da Cobrasma. Em meio
a esse processo Albertino, juntamente com outros ativistas e militantes da
frente Nacional, foram presos e levados para as dependências da Aeronáutica em
Cumbica, onde ficou preso durante cerca de 15 dias. No entanto essa prisão não
o afastou da militância. Ainda, a Frente Nacional continuou a expandir-se.
Alugou um novo espaço na Avenida dos Autonomistas. Com isso a comissão de
fábrica expande cada vez mais sua capacidade de organização e atuação política.
No entanto, com o golpe
militar-burguês, a Frente foi fechada, o sindicato sobre intervenção militar.
Albertino, assim como outros operários, ativistas e militantes, foi obrigado a
refugiar-se por cerca de 10 dias. Dentro das fábricas, os militantes e
sindicalistas redobram seus cuidados. Mas os operários continuam organizando-se
clandestinamente, com tudo isso, em 1968 a comissão será o núcleo da greve da
Cobrasma. Militantes da Frente Nacional e da Comissão de fábrica foram até
Contagem (MG), “ver como eles tinham feito a greve lá (...) trouxeram a
experiência deles”. A Frente Nacional, a Comissão de Fábrica e o Sindicato de
Osasco estavam diretamente envolvidos na preparação da manifestação do Primeiro
de Maio de 1968.
“A partir de 1968, começou a queda dos militares, foi uma brecha”
É dessa forma que Albertino
define o maio de 1968 no Brasil. Toda mobilização operário-estudantil no
período, foi entendida como uma onda de ameaça contra o regime ditatorial. A
partir desse processo, o governo militar-burguês decretou o Ato Institucional
numero 5. Desencadeia-se uma enxurrada repressiva contra os ativistas,
militantes sindicais, estudantis e direções políticas. Albertino foi preso
novamente e levado para o Gecan-40 (inteligência militar). “Quando eu cheguei,
a casa estava cercada, todo mundo com fuzil (...) um tenente do exército,
Quitanguilha, chegou a falar para minha filha, que naquela época tinha 14 ou 15
anos, sabe que agora já tem pena de morte no Brasil?”.
Como já se sabe, as forças
repressivas da ditadura, tinham invadido a Cobrasma e fechado o sindicato.
Rapidamente Albertino, em conjunto com outros ativistas, militantes e
sindicalistas passa a re-organizar o operariado no sindicato dos químicos de
Osasco. Era uma forma de evitar a dispersão dos ativistas que não haviam sido
presos. “Quando todo mundo foi preso, o pessoal da Frente Nacional (...) articulou-se
com o cardeal Arns para conseguir que a turma fosse solta, inclusive para que a
Cobrasma pagasse os direitos dos trabalhadores que tinham sido mandados embora.
Pagaram para todos, menos para o Ibrain. Que nessa altura já estava pra fora
[do país]. Eu abri um processo na Justiça do trabalho para que a Cobrasma
pagasse”. Albertino ganhava mais essa causa na justiça em favor de Ibraim.
Uma das formas de reoganização
foi a articulação em torno da luta contra a carestia de vida, uma vez que “não
podia passar perto do sindicato”. “Depois que passou a fase mais aguda, a gente
procurou reunir os trabalhadores que sobraram, praticamente todos estavam sem
emprego. Todos os militantes da Frente Nacional foram cortados da Cobrasma.
Alguns arrumaram empregos em outras fábricas por aqui mesmo (Osasco) e outros,
como João Batistas, foi para São José dos Campos porque ele não conseguia
emprego aqui perto [de Osasco]. (...). Eu consegui chamar o Ze Grof, o Pedro Tintino
[...] e outros mais pra retomar a luta, reiniciar o trabalho. [...] Foi muito
difícil retomar, porque o pessoal tinha muito medo, estava muito escaldado, e a
gente era vigiado todo o tempo”. Outra forma de manter a militância foi
utilizar “o MDB como uma espécie de salvaguarda, o pessoal convergia com o MDB
para poder fazer frente à ditadura”.
Em meio a todo esse processo,
voltou a advogar mantendo a clareza que
“desde que eu tomei ciência das coisas eu sabia que o advogado não muda nada
[...] o que dá a diretriz é a lei, se você tem uma lei [...] não pode discutir
além dela, então você tem que mudar a lei. Então a tendência é a militância
política, que é pra poder mudar a estrutura”. Desta forma, Albertino compunha
uma geração em que se encontrava certo numero de advogados que foram
diretamente influenciados pelo “clima” da luta de classes, e assim, advogavam
em defesa dos trabalhadores, pagamento de direitos, reversão de penalidades
políticas, etc. As perseguições e prisões não os impedia de continuar lutando
em prol do operariado e dos trabalhadores. Isso fica explicito na trajetória de
Albertino, que fora preso novamente em 1974 por mais 10 dias no Presídio
Tiradentes.
No entanto, como já colocava
Albertino, a partir de 1968, com a mobilização operário estudantil abriu uma
brecha Regime ditatorial, esta expande-se até fazer ruir o regime militar
policialesco. “É como se fosse uma espécie de muralha com um furinho e começou
a vazar água [...] foi crescendo e não teve jeito de segurar”.
Frente a isso, os militares, em conjunto com a
burguesia, patronato e seus sócios menores, começaram a articular um plano de
emergência para garantir sua própria salvaguarda e, ao mesmo tempo, dar sobrevida
ao capitalismo tupiniquim. Pois de acordo com Albertino “eles ainda tenham
força bastante para impedir que se faça a punição daqueles que agiram de
maneira ilegal”. Em relação a “anistia ampla, geral e irrestrita”, Albertino
considera que os militares e seus apoiadores “fizeram anistia para eles”. Por
outro lado, a militância no seu conjunto, bem como as direções políticas,
sindicais e intelectualidade “A gente não tinha assim uma visão muito clara das
coisas não. O fato de fazer a anistia obliterava, encobria o que estava por
trás. Então a gente não tinha idéia de que estava fazendo [anistia] para os
dois lados [torturados e torturadores]. Não era clara essa idéia. Havia mais
uma empolgação. Anistia, anistia, anistia! E esqueceu do resto”.
Essa debilidade expressa-se na
Comissão da verdade e a política do governo Dilma, “nos estamos atrasados em
relação aos outros países, Argentina, Uruguai, Chile, todos já fizeram essa
mudança radical... Nós não, mais vai chegar a hora”. Mas ainda, para Albertino
todo o movimento em busca da punição dos torturadores deve ser reivindicado “O
fato de ter sido alterado o registro civil do Hersog para constar que a morte
dele foi provocada pela ditadura, eu acho que é um marco. A apresentação da
documentação da morte do deputado Rubens Paiva é outro marco. E daqui a pouco vai
tendo mais coisas... É verdade que quando chegar a hora de punir serão poucos
os que estarão vivos, mas de qualquer forma é um caminhar, apesar das pressões
contrárias”.
Ainda, em relação a luta sindical
atualmente, com base em suas experiências vividas a pouco no movimento
operário, Albertino argumenta em defesa do não atrelamento dos sindicatos com
os governos. Combate inclusive o imposto sindical reivindicado por grande parte
da esquerda brasileira.
“Em termos de luta sindical hoje,
eu vejo com muito maus olhos essa vinculação mais acentuada do sindicato ao
governo, quanto mais estiver preso [atrelado ao governo] menos conquistas eles
vão ter, porque ai eles vão trabalhar em função dos interesses do governo e não
dos trabalhadores. Desde que eu trabalhava na Frente Nacional, eu defendia a
liberdade sindical de acordo com a OIT, que tem uma convenção, convenção 51,
que fala que a organização sindical tem que ficar absolutamente liberada para
fazer a organização do jeito que quiser. O governo não tem que se meter. Não
tem que ter esse imposto sindical. Essas coisas são vinculantes, prendem o
sindicato ao governo. Eu sou favorável a essa mudança. Tanto é verdade que, em
uma ocasião nos fizemos uma reunião dos antigos militantes da Frente Nacional,
há uns 5 ou 6 anos atrás, o mais até, e fizemos um documento e mandamos para a
OAB, pedindo que a OAB encaminhasse a luta pela liberdade sindical, e a OAB
arquivou...”
[1] As enciclicas papais de João
XXIII foram promulgadas em um momento de grave crise da Igreja, buscando
re-localizar, a Igreja buscava aproximar-se mais das frações mais precarizadas
do proletariado latino-americano. Por isso lançam tais encíclicas, essas
constituíram a base “teórica” de toda a esquerda católica, sobretudo da
corrente conhecida com Teologia da libertação. São oito 8 pontos que são
chamados de princípios
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_enc%C3%ADclicas_do_Papa_Jo%C3%A3o_XXIII).
Entre os principais pontos da encíclica estão: 1: “Conhecimento da verdade,
restauração da unidade e da paz na caridade”. 3: Sobre o Rosário: Oração para a
Igreja, missões, os problemas internacionais e sociais. 8: Sobre o
estabelecimento da paz universal, na verdade, a justiça, a caridade e a liberdade.
Confira: BERBEL, M. R. Partido dos
Trabalhadores: tradição e ruptura na esquerda brasileira (1978-1980).
Dissertação de mestrado. FFLCH-USP. São Paulo. 1991.
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